por André Felipe de Lima
Em 1965, o jovem zagueiro Galhardo mostrava-se preocupado com o futuro, sobretudo quando chegasse o momento de abandonar a carreira. Tendo o pai José como sócio, tocou uma fábrica de bebidas em Araraquara. Esse estilo cônscio e resoluto, ele levava para o campo. E foi assim que Galhardo foi construindo sua brilhante carreira no futebol. Um beque dos melhores de sua geração.
Orgulho da mãe Maria Michelini e da irmã Maria Helena, João José Galhardo, seu nome de batismo, começou em 1958 como lateral-direito, no juvenil da Ferroviária de Araraquara, cidade em que nasceu no dia 29 de novembro de 1942. Quem o levou para o clube foi o amigo Picolin, que na época era o treinador do time. Nos aspirantes, pulou para a lateral-esquerda e depois para a zaga, e lá permaneceu. Galhardo jamais deixou treinadores na mão. Era pau pra toda obra. “Antes eu jogava futebol na várzea, no time do bairro do Carmo, onde morava, chamado Paulista (onde jogava como meia-esquerda). Em 1960, fui promovido ao quadro de aspirantes e, em 1962, na Taça São Paulo, fui lançado no time principal da Ferroviária, entrando no lugar de Válter, lateral-esquerdo, na partida contra o Corinthians. Depois do jogo, o presidente corintiano perguntou se a diretoria da Ferroviária estava interessada na venda de meu passe. Ante a resposta negativa, o Corinthians pediu prioridade para a sua compra”, narrou Galhardo, à antiga Revista do Esporte, em 1965, quando já se encontrava no Parque São Jorge, vestindo a camisa do Timão.
Seu passe custou ao Corinthians 25 milhões de cruzeiros da época, além dos passes do Bazzani (maior ídolo da história da Ferroviária) e do Osmar. Logo no primeiro ano no novo clube, o técnico Oswaldo Brandão o escalou na lateral-direita. Na reserva ficara ninguém menos que Jair Marinho. Como chutava com os dois pés, não sentiu a diferença. Como já enfatizamos, Galhardo era polivalente.
Mas o craque dos “sete instrumentos” — como diziam os mais antigos — acalentava outro sonho, o de jogar pelo Santos. Afinal, que jovem jogador como ele na época não queria defender o alvinegro praiano e jogar ao lado de Pelé e companhia?
O menino dizia torcer pelo Flamengo no Rio e ocultava o time de coração em São Paulo. “Deixa pra lá”, respondeu ao repórter. Jamais escondera o desejo de um dia jogar por um grande time carioca. Ouvira falar em 1964 que o Flamengo estava interessado no passe dele. “Mas parece que tudo foi só onda dos jornais”, disse ele. Mas por pouco não parou com o futebol em 1968, após um entrevero com o então técnico do Corinthians Zezé Moreira. “Queria abandonar o futebol”, declarou ele a Valterson Botelho.
Se a investida do Flamengo foi “marola”, a de outro clube carioca no qual Galhardo escreveria a mais importante página da carreira seria um verdadeiro “tsunami”. Esse maremoto de alegria na vida do Galhardo chama-se Fluminense para onde Galhardo foi após um convite do treinador Evaristo de Macedo.
Foi quando ainda dava os primeiros passos na carreira que conheceu Selma, com quem se casaria. Ela foi, talvez, quem melhor compreendia a paixão que Galhardo construiu pelo Tricolor ao longo da jornada nas Laranjeiras. “Quando o Flu não consegue vencer, meu amor fica o resto do dia intranqüilo, aborrecido mesmo”. A mais pura verdade. Galhardo tornou-se um dos melhores zagueiros da história do Fluminense.
Com o Tricolor, foi campeão carioca de 1969 e de 1971 e da Taça Brasil de 1970, o antigo Torneio Roberto Gomes Pedrosa. Aquele Fluminense de “timinho” tinha nada. Era um esquadrão de respeito sob o comando do técnico “casca grossa” Paulo Amaral. Vamos lá: No gol, Félix; na defesa, Oliveira, Galhardo, Assis e Marco Antônio; vamos ao meio de campo com Denilson e Didi; no ataque, Cafuringa, Samarone, Mickey e Lula.
Em 1973, como destaca o jornal Folha de S.Paulo, o Fluminense planejava conceder a Galhardo o passe livre. O jogador vivia um drama. Um dos ligamentos de um dos joelhos ficou severamente comprometido após um jogo contra o Bahia em 1971. Telê Santana até o convidou para jogar pelo Atlético Mineiro, mas era mesmo o fim da carreira de jogador. Mas sem deixar de lado o futebol, sua paixão. Treinou escolinhas de futebol e trabalhou como vendedor.
Hoje, o grande ídolo e tricolor de coração vive tranqüilo em Araraquara ao lado da família.