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VOZES DA BOLA: ENTREVISTA ALEXANDRE TORRES

30 / agosto / 2020


O mundo todo acompanhou o ‘tirombaço’ do ‘capitão do Tri’, o lateral direito Carlos Alberto Torres, no último gol da vitória do Brasil sobre a Itália, no dia 21 de julho de 1970, na final da Copa do México, e em seguida a cena do ‘Capita’ erguendo a Taça Jules Rimet. 

Naquele dia, a milhares de quilômetros do Estádio de Guadalajara, um garoto de quatro anos acompanhava pela televisão da sua casa, em São Paulo, toda aquela festa, e não imaginava que 10 anos depois, ele estaria dando os primeiros passos, seguidos de muitos chutes e cabeçadas na bola, seguindo a trajetória de campeão e líder em campo como foi o pai tricampeão. 

Nascido em agosto de 1966, Carlos Alexandre Torres, o Torres, herdou do pai a semelhança física, a habilidade no trato refinado à bola, assim como o ‘Capita’, se formou na lateral-direita da base do Fluminense, onde chegou em 1980 aos 13 anos, e depois de se destacar nas competições, estreou nos profissionais em 1985, sagrando se Tricampeão Carioca. 

Depois de seis anos, quando já havia trocado a lateral-direita pela zaga, o mundo da bola o levou para São Januário, onde conquistou o tricampeonato estadual de 1992/93/94 com a camisa vascaína, e se tornou ídolo da torcida.

O sucesso e o desafio por atuar num mercado de futebol em formação o levou para o Japão, onde defendeu o Nagoya Grampus, conquistando novos títulos.

Alexandre Torres construiu uma carreira respeitada, sendo convocado para a Seleção Brasileira em seis oportunidades, e acabou sendo prejudicado por três graves contusões.

Filho do saudoso Carlos Alberto Torres, nosso sétimo personagem é Alexandre Torres,  que conversou com o Museu da Pelada para a série ‘Vozes da Bola’ 

por Marcos Vinicius Cabral e Fabio Lacerda

Assim como seu pai, você começou no Fluminense. Você se lembra, à época que subiu ao profissional, de supostas comparações com o ‘Capita’?

Eu joguei como meio campista logo que cheguei ao Fluminense, aos 13 anos. Nessa posição ganhei títulos no infantil, juvenil e cheguei a jogar na Seleção Brasileira Sub-17. Depois disso, nos juniores, passei para a zaga, mas eventualmente jogava como lateral-direito. O lateral do time principal (Aldo) sofreu uma fratura e joguei a Taça São Paulo como lateral, para servir de teste. Fui bem e subi para os profissionais como lateral.

Quem foi sua grande inspiração no futebol?

Nosso futebol sempre foi muito rico, e meu pai, obviamente, foi minha maior inspiração. Mas posso dizer que, na verdade, o próprio futebol brasileiro foi minha inspiração. Sempre aparecendo grandes jogadores, grandes jogadas, grandes times.

Dentre os grandes do Rio, seu pai não jogou no América, Bangu e Vasco e você esteve em São Januário em duas oportunidades, antes e depois da sua passagem pelo futebol japonês. Apesar de ter conquistado o tricampeonato Carioca, um Brasileiro e a Mercosul defendendo o Cruzmaltino, e as estatísticas demonstrarem que você foi um dos maiores zagueiros da história do clube, seu nome é pouco falado ou lembrado pela torcida. Você atribui isso a quê?

Eu tive ótimos momentos no Vasco e, na verdade, sou tratado com muito carinho pelas pessoas do clube e seus torcedores. Não sou muito falado, é verdade, mas sei o que fiz quando joguei no Vasco, e sou muito bom pra me auto-avaliar.

No Campeonato Brasileiro de 1990, quando você formou uma grande dupla de zaga no Fluminense, ficou um gosto amargo após a eliminação para o Bragantino?


Tínhamos feito uma campanha ruim, correndo até risco de rebaixamento, depois o time se acertou e fizemos uma ótima campanha. Poderíamos ter vencido o Bragantino, mas nosso time fez o seu melhor. Não tínhamos o melhor time do campeonato.

Quem foi seu melhor companheiro de zaga?

Tive a sorte de jogar com grandes zagueiros. Alguns foram os óbvios Ricardo Gomes, Válber e Ricardo Rocha. Mas outros zagueiros foram parceiros importantes também, como Vica, Jorge Luiz e Géder. O zagueiro Go Oiwa, que jogou comigo durante cinco temporadas no Japão, foi um ótimo companheiro de zaga. Muito bom e me ajudou muito.

No último 19 de julho foi comemorado o Dia Nacional do Futebol. O que representou o futebol para Alexandre Torres?

O futebol foi e é a minha vida. Quando eu nasci, o futebol do meu pai sustentava a nossa família. E até hoje, é do futebol que eu sustento a minha. Já tentei sem sucesso fazer outras atividades, mas só no futebol me realizo.

Fale sobre sua experiência no Japão que naquela época já tinha o modelo de negócio de clube-empresa…

Foi uma experiência muito boa. Os torcedores eram muito amistosos e os times, assim como o país, eram, e acredito que ainda são, super organizados. O modelo de clube empresa lá é diferente, pois as grandes empresas são as donas dos clubes. Os diretores dos clubes, geralmente, são recrutadas dentro das empresas e seguem o modelo administrativo da empresa. O futebol é tocado pelo treinador ou alguém contratado para essa finalidade. Nem sempre funciona bem em termos esportivos, mas funciona muito bem em organização e finanças.

Você lamenta por não ter jogado na Europa? Você chegou a ser sondado por algum clube do Velho Continente?

Realmente, eu queria ter jogado na Europa. Tive algumas sondagens, e na época, disseram que houve propostas, mas que não foram aceitas, principalmente pelo Fluminense. Era uma época anterior aos empresários e tinha a lei do passe.

Você acha que poderia ter tido mais oportunidades na Seleção?

Na época em que joguei, talvez tenha sido o período com o maior número de zagueiros de bom nível técnico dos últimos tempos. Nesse sentido, a disputa era grande e muito acirrada. Fui cortado de algumas convocações por motivo de contusão. Quando estive na Seleção fui bem nos treinamentos e estava confiante. De umas seis convocações, consegui estar com o grupo em dois amistosos, e joguei 15 minutos em um deles. Na minha opinião, eu não era pra ter jogado 100 jogos pela seleção, mas também não era pra ter jogado apenas um.

Do que você sente mais saudades quando era jogador?

De jogar. Eu adorava jogar. Gostava do desafio. Me sentia bem estando dentro de campo, procurando as soluções para resolver as jogadas. Gostava daquele clima dos estádios e de fazer parte de um time. Sinto saudades disso!

Como se sente tendo sido filho de um dos maiores laterais do futebol mundial?

É engraçado que até os meus 18, 19 anos nunca tinha pensado nisso. Sabia que ele tinha sido um jogador importante, mas pra mim era o meu pai. Depois que passei a viver do futebol profissionalmente, comecei a entender o tamanho dele no mundo do futebol. No início era uma pressão insustentável que eu mesmo me impunha para tentar superá-lo. Depois de um tempo eu me dediquei a achar meu próprio caminho. E finalmente, reconhecendo o talento, a fama, e o carisma dele com muito orgulho.

Então, ser filho do ‘Capitão do Tri’ te atrapalhou um pouco no início da carreira?


Era um peso muito grande. Meu pai foi, na sua posição, um dos melhores jogadores de todos os tempos. Isso é muita coisa. As pessoas criam expectativas muito grandes. Tanto positivas, quanto negativas, e que podem te desestabilizar, ainda mais quando você é um garoto. Mas eu queria ser jogador profissional e para ter sucesso tinha que superar isso. Foi difícil, mas consegui.

Defina Alexandre Torres em uma única palavra?

Humano.

Seu pai era exigente com você? Ele te cobrava muito na época em que você foi profissional? Como era essa relação?

Não. E devo a ele ter tido algum sucesso como jogador profissional. Meu pai sempre me apoiou, mas nunca me cobrou nada. Algumas raras vezes, ele me dava algumas dicas, de posicionamento e coisas do tipo. Ele fazia alguns comentários sobre a minha carreira, renovação de contratos, proposta de outros clubes, mas nunca me cobrou nada. Só me apoiou.

Faltou algo na sua carreira?

Acho que faltou muita coisa, mas só conseguimos entender isso depois que paramos. Em algum momento da carreira ou da vida poderia ter feito algumas escolhas diferentes. O mais importante é que tenho essa consciência, mas não sou ressentido com isso. Tive uma carreira muito boa que proporcionou coisas importantes para mim e para minha família.

Quais os ensinamentos que o ‘Capita’ deixou para o cidadão e jogador Alexandre Torres?

Meu pai tinha várias qualidades que eu admirava. Ele tinha liderança, personalidade e muita confiança. Mas a principal virtude dele era ser verdadeiro com o que ele acreditava. Temos personalidades diferentes, mas tento seguir esse exemplo.

Como tem enfrentado esses dias de isolamento social devido ao coronavírus?

Tenho uma rotina de trabalho e também procuro me exercitar todos os dias. Fico preocupado com os amigos e familiares, mas não há muita coisa a fazer. Esse vírus pegou todo mundo de surpresa e não me meto a opinar sobre o que não conheço.

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