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Vasco da Gama

VASCO DA GAMA NÃO NAVEGA NA CALMARIA

por Celso Raeder

O primeiro gol do Vasco foi o prenúncio de que algo muito estranho estava prestes a acontecer. Como virar uma partida em que o time já começa ganhando? E o que fazer diante de uma torcida que não está acostumada a explodir de alegria tão cedo, logo após o minuto de silêncio? Se Caetano Veloso tivesse assistido ao jogo contra o Sampaio Correia, diria: “Alguma coisa está fora da ordem, fora da nova ordem mundial”.

Qualquer vascaíno que passou o ano inteiro gritando, se emocionando, empurrando o time, sabe que aquele gol do Anderson Conceição era pra ter sido marcado aos 43 do segundo tempo, incendiando o estádio até o desfecho apoteótico com o gol do Andrey, já nos acréscimos. Tem sido assim ao longo de praticamente todo o campeonato, com o Vasco reafirmando sua vocação de Time da Virada, quando o juiz já está com o apito na boca apontando para o meio de campo.

Quem mandou o Figueiredo fazer aquele cruzamento magistral na cabeça do Anderson Conceição aos quatro minutos do primeiro tempo? Só para fazer o time esquecer que o Sampaio Correia já tinha metido três gols no Tiago Rodrigues no primeiro turno? Quando veio o empate, aos 15, a torcida, o técnico Jorginho e os jogadores estavam seguros de que recuperariam a vantagem no placar no momento que quisessem. Sobrava tempo para isso.

Foi aí que o barraco desabou. Por que o Vasco só arranca vitórias nos momentos em que está sob intensa pressão psicológica. Sua força nasce da adversidade. E jogando em casa, com arquibancada lotada, com um retrospecto invejável de bons resultados em São Januário, não passava na cabeça de ninguém que algo fosse dar errado. Mas deu.

Não sei o que vai acontecer logo mais, com a combinação de resultados entre os jogos dos times que também disputam uma vaga na elite do futebol brasileiro. Talvez o Vasco se classifique por antecipação, tornando o jogo contra o Ituano mera formalidade. Mas, sinceramente, torço para que isso não aconteça.

Gabriel Pec, o menino criado no Vasco, não enxugará as lágrimas na tabela. Ele quer o suor do rosto consagrando seu trabalho. Nenê, que não precisa mostrar mais nada a ninguém, também não se acovardará diante da missão. Yuri Lara entra com uma perna só, se for necessário. Alex Teixeira, Eguinaldo, Tubarão, titulares e reservas prontos para entrar em ação. Vitória do Vascão, vitória de virada em Itu, como deve ser.

E a torcida do Vasco, ah, essa galera diferenciada que mata de inveja os outros clubes…pra que chorar? Não empurramos esse time para cima da tabela com alegria e paixão? Por que seria diferente justamente na última e decisiva partida? Da minha parte, só tenho um único pedido: Figueiredo, mete um golaço consagrador para compensar essa mudança de roteiro que você, involuntariamente, provocou com o gol do Anderson Conceição. Jogar na zona de conforto é uma calmaria que o Almirante da Colina, acostumado a tormentas, não sabe navegar.

DINAMITE, A ESPERANÇA

por Rubens Lemos

Desde criança, no sufoco que a vida me reservou e à vida dos meus pais, a minha crença chamava-se Roberto Dinamite, herói de sorriso triste e gladiador solitário na luta contra o espetacular Flamengo de Zico. Narrava gols de Roberto Dinamite sozinho no quarto, tarde da noite, com fé e orgulho. Ele foi o maior artilheiro que vi jogar com a camisa do meu Vasco.

Hoje nem chamo o Vasco de meu, porque o Vasco é uma catástrofe de falta de vergonho e futebol paupérrimo, sem qualquer jogador acima da média, apanhando de times que goleava nos meus tempos de viciado nos domingos de Gol do Fantástico.

O Vasco de hoje não desperta aquele sentimento confiante de euforia, nem pode, é um time ridículo, com jogadores desconhecidos que podem perfeitamente jogador na Série C e até mesmo na Série D.

O Vasco tirou dos seus apaixonados a confiança nas vitórias tranquilas contra adversários ruins. Sua raça acima da técnica como nas jornadas em que guardava sozinho Roberto Dinamite contra a orquestra flamenguista.

O carisma de Roberto Dinamite, buscando o gol sem qualquer temor, assumindo a escritura da grande área ou partido do meio-campo como o Quixote das conquistas impossíveis. Roberto Dinamite é o maior jogador da história do Vasco, embora meu ídolo seja, também, o genial meia Geovani.

Roberto Dinamite é um estoico, um resignado. Desde o golaço que valeu seu apelido de Dinamite em 1971(ele aos 17 anos), contra o Internacional no Maracanã.

Roberto Dinamite se entregou à massa e ela o assumiu como explosão das causas impossível. Roberto Dinamite assumiu o cetro de ídolo e fez a torcida cruzmaltina assumir uma razão de lotar o Maracanã.

Roberto Dinamite sofreu muito a vida inteira. Introspectivo, de timidez e conformismo indescritíveis, foi convocado para a seleção brasileira de 1978 porque o centroavante Nunes se machucou. Roberto Dinamite parecia um guerreiro sem lança na chuteira, esquecido e sem merecer o menor respeito do falecido técnico Cláudio Coutinho.

O Brasil, tudo bem, tinha um gênio chamado Reinaldo do Atlético(MG) que sucumbiu, não apresentou 5% do seu toque esplêndido. O Brasil seria eliminado se empatasse com a Áustria e o Almirante Heleno Nunes, presidente da Confederação de Futebol, no auge da Ditadura, agiu certo e mandou escalar Roberto de titular.

Um passe preciso do ponta-direita Gil encontrou Roberto Dinamite pronto para o tiro de sniper, bem colocado, ajeitando a bola e fulminando o goleiro Koncília. Roberto – ah, hipocrisia impossível -, passou a ser bajulado sem deixar de manter o semblante blasé e sábio. Os elogios eram oportunistas.

Roberto Dinamite jogou mal uma partida, apenas uma, contra a Tchecoslováquia no Morumbi em 1×1 nos preparativos para a Copa do Mundo e Telê Santana, brilhante e teimoso, simplesmente o ignorou.

Roberto Dinamite fez falta e teria classificado o Brasil contra a Itália em 1982 porque Serginho Chulapa não passava de um zagueiro disfarçado. Só pra lembrar, Zico e Roberto nunca perderam juntos pela seleção.

Então Roberto entregou-se ao Vasco como um libelo, silencioso, grito abafado pela multidão vascaína , liderando time espetacular com Romário, Geovani, Mazinho, Tita, Acácio, Mauricinho, uma máquina que botou no liquidificador o Flamengo de 1987.

Roberto voltou a sofrer. Em 1989, o Vasco o emprestou para a Portuguesa(SP) e ele seguiu, humilde e machucado, para o campeonato brasileiro.

Duvidaram dele e em 1990 até 1992, fez gols decisivos tabelando com o craque e sucessor Edmundo. Roberto, claro, sempre buscando a foça e a liberdade de quem respondia balançando a rede, aqueles que o menosprezavam.

Roberto Dinamite é tão bom que Zico vestiu camisa do Vasco em sua despedida. Roberto é tão bom que os vídeos dos seus gols são repetidos com emoção e o ineditismo das lágrimas que correm de saudade.

Roberto Dinamite está com câncer aos 68 anos e, a cada batalha que vence, rompendo a covardia da doença, ensina que o ser humano é resistência. Roberto Dinamite é perseverança e exemplo. Explodindo o gol da vida que vai prosseguir.

vasco da gama campeão brasileiro 1989

por Luis Filipe Chateaubriand

Vasco da Gama Campeão Brasileiro de 1989

O ano era 1989.

No Morumbi, São Paulo x Vasco da Gama jogavam pelo título de campeão brasileiro.

Havia três possibilidades:

·         Se o São Paulo vencesse o jogo, iria jogar no Maracanã, com a vantagem do empate.

·         Se o jogo ficasse empatado, haveria novo jogo no Maracanã, com o Vasco da Gama jogando pelo empate.

·         Se o Vasco da Gama vencesse o jogo, seria campeão, sem a necessidade de se jogar no Maracanã.

O São Paulo fez de tudo para vencer, ou ao menos empatar, o jogo.

Sucede que as investidas da dupla Raí – Bobô eram invariavelmente bloqueadas pelo goleiro vascaíno Acácio, em tarde inspirada.

O Vasco da Gama, por sua vez, fazia um jogo muito seguro, com o sistema defensivo sólido e um meio campo inventivo.

Eis que, no segundo tempo, Bismark “rouba” uma bola dos são paulinos, passa no meio campo para Marco Antônio Boiadeiro, que passa na direita para Luiz Carlos Wink, que faz um cruzamento “de cinema” para a área, a bola passa por Bebeto, mas não por Sorato, que desfere uma cabeçada fulminante para o gol.

Era o gol do título!

Vascaínos em festa comemoraram Brasil afora.

CARTA ABERTA A ROBERTO DINAMITE

por Luis Filipe Chateaubriand


Prezado Ídolo:

A primeira lembrança que tenho de futebol, remete a você.

O Brasil ganha da Áustria, na Copa do Mundo de 1978, com gol seu, e se classifica à segunda fase da Copa do Mundo da Argentina.

Depois, nós saímos para passear, ali mesmo na Ilha do Governador, e passamos em frente àquele prédio de fachada verde onde você morava e que, naqueles dias, ostentava uma grande bandeira do Brasil na janela.

Eu tinha sete anos e, mesmo sem saber ainda, já era vascaíno.

Depois, o tempo se encarregaria de provar que eu era, mesmo, vascaíno.

Vi gols de falta, de pênalti, de oportunismo, de voleio, de sem pulo, de tudo quanto é jeito.

O moço dinamite explodia de todas as formas possíveis.

Como não ser Vasco da Gama, ainda mais sendo português, como sou?

Tive o prazer de presenciar uma carreira linda, de um homem bom, exemplo de pai de família, cidadão acima de qualquer suspeita, gente de bem.

O que me estimulou a escrever um livro sobre você.

Sim, Dinamite, eu escrevi um livro sobre você!

Um livro de exaltação, porque você merece!

E te digo: eu vou lançar esse livro, com você ao meu lado, pleno de saúde e bem-estar!

Porque você vai vencer essa doença!

Você vai dinamitá-la.

E sabe por quê?

Porque você é um vencedor.

Muita fé, querido Bob.

Porque Papai do Céu vai dar aquela força, e eu ainda vou ter o prazer de te dar um abraço!

Do seu fã,

Luis Filipe Chateaubriand

UM COFRINHO, UM SORRISO E ROBERTO

por Paulo-Roberto Andel


Duas da tarde de um dia qualquer de 1982. Naquele tempo estudávamos em um horário esquisito, das três às sete da noite. Combinamos de nos encontrar antes. O motivo? Futebol, claro. A gente gostava demais. Era jogo na praia, no calçadão, na vila, jogo de botão e o maravilhoso Maracanã.

Perto da nossa escola, Dr. Cícero Penna, no coração de Copacabana, ficava a Caderneta de Poupança Letra, que já não existe, trocou de nome ou foi absorvida por outra instituição bancária. Pois bem, a Letra ia distribuir cofrinhos em forma de bola de futebol. E quem estaria no banco dando autógrafos era ninguém menos do que Roberto Dinamite, ídolo do Vasco, do Rio e do Brasil.

Rivalidade no futebol sempre existiu, mas naquele tempo era natural os garotos admirarem os craques, os jogadores marcantes, de garra, pouco importando se jogavam em seus times de coração. Como ficar indiferente ao futebol de Leandro, Edinho, Deley, Mendonça, Zico, Adílio? Impossível.

Roberto era unanimidade na minha turma, que tinha poucos vascaínos. O Cassiano e o Luiz, no máximo. Não lembro se o Geleia também era Vasco. O fato era que Roberto era um artilheiraço, cobrava faltas mortíferas, cabeceava e ai da defesa que o deixasse ajeitar para a direita e chutar na frente da área. Um tormento para os zagueiros.

Juntamos a turma e fomos para a porta da Letra. O banco estava tão cheio que um funcionário veio para a porta distribuir os cofrinhos. Havia outras turmas também, todas com os mesmos objetivos: pegar os cofres mas também ver o craque. E tome gente, gente, gente.

Alguns dos nossos se espremeram na vitrine de vidro para tentar ver Roberto, que estava dando autógrafos numa mesa dentro da agência lotada. E assim ficamos por um bom tempo. Entrar era impossível, o máximo ficava numa espiadinha com nossos olhos recém saídos da infância.

Em certo momento, Roberto se levantou e veio para fora do banco para cumprimentar a garotada. Explodimos de alegria: nós éramos a dinamite daquela tarde. Mal ele saiu da agência, abriu o sorriso indestrutível e logo o cercamos para abraçá-lo. Ele também era uma felicidade só. Puxa vida, um dos maiores jogadores do Brasil bem ao lado da nossa escola. Ficamos muito contentes.

Não durou muito tempo, porque Roberto precisava voltar para o banco, mas foi suficiente para ser inesquecível. Pense em garotos felizes ao ver um de seus heróis sorridente, bem de perto? Foi assim.

Não juntei moedas. Muitos dos cofrinhos serviram para peladas no calçadão da Avenida Atlântica. O meu, não: levei para casa de recordação. O tempo e as mudanças me fizeram perdê-lo para sempre, mas o mais importante de tudo ficou comigo desde então: a lembrança de ter visto de perto um dos maiores jogadores de meu tempo, com aquele sorriso desfraldado e gigantesco como seu futebol, um ídolo de todos os garotos daquele tempo.

Acabamos de saber que Roberto terá uma batalha pela frente, provavelmente a mais desafiadora de toda a sua vida. Eu volto no tempo, na melhor das minhas épocas, e resgato um jovem artilheiro feliz, cercado por crianças e com um sorriso que batalha nenhuma há de derrotar. Um abraço em Copacabana fica para sempre. Logo, logo, o camisa 10 sairá comemorando como fazia em seus gols imortais, feito aqueles cinco sobre o Corinthians em 1980. E nós, que torcíamos lá, continuaremos a torcer por aqui.