Escolha uma Página

O RETORNO

por Claudio Lovato


Os dois times entram em campo e são recebidos por um imenso silêncio – um silêncio de cimento e plástico.

O menino com o pai nas cadeiras perto do campo não tira fotos com seu celular nem o pai olha para ele, sorrindo, compreensivo, sensibilizado, porque nenhum dos dois está ali.  

Os amigos que há mais de trinta anos vão juntos aos jogos, sempre gozando da cara uns dos outros, sempre relembrando aventuras e elogiando os “nossos tempos”, também não estão ali.

As torcidas organizadas não entoam seus cantos nem fazem tremular suas bandeiras nem agitam suas faixas e seus trapos porque igualmente não estão ali.

Em suas casas, os torcedores assistem ao jogo na TV, pelo pay-per-view, no celular, no tablet, no desk top, e alguns se socorrem no rádio e nas transmissões minuto-a-minuto. Não são permitidas aglomerações no entorno do estádio.

O primeiro gol é do time da casa, um gol bonito, diga-se; um voleio da entrada da grande área, mas os jogadores não comemoram. Não como antes. Agora apenas dão sorrisos tímidos, fazem sinal de positivo com o polegar, batem palmas e então voltam para seu lado do campo.

No intervalo, na saída dos jogadores para o vestiário, é possível perceber o semblante de cansaço e tensão de alguns deles. Não conversam entre si, sequer se olham.    

Mais adiante, por longos instantes, por ordem ou por distração do diretor de TV, vão ao ar apenas imagens de cadeiras vazias, setores inteiros vazios, o estádio vazio.

Nas entrevistas do intervalo, feita por meio de um aplicativo de reuniões virtuais, um ex-jogador com duas Copas do Mundo no currículo diz que “os donos do poder estão aproveitando a situação para aprofundar o processo de transformação do esporte mais popular do planeta num espetáculo unicamente televisivo” e que “futebol é povo no estádio, aliás, como antes mesmo da pandemia já não estava se vendo mais” e que “o futebol, assim como todo esporte, é celebração da vida e da saúde e que deveria haver mais preocupação com os jogadores, os integrantes das comissões técnicas e os funcionários dos clubes e suas famílias”. Um ex-técnico que participa do programa pondera que o futebol tinha que voltar mesmo, “porque se demorasse mais os clubes poderiam quebrar, alguns não conseguiriam se reerguer”, e outro ex-jogador argumenta que “o que mais importa agora é que os protocolos sejam seguidos com todo o rigor” e o jornalista que conduz a entrevista encerra a conversa dizendo “bom, é assim que estamos por ora, é assim que será por enquanto, isso vai passar, gente, daqui a pouco vamos ter estádios lotados de novo, vamos botar fé”, e, depois de um break comercial, voltam à tela imagens do estádio.

O segundo tempo é lento e burocrático, fato atribuído à forma física dos jogadores, que ainda precisa melhorar de forma considerável. O jogo termina um a zero e, sem entrevistas de beira de campo, a TV logo passa a exibir os melhores momentos da partida. Em seguida, a transmissão vai para o estúdio, onde os comentaristas tentam explicar aos telespectadores o novo momento que está se vivendo. Fazem um nítido esforço para justificar a decisão de retomar o futebol neste exato instante. Há quem concorde e há quem discorde em medida praticamente igual, conforme mostram os números da participação dos internautas na enquete que acaba de ser feita no ar. Então partem para a análise do jogo, com entradas ao vivo feitas por repórteres usando máscaras e a repetição dos lances do jogo até o início da madrugada.

   

EU, LAZARONI, A POCHETE E OS PASTORES ALEMÃES

por Nielsen Elias

1º CAPITULO


Há 31 anos, exatamente no final dos anos 80, após a classificação do Brasil para a Copa de 90.

O técnico Sebastião Lazaroni da seleção brasileira, e eu, fomos para Europa, em especial ao leste europeu, acompanhar alguns jogos das eliminatórias europeias para a Copa do Mundo na Itália.

No roteiro, estavam os países, Bélgica, Hungria, Tchecoslováquia, Bulgária e Alemanha Oriental. E nesse período, estava começando uma grande mudança politica nos países do leste europeu.

A primeira parada foi em Bruxelas, na Bélgica, após uma conexão em Paris… Malas nas mãos, partimos para o hotel com as reservas previamente feitas. Ao dirigirmos à recepção com as reservas devidas, nossa grande surpresa, quando o gerente com sua frieza europeia nos disse:

– No booking!!! I feel so much… – mesmo assim, o Laza tentou argumentar que ela estaria confirmada. Então, o gerente pediu que esperássemos no hall do hotel, pois iria tentar resolver aquela situação; e sempre afirmando que tinha um grande evento na cidade e todos os hotéis estariam lotados!

Já era noite, e nós sentados nas poltronas, que ficavam no hall, e muito cansados pela viagem, estávamos “loucos” por um banho e afrouxar o nó da gravata…e essa altura, nossas malas já serviam como descansos para as nossas pernas. E, finalmente, após uma longa espera, chega o gerente com uma solução, isso já quase meia noite, e diz:

– Como está muito tarde vocês irão dormir aqui, mas nas primeiras horas da manhã terão que deixar o quarto, pois um hóspede estará entrando amanhã bem cedo. E enquanto isso, vou tentando um lugar para vocês ficarem amanhã…

No dia seguinte, apesar de não termos um sono confortante, fomos despertados pelo telefone com o gerente dizendo que teríamos que deixar o quarto, pois haveria necessidade de ser limpo. Tomamos nosso banho e descemos rapidamente. Na recepção, lá estava o gerente com os nossos passaportes em uma mão e a conta na outra, e dizendo que havia conseguido um hotel não muito bom, mas naquele momento era o máximo que poderia fazer por nós… Bem, outros contra tempos ocorreram. Na hora de fazer o pagamento, por aquela noite mal dormida, Laza sacou duas notas de U$100 e colocou no balcão, para logo em seguida ser recusada pelo gerente:

– Desculpe senhor mas no momento não aceitamos essas notas de 100.

Laza perguntou já perdendo a paciência.

– Por quê!?

O gerente prontamente respondeu:

– Houve um derramamento de notas falsas e por essa razão estamos no momento proibidos de receber…

Era só que nos faltava, pensamos, olhando um para outro, e o gerente querendo ajudar, nos disse que só no banco poderíamos trocar! O Laza perguntou onde tinha um banco mais perto e o gerente explicou:

– No outro lado da rua, mas infelizmente hoje é sábado e todos os bancos estão fechados.

Sem mais o que fazer, Lazaroni com um sorriso irônico, que mais parecia que estava “puto”, tirou seu cartão pessoal e pagou a diária.

Então rumamos para o outro hotel indicado pelo gerente, que além ter um pequeno quarto que mal cabia nós dois e ainda por cima sem banheiro privativo, ficava numa espécie de serra bem longe do centro, putsgrila! Mas mesmo com essas situações nada agradáveis, podemos acompanhar o jogo da seleção Belga no Estádio de Heisel, que depois ficou marcado por grande tragédia entre torcidas e após 1995 passou a ser chamado Rei Balduíno. O jogo foi bem disputado e o tratamento no estádio foi VIP, com direito champanhe, vinhos, cervejas e todos os tipos de comida.

Bruxelas é uma cidade única, com suas ruas subterrâneas e sua linda arquitetura, além de ter um escargot delicioso, que eu fiz o Laza provar, como o prato de entrada do nosso jantar:

– Pô são caramujos, Ni!? – para em seguida cairmos na gargalhada… além de uma cidade muito interessante, possui também mulheres lindas…

Assim foi a nossa passagem pelo primeiro país. No próximo capitulo, eu conto mais… especialmente, a nossa chegada na fronteira com Alemanha Oriental. Foi surreal!!! Me senti na Segunda Guerra mundial, com os enormes soldados alemães e seus ferozes pastores, em frente a nossa cabine do trem…

Até..,

BLOG DO LEDIO

por Ledio Carmona


O respiradouro do Vasco é o coração do vascaíno.

O craque do clube nessa década não calça chuteiras, nem entra em campo. A torcida é a camisa 10.

Vou repetir e escrever pela enésima vez. O craque do Vasco nessa década não calça chuteiras, nem entra em campo. A torcida é a camisa 10.

São os vascaínos que arregaçam as mangas, botam o clube no colo e tentam levá-lo à frente. É o cruzmaltino que derrama amor e altruísmo pela sua bandeira. Foi ele que ajudou a erguer o monumento batizado de São Januário, tijolo a tijolo, centavo por centavo, suor em cima de suor. Paixão avassaladora e sem limite. Diante de tantos problemas, descaso, desmando e politicagem barata, o Vasco-2020 não seria nada sem a sua gente. O respiradouro do Vasco é o coração do vascaíno.

A imprensa, como quase sempre, não deu muita atenção, porém o torcedor vascaíno fez sua parte mais uma vez essa semana. A TV retransmitiu ontem a final da Taça Libertadores de 1998. O Vasco tinha um timaço e levantou a taça em Guayaquil. 22 anos e uma pandemia depois, a TV Globo anuncia a retransmissão e alguém tem a ideia de vender ingressos simbólicos.

Com a grana arrecadada, a ordem é ajudar no pagamento (eternamente) atrasados de salários dos funcionários. Mais de 13 mil ingressos foram comprados. E muitas famílias terão algum dinheiro graças a esse movimento.

Esse mesmo torcedor ajudou (e segue ajudando) na arrecadação de recursos para a construção do CT do clubes. E fez história ao transformar o Vasco no clube com o maior número de sócios-torcedores no Brasil.

Repito: hoje, sem dinheiro, com time fraco e totalmente à deriva, o Vasco estaria muito pior sem o amor do seu torcedor. Cada um desses apaixonados merecia uma placa de agradecimento na Colina Histórica. Mais trabalho, mais ideias e menos politicagem já seriam uma boa retomada. Não custa sonhar. Sai de graça e, se custar alguma coisa, o cruzmaltino banca com sua esperança.

Texto publicado originalmente em: https://globoesporte.globo.com/blogs/blog-do-ledio/post/2020/05/24/o-respiradouro-do-vasco-e-o-coracao-do-vascaino.ghtml

E-SPORTS

por Wendell Pivetta


O sonho de vestir o manto da canarinho se tornou real.

Em tempos de distanciamento social, complicações para se exercitar, e se comunicar com o mundo lá fora, o E-Sports tem se tornado cada vez mais uma salvação psicológica.

Especialistas em Psicologia Esportiva para Esportes Eletrônicos ressaltam o papel dos games no confinamento por conta da pandemia de coronavírus. Os estudiosos alegam que o videogame cria laços de amizades entre as pessoas, auxiliando contra fatores muito críticos dessa pandemia, como a solidão e os índices de depressão.

Para entendermos mais sobre este artifício presente nos tempos modernos, conversei com o atleta virtual Maykon Kjellin. Catarinense, comemora sua recente convocação para jogar na seleção brasileira, na lateral esquerda. E ele começa contando sobre sua inclusão neste mundo:

– Sempre fui um amante de jogos eletrônicos, desde o atari, passando por Megadrive, super Nintendo, PS1, PS2, PS3 até que cheguei no Xbox 360 e hoje estou na nova geração das plataformas que é o Xbox One Primeiramente comecei na modalidade X1, que é um contra um online controlando o time todo, mas quando descobri o Pro clubs em fevereiro de 2019, foi paixão na hora. Cada jogador controla seu único jogador dentro de campo, após falhar sendo um meia armador e meia esquerda (risos), achei meu lugar como lateral esquerdo, sendo inclusive agora convocado para a seleção.

Seu futebol com a bola no pé nunca foi o mais glorioso, agora se tratando dos consoles, o cara arrebenta. Celebra inclusive um ponto especial em sua carreira virtual:

– Ser convocado pra seleção foi algo que tirou fortes emoções. Fortes emoções porque eu troquei de clube, no e-sports recentemente, saí do Gorillas e fui pro Varzelona, time que me revelou. Inclusive foi o primeiro time competitivo da modalidade no ano em que comecei, e eu não esperava porque a primeira vez que eu fui convocado foi para amistosos contra o Chile. Ganhamos duas partidas e antes de sair a convocação, fomos avisados, dias antes, e agora com a Super Copa das Américas não teve esse aviso prévio. Então eu tava lá, assistindo a live do manager e saiu a lista do goleiro, saiu zagueiro, e chegou nos laterais. E no primeiro anunciado fui eu. Cara, eu não acreditava, recebia áudios de amigos meus do e-sports, e foi um sentimento bem complexo porque era algo que eu não esperava, fiquei feliz de ter acontecido, vou jogar com grandes amigos meus, que jogaram comigo na antiga equipe, vou jogar com caras que nunca tive a oportunidade de jogar e eu admiro pra caramba. Então tem uma semelhança sim com o futebol real porque a gente treina pra caramba, estuda tática, estuda jogada ensaiada, se dedica em dias da semana treinando…. Então, a gente chegar a uma seleção no meio de tanto jogador bom que tem na individualidade é surreal. Tem essa semelhança com o futebol real porque o pessoal, dependendo do assunto, eles não são comunicados, né, igual Copa do Mundo, eles sabem pela TV. Vão ali acompanhar a coletiva do técnico e o cara não acredita que o nome do cara tá ali.

O cara é fã do bom Rock N’ Roll, amante da música pesada, e assim como David Bowie, é um camaleão esportista quanto ao seu lado torcedor:

– Hooo se lembro, eu lembro vagamente assim que eu era muito novo, mas meu pai era colorado e meu avô é flamenguista. Eu nasci em 1991 e na Libertadores de 1996 que o Grêmio tava moendo. O meu pai e o meu avô estavam aqui em casa assistindo, e dizem eles que o Grêmio tava moendo, vencendo, e na nossa casa sempre tivemos uma filosofia de torcer para os brasileiros, independente de rivalidade futebolística, e começaram a torcer pelo Grêmio, gritaram quando teve gol e meu pai disse que eu comecei a gritar ali junto. Aí deu mais alguns meses e ganhei a camiseta do tricolor gaúcho pelo meu tio e aía paixão começou, só que o amor não ficou só no Imortal. Quando conheci o Real Madrid na época dos galáticos, entre 2000 e 2004, foi amor à primeira vista. Sou madrilenho, gosto do Real pra caramba, futebol inglês gosto muito do Liverpool de 2004, são os times que eu mais acompanho. De vez em quando estou aqui na minha namorada e começamos a assistir um Botafogo x Madureira, adoro futebol. Adoro futebol de várzea, principalmente o amador, futebol pra mim é tudo. Teve um tempo em que eu jogava bola, disputava campeonato, então é um dos hobbies que mais gosto é o futebol. E durante a pandemia a coisa que mais me faz falta é assistir um futebolzinho, tranquilo, tomando aquela cerveja gelada, churrasquinho. Sem dizer que era um dos momentos que eu via a minha família se reunir, era pra ver jogo de futebol da seleção, finais de times, então é algo bem característico que está na minha vida.

E os objetivos de um jogador virtual? Até que ponto elas se tornam semelhantes da vida real? Maykon nos conta apresentando seus sonhos na carreira:

– Então, a gente tem diversas federações aqui, e o objetivo é chegar nos times de elite. Tem os times de série A, B, C e D da principal federação que se chama CPN, e tem a ICL Game, sendo duas federações fortes. E atualmente estou trabalhando para subir a um time de elite. Daí é time que trabalha com remuneração, tem patrocínio, disputa os principais campeonatos, inclusive com campeonatos presenciais sendo desenvolvidos em São Paulo e no Rio de Janeiro. Atualmente estou em um time muito bom, e essa meta é mais a longo prazo mesmo. A meta é essa, evoluir e futuramente ver o e-sports, jogo eletrônico, mais valorizado. Já temos por exemplo o League Of Legends que é um jogo bem valorizado, com vários patrocinadores, vários campeonatos bem remunerados, muitos times também, dando para sobreviver do jogo. O bacana disso é que a gente já tá vendo clubes investindo nessa área. Já temos o time do Flamengo no LoL, times do Fluminense no Pró-Clubs mesmo, no próprio 1 contra 1 do FIFA, controlando o time todo, temos brasileiros representando o Sporting de Portugal, que é o Wendel Lira, ele que era jogador profissional, ganhou o Puskas, e hoje é jogador profissional de FIFA do PS4. Ronaldinho Gaúcho é um cara que investe no E-Sports, tendo vários jogadores que ele patrocina. Então já estou vendo que jogos eletrônicos são o futuro para quem nunca conseguiu ser jogador profissional por exemplo, quem queria ser piloto e nunca conseguiu tem o Fórmula-1 online que também já está crescendo um monte, assim como tem jogos de luta. A gente só tem que ter mais profissionalismo dentro do E-Sports e objetivos.


Jogar é divertido, monta amizades, mas um bom sonhador também tem aquela meta de viver do video-game, e aqui tem um bom método para iniciar a meta:

– Com certeza. Uma das melhores maneiras de ser remunerado no E-Sports hoje em dia é sendo Streamer. O Streamer além de conseguir patrocínio, o público que acompanha os vídeos, a rotina de gamer, podem também contribuir virando sócio pra ter mais vídeos. Eu sou muito de acompanhar streamers. Mas não me prendo só no FIFA, também gosto de assistir Euro Truck, League Of Legends por mais que eu não jogue, mas gosto de ver. É tipo eu que sou músico do rock/metal também gosto de assistir algumas coisas do sertanejo para tentar agregar na minha experiência que eu possa fazer. Ver outros jogos e tentar trazer ao meu jogo itens como a organização, a estrutura. Então acho que uma das melhores maneiras em ser remunerado pra isso é ser Streamer ou YouTuber. Acredito que futuramente terei estrutura para produzir vídeos também.

E assim encerramos nossa conversa, com o atleta que respira futebol. Antes mesmo desta pandemia. o amigo Maykon já atuava no E-Sports. Instrumentista, toca sua bateria na banda Dark New Farm e é redator chefe do Blog O Subsolo, sincronizando música e futebol, algo que torcida e time combinam tão bem.

A MÁQUINA TRICOLOR, SEPP MAYER E A ESTREIA DE PC CAJU

por Valdir Appel


Eu e meu pai, subimos a rampa do Mário Filho e assumimos uma posição privilegiada nas arquibancadas, pertinho daquela linha imaginária que costuma dividir as torcidas rivais nos dias de clássico. Linha desnecessária porque era noite de uma torcida única, exceção para meu pai e eu, dois torcedores sem bandeira, ávidos por um grande jogo de futebol.

No gramado, os times saúdam os torcedores e os craques se cumprimentam antes do pontapé inicial do amistoso internacional promovido pelo Fluminense contra o Bayern de München, base da seleção alemã, Campeã do Mundo em 1974.

É a estreia de Paulo César Caju na “máquina”, repatriado junto ao Olimpique de Marselha. É o “pó de arroz” se preparando para o bicampeonato após a conquista da Taça Guanabara.

O espetáculo atrai um público soberbo, muito acima do previsto, e a administração do estádio acaba liberando a entrada de milhares de pessoas sem ingresso.

Bola rolando.

Desde o começo o Fluminense é só pressão. Tem o domínio da meia-cancha, é agressivo, brilhante. Entusiasma até quem não torce por ele.

Apenas um “chucrute” não quer ser coadjuvante do show de bola aplicado pelos bailarinos do presidente Francisco Horta, é o goleiro alemão Sepp Mayer, destaque do Die Bayern, como é conhecido o timaço europeu.

Rivelino dá um elástico na entrada da área e toca a bola para Cléber que invade a área. Mayer sái fechando o ângulo. Cléber desloca o goleiro com um toque sutil, mas sem endereço e a bola caprichosamente encontra as canelas de Gerd Müller – centroavante do Bayern que voltara para marcar no escanteio – indo para o fundo da rede.


Gol contra do artilheiro da Copa de 74.

E é só o comecinho da partida.

Um time dá espetáculo, o outro se defende. Aliás, Mayer defende. A facilidade com que detém os disparos, sempre bem colocado, é de arrepiar.

Meu pai, que no passado também fora goleiro, vibra muito, aplaude e não contém o comentário ácido:

– Isto sim é que é goleiro, não estes merdas que a gente vê por aí!

Sorri concordando, com uma pontinha de inveja. Ele nem se lembrou que o filho também era goleiro.

Segundo tempo, réplica do primeiro. O show de Mayer continua. Defesas incríveis, seguras. Feitas com tanta simplicidade que irrita os atacantes do Fluminense e delicia quem vê.

Cafuringa, que nunca fez gol em ninguém, invade a área na vertical, ameaça o chute uma, duas vezes, cortando sempre para a direita. Quando vai fazer o disparo final, Mayer se projeta aos seus pés, dá um tapa com a mão espalmada e arremessa a bola pela linha de fundo.

O alemão ergue-se rápido e desafia:

– Mann, hier nicht!

Os astros Beckenbauer, o Kaiser Rumenigge, Kapelman assistem impotentes à exibição de bola de Rivelino, Marco Antonio, Mário Sérgio. O magro marcador construído na etapa inicial é pequeno e não espelha a superioridade do futebol jogado pelos astros das Laranjeiras.

O espetáculo termina. O público aplaude de pé, inclusive Herbert e eu.

A vida inteira e até o fim dela, meu pai não perdeu uma única oportunidade de descrever para os amigos as defesas daquele que para ele foi o maior goleiro do mundo.

(Amistoso internacional. Dia 10 de junho de 1975 para um público pagante de 60.137 torcedores. Fluminense 1 x 0 Bayern München Local: Maracanã. Árbitro: Arnaldo César Coelho. Renda de Cr$ 1.162187,50. Gol: Müller contra, aos 7 do 1º tempo.

Fluminense: Félix, Toninho, Silveira, Assis, Marco Antonio, Zé Mário, Cléber, Cafuringa, Paulo César (Manfrini), Rivelino e Mário Sérgio.

Bayern: Maier, Durnberger,Schwarzenbeck, Beckenbauer, Weiss, Roth, Tortensson, Rumenigge, Zobel, Müller e Kapell .                                                                                    

(Glossário pra quem não sabe nada de futebol: Mário Filho = Maracanã; máquina, pó de arroz, tricolor das Laranjeiras = Fluminense; Die Bayern = Os Bárbaros; chucrute = alemão; Mann, hier nicht! = Cara, aqui não!; Kaiser = Imperador)de arroz, tricolor das Laranjeiras = Fluminense; Die Bayern = Os Bárbaros; chucrute = alemão; Mann, hier nicht! = Cara, aqui não!; Kaiser = Imperador)