por Claudio Lovato Filho
No começo, ele estava lotado. Crianças, adultos e velhos. Cantos, batucada. Bandeiras, faixas e trapos por todos os lados. Uma festa.
Mas de repente começaram a surgir os clarões.
Primeiramente, pequenas áreas esparsas; depois, grandes espaços vazios em todos os lugares avançando como sombras sedentas de mais escuridão.
As bandeiras, faixas e trapos voaram, sugadas pelo céu cinza-chumbo.
Então o estádio desmoronou.
Foi assim: pedaço por pedaço, seção por seção, anel por anel – até não sobrar nada além de um vasto terreno descampado pedregoso, calcinado e deserto.
Nesse ponto acordei.
Um pouco mais tarde, com uma caneca de café na mão e o olhar preso no horizonte através da janela da sala, pensei numa passagem de “A Estrada”, de Cormac McCarthy:
“Eu disse ao garoto que quando você sonha com coisas ruins significa que você ainda está lutando e que ainda está vivo. E quando você começa a sonhar com coisas boas é a hora em que você deve se preocupar”.
O dia prosseguiu em seu novo modo quarentena. Na minha cabeça e no meu coração se fortalecia o desejo de continuar sonhando com coisas ruins desde que isso signifique continuar tendo ao meu lado aqueles de quem preciso e que precisam de mim e fazer por eles o melhor que eu puder, colhendo de volta a possibilidade de, com eles, poder olhar para o céu à noite e falar da Lua, da brisa leve e das estrelas.
Mais adiante, quem sabe, conforme eu continuar a ter sonhos ruins, talvez eu possa ver acontecer coisas como o surgimento de novas e melhores formas de relacionamento entre as pessoas, junto com o retorno de velhas alegrias, coisas simples e maravilhosas como as caminhadas no parque, as confraternizações com os amigos do peito e os estádios lotados.
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