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“UMA COISA JOGADA COM MÚSICA” – CAPÍTULO 18

por Eduardo Lamas Neiva

A música de Chico César e Zezo Ribeiro agrada em cheio e é até aplaudida, mesmo sem os músicos presentes.

Garçom: – Que bom que gostaram.

O drible continua à baila no bar Além da Imaginação, e João Sem Medo sai jogando com elegância.

João Sem Medo: – Nosso gingado não tem igual no mundo, por mais que alemães, espanhóis e outros europeus queiram ensinar à sua criançada a jogar parecido com o que de melhor apresentamos nos campos de todo mundo. Só os africanos poderão, talvez, nos alcançar um dia. O nosso futebol é uma coisa jogada com música.

Garçom: – O drible já foi tema de várias músicas, seu João. Então vou colocar outra aqui pra vocês ouvirem. Ela se chama “Drible de corpo” e foi composta por Toinho Gomes e Aisier Vinicius.

Zé Ary vai então ao notebook do Além da Imaginação e põe o som no ar:

O choro agrada em cheio também e Ceguinho Torcedor agora é que domina a área.

Ceguinho Torcedor: – As coisas estão tão de cabeça pra baixo que resolveram punir o drible.

João Sem Medo: – Até juiz aqui no Brasil andou advertindo jogador por driblar.

Ceguinho Torcedor: – A alegria do futebol, do nosso futebol, virou um acinte, uma humilhação.

João Sem Medo: – Isso só para os burocratas e os pernas de pau! Mas não tem árbitro, técnico ou dirigente que vá acabar com a criatividade do brasileiro.

Ceguinho Torcedor: – A música e o futebol deste país sempre produziram grandes craques.

Músico: – Sem dúvida alguma, seu Ceguinho. E tem mais músicas sobre o drible. Uma pena que o seu Garoto não pôde vir ainda pra tocar aqui pra gente o maxixe “Driblando”.

Garçom: – Mas tem uma aqui com o mesmo nome, do pianista Marcos Ariel. Vou colocar no som pra vocês ouvirem.

Todos curtem a música. Ao fim da execução, a palavra volta ao comando de quem? João Sem Medo!

João Sem Medo: – Falar de drible é falar de Garrincha, claro. Mas ele merece um dia inteiro pra que a gente comente um pouco sobre sua importância para o futebol brasileiro.

Ceguinho Torcedor: – Contra a Rússia, em 58, ele driblou até as barbas do Rasputin! Mas como disse o João, Garrincha é um assunto que não se esgota e merece que a gente fique falando só sobre ele durante séculos. E falaremos!

João Sem Medo: – Sim, é um papo certo pra mais adiante.

Garçom: – Tem uma música com um gingado ágil como o Garrincha aqui. É do saxofonista Léo Gandelman, chamada “Camisa 7”. Vamos ouvir!

Ceguinho Torcedor: – João, esse Zé Ary sabe tudo sobre música e futebol.

Garçom: – Obrigado, seu Ceguinho. Gosto muito desta tabelinha. Não há no mundo coisa igual!

João Sem Medo: – Muito bom, Zé Ary, muito bom mesmo. Olha, um dos nossos craques que driblavam muito e tinha um futuro brilhante, mas infelizmente morreu muito jovem foi o Dener. Era um grande jogador, tinha um grande futuro pela frente.

Garçom: – Dener está ali, seu João.

João Sem Medo: – Opa! Muito prazer, garoto. Vi você começando e depois o acompanhei daqui com muita alegria. Parabéns! Sua passagem foi curta na Terra, mas inesquecível, pode ter certeza.

Dener: – Muito obrigado, seu João. É uma honra pra mim ouvir seu elogio.

Ceguinho Torcedor: – Receba os meus também e de todos aqui presentes.

Dener: – Agradeço muito, seu Ceguinho.

Todos aplaudem Dener, que agradece com acenos, de sua mesa.

Fim do capítulo 18

PESSIMISMO E REALISMO

por Rubens Lemos

O pessimismo atávico passou a me consumir de vez quando o tema é o futebol do Rio Grande do Norte. A fase tétrica de ABC e América, perdendo a moral dentro de casa em derrotas injustificáveis, parece uma gangorra psicológica na qual estar embaixo virou padrão e o sofrimento irmana adversários.

É impossível achar normal o ABC ficar segurando a lanterninha da Série B, após inúmeras chances de deixá-la em jogos tidos e havidos como fáceis e encerrados com fracassos subsequentes. O ABC em campo exibe o ritmo paquiderme dos pré-defuntos. A raça, alma do clube, desapareceu levada na enxurrada da falta de autoestima e de erros infantis e outros por absoluta incompetência.

Se ganha o Criciúma, no Frasqueirão, o ABC poderia sair da Zona de Rebaixamento e até enganou nos primeiros minutos. Seu homem de criação, Matheus Anjos, ensaiou boas jogadas e virou um pobre menino inofensivo, quase o tristonho Zezé, lacrimoso e conformado garoto de bom coração e sempre trapaceado pelos malandros que o cercavam. Do romance Meu Pé de Laranja Lima. de José Mauro de Vasconcelos, um clássico, bem poderia ser intitulado Matheus Anjos, o Garoto Que Nunca Será.

Matheus Anjos está na galeria dos jogadores nos quais recaíram as maiores esperanças da torcida do ABC. Fez duas partidas fantásticas, uma contra o Fortaleza pela Copa do Nordeste outra contra o Grêmio em Porto Alegre na Copa do Brasil. Desconcertante, refinado e, no átimo, desaparecido por questão física ou mesmo pela melancolia que seu rosto de traços finos aparenta.

O camisa 7 Matheus Anjos está perdendo a (minha) confiança. Está parecendo um daqueles satélites que oscilam entre o talentoso e o fugidio, o criativo e o omisso. Contra o Criciúma, de corpo até foi visto em campo. Seu uniforme deve ter sido retirado intacto, sem uma gotícula de suor. Não estou afirmando que é de propósito, não, não e não. Matheus Anjos precisa apenas ser situado de forma correta: como um bom coadjuvante, sem obrigações de levar o time em seu corpo franzino.

É justo o questionamento a ser feito após a opinião acima: se Matheus Anjos seria operário do balé-bola, o ABC teria o protagonista em quem? Em ninguém, caríssimo leitor. É esse vazio motivo agudo para a anemia existencial do bem comportando meio-campista. Falta-lhe o instinto raçudo que a camisa do ABC impõe sobre qualquer jogador, seja dono da bola ou perna de pau.

A insistência em Matheus Anjos é clara cobrança e evidente decepção pela fama criada que acabou se tornando trivial na grama. E, em qualquer time em crise, a cobrança recai sobre aquele que, pelo menos em tese ou pálida exaltação, é ou seria o homem ideal para ressuscitar o time.

Há muito mais a se consertar no ABC: o tempo, outro oponente, é invencível. Maldade o que se faz com a Frasqueira após cada derrota: calma que tem outra rodada. Derrota consumada, lá vem as carpideiras desafiando a verdade: O ABC vai se recuperar, afinal, faltam mais de 20 rodadas.

Gosto do estilo sóbrio e pontual do novo Diretor de Futebol Marcelo Segurado, que, todo dia ao despertar, luta para corrigir os erros terríveis cometidos por seu antecessor, unha e cutícula com o ex-técnico numa dobradinha de aspectos e efeitos macabros.

Veterano, Segurado não vai cair na besteira de trazer outro caminhão de cabeças de bagre. Ele próprio afirma que é “chato”para contratar. Deve examinar até a unha encravada do boleiro. Está certo, acontece que está ficando impossível reabastecer o combustível da confiança extrema, daquele fanático de camisa surrada, dinheiro contato para a cachaça e gogó sempre firme para gritar que vai ser bom e depois esbravejar que foi uma porcaria.

O ABC sabe o quanto custou subir à Série B. O equívoco foi entender que a obra teria sido somente do ex-entregador de camisas e atitudes arrogantes. O ABC sabe, seus homens estão convictos mesmo sem admitir, que o pessimismo é realista e que a terra arrasada de agora começou a ser dizimada nos descaminhos da dupla que recebeu poderes máximos e devolveu sofrimento ao povo.

ERA O DIA DO GUILHERME

por Zé Roberto Padilha

Coube ao Guilherme, que cresceu no Purys e passou pelas mãos de todos os nossos treinadores, hoje no Goiás, a nobre tarefa de defender o prestígio dos trirrienses que fizeram história em nosso futebol.

E contra o Santos, ao vivo pelo Sportv, no domingo passado pela manhã, ele se superava: marcou 2 gols e deu uma assistência no 3×3 fora de casa.

Tudo encaminhava para ser o craque da rodada quando o árbitro da partida deu ao Santos um pênalti inexistente de presente. Com 4×3, foi jogado para o segundo plano o feito heroico do nosso menino.

Árbitro caseiro. Parece que nunca vai acabar a saga daquele cidadão medroso que quer sair do estádio em segurança. E garante seu salvo conduto marcando uma penalidade máxima para os donos da casa.

Simples assim. Certa vez, percebemos sua origem. O América FC-TR foi jogar contra o Miguel Couto, pela segunda divisão estadual, na Baixada Fluminense. Os árbitros eram recém-formados e nos deram esperanças. Em vão.

Com 10 minutos, marcou um pênalti contra nós que não existiu. E no jogo da volta, devolveu a “gentileza” nos concedendo outro que não foi. Acabando o jogo, fomos ao vestiário conversar com eles. Em busca de explicações para tantas aberrações. Tão novos, por que repetiriam os erros das velhas raposas do apito?

O trio de arbitragem nos levou pra fora do vestiário e apontou a segurança no Estádio Odair Gama. Tinham apenas 4 guardas municipais. A PM, embora convocada, não apareceu. E eles disseram: “Temos que optar entre sair com segurança ou levando pedrada no carro. O que fariam em nosso lugar?”

Com o tempo, as competições têm reforçado a segurança. E ainda tem o VAR. Mesmo assim, quando a bola foi alçada para a área do Goiás, finalzinho da partida, o tal trauma de infância falou mais alto.

Uma simples disputa ombro a ombro levou o atacante do Santos ao chão. O racicionio é rapido para o árbitro perceber onde estava. Na Vila Belmiro? Põe na marca da cal.

E lá se foi o domingo em que nosso Guilherme, merecidamente, dominaria o noticiário esportivo nacional.

Até quando?

SOB A BATUTA DO EDUARDO

por Zé Roberto Padilha

Não se faz uma grande equipe sem um maestro. E o Botafogo, que vem encantando todo mundo, depois do Didi e do Gerson, encontrou no Eduardo o seu novo maestro. Afonsinho, Nei Conceição e Mendonça reencarnados.

Com rara habilidade e visão de jogo, Eduardo cadencia as jogadas em meio a correria que transita ao lado. Como Ademir da Guia, no Palmeiras dos anos 60/70, a bola precisa passar pelos seus pés para receber o selo ISO de qualidade.

Em meio ao badalado Tiquinho, ao bom goleiro que colocou Gatito no banco, uma zaga que erra pouco e um novo Jairzinho aberto na direita, assistimos despontar no meio campo um novo maestro.

Com um domínio absoluto da sua ferramenta, a bola, Eduardo dificilmente erra um passe. O que dá ao meio campo o equilíbrio necessário para que todos se realinhem e não ocorra um buraco entre as alas.

Um craque como há muito não víamos circular por aquela zona de criação.

Há pouco, passando pela portaria de um prédio, o porteiro me gritou: “Mais umas três rodadas e esse time do Botafogo cai.”

Pensei logo na manga espada. A mais cobiçada. Que quando está madura, no auge do seu sabor e sob o olhar atento da vizinhança, despenca. A diferença é que eles, jogadores do Botafogo, mesmo maduros. estão firmes, focados e fortalecidos até o talo.

Vão ter que subir na tabela se quiserem alcançá-los.

VANTAGEM PODE AUMENTAR

por Elso Venâncio, o repórter Elso

O Botafogo está uma máquina. Vence consecutivamente, e o melhor, vence e convence. Impressiona a intensidade em campo, a entrega dos atletas, o jogo coletivo, todos juntos misturando união e humildade.

Lucas Perri, aos 25 anos, é o melhor goleiro em atividade no futebol brasileiro. Aliás, com a chegada de Fernando Diniz está na hora de renovar a seleção e dar chance a quem joga no país.

Não duvidem se a diferença de 10 pontos para o atual vice-colocado aumentar nas próximas rodadas. Domingo, o jogo é em casa, contra o Bragantino, enquanto Flamengo e Fluminense duelam entre si, no Maracanã. O Grêmio vai ao Itaquerão enfrentar o Corinthians, depois de encarar o Bahia pela Copa do Brasil. O Palmeiras tem o São Paulo no meio de semana e, no domingo, pega no Beira-Rio o Internacional.

No returno o Botafogo receberá alguns adversários diretos, como Flamengo, Palmeiras e Grêmio, no Estádio Nilton Santos, onde tem 100% de aproveitamento. Flamengo, Grêmio e Palmeiras ainda estão envolvidos em outras Copas, com jogos eliminatórios e uma grana forte à vista, para quem alcançar as primeiras colocações. Por isso, poupam o tempo inteiro, o que é um erro grave. O argentino Sampaoli chega a botar Arrascaeta, Éverton Ribeiro e Bruno Henrique no banco. O Botafogo, sim, pode se dar ao luxo de escalar reservas na Sul-Americana, competição na qual encara adversários de menor força.

O líder não denuncia esquemas ou sistemas nem dentro, menos ainda fora de campo. Tiquinho Soares teve seu gol anulado contra o Grêmio e, como dizia João Saldanha, ‘Vida que segue’. Hoje, a psicologia no esporte de alto nível é fundamental. Paulo Ribeiro, como excelente profissional de ponta que é, cuida da saúde mental dos jogadores, que não se abatem ou perdem a linha nem com possíveis erros de arbitragem.

Matías Segovia, o Segovinha, é o amuleto da equipe. Que nem Iranildo, o ‘Xuxu’, foi na vitoriosa campanha de 1995. Aos 20 anos, na flor da idade, entra sendo sempre decisivo no segundo tempo. A firme zaga formada por Adryelson e Víctor Cuesta faz lembrar Gottardo e Gonçalves. No ataque, Tiquinho Soares é o astro-rei da equipe. Artilheiro como Túlio naquela época.

A coincidência não para por aí. Segue até com a chegada do novo técnico, que, naquele tempo, também veio de Portugal. Paulo Autuori assumiu no mês de julho e com o Brasileirão em andamento. O mesmo vai acontecer agora, com Bruno Lage.

‘Papai’ Joel Santana, que conhece como ninguém os clubes cariocas, recentemente deu a seguinte declaração:

“A torcida do Botafogo sente o cheiro do título. Coloca a camisa e vai para os estádios, para as ruas, bares e praias, entrando no clima e passando uma forte energia ao time.”

Já são cinco jogos sem sofrer um gol sequer. E, para perder a liderança, o time terá que sofrer quatro derrotas seguidas e, o que é mais complexo ainda, ver seu maior rival vencer também quatro embates.

Em suma, tudo se encaminha para um ano glorioso, como reza o figurino da Estrela Solitária