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Nielsen Elias

OS GAROTOS DE IPANEMA

Muitos dizem que pelada boa é aquela que tem goleiro, sem essa de revezar com jogadores de linha, que às vezes até fazem corpo mole para levarem o gol e trocarem a posição o quanto antes! Por isso, a equipe do Museu quis saber mais sobre a história de Renha, um dos maiores goleiros de pelada do Rio e que hoje é treinado por ninguém menos que Nielsen, ex-treinador de goleiros da Seleção Brasileira!

Seguindo todas as recomendações de segurança, fomos até Ipanema e, como de costume, tivemos o privilégio de encontrar ainda o cantor Fagner e Paulinho Pereira, que deram o pontapé inicial da resenha e relembraram histórias deliciosas dos áureos tempos do futebol brasileiro.

Após o papo, chegou a hora da verdade! Nielsen armou os cones e deu início ao treinamento. No alto dos seus 63 anos, Renha esbanjou agilidade e flexibilidade, mostrando que ainda tem muita lenha para queimar. Ao lado do jovem Gustavo, jovem que perdeu 20 quilos e está em busca do sonho de se tornar profissional, Renha fazia pontes e demonstrava segurança.

Uma coisa é certa: quando as peladas voltarem, os atacantes terão trabalho em dobro para balançar as redes de Renha!

COM O DESTINO NAS MÃOS

por Alberto Lazzaroni


Rio de Janeiro, anos 50. A então capital da República era uma cidade bem diferente da que conhecemos hoje. Eram os anos subsequentes ao fim da Segunda Guerra Mundial e vivia-se a esperança de novos tempos. Tempos de paz e prosperidade.

Desde a sua fundação, a cidade sempre teve como característica marcante o fato de ser aberta ao mundo, de receber pessoas das mais variadas origens. E foi ali, no então aprazível bairro do Rio Comprido, que se estabeleceu um filho de imigrantes sírios. Seu nome? João Elias. Ou simplesmente Elias. Ou ainda Cachimbo, por conta do amigo inseparável.

Elias era uma figura ímpar. Sujeito alto, forte e decidido, não gostava de ficar esperando as coisas acontecerem. Ele ia literalmente à luta para realizar os seus objetivos. Era chofer de táxi. Ou melhor, era “O” chofer tamanha a seriedade com que encarava o seu ofício, o que inspirava todos à sua volta. Aqui vale lembrar um detalhe inusitado: à época os taxistas tinham que usar um uniforme, que era camisa branca e calça e gravata pretas. A camisa dele vivia furada por conta das brasas do cachimbo.


Apaixonado por futebol e com tamanha liderança, não tardou a buscar novos voos. O América FC, tradicional clube tijucano, abriu suas portas para ele e, com a mesma maestria com a qual guiava seu táxi, conduziu o time de veteranos a grandes conquistas. Mas Elias queria mais. Não deixava de pensar na família. Criou então um time de futebol de salão (hoje futsal) do qual faziam parte os três filhos. Os dois mais velhos eram realmente bons de bola mas o caçula não jogava nada. O que fazer? Deixar de fora? Nem pensar. Não titubeou: vai virar goleiro.

E aí o destino se encarregou do restante. Os dois mais velhos não deram sequência na carreira de jogador de futebol. Já o caçula é ninguém menos que o grande Nielsen Elias. As mãos que seguravam o volante inspiraram as mãos que seguravam a bola. Dois homens fortes. Dois homens de bem.

O destino estava literalmente em suas mãos.

Bate-pronto: essa coluna é uma declaração de amor de um filho para o seu pai. Serve para nos mostrar o quanto podemos ser inspiradores fazendo o simples, o básico, qual seja fazer sempre com amor. Obrigado Nielsen Elias por me dar essa oportunidade.

EU, LAZARONI, A POCHETE E OS PASTORES ALEMÃES | PARTE 3

por Nielsen Elias (@nielsen_elias)

CAPITULO FINAL


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No dia seguinte, já estávamos no aeroporto de Lisboa para fazer conexão em Paris. 

Iriam começar as nossas viagens aos países comunistas… 

Aterrissamos no aeroporto Charles De Gaulle, bem cedinho. E fomos direto buscar nossas malas no serviço de guarda volume.

Malas nas mãos, nos encaminhamos para o balcão da Air France. 

Havia uma pequena fila, mas logo nos atenderam.  

Laza entregou nossos passaportes, juntos com as passagens. Foi quando tivemos a primeira surpresa dessa viagem ao leste europeu.  

Com aquela simpatia, que é bem peculiar dos franceses, ela nos informou:

– Esse voo não parte daqui. Sai do Orly…

Orly é um outro aeroporto de Paris e, surpresos, perguntamos como fazer. Ela disse para descermos e pegar o shuttle; e chamou outra pessoa que estava atrás. 

Pensamos “será que dará tempo?”.

Malas nas mãos, descemos para encontrar o ônibus que nos levaria ao aeroporto de Orly. Ufa… encontramos! 

Enfiamos as malas no bagageiro e subimos no ônibus, que já estava perto de partir…

Fomos apreciando a beleza da cidade pela grande janela de vidro. 

A freada do ônibus, nos confirma que chegamos ao nosso destino. 

Pegamos as malas e entramos. 

Através das enormes escadas rolantes, chegamos ao balcão da companhia. 

Aguardamos a nossa vez e fomos atendidos, com a mesma gentileza. 

Os franceses são muito coerentes…

No balcão, nos informaram que o voo para Budapeste é por uma outra companhia, que tinha parceria com a Air France. 

Lá fomos para o balcão da companhia, que a princípio não havia ninguém no atendimento. 

Aguardamos um pouquinho até chegar uma atendente. 

Entregamos os passaportes e as passagens para a mocinha, que já era bem mais simpática. 

Ela confere tudo, pois havia a necessidade do visto de entrada, e diz:

– Tudo ok!

E nós perguntamos sobre as malas. Então ela explica que teremos que levar até ao avião e lá o pessoal se encarregaria de colocar na aeronave e finaliza dizendo qual era o portão e a hora de embarcar. 

Procuramos ficar em frente ao local de embarque, para não dar qualquer zebra… 

Estranhamos que o portão era minúsculo, algo que não correspondia aos outros. 

Bem, chegou a hora. 

A mesma mocinha que nos atendeu no balcão, é a que conduz um pequeno grupo até aeronave… 

Andamos carregando as nossas malas atrás dela.

Chegamos no avião e levamos um susto! Era bem pequeno e bem baixo, quase não havia necessidade de escada para subir. 

Nossas malas foram entregues ao responsável, que as levou.

Agora a mesma mocinha está frente das escadas para receber os cartões de embarque.

No avião, havia alguma coisa escrita em letras vermelhas que deveria ser o nome da companhia que nos levaria para Hungria, mas não conseguimos ler. Pelo o número de consoantes que formavam a palavra, deduzimos que era russa.

Dentro da avião, percebemos que estávamos mesmo indo para um país de regime comunista. 

As poltronas eram bem desconfortáveis e não reclinavam. Eram duras!! 

A capacidade de passageiros era bem pequena. Fez me lembrar o fusca, lançado no Brasil, que era bem mais simples, e foi batizado como “ pé de boi”. Pois bem, aquela era uma boa definição para aquele avião, era um “pé de boi”!

Depois de uma viagem cansativa, chegamos a Budapeste!! 

O aspecto do aeroporto nos dizia o que iriamos encontrar naquele país…

Pegamos um táxi e chegamos ao nosso hotel. No meio do caminho, fomos descobrindo, com o auxílio do motorista, que o Rio Danúbio dividia a cidade em duas partes, Buda e Peste, e uma era mais moderna que a outra. 

Advinha qual lado do nosso hotel? O que deixou Lazaroni puto da vida com quem tinha traçado aquele roteiro…Haja vista o que aconteceu em Bruxelas… 

Como estávamos cansados, fomos dormir um pouco. 

O hotel não ajudava muito. As cortinas, em algumas partes, estavam soltas e as colchas de chenile não tinham uma boa aparência. Mas, “o que não tem remédio, remediado está”.

No dia seguinte, fomos até o outro lado do rio. Atravessamos uma ponte e estávamos em Peste. Realmente, havia uma grande diferença entre os dois lados. Peste era bem mais moderna, com bonitos hotéis e lojas, e mais movimentada, para a nossa frustração…

O povo era muito sofrido. Eles adoravam o futebol, e não era pra menos. Um dos maiores jogadores do mundo, Púskas, que depois conquistou a Espanha, era Húngaro. 

Mas, era unânime a revolta deles contra o regime que foi implantado, após a guerra, pela União Soviética. Nos poucos contatos que tivemos, eles sempre mencionavam que teriam que ter muito cuidado porque estavam sempre sendo vigiados.

 Realmente, eles ainda possuíam um futebol muito técnico e de muita qualidade, como podemos conferir na partida em que assistimos.

Encerramos nossa passagem pela Hungria e viajamos para Bulgária, que era a mesma situação encontrada em Budapeste. 

De lá fomos para Tchecoslováquia. 

Praga é uma cidade linda!! Com suas igrejas e seus monumentos de uma arquitetura magnifica.  

Além dos seus cristais Bohemia, que são muito respeitados em todo mundo.

Tchecoslováquia x Portugal foi o jogo mais violento que assistimos em toda a viagem.                      

 A seleção local bateu muito nos patrícios. 

Ficamos impressionados com as entradas desleais dos Thecos e, com a complacência da arbitragem, venceram de 1×0.

Após o jogo, encontramos com alguns jogadores da seleção portuguesa, que só fizeram reclamar da violência do adversário.

No mesmo voo, voltamos a Paris..

Agora, em Paris, iremos pegar o trem que nos levará a Dresden, na Alemanha Oriental. 

É sempre bom relembrar que o Muro de Berlim estava prestes a cair, pois a União Soviética com seu regime comunista estava completamente destroçada.                     

 Pois bem, pegamos o trem em Paris. 

A viagem levaria de 10 a 12 horas até Dresden. 

Teríamos que fazer a troca de linha em Berlim. 

Era uma manhã de sol e a viagem prometia muito. 

O trem me remeteu aos filmes de Humphrey Bogart, nos anos 40, e me sentia o próprio!

Havia história naquele trem. 

Seu interior era de uma madeira muito bonita e dava um toque de romantismo. Era igualzinho ao filme. 

A atmosfera era fantástica.

Nos instalamos numa cabine com dois bancos, um de cada lado. 

A janela enorme mostrava as plantações que tornava a viagem amena e bucólica.

Nossas malas nos acompanhavam dentro da cabine e serviam para repousar as nossas pernas. 

Tiramos um cochilo e fomos acordados com o sino do inspetor do trem, anunciando o almoço. 

A viagem seria longa e precisávamos nos alimentar. 

Lazaroni e euf omos ao restaurante, que era mais romântico ainda. 

Com suas cortinas, as mesinhas e fechando um pequeno abajur na mesa, e pela janela passava uma linda paisagem. 

Realmente, parecia que estávamos nos anos 40. 

O garçom, bem simpático, se aproximou e nos ofereceu o menu. 

Pedido feito, e um bom vinho francês para acompanhar o prato, sugerido pelo garçom. Ele usa gravata borboleta preta, com uma camisa branca e calça da mesma cor da gravata.

Final de almoço, o garçom já a essa altura se tornara mais íntimo e simpático. 

E nos perguntou o que fazíamos e para onde estávamos indo.

Naturalmente, falamos…

Ele ficou todo entusiasmado quando soube que o Laza era o técnico da seleção brasileira de futebol, e perguntou:

– Você já possui o marco alemão!?

Laza responde que não. Então ele oferece alguns marcos que possuía no bolso, dizendo que faria um preço bem mais em conta, para em seguida pedir o nosso autógrafo.

Laza acha uma ideia boa, pois poderia precisar quando chegássemos em Berlim. Abre a sua pochete e tira alguns dólares e compra o dinheiro do garçom. Após isso, voltamos a nossa cabine…

Mais algumas horas de viagem, chegaríamos a fronteira da Alemanha Oriental. Recebemos um formulário alfandega para preenchermos como em qualquer país. 

Eu preencho o meu e o Laza a dele e, entregamos ao responsável, juntos com os nossos passaportes.

 Um pequeno detalhe. 

Havia uma pergunta no formulário: Você traz marco alemão? E o Laza, como tinha adquirido do garçom, diz que sim!!! Pra que!?!?

De repente, a porta da nossa cabine é aberta com grande violência e, do nada, aparecem quatros soldados alemães e dentre eles, uma soldada, todos de preto, com três ferozes e enormes pastores alemães, latindo muito alto, que chegam a espumar. querendo nos atacar.  

Ficamos sem qualquer ação. 

Um grande soldado, com o formulário na mão começa gritar em alemão, enquanto os cães estão quase dentro da cabine. 

É um clima de pavor. Parecia que nós estávamos na segunda guerra mundial e éramos os inimigos que tinham sido descobertos.

Não entendíamos o que estava acontecendo, enquanto isso alemaozão gritava, e batia na folha com muita raiva, em alemão. 

Nós, acuados, com os pés já recolhidos das malas, que nessa hora virou nossa barreira de proteção, para evitar que os cães nos mordessem e espremidos contra a parede, não sabíamos o que fazer ou que falar…

E o alemão possesso gritava cada vez mais, e essa altura o seu rosto transmitia a sua raiva. 

Estava vermelho de tanto ódio e os cães o acompanhavam, estavam cada vez mais perto das malas, que ainda nos protegiam.

O clima e atmosfera era da segunda guerra mundial, essa altura eu só pensava na Gestapo, o Humphrey Bogart tinha ido pra casa do caralho…  romantismo era a puta que pariu… 

Nós estávamos todos cagados!!! Caralho, que foda!!! 

Então, de repente o alemãozão percebe que não falamos alemão, e fecham a porta da cabine, ficando do lado de fora.  

Laza me olha e eu olho pra ele, estamos brancos…e uma pergunta no ar, que porra tá acontecendo, caralho?!

O trem parado. Um corre, corre infernal e nós lá dentro trancados…

De novo, a porta abre. E lá vem o alemãozão com uma soldada. 

Ela tenta interagir com a gente em inglês, e mostrando o passaporte com o formulário, pergunta a quem pertence? 

Laza diz que é dele. 

O inglês dela é horrível, mas através de gesto, o Laza vai se entendo…

Até que mostrando o formulário preenchido pelo Laza, finalmente ela aponta para a pergunta que está nele.

Você traz marco alemão!?  Laza responde que sim!

 Ela pede pra ver. Laza abre a pochete e retira o causador de todo aquele pânico.

Os marcos alemães!!!! 

Ela pergunta como ele tinha conseguido aquele dinheiro? 

Ele responde que comprou com o garçom, no restaurante.

Pára tudo. 

Agora, voltam a trancar a cabine e vão até o restaurante encontrar o garçom.

Surpresaaaaa! O filho da puta tinha descido na ultima parada do trem. 

Puta que pariu, porra!! E agora!? 

O puto do garçom fodeu a gente!!!

Então, a mulher volta a cabine dizendo que ele tinha ficado na última parada. 

E, começa a perguntar o que iríamos fazer na Alemanha? 

Santa bola!!!! 

O Laza explica que é técnico da seleção brasileira de futebol e que estamos indo assistir em Dresden o jogo da seleção da Alemanha.

O trem continua parado na estação e aí já se vão mais de uma hora…

Saem de novo da cabine com os passaportes confiscados, juntos com a porra dos marcos. 

E, pensamos…

Vão verificar se essa informação é verdadeira.

Estamos torcendo que consigam, porque o filho da puta do garçom não poderia confirmar a porra da nossa estória. 

Ele se mandou… sabia que iria dar merda… e a gente ali rezando para que a soldada confirmasse o que o Laza tinha dito.

Depois de uma espera interminável, recheada de tensão e pavor, a porta volta a abrir, novamente eles entram.

Ela já mostra no rosto uma expressão mais calma e sem os putos dos cachorros, e diz que está tudo ok e podemos continuar a viagem. 

Devolve os passaportes, já com carimbo da entrada. Mas o dinheiro foi confiscado. 

Aquela porra daquele dinheiro!!!

Enfim, chegamos  em Dresden tarde da noite, porque tivemos que pegar outro trem de Berlim para Dresden.

Chegando em Dresden, um grande busto de Karl Max saltava aos nossos olhos, uma homenagem ao líder do regime.

Se nós tínhamos reclamado dos hotéis anteriores, foi porque ainda não conhecíamos aquele. 

Pensa num hotel ruim, agora coloca ele em Dresden! PQP!!!

Após o jogo assistido, tá na hora de irmos embora…graças a Deus!!

No caminho, as ruas estavam cheias daqueles policias de preto, iguais aqueles do trem e com os pastores, também.  

Estavam cheias de bloqueios…

Nosso táxi é parado. Olho pro Láza e pergunto:

– De novo?

Os policiais se aproximam e nós olham, mas manda logo o motorista seguir. Ufa!!!!!

 Aí, ficamos sabendo que há um grande movimento popular para derrubar o Muro de Berlim.

Pedimos ao motorista andar mais rápido, vai lá que o muro cai em cima de nós…

Dessa maneira, foi a nossa viagem ao leste europeu, nos seus últimos dias do comunismo… 

Não poderia ter sido pior…

ufa…

Capítulo 1: https://www.museudapelada.com/resenha/eu-lazaroni-a-pochete-e-os-pastores-alemaes

Capítulo 2: https://www.museudapelada.com/resenha/eu-lazaroni-a-pochete-e-os-pastores-alemaes-parte-2

EU, LAZARONI, A POCHETE E OS PASTORES ALEMÃES | PARTE 2

por Nielsen Elias (@nielsen_elias)


2º CAPITULO 

Ainda em Bruxelas, como haveria um espaço entre os jogos da eliminatórias.

Lazaroni resolveu ir até Portugal para acompanhar o jogo entre o clube do Porto x Benfica. Afinal de contas, pelo menos quatro jogadores estavam na sua lista para a Copa do Mundo, que eram, Ricardo Gomes, Mozer e Valdo pelo Benfica e Branco pelo Porto.

Já no aeroporto de Lisboa, fomos recebidos pelo empresário Manoel Barbosa, que na ocasião tinha um certo prestígio na Europa, em especial em Portugal.

Manoel Barbosa era um Benfiquista ferrenho e naquele momento tinha colocado os três jogadores nos encarnados, como chamam os torcedores do Benfica.

A rivalidade era bem acentuada entre as torcidas.

E essa partida aconteceu no antigo Estádio das Antas, pertencente ao Porto.

Fomos de carro, de Lisboa a cidade do Porto.

Levamos quase três horas para chegar.

O movimento era muito grande de torcedores, não só no entorno, como dentro do estádio.

Carro estacionado e o convite nas mãos. 

Lazaroni, eu, Manoel Barbosa e seu segurança subimos a rampa que tinha uma placa que indicava: camarotes.

Pelo caminho, percebemos que alguns torcedores do Porto demonstravam um certo descontentamento com a presença do Manoel Barbosa, mas como ele era torcedor do Benfica, consideramos  situação normal, que acontece na maioria dos países.

Entramos numa pequena fila para passarmos pela roleta. 

O primeiro foi o Lazaroni que não teve qualquer problema para entrar, até porque naquela altura já sabiam da sua presença na cidade para assistir ao clássico, tudo bem natural.

O segundo fui eu, que da mesma forma que o Laza, entrei normalmente. 

E logo após de mim, vinha o Barbosa.

Eu e Lazaroni paramos para esperar por ele.

Mas, quando o Manoel Barbosa chegou bem perto da roleta, de repente, surge uma mão e bate no peito dele com uma certa violência , e diz:

– Você aqui não entra!!!!     

Levamos um grande susto com aquela reação inesperada. Não entendíamos o que estava acontecendo… Por outro lado o Barbosa também não fez por menos. Com o ingresso na mão, bradava enraivecido que iria entrar de qualquer maneira e que além de tudo estava acompanhando o mister da seleção brasileira e aquilo era um desrespeito! Uma grande confusão se formou de imediato. 

E rapidamente fomos conduzidos ao nosso camarote, mesmo argumentando que gostaríamos de esperar o Manoel Barbosa, afinal era o nosso cicerone.

Com a argumentação que tudo logo seria resolvido e que não nos preocupássemos, nos  conduziram até o camarote.                                            
Jogo pra começar e nada do Manoel…

O estádio estava lotado!!

Acaba o primeiro tempo, mas ele não aparece… essa altura achávamos que estava em algum lugar reservado para os torcedores do Benfica.

Finalmente, o jogo termina em 0x0, e nada dele aparecer…

Fomos convidados para descer ao balneário (é assim que os portugueses chamam os vestiários).

Já no balneário, encontramos com todos os jogadores, em especial os brasileiros e ficamos conversando por um bom tempo.

Os jogadores do Benfica vão para o ônibus para retornar a Lisboa. 

E continuamos o papo com o Branco, que nos leva para o estacionamento, onde sua esposa o espera com seu carro.

No trajeto até o carro, verificamos que o estacionamento está praticamente vazio e o carro do Manoel Barbosa não está por lá.

Contamos o ocorrido ao Branco, que nos diz que os dirigentes do Porto odeiam ele por suas declarações contra o Porto.

Falamos mais sobre o jogo, que achamos um pouco violento, com o que o Branco concorda e tira da bolsa a caneleira que se usa em Portugal, como uma forma de confirmar o nosso sentimento em relação à partida.

Me surpreendo com a caneleira, pois não é nada convencional. É um tipo bem diferente. A começar que é feita sob medida em loja de ortopedia. 

O material é bem leve e ela se encaixa na perna, se prendendo na panturrilha. Seu tamanho também é bem diferente, ela vai da base do joelho até quase o calcanhar, dessa forma protege por inteiro a tíbia. Sensacional!!!

A nossa preocupação aumenta não só com o Manoel Barbosa e também como retornaríamos para Lisboa? 

Menos mal, porque estamos com o Branco e ele poderia nos socorrer. 

Papo vai e papo vem, surge um mensageiro com um recado.

Ele pergunta:

– O senhor é seu Sebastião!?

Laza, com a cabeça faz um sinal positivo.

Após a confirmação, ele diz:

– Seu Barbosa está esperando o senhor no restaurante tal…

Ficamos mais aliviados e o Branco se oferece para nos deixar lá. E emenda:

– Só posso levar, infelizmente não poderei ficar… vocês sabem como é, né!?

Era restaurante grande e com estilo bem antigo, decorado por barcos e redes de pescar. 

Sua especialidade era frutos do mar!

Entramos, e logo avistamos o Barbosa sentado à mesa e atrás, em pé, seu fiel escudeiro.

Ao nos aproximar, vimos um Manoel bem destroçado…

Sentamos à mesa e já havia uma garrafa de vinho aberta.

A aparência dele era a pior possível, parecia que tinha saído de uma garrafa. Cabelo em desalinho, seu paletó todo amassado. 

No pé só um sapato.

Seu rosto estava marcado com algumas manchas vermelhas, mas o que mais chamou a minha atenção foram seus óculos Cartier. A lente esquerda estava pra baixo, enquanto a direita estava pra cima…  Os óculos estavam completamente tortos!!!

A gente meio perplexo com toda aquela situação não sabia o que dizer…

Então, ele quebra o silêncio e fala:

– Olha o que aqueles bárbaros fizeram comigo… me bateram à beça!! 

Eu e Laza balançamos a cabeça, quase ao mesmo tempo!

E ele continuou falando de forma resignada:

– Sabe de uma coisa mister!? Poderia ter sido uma tragédia….

A sorte que meu segurança é muito calmo e não reagiu…

– Ainda bem, mister!!!! Ainda bem… 

 E finalizou…

No próximo capítulo, estaremos no leste europeu, países com o regime comunista.

Lembrando que o muro de Berlim está preste a cair…

Até!

EU, LAZARONI, A POCHETE E OS PASTORES ALEMÃES

por Nielsen Elias

1º CAPITULO


Há 31 anos, exatamente no final dos anos 80, após a classificação do Brasil para a Copa de 90.

O técnico Sebastião Lazaroni da seleção brasileira, e eu, fomos para Europa, em especial ao leste europeu, acompanhar alguns jogos das eliminatórias europeias para a Copa do Mundo na Itália.

No roteiro, estavam os países, Bélgica, Hungria, Tchecoslováquia, Bulgária e Alemanha Oriental. E nesse período, estava começando uma grande mudança politica nos países do leste europeu.

A primeira parada foi em Bruxelas, na Bélgica, após uma conexão em Paris… Malas nas mãos, partimos para o hotel com as reservas previamente feitas. Ao dirigirmos à recepção com as reservas devidas, nossa grande surpresa, quando o gerente com sua frieza europeia nos disse:

– No booking!!! I feel so much… – mesmo assim, o Laza tentou argumentar que ela estaria confirmada. Então, o gerente pediu que esperássemos no hall do hotel, pois iria tentar resolver aquela situação; e sempre afirmando que tinha um grande evento na cidade e todos os hotéis estariam lotados!

Já era noite, e nós sentados nas poltronas, que ficavam no hall, e muito cansados pela viagem, estávamos “loucos” por um banho e afrouxar o nó da gravata…e essa altura, nossas malas já serviam como descansos para as nossas pernas. E, finalmente, após uma longa espera, chega o gerente com uma solução, isso já quase meia noite, e diz:

– Como está muito tarde vocês irão dormir aqui, mas nas primeiras horas da manhã terão que deixar o quarto, pois um hóspede estará entrando amanhã bem cedo. E enquanto isso, vou tentando um lugar para vocês ficarem amanhã…

No dia seguinte, apesar de não termos um sono confortante, fomos despertados pelo telefone com o gerente dizendo que teríamos que deixar o quarto, pois haveria necessidade de ser limpo. Tomamos nosso banho e descemos rapidamente. Na recepção, lá estava o gerente com os nossos passaportes em uma mão e a conta na outra, e dizendo que havia conseguido um hotel não muito bom, mas naquele momento era o máximo que poderia fazer por nós… Bem, outros contra tempos ocorreram. Na hora de fazer o pagamento, por aquela noite mal dormida, Laza sacou duas notas de U$100 e colocou no balcão, para logo em seguida ser recusada pelo gerente:

– Desculpe senhor mas no momento não aceitamos essas notas de 100.

Laza perguntou já perdendo a paciência.

– Por quê!?

O gerente prontamente respondeu:

– Houve um derramamento de notas falsas e por essa razão estamos no momento proibidos de receber…

Era só que nos faltava, pensamos, olhando um para outro, e o gerente querendo ajudar, nos disse que só no banco poderíamos trocar! O Laza perguntou onde tinha um banco mais perto e o gerente explicou:

– No outro lado da rua, mas infelizmente hoje é sábado e todos os bancos estão fechados.

Sem mais o que fazer, Lazaroni com um sorriso irônico, que mais parecia que estava “puto”, tirou seu cartão pessoal e pagou a diária.

Então rumamos para o outro hotel indicado pelo gerente, que além ter um pequeno quarto que mal cabia nós dois e ainda por cima sem banheiro privativo, ficava numa espécie de serra bem longe do centro, putsgrila! Mas mesmo com essas situações nada agradáveis, podemos acompanhar o jogo da seleção Belga no Estádio de Heisel, que depois ficou marcado por grande tragédia entre torcidas e após 1995 passou a ser chamado Rei Balduíno. O jogo foi bem disputado e o tratamento no estádio foi VIP, com direito champanhe, vinhos, cervejas e todos os tipos de comida.

Bruxelas é uma cidade única, com suas ruas subterrâneas e sua linda arquitetura, além de ter um escargot delicioso, que eu fiz o Laza provar, como o prato de entrada do nosso jantar:

– Pô são caramujos, Ni!? – para em seguida cairmos na gargalhada… além de uma cidade muito interessante, possui também mulheres lindas…

Assim foi a nossa passagem pelo primeiro país. No próximo capitulo, eu conto mais… especialmente, a nossa chegada na fronteira com Alemanha Oriental. Foi surreal!!! Me senti na Segunda Guerra mundial, com os enormes soldados alemães e seus ferozes pastores, em frente a nossa cabine do trem…

Até..,