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Banco de reservas

UM LOCAL ONDE SENTA E HABITA A HIPOCRISIA

por José Roberto Padilha


No tempo em que o Denílson, o Rei Zulu, era emérito capitão tricolor, banco de reservas era um local respeitado. Era a antessala do poder. Não tinha esta história de time misto, a escalação estava na ponta da língua do torcedor e o álbum de figurinha da Panini não era traído quando da confecção dos onze que jogariam o Campeonato Brasileiro: Félix, Oliveira, Galhardo, Assis e Marco Antônio; Denílson e Didi; Wilton Flávio, Samarone e Lula.

Subindo dos juniores, contrato assinado, restava após o treino esperar a lista dos convocados que era afixada na parede azulejada. Eram sempre 17. 11 entravam em campo, ficavam no banco um goleiro e mais 5. E um era cortado no vestiário. Poderia alguém passar mal, ter uma indisposição qualquer. Era o correto.

Na primeira vez que por lá sentei, aquela que a gente nunca esquece, como tricolor desde criancinha, cai na asneira de vibrar com um gol do Lula. Os outros permanecerem calados com olhares de reprovação. Depois da partida me chamaram no canto: “Ô juvenil! Está torcendo contra o patrimônio?” Não, retruquei. Estou torcendo pelo Fluminense. E a raposa felpuda contou os segredos daquele frio e desesperançoso lugar a partir dali. “Para o Fluminense, disse, você torce em silêncio, como todos nós. Para quem joga na sua posição, você fica em silêncio secante”. E traduziu: “Torce para o Lula ter uma leve entorse, nada sério, pegar um terceiro cartão amarelo, uma expulsão, então, lhe darão dois jogos para você ter uma oportunidade. O maior patrimônio que temos é estar lá dentro. Aqui, sentado, não valemos nada.” Era algo que soava diferente. Mas pelo menos eram sinceros.

E nunca mais sentei em um banco de reservas que não torcesse por si mesmo. Silêncio secante, dedinhos discretamente cruzados. Ou você permaneceria ali o resto da carreira, obscurecido como os reservas do Fábio, do Cruzeiro, do Vitor, do Atlético Mineiro, que ninguém contrata porque nem eu nem você sabe quem são. Ou pega uma lordose crônica, como herdaram os goleiros reservas do Rogério Ceni após 889 jogos sem deixar o gol do São Paulo.

Hoje, a FIFA estragou a antessala do poder. Parece um portal dos desesperados. São tantos ali sentados, que basta seu time marcar um gol que saem correndo atrás do artilheiro. Não para comemorar seu feito, mas para darem tapas em sua cabeça. E dezesseis tapas seguidos podem gerar uma brecha no lugar do Gabigol. E serem vistos na televisão.

Não se iludam. São 17 anos de bola, 7 clubes defendidos em 4 estados da federação e 2,5 na reserva do Lula: banco de reservas nunca torce a favor. Os que fingem que o fazem, e deixam escapar pro treinador que estão felizes e acomodados, apenas atestam que mesmo diante das novas e confortáveis poltronas, por ali reina a dissimulação. Um local onde senta e habita a hipocrisia.