Escolha uma Página
Generic selectors
Exact matches only
Search in title
Search in content
Post Type Selectors

REI DO APITO

entrevista: Sergio Pugliese | texto: André Mendonça | vídeo e fotos: Daniel Planel

 

“Todo juiz é ladrão, Cabelada não”. Quem acompanhou o futebol carioca nos anos 70 e 80 conhece bem esse frase, que é sempre seguida de gargalhadas. Há tempos a equipe do Museu da Pelada queria conhecer de perto esse personagem folclórico. E foi no Beco do Rato, na Lapa, na comemoração dos 50 anos bem vividos da jornalista Marluci Martins, que estava acompanhada do maridão Moacyr Luz, lenda do samba, e de um punhado de amigos, muitos companheiros de redação, como Renato Maurício Prado, Eucimar Oliveira, Dácio Malta e Denise Nascimento. Animando a roda de samba, o boleiro Leandro Samurai. E foi nesse clima descontraído que batemos um papo com Luiz Carlos Gonçalves, o Cabelada, um dos árbitros mais hilários do cenário nacional.

Carioca típico, malandro de Vila Isabel, cliente assíduo do antigo Petisco da Vila, não dispensa uma boa gelada e sempre foi figurinha carimbada nas ruas da cidade. Dessa forma, antes mesmo da sua chegada, um balde com cervejas trincando já estava sobre a mesa. Era o cenário perfeito para o árbitro soltar o verbo sobre as polêmicas em que se envolveu.

– Vocês querem ouvir uma história boa? Vou começar pela melhor! – disparou assim que chegou, já com o copo devidamente cheio.

Tratava-se de uma confusão nos minutos finais da partida entre Bangu e Goytacaz, pelo Campeonato Carioca. O Bangu vencia com facilidade e o jogo caminhava sem polêmicas até o goleiro Gilmar, do alvirrubro e da seleção brasileira, fazer cera.

Cabelada correu até ele para aplicar o cartão amarelo, mas um berro ecoou do banco de reservas do Bangu:

– Cabelada, não!! Esse tem dois! – alertou Dr. Castor, do banco de reservas. Mais um amarelo e o goleiro ficaria de fora da decisão contra o Fluminense.

O árbitro, então, mudou a direção e voltou-se para o lateral-esquerdo.

– Esse também tem dois!! – esbravejou o dirigente.

– Então para quem eu dou essa merda, doutor? –

 

 

(Foto: Reprodução)

 

rebateu Cabelada, para em seguida punir o lateral-direito.

A confusão foi tema de muita discussão no dia seguinte e estampou as capas de todos os jornais. Sagaz, Cabelada deu o seu jeitinho. De acordo com ele, havia sofrido uma crise de labirintite 40 dias antes daquela partida e utilizou o problema como o grande responsável pela confusão.

– O Dr. Eduardo (Caixa d’água) não queria que o Bangu jogasse o clássico sem seu goleiro titular. Com isso, ganhei umas três ou quatro escalas seguidas. Foi o famoso “cala boca”.

Com tantas polêmicas no currículo, Cabelada revelou os bastidores da Federação:

– Sempre rolou interesse e volta e meia eles me pediam algum “favor”. Eu apoio o sistema. Na minha opinião, Fluminense, Vasco, Flamengo e Botafogo não poderiam ser rebaixados nunca e deveria existir um regulamento para isso. Isso evitaria que os árbitros ficassem em saia-justa.

Mesmo tendo apitado sua última partida oficial há 25 anos, a figuraça afirmou que volta e meia é reconhecido nas ruas. Além disso, está prestes a ser homenageado com um curta sobre sua vida dentro e fora de campo, algo que nunca imaginou. Para o projeto ser viabilizado, no entanto, os diretores do filme criaram uma arrecadação coletiva (https://www.catarse.me/cabeladanao), que segue a todo vapor na internet.

Por fim, o árbitro não titubeou ao falar sobre o seu estilo:

– A minha conduta é um pouco diferente. Sou autêntico, gosto de bebida, gosto de mulher, gosto da noite. No mundo de hoje sou visto como extravagante! – revelou o vascaíno confesso.

Após muitas horas de resenha, deixamos o bar dispostos a marcar outro papo para terminar de ouvir as infinitas e divertidíssimas histórias dessa figura.