por Eduardo Lamas Neiva
Santos e Botafogo foram mesmo os principais times do Brasil nos anos 60. Portanto, o papo no bar “Além da Imaginação” acabou retornando ao clube paulista, que obteve conquistas mais expressivas que o carioca.
Idiota da Objetividade: – A confirmação de que o Santos era o melhor time do mundo no início dos anos 60 veio em 1963, com a conquista do bicampeonato mundial. Almir Pernambuquinho foi um dos grandes nomes daquela final, como já dissemos.
Garçom: – O Santos enfrentou qual time mesmo na final?
João Sem Medo: – O Milan, que tinha um grande time. Os brasileiros Mazzola, que na Itália era conhecido como Altafini, e Amarildo, que havia substituído Pelé no Mundial do Chile, jogavam naquela equipe, que ainda tinha Rivera, Trappatoni e o Cesare Maldini, pai do Paolo Maldini, que disputou as Copas de 90 a 2002.
Garçom: – Lembro do Maldini filho, muito bom jogador. Foi vice pra gente, em 94.
João Sem Medo: – O pai dele também foi um grande jogador. Mas o Santos, mesmo sem Pelé, conseguiu superar o timaço do Milan.
Sem anunciar nada, Zé Ary põe no telão a versão de Zeca Baleiro pro hino mais popular do Santos, chamado de “O Leão do Mar” e que foi composto por Mangeri Neto e Mangeri Sobrinho.
O povo do bar assiste com atenção e quando o clipe acaba, João Sem Medo passa a bola pra Ceguinho Torcedor.
João Sem Medo: – O Santos conquistou aquele título de 63 no pau e na bola.
Ceguinho Torcedor: – O Santos era uma equipe assassinada pela desumanidade de seus dirigentes. Nenhuma equipe terrena pode jogar tanto sem morrer. E contra o Milan, o glorioso time santista ruía aos pedaços, estrebuchava, agonizava.
João Sem Medo: – Os times brasileiros eram obrigados a excursões extenuantes, com jogos de dois em dois dias, mais as viagens. Além do Pelé, o Santos jogou as finais de 63 no Maracanã sem o Zito e o Calvet.
Ceguinho Torcedor: – Nunca houve cansaço tamanho. E apesar disso ganhou do Milan na mais linda reação que se conhece. Ganhou duas vezes. No primeiro jogo, o Santos saiu pro intervalo perdendo por 2 a 0. Mas cai uma tempestade de 5º ato do Rigoletto no Rio de Janeiro e mudou tudo.
Como que por encanto, ouve-se um estrondo, um trovão com relâmpagos, e toda plateia fica arrepiada. Sobrenatural de Almeida dá sua gargalhada tenebrosa, cantarola um trechinho da ópera de Giuseppe Verdi (https://www.youtube.com/watch?v=fYDI6MWkCW8) e todos entendem que ele tinha atuado como sonoplasta da narração do Ceguinho Torcedor, que prossegue.
Ceguinho Torcedor: – O Santos virou e levou a decisão para a terceira partida. Houve quem dissesse que Almir era um delinquente irrecuperável e paranoico. Mas se Almir chutou o Amarildo no terceiro jogo, o que fez Didi, o Príncipe Etíope de Rancho, que quebrou o Mendonça? Ninguém o chamou de delinquente e paranoico. Nem o próprio Amarildo, que quebrou o Jair Marinho, num Fluminense e Botafogo.
Didi, em sua mesa, ao lado de d. Guiomar, nada fala, apenas acompanha a resenha com atenção. Numa mesa próxima, Almir Pernambuquinho apenas sorri quando João Sem Medo começa a relatar o que viu naqueles jogos finais.
João Sem Medo: – A pancadaria comeu solta no Maracanã. Almir deu um chute em Amarildo logo no início do primeiro jogo no Maracanã. Almir, que aqui está e não me deixará mentir, confessou que jogou dopado e que foi pra vingar Pelé, por quem tinha grande respeito. Amarildo teria dito em entrevista que Pelé não era mais o Rei. E Pelé não pôde ir a campo em nenhum dos dois jogos. Almir foi em seu lugar e na partida que decidiu o título sofreu o pênalti de Maldini, que quis brigar e foi expulso. Dalmo pegou a bola que seria do Pepe e converteu o pênalti pra dar o título ao Santos. Até o Lula, técnico do Santos, agrediu com um soco o Carniglia, treinador do Milan. O Trapattoni caçou o Almir em campo, mas ficou até o fim do jogo. Ismael deu uma cabeçada em Amarildo e também foi expulso.
Sobrenatural de Almeida: – Assombroso! Eu fiz plantão naqueles dois jogos e irritei muito os jogadores do time italiano. (dá outra gargalhada tenebrosa e volta a cantarolar um trecho do Rigoletto)
Idiota da Objetividade: – O Santos chegou à final do Mundial de 63 depois de conquistar a Libertadores daquele ano. Eliminou o Botafogo na semifinal, com um empate em 1 a 1, no Pacaembu, e goleada de 4 a 0, no Maracanã. Na final contra o Boca Juniors, da Argentina, venceu por 3 a 2 no Maracanã, e 2 a 1, em La Bombonera.
João Sem Medo: – O Santos ganhou do Boca lá dentro, de virada, com gols de Coutinho e Pelé.
Idiota da Objetividade: – Pelé só jogou o primeiro jogo das finais do Mundial, em Milão, na derrota de 4 a 2. Ele fez os dois gols do Santos, de pênalti. Amarildo fez dois pro Milan. No Maracanã, diante de 132 mil pagantes, o Santos perdia por 2 a 0 no primeiro tempo, mas virou na segunda etapa para 4 a 2, com dois gols de Pepe, ambos de falta, um de Almir e outro de Lima. Foi necessário então um terceiro jogo, disputado dois dias depois, em 16 de novembro de 1963. Mais de 120 mil pessoas pagaram ingresso para ver quem seria o campeão. E numa partida marcada pela violência, como João já nos relatou, o Santos ganhou de 1 a 0, gol de pênalti marcado por Dalmo, aos 35 minutos de jogo.
Almir Pernambuquinho, enfim, pede a palavra de sua mesa.
Almir: – Entrei com tudo naquela partida, pra matar ou morrer. Eu só pensava no bicho, que dava pra comprar um Fusca do ano. Fui incentivado por um dirigente chamado Nicolau Moran. Ele me disse: “Você pode fazer o que quiser em campo, Almir. Você é rei lá dentro, faz o que achar melhor. O juiz não vai fazer nada”.
Sobrenatural de Almeida: – Assombroso, Almir. Assombroso.
O público ri e Zé Ary pede a palavra.
Garçom: – Como falamos muito do grande Santos bicampeão mundial, vamos fazer uma grande homenagem aqui com mais duas versões no telão do hino do clube: “Leão do Mar”, com Paulo Miklos, e o hino oficial com a Rygel, banda santista de heavy metal. Aguentem os ouvidos aí!
Músico: – Aumenta que isso aí é roquenrol!
Fim do capítulo 40
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