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Danilo Moura

MADE IN CHINA

por André Mendonça


Danilo foi o artilheiro da última edição da Liga

De uns tempos para cá, jogar no futebol chinês virou moda. Diego Tardelli, Renato Augusto, Alexandre Pato, Ramires e Jô foram alguns dos brasileiros que se transferiram recentemente para o continente asiático, atraídos pelos salários generosos. Muito antes desses jogadores, no entanto, um carioca já fazia história na China com a bola nos pés. Desde 2010 no continente asiático, Danilo Moura, de 31 anos, já levantou quatro taças e foi artilheiro em quatro edições. Nesta temporada, também lidera a lista dos goleadores. O sucesso, contudo, não veio por acaso.

Assim como muitas crianças, Danilo sempre teve o sonho de ser um jogador profissional. Nascido na favela da Rocinha, no Rio de Janeiro, o craque desde cedo impressionava pela habilidade e agilidade. Por isso, com cinco anos, já fazia parte do time de futsal da comunidade e logo passou a treinar no São Cristóvão, a convite de Bruno, seu primeiro técnico. Não demorou muito para o talento novamente ser reconhecido e, aos seis, integrava a equipe do Flamengo, onde ficou até aos 17 anos, sempre no futsal. Quando se interessou pelo futebol de campo, contudo, teve uma frustração:

– Eu gostava mesmo do futsal. Todo ano me chamavam para fazer teste no campo, mas eu não ia. Quando tinha uns 16 anos e me interessei já era tarde. Os meus colegas estavam em um nível muito acima do meu.


Durante as férias o craque costuma jogar peladas na Rocinha, onde foi criado

Dedicado, Danilo não deixou que o problema lhe abatesse e se transferiu para o salão do Vasco, onde jogou apenas um semestre. A passagem pelo clube foi interrompida por conta de uma boa oferta do Desportivo de Boticas, de Portugal. Chegou quando a equipe estava na terceira divisão e, com muitos gols, ajudou o clube a chegar à elite do futsal português. Ainda em Portugal, teve a oportunidade de atuar por Belenenses e Operário, sempre na ala-direita.

Depois de cinco anos e muita bola na rede na Europa, em 2011 surgiu o convite de um empresário para jogar no futebol chinês, no Shenzhen Nanling. O idioma, a distância e a cultura exótica não o desanimaram: partiu para em Shenzhen, cidade no sul da China, província de Guangdong.

Apesar da companhia dos compatriotas, Danilo revelou que encontrou bastante dificuldade no primeiro ano, principalmente  na hora das refeições. O brasileiro, aliás, contou uma divertida história que aconteceu no primeiro jantar ao lado dos companheiros de time. Brincalhões, os chineses não perderam a oportunidade de colocar uma pilha:

– Já passei cada sufoco! No primeiro jantar deu aquele choque. Só veio comida estranha. Era um frango cru, todo fatiado e só a cabecinha dele te olhando. Foi assustador! Os chineses falaram que se eu comesse aquilo faria três gols. Tá doido! – lembra, às gargalhadas.

Mas as dificuldades de adaptação também se refletiam dentro de quadra. Além do jogo ser muito mais corrido do que estavam acostumados, Danilo e os outros brasileiros, sem nenhum domínio da língua chinesa, sofriam para entender as orientações do treinador e para se comunicar com os companheiros. O técnico, então, encontrou uma criativa solução para esse problema, e foi brilhante! Os recém contratados escolheriam o nome de um jogador brasileiro para cada companheiro de equipe. Dessa forma, o Shenzhen Nanling passou a ter “Ronaldo”, “Romário”, “Lúcio”, entre outros craques. E não é que deu certo?

– A comunicação era impossível! Não dava para entender nada! E até pronunciar o nome de um chinês para alertar alguma coisa dentro de quadra, já tinha sido gol dos caras. Era bola nas costas direto! A solução foi perfeita!


A amizade com Nonato vai além das quatro linhas

A difícil adaptação poderia ser ainda pior se não fosse “Nonato”, o chinês gente boa que se interessou pela cultura brasileira e se prontificou a aprender a língua para ajudar os novos amigos. “Nonato”, na verdade, era para ser o “Ronaldo” da equipe, mas a variação linguística acabou transformando o apelido do jogador. Segundo Danilo, a comunicação entre eles mistura todas as línguas e muitos gestos, mas isso não é problema.

A amizade com Nonato se desenvolveu de tal forma, que nas férias do ano passado, a convite de Danilo, o chinês veio visitar o Brasil. Além de ter ficado na casa do craque brasileiro, na Rocinha, o chinês, que compartilhou tudo na rede social, curtiu o samba carioca, jogou futevôlei na praia e ainda foi ao Maracanã ver o Flamengo. A parceria logo se refletiu nas atuações dentro de quadra e quem agradeceu foi a torcida do Shenzhen. Em uma temporada, Danilo bateu o recorde de gols da liga, balançando a rede por incríveis 118 vezes.

– Preciso fazer meus golzinhos para o contrato ser renovado, né! – brincou.

Ainda que sua fase seja brilhante, o ala lamentou as constantes mudanças na regra do futsal na China. Antigamente, sua equipe contava com mais brasileiros, mas, no ano passado, a federação estipulou que só poderia um jogador estrangeiro por time, o que acaba sendo um estímulo para os chineses praticarem o esporte. Apesar de ainda não ser uma modalidade muito conhecida no país, Danilo afirma que o futsal vem sendo praticado cada vez mais pelos chineses e, dependendo da região, os ginásios já ficam cheios e a torcida apoia. Contudo, ao mesmo tempo em que serve como estímulo, a nova regra fez o nível técnico cair.

– No Brasil a bola chega redondinha. Na China o passe chega quadrado e tem que se virar pra consertar.

Mesmo totalmente adaptado ao país em que joga, Danilo revelou que em um futuro bem próximo pretende retornar às quadras do Brasil. Com 31 anos, diversos títulos e muitos gols, o craque afirmou que ainda tem sonhos a serem realizados.

– Todo mundo deseja jogar com o Falcão. Eu saí muito cedo do Brasil e poucos me conhecem. Jogar uma Liga aqui no Brasil seria um sonho e também um ótimo desafio para mim. Seria a oportunidade de mostrar meu trabalho no país em que nasci.

Nas férias, o craque não abandona as raízes e pega o primeiro voo para o Brasil para curtir as peladas, os sambas e as resenhas com os amigos no Complexo Esportivo da Rocinha, onde é bastante conhecido. 

Enquanto não realizar o sonho de voltar definitivamente para o Brasil, os chineses vão continuar vibrando com os dribles do artilheiro.


Jogadores do Shenzhen posam para a foto após a conquista do título