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OLHOS NOS OLHOS

26 / março / 2020

por Rubens Lemos


Olhar nos olhos é a tradução intuitiva da verdade e do caráter. Desconfie de quem conversa com você de luz baixa, desviando a vista ou franzindo o cenho. Esse é um traiçoeiro certificado.  Olhar nos olhos, nos cafundós sertanejos, tem o poder do papel passado. Fechado o assunto, acertado o pacto, é ir dormir sossegado. 

O fraco sem personalidade, o boboca passado para trás (em qualquer aspecto), o avarento de placenta e sem autoridade mínima, é esquivo em geral. Anda desconfiado, vislumbrando o chão, no máximo balança a cabeça em cumprimento, como fazem os ratinhos bípedes, ratos de duas pernas. 

O homem que não olha nos olhos se cerca mal. Põe puxa-sacos deslumbrados para tomar as medidas que evita assumir por covardia, a sua tatuagem invisível. É uma pústula, um desprezível acompanhado por outras catitas de laboratório. 

O ABC adaptou para si a fábula acima. É um clube insosso, sem compromisso com suas raízes, dominado por quem não o conhece, não respeita sua história e, logo o clube da Frasqueira, pisoteia primeiro os humildes. 

É claro que a pandemia do Coronavírus vai levar empresas a enxugar seus quadros por falta de dinheiro. Confinado, ninguém compra. Fechado, ninguém vende. Os vampiros do ABC usam tal discurso para justificar a perseguição aos funcionários. Menos a verdade. Para dar o exemplo, eles saíssem primeiro. Puxando pela mão o inútil que despejou por incompetência redundante o clube na Série D. 

O símbolo de todos os jogados fora é o roupeiro Joca, R$ 2.500 de salário, sobre quem escrevi há semanas uma crônica de domingo. Joca é(era) o roupeiro mais antigo do Brasil. Foi tema de reportagem da Revista Placar, é um servidor padrão, chegou menino ao ABC do qual conhece cada centímentro. 

Joca tem(tinha) 52 anos de clube. João, Bernardo em homenagem ao Santo Claraval combatente de mentiras  e heresias, arrumou o uniforme de um jovem loiro nascido nas encruzilhadas das Salgadeiras e das Sete Bocas, periferia próxima ao Cemitério do Alecrim(o maior de Natal). O menino de 17 anos atendia por Marinho Chagas, maior esportista do Estado pelos séculos, amém. 

Joca chegou antes de Marinho ao clube do povo. Era do povo. Lá na sede de Morro Branco, que não existe mais como a instituição prostituída pelos seus inquilinos atuais. Em 1970, com Joca moleque e Marinho também, o ABC quebrou um tabu de quatro anos sem títulos. Com ambos, o Deus Banto da bola potiguar, Alberi.


Joca estava no tetracampeonato de 1973, o do time de Erivan; Sabará, Edson, Telino e Anchieta; Maranhão, Danilo Menezes e Alberi; Libânio, Jorge Demolidor e Moraes. 

Joca estava no timaço que evitou o tricampeonato do América em 1976: Hélio Show; Fidélis, Pradera, Wagner e Vuca; Draílton, Danilo Menezes e Zé Carlos Olímpico; Noé Silva, Reinaldo e Noé Macunaíma. 

Como estava Joca em 1983, no sonho tocado de primeira por Dedé de Dora, Marinho Apolônio e Silva em orquestra com Lulinha; Alexandre Cearense, Joel, Alexandre Mineiro e Dudé; Nicácio, Dedé de Dora e Marinho Apolônio; Curió, Silva e Djalma. 

Em contas que faço – duvido consigam os carrascos -, Joca participou de 24 dos 55 títulos estaduais do ABC, ou do Ex-ABC.  Joca está na biografia de mais da metade dos campeonatos conquistados. De seis Taças Cidade do Natal. Fora torneios interestaduais e locais para ocupar agenda vazia.

Promovendo um festival de cabeças cortadas, a ridícula e pior gestão do ABC joga para debaixo do tapete, histórias tenebrosas de uma pequena auditoria que flagrou gastos inexplicáveis como o uso de um cartão corporativo no valor de 118 mil reis, ou 47 salários de Joca. Vão deixar por isso? Ou a conveniência da cumplicidade vale para os poderosos e prepostos de costas quentes? Os humildes temem a Deus.

Cadê o ABC? Tem Conselho Fiscal? Joca é um simplório, entrava em campo vestido de frade, de sacristão, da religião alvinegra. Está no desenho escrito por Victor-Marie Hugo: “De que adianta triunfar sobre uma multidão de humilhados e famintos?”. Só miseráveis tripudiam. 

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