por Cláudio Lovato Filho

O gol do Gustavo Martins deve ter feito o André Catimba sorrir lá em cima.
E talvez dizer, com aquele sotaque baiano dele (quem sabe lembrando de um célebre gol de bicicleta de autoria dele, no Olímpico, em cruzamento do Eurico): “Rapaz, o que foi que você fez?”
O gol do Gustavo Martins foi um daqueles momentos em que o futebol nos diz assim: “É por isso que vocês não conseguem passar sem mim”.
Veja bem: o gol foi uma pintura, resultado de um – como dizem os comentaristas de hoje – “gesto técnico” perfeito.
Mas havia, além disso, toda a circunstância que o envolveu: 51 minutos do segundo tempo, a desvantagem de um jogador a menos em campo desde o final do primeiro tempo e de dois gols no placar, o que impediria o time de ir à final e de continuar lutando pelo octacampeonato estadual.
“Eu sou eu e as minhas circunstâncias”, escreveu o filósofo José Ortega y Gasset. “E se não salvo a elas, não salvo a mim também”.
Então, como era preciso salvar as circunstâncias e a todos nós, dá-lhe pressão e pressão e mais pressão, e eis que, na base do sufoco, acontece um escanteio.
Pavón bate, Villasanti apara de cabeça dentro da grande área e manda para Edenilson, que cabeceia de volta para o bolo, e a bola está lá no alto e Gustavo Martins, o Carioca, guri da base, zagueiro bom de bola, de costas para o gol se lança ao ar e dá a pedalada, e que bicicleta sensacional, e a bola entra no canto, à direita do goleiro.
O gol do Gustavo Martins deve ter feito o Tarciso erguer os braços e sair vibrando lá em cima, como tantas e tantas vezes fez aqui embaixo.
E quem sabe dizer, com o conhecimento de causa e o orgulho de jogador que mais vezes vestiu a camisa do clube: “Isto é o Grêmio!”
O gol do Gustavo Martins foi coisa de espírito de luta e coragem, de talento e autoconfiança.
Foi muito louco.
E deve ter feito o mestre Ênio Andrade se lembrar, lá em cima, das palavras que disse a Renato Sá quando o mandou a campo na final do Brasileiro de 1981, no Morumbi. “Renato, vamos fazer uma correria ali no meio”.
Alguns analistas de arbitragem disseram que o gol deveria ter sido anulado, por jogo perigoso. Bom, um gol desses, épico da maneira como foi, não estaria completo se não envolvesse polêmica. O que eu vi é que o jogador do Juventude buscou, desesperadamente, o contato do rosto com a perna do Gustavo, na tentativa de descolar uma falta. Basta rever o lance para constatar. Minha opinião é compartilhada inclusive por pessoas que não torcem para o Grêmio.
Mais que tudo, o gol do Gustavo Martins foi um presente para a torcida e uma homenagem aos ídolos do passado.
O Fortim da Baixada, o Olímpico e a Arena estavam naquele gol. Lara e Everaldo participaram dele, e também Airton e Alcindo e Gessy…
O gol do Gustavo Martins fez coroas sessentões voltarem a ser crianças e fez crianças de 12 anos olharem para o céu com ar de velhos sábios calejados pela vida.
Todos felizes em torno de um escudo, de uma camisa, de uma História repleta de peleias e conquistas.
Um História de luta sem fim.
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