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AGONIA DO CRUZEIRO

26 / maio / 2020

por Marco Antonio Rocha


E o Cruzeiro de Tostão, Dirceu Lopes, Piazza, Nelinho, Raul, Sorín, Niginho e Natal trocou as páginas de esporte pelas de polícia. A poucos meses de completar 100 anos, no dia 2 de janeiro, o clube não tem o que festejar. Afundado em dívidas, vê ações trabalhistas se acumulando, jogadores indo embora, salários atrasados e seu nome manchado por aqueles que lhe juravam amor eterno. Traição.

A situação ficou ainda pior quando a Fifa decretou a perda de seis pontos na Série B por uma dívida com o Al-Wahda, dos Emirados Árabes, pelo empréstimo de seis meses do volante Denilson. E mais: o Cruzeiro corre o risco de sofrer em breve a mesma punição pela compra do atacante Willian junto ao Zorya, da Ucrânia. Seriam 12 pontos a menos… O risco de queda para a Terceira Divisão este ano é imenso, já que o clube teria apenas seis meses para quitar o débito. É provável que novos processos do tipo surjam em breve. Tormento.

O cenário se desenha justamente no momento em que o Cruzeiro precisa se reerguer nos gramados, em uma Série B complicada como jamais acontecera: o regulamento pela primeira vez obriga um clube grande a ver sua cota fixa de TV despencar – neste caso, de R$ 22 milhões para minguados R$ 6 milhões. A pandemia, que deixará os estádios desertos e a arrecadação com bilheteria reduzida a zero, aqui é apenas um detalhe. Devastação.

Minha sogra, Zilda, é cruzeirense e aos 70 e poucos anos foi enfática ao resumir seu sentimento: “Ao ver a camisa do Cruzeiro, sinto saudade. Mas é só. Perdi a chama”. É justamente isso o que esses dirigentes abjetos fazem com os torcedores — e não apenas do Cruzeiro, mas de todos: apagar a chama. É ela que motiva uma pessoa a sair de casa no dia do aniversário da mãe para ver um jogo, entupir o armário de camisas oficias caríssimas, economizar cada centavo para pagar o plano de sócios, passar essa paixão para o filho. Esses dirigentes não. São capazes de acumular um déficit de R$ 394 milhões somente em um ano. Mais de R$ 1 milhão em cada dia de 2019! Em outras palavras, para usar a definição da querida mineira, o que essa gente faz é apagar a chama. Desilusão.

Há quatro crimes sendo investigados pelas bandas da Raposa: falsificação de documentos/falsidade ideológica, apropriação indébita, organização criminosa e lavagem de dinheiro. Estima-se que a dívida total do Cruzeiro passe de R$ 1 bilhão. Se o clube fosse uma empresa, já teria fechado as portas, confinando o amor de sua torcida a memórias que se apagariam com o tempo — a bem da verdade, se fosse uma empresa os dirigentes estariam no seu lugar de direito: atrás das grades. Revolta.


Não me surpreenderei se o Cruzeiro — esse mesmo de Tostão, Dirceu Lopes, Piazza, Nelinho, Raul, Sorín, Niginho e Natal; duas Libertadores e tantos outros títulos — sumir do mapa. Seria o primeiro de muitos gigantes que se deitariam para sempre. Clubes brasileiros têm dívidas insolúveis, fazem do drible sobre o fio da navalha uma prática recorrente. Há 20 anos o Vasco sobrevive graças ao esforço de sua torcida, que constrói um CT e distribui cestas básicas a funcionários; o Santos agradece a cada craque fora de série vendido, sem saber se haverá um próximo para pagar contas básicas — e nem isso tem sido o bastante; o Corinthians joga dentro de uma bomba-relógio prestes a explodir. Somam-se a eles Fluminense, Botafogo, Atlético-MG… A lista é longa, e mais chamas podem se apagar. Desesperador.

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