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CARA CRACHÁ

por Eliezer Cunha


Tivemos na última quarta feira a realização de um dos maiores clássicos do futebol brasileiro Flamengo x Vasco. O chamado “clássico dos milhões”, classificação que infelizmente não se consolidou na ocorrência desta partida, já que por parte da torcida do Vasco não houve a adesão esperada dos torcedores. Bom, perderam uma boa oportunidade de assistir o time da Cruz de Malta jogar de igual para igual com o melhor time do campeonato. 

Rivalidades à parte dentro do campo durante ou após os jogos são fatos normais e vão se estender enquanto houver disputas entre equipes. O que não dá pra entender são situações inoportunas geradas por personagens que deveriam estar em outro lugar que não fosse dentro do contexto do jogo, me refiro a diretores, gerentes e/ou os amigos do rei. Possuir crachá ou ser indicado já é o suficiente para ficar presente no banco com direito de até entrar no gramado. Em geral, essa prática é utilizada por todos os clubes e ocorrem em praticamente todos os jogos, proporcionalmente, obviamente ao poderio do clube no contexto esportivo nacional. 

No caso específico do jogo da última quarta feira, ao final da partida, no calor do resultado, um “gerente” se adentra em campo para tomar satisfação com um jogador do time adversário e chega a agredi-lo. Esta recepção “calorosa” e dispensável veio por parte de um integrante da gestão do Vasco. Ora, o que deveria ser comemorado pelo time por conquistar um belo resultado, foi manchado por uma atitude imatura e inconsequente. 

O Club de Regatas Vasco da Gama já carrega por anos o estigma do coronelismo esportivo praticado no passado por grandes e importantes dirigentes como Eurico Miranda e Calçada, mas o que precisamos entender é que os tempos mudaram e os rumos do esporte também. Quando uma atitude desta natureza ocorre traz em si consequências que vão de desentendimentos no gramado do jogo até uma desavença em uma roda de amigos em um bar da esquina. 

O espetáculo e o seu resultado deve ser respeitado. A preocupação com as interferências extra campo devem ser medidas e monitoradas e a prática “Cara Crachá” banida dos esportes de uma vez por todas pelo bem e evolução de nossos esportes.

MISTER X LUXEMBURGO

por Marcos Vinicius Cabral


O ser humano não consegue elogiar o trabalho de dois profissionais da mesma área sem compará-los.

Isso é inevitável e no país do samba, cerveja e futebol dos 7 a 1, infelizmente é cultural.

Eu gosto de perceber nos times, o dedo do treinador, as mexidas que fazem para mudar os 90 minutos de uma partida, as táticas que utilizam e porque não dizer, a maneira com quem buscam a vitória a qualquer preço.

Vanderlei Luxemburgo é disparado o melhor técnico da história dos Brasileiros e Jorge Jesus é atualmente o melhor do país, mesmo estando há apenas três meses trabalhando aqui.

Na verdade, na verdade, vos digo: são dois baitas técnicos, como ficou provado neste Flamengo e Vasco, da última quarta-feira (13), da 34ª rodada que foi antecipada.

Mas querem colocar um acima do outro.

Por quê?

Luxemburgo fez uma leitura do Flamengo que nenhum outro treinador havia feito ainda, mesmo com equipes melhores que a sua.

Colocou duas linhas de quatro e colocou dois pontas (Rossi e Marrony ) para jogar em cima de Rodrigo Caio e Pablo Marí, pois havia percebido que Willian Arão costuma flutuar entre os dois zagueiros, liberando-os para sair jogando com facilidade.

Jorge Jesus só permite que sua dupla de zaga faça isso, pela qualidade dos dois.

Mas no jogo de quarta-feira, Luxemburgo anulou isso e obrigou Jesus a ter que se “reinventar” no meio do jogo, quando tirou Gabriel de dentro da área na inércia costumeira do centroavante em esperar a bola e fez com que todos os outros jogadores se movimentassem para criar os espaços que o Vasco não permitia ter.

Simplificando: Luxemburgo tirou o líder do campeonato do seu habitual “usual comfort” e encarou de igual pra igual o adversário.


Portanto, forçou Jorge Jesus a fazer uma mudança no estilo de sua equipe atuar e foi obrigado a introduzir no DNA de seus jogadores a velha máxima do clube jogar: com raça, amor e paixão.

Diante de dois grandes estrategistas, o empate acabou sendo justo mas se houvesse um vencedor, não seria nenhuma injustiça para o futebol praticado no Maracanã.

Esse Flamengo 4 x 4 Vasco, entrou para a história e deveria ser emoldurado e colocado na parede da sala da casa de todo rubro-negro e vascaíno, como um dos grandes jogos deste século 21.

Assim como foi aquele Santos 4 x 5 Flamengo, na 12ª rodada do Campeonato Brasileiro em 2011, na Vila Belmiro, considerado por muitos especialistas, torcedores, emissoras, e acompanhantes de futebol como o maior jogo do século.

O que esses dois jogos têm incomum?

Vanderlei Luxemburgo, que era o treinador daquele Flamengo de Ronaldinho Gaúcho & Cia.

Que tenhamos mais Santos x Flamengo e Flamengo x Vasco nos campos nacionais, pois o futebol brasileiro e os torcedores merecem.

Twitter: @ViniciusCharges

Aqui eu expresso minha opinião, e você leitor tem todo o direito de discordar.

Comente, critique sem ofender ou elogie se merecer, mas não deixe de participar.

LEANDRO, O CÚMULO DO FUTEBOL ARTE

por Luis Filipe Chateaubriand 


Este texto homenageia o Leandro do Flamengo e da Seleção Brasileira, um dos maiores jogadores de todos os tempos, não só no Brasil, mas no mundo.  

Jogador de técnica absurda, era daqueles que aparava uma bola no ar levantando a perna para o alto, interceptando a bola com o pé no alto, fazendo a bola grudar no pé, descendo a perna até o chão com a bola grudada no pé. 

Naturalmente canhoto, sabia jogar de tal forma com o pé direito que muito julgavam que fosse destro. 

E vice versa.

Consagrado na lateral direita, devido a contusões foi jogar na zaga. Conseguiu o que parecia impossível, jogar ainda mais como zagueiro do que como lateral. 

Aliás, polivalente que era, jogava em diversas posições, seja de defesa, seja de ataque. 

Ao defender, era um Aldair ou um Baresi. Ao criar, era um Carpegiani ou um Modric. Ao atacar, era um Bebeto ou um Littbarski. 

O cara jogava tanto, mas tanto, mas tanto, que a história a seguir é verdadeira. 

No segundo jogo da final do Campeonato Brasileiro de 1982, em Porto Alegre, o Grêmio estava pressionando o Flamengo. 

Leandro pedia ao goleiro Raul para sair jogando com ele, mas Raul insistia em dar chutões para a frente. 

Leandro encheu tanto a paciência de Raul para este sair jogando com ele que Raul de uma bola toda “quadrada” ao Peixe Frito. 

O ponta gremista Odair veio em cima de Leandro e deu carrinho para tomar a bola.

Leandro, tranquilamente, deu um lençol em Odair, saiu jogando e, quando passou a bola, virou-se para Raul e disse: “Velho, eu jogo pra caral…”. 

Jogava mesmo. Fato!

Por essas e outras, este escriba afirma que Leandro é o jogador de defesa mais completo que viu em atividade, muito embora no meio e no ataque também “tirasse uma onda” responsa.

Luis Filipe Chateaubriand acompanha o futebol há mais de 40 anos e é autor da obra “O Calendário dos 256 Principais Clubes do Futebol Brasileiro”. Email: luisfilipechateaubriand@gmail.com.

O OLHAR DE HUGO

por Sergio Pugliese


No melhor do jogo, o lateral Itiro disparou o famoso petardo e como sempre o destino foi o? Foi o? Foi o? Acertaram!!! O terreno baldio, vizinho ao campo, em Laranjeiras. A bola sumiu no mato, um verdadeiro Triângulo das Bermudas de Adidas, Penaltys, Toppers e Nikes. Uma outra, zero quilômetro, fora zunida por ele mesmo minutos antes. Os dois times se embrenharam no matagal e só faltou levarem cães farejadores. Horas depois, necas de pitibiriba, frustração geral. Anoiteceu, a peleja acabou e a resenha começou mais cedo. Nesse dia, Hugo Aloy, organizador da pelada, não foi. Sua ausência é fato tão raro que teve atleta linguarudo apostando em praga.

– Quando ele não vem ou cai um temporal ou o jogo acaba de forma estranha – reclamou Tico, já na mesa do bar.

Na semana seguinte Hugo quis saber o paradeiro das bolas, não se conformou com o resultado das buscas e muito menos com as desculpas do constrangido Itiro. Eram novinhas e o caixa estava no vermelho. Emburrado, caminhou para os fundos do campo, espremeu o rosto no alambrado, ligou o radar imaginário e fixou o olhar no mato. Ficou estático como os felinos antes do bote.

– Olha o Hugo tentando achar a bola. Pirou! – ironizou Guilherme, o Soninho, de 25 anos.

Era uma missão aparentemente impossível. O mato estava alto e fechado, e o campo ficava uns bons metrinhos acima do terreno abandonado. Mas a rapaziada conhece o cara. Hugo é teimoso e não carrega 73 anos na carcaça em vão. Ficou ali, determinado, por 45 minutos. Com as mãos fixas na grade, mirava cada detalhe, cada fresta. Atirador de elite!!! Ali, sozinho, viu o pensamento distanciar e lembrou-se dos tempos de garoto, no Capri, em Santa Teresa, campinho morto para dar lugar ao Parque das Ruínas. Quantas bolas voaram por cima do telhado do Colégio Machado de Assis! Nenhuma escapou. Corria atrás e resgatava uma a uma! “Bola não é coisa que se perca”, costuma dizer.

– Cara, o Hugo continua lá. Endoidou de vez. – comentou Pedro, o Paçoca, de 26 anos.

Seus olhos buscavam as bolas, mas acabaram funcionando como um liquidificador chacoalhando capítulos de sua vida. Respirou fundo quando lembrou-se da teimosia em trocar a missa de domingo pela bola. O frei João Moreira, da Escola Carmelita Santo Alberto, sofria com as faltas, arrancava os poucos fios de cabelos e na segunda-feira o obrigava a escrever 200 vezes “não devo faltar à missa…”. Para não perder o recreio, apelava para a técnica infalível, nunca descoberta pelos padres: usar dois lápis ao mesmo tempo, um grudadinho ao outro. Após 100 repetições, tchau para o castigo. De repente, um pedaço de gomo branco clareou seus pensamentos. Era uma das bolas presa ao galho de uma mangueira. Guardou para ele a descoberta, afinal ainda faltava a outra.

– Pai, não vai sair daí nunca mais? – provocou o filho Huguinho, de 42 anos.

O moleque cresceu! Quem diria! Outro dia era um pimpolho chutando a Dente de Leite para o paizão agarrar. E não era nem nascido quando Hugo saiu de casa escondido de Dona Edilia, deixou as filhas Monica, de três anos, e Adriana, de dois, nos braços do técnico-babá Roberto Altomar para que ele disputasse, no campo do Olaria, a final do campeonato interno da Petrobras, empresa pela qual trabalhou 30 anos na área de relações internacionais. Marcou três gols, conquistou o título e voltou para a casa correndo. Quando a mulher chegou estavam os três, angelicais, de banho tomado, assistindo tevê. Ninguém sabe, ninguém viu. Na cabeça também veio o primeiro título internacional da história do futebol de salão, disputado no Paraguai, há exatos 50 anos, e vencido pelo seu Fluminense.

– Achei! – gritou.

Aos poucos, todos foram conferir e espantaram-se quando ele apontou as duas redondas, camufladas. “É pegadinha?”, perguntou Camilo. O goleiro Neneca desceu para resgatá-las. Os jovens Soninho e Paçoca, intrigados, encararam-se. Agora entendiam Hugo em campo e sua tal “visão de jogo”. Era um bruxo! Por isso seus passes improváveis e gols inimagináveis para um homem de 73 anos, com os joelhos tomados por artroses que não o deixam dobrá-los. Itiro balançou a cabeça, pasmo. Huguinho estufou o peito de orgulho. As bolas foram arremessadas de volta. No reencontro, Hugo sentiu o mais profundo dos prazeres e com o olhar de uma vida inteira sorriu ao vê-las quicando, felizes, em campo.

O CORAÇÃO NUMA CAIXA DE FÓSFOROS

por Claudio Lovato


Entrei no carro quando o temporal estava prestes a desabar. Foi só o tempo de fechar a porta para que os primeiros pingos começassem a metralhar a janela. O motorista era um cara grisalho. Quando li o nome dele e olhei para a foto que apareciam na tela do meu celular, uma sensação de estranha familiaridade me assaltou, mas foi só dentro do automóvel que tive a certeza de que era ele. 

“Puxa, mas você é o Délio! Que satisfação!”, falei sem conseguir calibrar o volume da voz e o tom do entusiasmo. 

“Desculpe, não entendi”, ele respondeu, evitando meus olhos no retrovisor. 

“Será que eu me enganei?”, eu disse. “Você não é o Délio, centroavante?”

“Não, não sou”, ele disse, forçando um sorriso. “Muita gente me confunde com ele”.

Não dissemos mais nada um ao outro. A corrida durou mais alguns minutos. Durante o que nos restava de viagem nem me dei o trabalho de pesquisar sobre ele na internet, ver fotos atuais, conferir o que ele andava fazendo, essas coisas. Eu sabia que era ele. Paguei, saí do carro e fiquei pensando sobre as razões de ele ter mentido. Não cheguei à conclusão alguma. Fiz apenas algumas suposições sem a menor importância. 

 

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“Vai com Deus, meu filho”, e isso foi tudo o que ela disse.

Seu menino estava indo embora. Ela bem que gostaria de fazer um último pedido ao seu Waldemar, para que ele cuidasse bem do menino, mas não conseguiu. Se tentasse falar mais do que falou, cairia num choro incontrolável. 

Thiago levava a mochila às costas e uma bolsa preta de náilon, ambas com o distintivo do clube, mas não eram produtos licenciados; seu Waldemar tinha comprado tudo, uma forma de agradar o garoto e tornar “oficial” uma sequência de procedimentos que de oficial tinha muito pouco. 

Ela viu o filho e o homem magro e calvo entrarem no carro, sob a chuva fina e insistente, e tomarem o rumo da capital. 

“Vai com Deus, meu filho”, ela pensou, os braços cruzados, o coração parecendo estar dentro de uma caixa de fósforos. 

 

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Há algum tempo que ele só tem olhos para ela.

Ele foi uma promessa de craque que deu certo. Profissional aos 18 anos. Europa aos 21. Duas Copas do Mundo. Hoje, de volta ao Brasil, é o artilheiro do clube. Solteiro. Rico.    

Ela trabalha na loja do clube. Mora na periferia. É um pouco mais jovem que ele.

Ele passa pela loja todos os dias. A loja é anexa ao Centro de Treinamento. Numa tarde em que o sol e a chuva resolveram aparecer juntos, ele a convidou para sair. Ela disse não. Tem namorado. Vão se casar. O namorado dirige Uber e estuda para concursos. 

O artilheiro, apesar disso, só tem olhos para ela. Apaixonou-se como somente ocorreu uma outra vez em sua vida – pela mulher vencida pela doença cruel há dois anos. 

Ambos – o artilheiro celebridade e a vendedora da loja do clube – estão sendo honestos com eles mesmos. 

São pessoas que já entenderam que a vida está além do que se compra e do que se vende. 

 

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Nos últimos dias, ele tem pensado muito no avô. 

O avô lhe dava muitos conselhos e gostava muito de ditados e provérbios.

“Não se deve ser arrogante com os humildes nem humilde com os arrogantes”, o avô dizia com frequência. 

Ele riu, enquanto dirigia para casa. O avô era uma figura. 

Muito, muito tempo atrás, antes de sua primeira viagem com o time principal, ele recebeu do avô o seguinte conselho:

“Cuidado com o terno. A camisa é branca. Quando forem comer no aeroporto, cuidado com a beterraba e o molho da massa”.

Ele riu de novo dentro do carro silencioso que avançava no asfalto molhado pela chuva que tinha começado de manhã e não dava sinais de trégua. 

Como sentia saudades do avô.

Chegou em casa, estacionou o carro na garagem e, antes de sair, olhou para a calça. Na perna direita, logo acima do joelho, a marca redonda e roxa denunciava que uma rodela de beterraba havia despencado ali. 

Então, antes de dar aquele dia por encerrado, ele pensou:

“Em apenas um par de dias fui arrogante com um humilde e humilde com um arrogante”.

E por fim:

“Eu não sou isso”. 

Depois, com a cabeça baixa e os olhos grudados no chão, foi falar com os dois bisnetos do homem que ele sempre teve e sempre terá como referência absoluta do que é bom e digno e realmente importante.