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PELAS LENTES DO AMOR ALVINEGRO

texto: Sergio Pugliese e Flavia Ribeiro | fotos: Família Moraes

 

Quando a produtora Sílvia Magalhães e a designer Izabel Barreto entraram no estúdio da fotógrafa Nana Moraes, na Glória, acompanhadas de Paulo Cezar Caju iniciou-se o alvoroço. Ele, ídolo, ela, fã, o resultado não podia ser outro: abraços emocionados de “amigos” que não viam-se há tempos. Barba branca, o estilão continuava o mesmo. Ela estava acostumada a vê-lo correndo com a camisa do Fogão e da seleção brasileira. Os cabelos de Nana também embranqueceram, mas o olhar continuava afiado. Na conversa, observava os traços do craque e imaginava o enquadramento, a luz, as poses. Pena a foto não conseguir registrar a deliciosa gargalhada de PC, imaginava, sempre observada pela vascaína Sílvia e a rubro-negra Izabel. “Onde troco de roupa? Vai ter maquiagem?”, brincou PC. Mas antes da sessão, Nana tinha uma missão especialíssima a cumprir. Ligar para a mãe, Luzia, de 79 anos, alvinegra roxa, apelidada de “Vó dos Loucos”, em referência à torcida organizada Loucos pelo Botafogo.   

Ligou. Suspense!!!  Do celular da filha veio a voz grossa, marcante, inconfundível, perguntando como ela estava. Um curto silêncio e a surpresa. PC fora surpreendido pela ex-bailarina e ex-produtora de moda, com quem nunca falara antes: “É Paulo Cezar Caju? Que fez três gols contra o América quando tinha 17 anos e quase me matou do coração?”, perguntou. “Aquele dia, minha estreia no Maracanã, foi lindo!”, vibrou, ao recordar um dos momentos mais marcantes de sua carreira. Os dois tagarelaram até PC desligar com os olhos transbordando de emoção. “Esses momentos sacodem a nossa alma”, suspirou enquanto vestia o blazer preto.

Luzia contou para PC que o marido, Zé Antônio, fotógrafo consagrado do JB e da Abril, o clicou muitas vezes e adorava a dupla que fazia com Jairzinho, no Botafogo, seleção brasileira e no francês Olympique de Marseille. O curioso era que Luzia usava cabelo Black Power igual ao de PC e, certa vez, no aeroporto em Paris, foi abordada por um oficial da alfândega querendo saber se ela era irmã do craque. Na época, PC arrastava multidões aos estádios franceses e era idolatrado por políticos, estilistas e atores, como Jean Paul Belmondo.

O estilo Black Power, por sinal, foi estudado por Nana, uma das profissionais mais requisitadas do país. Dias antes de fotografá-lo também reviu imagens de alguns ídolos do craque contestador, como Martin Luther King, Malcom X e os Panteras Negras, homens que lutaram pela causa negra. Nana não queria errar, afinal decepcionaria toda uma família de botafoguenses. Nana, além de ser filha de Luzia, é irmã do também fotógrafo, Sérgio Moraes, da agência de notícias Reuters, e da produtora de moda top de linha Bebel Moraes. Entre os netos, os dois filhos de Nana – a empresária Lígia e o fotógrafo Ricardo, também da Reuters – e o mais velho de Sérgio – o estudante Pedro – também carregam uma estrela solitária no peito. E uma quarta geração alvinegra já dá seus primeiros passos na família: Rosa, de 6 anos, filha de Lígia, e o pequeno José Antônio, de 1 ano e 7 meses, filho de Ricardo, continuam a tradição iniciada por um outro Zé Antônio lá pelos idos anos 40.

Diante dos flashes, PC parecia um profissional. Suas expressões variavam como assistisse uma partida de futebol. Ele mesclou sorrisos exuberantes com olhares distantes, tensos e tristes. Nana viajava e resolveu arriscar. Pediu para que ele ficasse sem camisa e usasse a amarelinha da seleção brasileira como um cachecol, imagem que representaria seu estilo festeiro, ousado, rebelde e ao mesmo tempo elegante, de lançador de tendências, com o amor incondicional pelo futebol. Quem conhece PC sabe que ele poderia devolver s sugestão com uma resposta ríspida. Mas nesse caso, não. Ele nunca negaria algo que fosse uma bicuda nas regras e nas caretices do mundo atual. “Adorei, vamos nessa!”.

Mas, peralá, a rebeldia do craque não rima com inadimplência. De repente, ele pirou, disse que precisava ir embora, precisava achar uma casa lotérica, pois esquecera de pagar duas contas. “Que horas são?”, perguntou, inquieto, enquanto conferia o dinheiro, contava moedas. Mas Sílvia e Izabel sabem a hora de colocar a bola no chão e pedir calma ao time. “Bebe uma água e acalma, PC”, sugeriu Sílvia. Em cinco minutos pagaram as contas pelo celular. O indomável PC, avesso às tecnologias, acalmou-se e voltou ao campo de jogo.