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NEWTON ZARANI

12 / maio / 2020

por Marcos Vinicius Cabral


Passava das 19h quando cheguei à redação do Jornal dos Sports, na Rua Tenente Possolo, Cruz Vermelha. 

Não lembro o dia mas não esqueci o ano: 1995.

Com meu portfólio debaixo do braço, percorrer os jornais da cidade era uma rotina que eu começava sempre depois do almoço e ia até tarde da noite.

Ora, era um garoto de 22 anos, que acreditava que minhas charges e caricaturas poderiam mudar o mundo, as coisas, as pessoas, sei lá…

Mas naquele noite, em que o corre-corre na redação era frenético em virtude do fechamento, tive a oportunidade de, antes de receber um “por favor, volte amanhã, e venha mais cedo que conversaremos”, de Carlos Macedo, então editor do jornal esportivo mais tradicional da cidade, cruzei com Newton Zarani na portaria.

Era fácil saber quem era Zarani, pois como leitor assíduo do “cor de rosa” e das suas colunas “Vale-Tudo”, “Esporte Total” e a principal delas, “De Trivela e na Canela”, seu rosto já era familiar para mim.

Segurei pelo seu braço, fui me apresentando e já mostrando meus desenhos. 

– Olha, me desculpe mas tenho que fechar duas matérias e uma Coluna! – disse tentando se esquivar de mim como quem driblava seus marcadores no infantil, no juvenil e nos aspirante do América, seu clube de coração. 

– Não! Por favor, preciso que o senhor veja meu trabalho e diga ao Macedo o que achou, pois ele me mandou voltar amanhã! – implorei.

– Tá bom, garoto, mas seja breve! – ordenou ajeitando os óculos. 

Não levei mais de cinco minutos.

– Pronto, já vi! Posso trabalhar? – perguntou e saiu andando.

Olhei fixamente com cara de desolado e antes de ir embora, soltei.

– Gostou, seu Zarani?

– Lógico que não, respondeu.

– Sério? – insisti. 

– Sério, pô! Não tem caricatura de nenhum jogador do América – justificou abrindo os braços, se virando em minha direção e rindo.

Depois disso, nunca mais o vi, ou melhor, nunca mais falei com ele.

No dia seguinte,  cheguei mais cedo e fui muito bem atendido por Macedo, que comentou sobre o Zarani ter visto meu portfólio.

Acabei fazendo as charges e as caricaturas naquele Campeonato Brasileiro de 1995, no qual Kléber Leite era presidente e responsável pela contratação do pior ataque do mundo, com Romário, Sávio e Edmundo.

Voltei a colaborar com o JS em outras três ocasiões: 1999, 2005 e 2010.

Mas a primeira eu jamais esqueci, assim como desse nosso (único) encontro.

Passados 25 anos, fica a dúvida: foi o Macedo que gostou realmente do meu trabalho ou o Zarani que deu uma força?

Não terei essa resposta, infelizmente. 

O craque que até os 80 anos esbanjou “catiguria” nos campos da Tijuca, Zona Norte do Rio de Janeiro, chorou por duas vezes na vida pelo Mecão. 

Uma, no título carioca do América conquistado em 1960, na vitória por 2 a 1 contra o Fluminense, no Maracanã. 

– Eu tive um tremelique! Aquilo deu de uma hora para outra. Foi o momento que eu mais senti, achei até que ia passar mal, porque era muita emoção! Eu estava voltando do Maracanã e precisei encostar em um canto. Abaixei a cabeça e chorei muito! – desabafou ao repórter André Mendonça.  

A outra, no inexplicável rebaixamento do clube em 1987, na Copa União. 

– Aquilo foi uma covardia! Eu senti raiva, fiquei revoltado! Escrevi muita coisa sobre isso no Jornal dos Sports, dei muita porrada! Foi um assalto à mão armada com vários cúmplices. O América nunca foi ajudado pela arbitragem! Nunca teve força, porque sempre foi um clube de bairro. Clube querido, segundo clube de todo carioca, mas isso não adiantava nada! – revoltou-se à época.

Porém, das lágrimas derramadas por Zarani, certamente a mais dolorosa foi quando o Jornal dos Sports encerrou suas atividades e fechou.

Anteontem, dia 11 de maio, o criador do futsal e que era chamado carinhosamente “De Todos Os Esportes”, se foi aos 93 anos.

Enquanto aqui esteve, foi grande como o seu América e referência para todo jornalista.

Ao mestre, todo carinho e que descanse em paz!

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