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O ZAGUEIRO BUFÃO E A GINGA DO MENINO VOODOO CHILD

8 / agosto / 2017

por Marcelo Mendez


(Foto Ilustrativa: Check)

Sábado de futebol, inverno chegando em mim e eu, em doces lembranças que iam da luz que vem de um par de olhos azuis e uns sons de Jimi Hendrix, me vi na beira do campo do São Paulinho do Parque Novo Oratório em Santo André, vendo um daqueles jogos que nada mais vale, além apenas de ser lúdico.

Uma autêntica pelada de várzea, com times que se juntam em um sábado a tarde para nada além de bater uma bolinha, comer uma carne e beber uma cerveja. O jogo, portanto, era aquilo que o ludismo poderia propiciar. As favas com os fatos. Estão lá as caneladas, mas, o coração tem que se sobrepor ante o olho para efeitos poéticos.

Com essa premissa na cabeça, nada esperava. Eis que então a bola encontra o camisa 11 do time de vermelho. Sim, esqueçam essas groselhada de FIFAs, Federações e afins. Essa pelada era entre o time de vermelho e o time de branco e azul. O time de branco e azul tinha lá pelo lado do campo um zagueiro daqueles que só a várzea pode nos dar. Grisalho, meio duro de cintura, pançudo, caneleiro clássico a exibir as travas de sua chuteira ainda preta. Foi babando pra cima do menino camisa 11 de vermelho.

Nesse momento, com a ginga de um milhão de gafieiras, o menino camisa 11 de vermelho lhe aplicou muito mais que um drible. A bola que passou por entre as pernas do zagueiro bufão do time branco era uma privação de sentidos! Uma afirmação de fé! Uma afronta à razão!

Meus caros, aquilo não foi um drible; foi uma esculhambação!

Não contente o menino prosseguiu. Atrasou o passo, esperou o botinudo voltar e então lhe rabiscou em dribles coloridos de todas as formas possíveis e principalmente, inimagináveis. E como gran finale, parou a bola, olhou pra cara do sujeito e colocou a pelota para fora pela linha lateral, apontando pro cara e dizendo:

– Da onde veio esses dribles vai vir mais. Bate o lateral aí que você vai sair daqui zonzo…

Rapaz… O zagueiro do time branco então passou a vociferar pragas em cima do menino camisa 11 de vermelho que nem ligou. Saiu vitorioso da picardia e prometendo mais. Nesse momento, no meu ipod Jimi Hendrix tocava “Voodoo Child” com uma letra que dizia o seguinte:

– Uma Criança Vodoo que te rouba um doce, mas, devolve qualquer dia desses – perfeita definição:

O menino é um escândalo!

Dribla para satisfazer sua sanha hedonista, para lavar a alma do cronista ávido por arte, esculacha zagueiros para o deleite de fãs sazonais de sábado à tarde. Com ele o que mais importa é a brincadeira. É a chance que o moleque tem de ser grande. De subverter a ordem dos “sérios”, de mandar as favas os “Objetivos” e os “Planejamentos dos Pofexô” dos bancos de reserva. Aquele menino camisa 11 de vermelho é a chance do torcedor de “não estar nem aí”, de não ligar para a miséria da “busca pelos três pontos da tabela”, de deixar pra lá todo o resto das obviedades que infestam o dia a dia do nosso futebol. E mais:

Ele é nossa chance de fazer com que o as coisas se revolucionem por um viés muito mais maneiro e mais transado que as caretices que se apresentam por aí. Ele dribla, ele esculacha, ele sorri, ele tira onda, ele faz o zagueiro bufão cheio de ódio comer terra e babar. Ele joga por nós!

Em um dos dribles que aplicou no botinudo, eu sorri e ele viu. No outro, tomou uma pernada e riu de novo. Na seqüência, deu outra caneta e olhou para mim:

– Essa caneta foi para você, barbudo!

Com um sorriso, o agradeci! Era meu doce sendo devolvido…

 

 

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