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Ídolos

RUBRO-NEGROS SEM ÍDOLOS

por Luiz Carlos Cascon


Desconheço se há estudo a respeito, mas tenho a impressão que um ídolo se forma e se consolida na nossa cabeça na fase de transição entre a infância e a adolescência.

Se essa tese tem algum fundamento, posso concluir que os rubro-negros da minha geração não tiveram muita sorte para eleger um craque para idolatrar.

Comecei a acompanhar futebol no início dos anos 1960. Nos primeiros anos da década, o Mengo, como era mais chamado, tinha um time bom, mas os  jogadores com potencial de ídolo, como Dida e Joel,  já estavam em fim de carreira. Atletas talentosos surgiram, como Gérson, mas os dirigentes do clube na época, amadores e incompetentes, deixaram escapar.

Seria possível contar nos dedos jogadores de qualidade que vestiram por várias temporadas o manto sagrado naquele período –  o meia-atacante Silva, os laterais Murilo e Paulo Henrique, o volante Carlinhos Violino e, no finalzinho daqueles anos, o argentino Doval. Em suma, foi muito pouco para formar equipes de qualidade e promover ídolos de verdade.

Como todo flamenguista, era teimoso e não deixava de ir ao Maraca. Íamos ao estádio em grupo e não havia discriminação – faziam parte da “turma do Ingá” (bairro de Niterói) torcedores de todos os times. Tinha até um americano. Os botafoguenses deitavam e rolavam. E não era para menos: Manga, Leônidas, Carlos Roberto, Rogério, Roberto, Gérson, Jairzinho e Paulo César formavam um timaço. Era duro voltar para casa de cabeça inchada, enfrentando uma barca da STBG lotada e aturando um bando de botafoguenses irritantes.

Aliás, “Cri-Cri” (sinônimo de chato) era o personagem do Botafogo criado por Henfil. O genial cartunista publicava tirinhas de humor nos jornais esportivos naqueles anos sobre o comportamento dos torcedores. Tinha um representante para cada time carioca: o vascaíno “Bacalhau”, o “Pó-de-arroz” tricolor, o “Gato Pingado” americano, e o “Urubu” flamenguista. Rubro-Negro declarado, Henfil conseguiu, com fino humor, instituir a ave urubu como símbolo da nação, transformando em orgulho toda a carga pejorativa e preconceituosa que a palavra carregava – sinônimo de negro, favelado, comedor de carniça.

A partir de meados dos anos 70, os ventos começaram a soprar a nosso favor. Surgiram jogadores de altíssima qualidade, formou-se a Frente Ampla pelo Flamengo, liderada por Márcio Braga, que passou a gerir o clube com um pouco mais de profissionalismo. Mais tarde, como todos sabem, seríamos campeões do mundo.

Era (e sou) um grande admirador da geração de Zico e Cia. Durante muitos anos, aquela equipe espetacular, de toque rápido e refinado, deixava os flamenguistas em estado de êxtase e os torcedores adversários atônitos. Mas nessa altura da vida, o futebol já não era a prioridade absoluta entre as minhas preocupações. Por isso, costumo dizer que faço parte da geração rubro-negra dos sem-ídolos.