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UM PERU EM NOSSAS VIDAS E O ROCK DO MAVERICK COR DE SANGUE

21 / fevereiro / 2018

por Marcelo Mendez

Era mais um dia de Copa do Mundo.

Eu já estava me acostumando com o fato de sempre acontecer algo bacana nos dias de jogos do Brasil. Naquele dia não seria diferente e a novidade da vez era a vinda do Paulinho pra buscar eu e meu Pai pra gente ir ver o jogo lá no bairro Campestre, do outro lado da cidade de Santo André

– Mauro, por favor, fala pra aquele doido do seu amigo não correr com aquele carro!

– Calma, Mulher. Paulinho sabe o que faz. É gente boa…

– É um doido! E você é outro! Cuida do teu filho!


Depois dessa rápida prosa com minha mãe, meu pai veio até meu quarto me pegar. Paulinho já buzinava na frente de casa e então partimos. Do quintal, vi aquele carrão vermelho no nosso portão e Paulinho lá encostado no carro. Com uma calça boca de sino verde, uma camisa azul, umas correntes no pescoço e um bombom na mão, me convidou:

– E aí, Marcelo! borá la ver o jogo. Entra aí…

Levantou o banco para ir na parte de trás do seu Maverick vermelho. Íamos novamente para casa de um amigo, ver aquelas cores via aparelho de televisão, em mais um dos jogos do tal torneio o qual eu já começava me simpatizar…

A descoberta do rock and roll

Da janela do carro, via o mundo passar. Era outra cidade.

Santo André em 1978 não tinha muitos carros, muitos viadutos, trânsito stress, nada. Era uma cidade que relutava em ser urbana, que mantinha as coisas de cantinho do interior e andar por suas ruas pouco habitadas era muito legal.

Na parte da frente do carro, enquanto o Paulinho dirigia, meu Pai brigava com ele para abaixar o volume do toca fitas último tipo, que tinha no Maverick:

– Mauro, isso é Bachman Turner Overdrive. Não se ouve em volume baixo…

Hoje eu sei que ouvíamos “Down The Road” e que o BTO é uma bandaça. Mas aos 8 anos aquilo era tão somente uma barulheira deliciosa. Devo ao Paulinho os primeiros rocks da vida, portanto. Mas ele abaixou o volume e então ele e meu Velho passaram a falar do jogo que veríamos logo mais. Eu ouvi.

A partida seria contra um time que tinha nome de frango de Natal: Peru. Eu anotava mais um lugar do mundo que a Copa me apresentava, agora esse; Peru. Eles falavam de um time muito bom, que tinha uns jogadores de nomes estranhos, Oblitas, Chumpitaz, Manso e um outro, que segundo eles, era um craque de bola, Cubillas.

Concluí que seria um jogo complicado, que mais uma vez meu Pai ficaria nervoso, fumaria um cigarro atrás do outro, mas não foi o que houve. Pelo menos não por conta do jogo…

A queda…

A casa do Paulinho estava lotada. Ele trabalhava com meu Velho na mesma firma, gostava de rock, de cerveja, tinha cabelão comprido e falava muito de umas pessoas que já não estavam mais conosco, que por alguma razão meu Pai evitava falar comigo;

– Pai, cadê fulano?

– Ele foi viajar, já já volta!

Minha mãe, ao contrário do meu pai, dizia que essas pessoas estavam sumidas e eu não entendia o porquê… Seja como for, o jogo rolava.


Ao contrário do que meu pai e Paulinho falavam no carro, o tal Cubillas, pelo menos naquele jogo, não jogou nada. No Brasil, ao contrário da expectativa de ter Rivellino, de Zico sair jogando, de Reinaldo voltar como titular, quem arrebentou com o jogo foi um cara de nome Dirceu.

Um canhoto magrinho, cabeludo, esperto, que batia na bola como poucos. Foi Dirceu quem carregou o time do Brasil para o 3×0 final daquele jogo. Mas sentia que naquela casa cheia, algo não estava lá muito alegre. Piorou com a notícia que alguém na casa contou para todos:

– Fulano caiu!

Na minha cabeça de menino de 8 anos, pensei que as pessoas ficaram chateadas, talvez por conta de o tal fulano ter se machucado com a queda, eu mesmo, vivia caindo lá nas peladas da rua. Meu pai era um dos tristes, então eu decidi dar esse alento a ele:

– Pai, num fica assim; A gente cai mesmo, depois a mãe passa mercúrio e sara!

De olho marejado de água, meu pai me fez um afago no rosto e me abraçou. Eu retribuí e depois o Paulinho nos levou embora. Ao contrário da alegria da ida, na volta, não teve rock, não teve prosa, não teve nenhuma festa. O Brasil seguia vendo os seus caírem e nada era feito com relação a isso. No carro, Paulinho tenta quebrar o gelo:

– Esse Peru, hein? Que time estranho, Mauro.

– Pois é, não entendi a partida que eles fizeram.

O Peru seguiria em nossas vidas naquela Copa, de uma outra maneira mais estranha ainda. Mas isso é uma outra história…

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