FUI!
por Zé Roberto Padilha

Estou indo jogar na Arábia Saudita. De rico me tornar milionário. E agradeço ao talento que Deus me concedeu ao nascer no Brasil. Em nenhum outro país teria alcançado os recursos que adquiri para jogar futebol.
A receita é simples, mas dolorosa no começo. Porque primeiro você tem que ser pobre. Não ganhar um Playstation de Natal, mas apenas uma bola de futebol. Ficar com ela nos pés o dia inteiro porque a escola pública só tem um turno. O que aprendemos não atrapalha a pelada e dá para conceder entrevista. Foi assim comigo, com Pelé, Ronaldinho…
Depois você, sendo de família humilde, seus pais não podem pagar mensalidades em uma escolinha de futebol cujo treinador pede para calçar chuteiras no nascedouro. Daí você vai procurar um campo de terra batida na periferia. Jogar descalço e não perder o tato. Ou Jordan, Duran, Irving, LeBron James começaram jogando basquete de luvas?
Ao ser enganado pelas irregularidades, criamos recursos de domínio para os buracos e montinhos traiçoeiros que nem em Harvard pensaram criar. Acham que basta trazer um produto pronto, como o Messi, para dar cria. Foi assim com Ivair, o Príncipe, Vinicius Jr., o Rivaldo…
Já disputei algumas Copas, fui campeão olímpico, ganhei a Champions League e está na hora de curtir de vez a vida. Ser menos cobrado, menos marcado pois quem me contratou, o Príncipe, quer espetáculo, circo, encher suas arenas para distrair seu povo.
Desde Roma, Emílio Garratazú Médice, Augusto Pinochet tem sido assim. Desse jeito, a riqueza debaixo da terra paga, os talentos que crescem sobre ela, recebem em petrodólares. À sua volta, permanecem distraídos os pobres coitados.
E eu e o Cristiano, que viemos buscá-los, sabemos que nunca mais seremos competitivos. Dentro de campo, claro, porque fora dele vamos brigar pelas dez primeiras colocações na Revista Forbes.
Mas para o jogo das estrelas, Zico pode contar comigo.
Abraços meu povo
O GIGANTE PAULO AMARAL
por Elso Venâncio, o repórter Elso

Paulo Amaral foi o precursor da preparação física no futebol brasileiro. Esteve junto à comissão técnica nacional durante as conquistas das Copas de 1958 e 1962, além do Botafogo, clube pelo qual teve forte identificação. Lutador de boxe, nadava e também levantava pesos. Era um gigante, com quase dois metros de altura e cem quilos de músculos.
O ‘Sargento de Ferro’ trabalhou na temida Polícia Especial do Presidente da República Getúlio Vargas. Paulo Amaral e Mário Vianna, ‘com 2 enes’, aquele que tão bem representou a arbitragem brasileira nos Mundiais de 1950 e 1954, patrulhavam o Rio de Janeiro, então Capital Federal do país, com suas possantes Harley-Davidson, sempre em dupla. Cabeças raspadas à navalha, fato raro na época, usavam boinas vermelhas. Eram famosos, mas também temidos, principalmente quando rondavam pela Lapa.
Paulo Amaral tinha 36 anos quando a Seleção Brasileira, já tendo conquistado a Copa na Suécia, enfrentou o Uruguai, no Estádio Monumental de Nuñez, pelo Sul-Americano de 1959. Nesse jogo estourou um dos maiores conflitos da história do futebol. Brigaram jogadores, reservas e comissões técnicas. Almir Pernambuquinho, que substituía Vavá, chocou-se com o goleiro adversário e foi agredido pelo zagueiro Martinez. Nisso, revidou no ato. Pelé tomou as dores e o zagueiro Orlando Peçanha entrou na confusão. Didi apareceu, acredite, dando voadoras. A polícia, preocupada em impedir a invasão dos torcedores argentinos, deu as costas para a batalha campal. Surgiu, então, o imponente Paulo Amaral, derrubando um a um que lhe aparecesse à frente com socos. Até os brasileiros se assustaram. Paulo Amaral, Didi e Paulo Valentim, foram os que mais bateram e apanharam. No reinício do jogo, o Brasil venceu por 3 a 1: três gols de Paulo Valentim.

“Vencemos na bola e na porrada!” – declarou Didi.
Antes de levar os estudos a sério e se formar, Paulo Amaral jogou futebol. Foi lateral-direito no Flamengo, passando depois para o meio de campo. O técnico Flávio Costa observava sua paixão pelos esportes e o aconselhou estudar na Escola de Educação Física do Exército, na Urca. Amigo de João Saldanha, Amaral gostava de comentar:
“Como é que João fala inglês, francês, alemão e até russo?”
Paulo Amaral passou a ter destaque como treinador quando dirigiu o Botafogo em quatro períodos diferentes. Depois, Corinthians, Fluminense, Vasco, Atlético Mineiro, Al-Hilal, Bahia e a Seleção do Paraguai, além do Juventus e do Genoa, dentre outros times nacionais e internacionais, conquistando títulos importantes.
Na geral do Maracanã, atrás do banco do Botafogo, um torcedor gritava insistentemente:
“Careca viado! Careca frouxo!”
Os jogadores reservas se entreolham, mas seguraram o riso. O técnico saiu de fininho, desceu o túnel, chegou ao antigo saguão e invadiu sorrateiramente a geral. De frente para o inconsequente sujeito que o esculachava, cruzou os braços e começou uma verdadeira sessão de boxe, abrindo um clarão no meio da galera.
No casarão histórico de General Severiano, eu acompanhava o velório do ídolo Didi. Antes de seu corpo deixar a sede, Paulo Amaral pediu atenção a todos. Pôs uma flor no peito do mestre da “Folha Seca”, beijou Rebeca e Lia, filhas do ex-jogador e rezou em voz alta:
“Pai nosso que está no céu…”
Em seguida, desceu as escadas e, nos jardins do casarão, seus soluços eram ouvidos à distância.
O carioca Paulo Lima Amaral faleceu em 5 de maio de 2008, aos 84 anos, na sua casa em Copacabana, bairro onde morou durante toda a vida.
A RAÇA DE CHINA
por Reinaldo Sá

Nos tempos do futebol raiz, China era a garantia para os avanços dos laterais Paulo Roberto e PC Magalhães e o porto seguro para os zagueiros Baidek e De León. Sua marcação sempre foi implacável! E se os defensores sentiam-se blindados o meio-campo também o reverenciava. E olha que na final do Mundial de Clubes, em 83, contra o Hamburgo, ele dividiu o espaço com nada menos que os talentosos Mário Sérgio e PC Caju.
China corria por todos, suava a camisa, se entregava como poucos pelo clube que sempre amou! E essa dedicação deixava mais livres PC Caju, o Vesgo e Osvaldo para abastecerem Renato e Tarciso. China carregava o piano para que toda a orquestra não desafinasse. Mas é bom deixar claro que também era integrante dessa orquestra estelar, pois tinha qualidade, botes certeiros e uma dedicação contagiante. Mas ele é pouco lembrado pela imprensa. Sempre foi idolatrado pelo técnico Valdir Espinosa.
O Grêmio travou várias batalhas até chegar ao cume, ao título, e o mosqueteiro China sempre saía vencedor. Sua raça jamais será esquecida pela legião gremista e pelos amantes do futebol. Se o Grêmio é gigante as novas gerações entender que um dos responsáveis por isso é Henrique Valmir da Conceição ou simplesmente China.
EM 1984, ASSIS É O CARRASCO DO FLA NOVAMENTE
por Luis Filipe Chateaubriand

Em 1984, Flamengo, Fluminense e Vasco da Gama chegavam ao triangular final do Campeonato Carioca.
O Vasco da Gama não foi bem no triangular, tendo perdido os seus jogos, tanto para o Fluminense, como para o Flamengo.
Assim, Flamengo e Fluminense chegavam para o jogo decisivo, em 16 de Dezembro de 1984.
Jogo muito disputado, o Flamengo tinha em Tita e Bebeto jogadores cruciais para o time jogar bem – lembre-se que Zico estava no futebol italiano.
Já o Fluminense contava com um conjunto harmonioso, bons jogadores e uma força física impressionantes.
Jogo equilibrado, os excelentes ataques do Flamengo invariavelmente paravam nas mãos de Paulo Victor, o goleiro tricolor, que cumpriu atuação de gala.
E, aos 30 minutos do segundo tempo, aconteceu o lance decisivo – da partida e do título.
O meia Renê, na intermediária, acionou o lateral direito Aldo, ao lado da área, pelo lado direito.
Aldo, com o pé direito, fez excelente cruzamento para a área, no alto, e a bola encontrou Assis, na pequena área.
Assis meteu a cabeça na bola, com extrema categoria, e esta foi “morrer no barbante”, no alto e no lado esquerdo do mítico goleiro flamenguista Ubaldo Fillol.
Fluminense 1 x 0 Flamengo.
O placar definitivo do jogo, que dava o bicampeonato carioca para o clube das Laranjeiras.
O herói do título era Assis.
Que, tal qual havia feito em 1983, tirou do Flamengo a chance de ser o campeão carioca.
Assis, o carrasco rubro negro, pela segunda vez consecutiva!
E A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL CHEGA AO FUTEBOL
por Zé Roberto Padilha

Ontem, em O Globo, Eduardo Barthem, criador da Performa Sports, explica porque cobra 4,5 mil mensais para ensinar ao Nino, do Fluminense, algo que jamais precisaram explicar pro Edinho.
Muito menos para o Thiago Silva, Ricardo Gomes, Duílio, Abel, Tadeu, Assis e Altair. Enfim, para a escola tricolor que usava a Inteligência Natural do Pinheiro para os ensinar a posicionar.
“Depois que ele estava correndo em direção à própria área, girava o corpo em 360 graus se o adversário mudasse a bola de lado. Foi por mim alertado. E passou a fazer o giro mais curto!”.
Como a Inteligência Natural nos abandonou, tantos anos sem uma genialidade em campo, tantas Copas do Mundo perdidas, melhor deixar o Nino ouvir, de um empresário que nunca jogou bola, situações buscadas no computador para obter mais recursos.
Se foi o dom, a habilidade, o drible da vaca inventado na pelada de rua ao tabelar com o muro, enganando o poste da Light que vinha na cobertura. Se foi o talento natural, imarcável, inimitável, do jogador de futebol brasileiro.
Não foi à toa que levaram o Messi para atuar mais próximo da sede do Facebook. Mark Zuckerberg vai aprontar mais aplicativos por aí, ou vocês acham que os americanos estão felizes em não ocupar também as trincheiras do futebol?
Ah! Pelé. Que falta nos faz a presença de um ser supremo, que conquistou o único reinado permitido aos colonizados, apenas dando tiros livres, diretos ou indiretos, com a naturalidade e a arte com que os Deuses do Futebol lhe concederam.