UMA VITÓRIA SURPREENDENTE E DESABAFO DE ZAGALLO
por Wilson da Silva
Noite de domingo, 29 de junho de 1997. Brasil e Bolívia entraram em campo para decidir o título da Copa América. De um lado, os bolivianos, anfitriões, buscando o primeiro troféu da competição. A torcida compareceu em peso. Em contrapartida, a nossa seleção, comandada por Zagallo na área técnica, com duas missões: a primeira, quebrar o tabu de oito anos sem conquistar o torneio, vencendo a partida fora de casa, e a segunda, encarar o desafio de jogar numa altitude superior a 3 mil metros. Não saía da minha cabeça aquela derrota que tivemos quatro anos antes (2×0) pelas eliminatórias da Copa de 1994. Mas em meu pensamento ficava: esse tabu vai ter que cair e será nessa decisão.
Em princípio, a inquietude no sofá da sala a cada lance de ataque dos bolivianos era um “Deus nos acuda”, pois com o ar rarefeito, a bola ganhava velocidade e os brasileiros “segurando a onda”, indo para o setor ofensivo em situações favoráveis.
Quando Roberto Carlos bateu a falta, o goleirão deu o rebote e sobrou para Denílson balançar a rede, vibrei demais no lance do primeiro gol brasileiro.
Mas a vibração deu lugar à frustração e preocupação quando Erwin Sanchez empatou o jogo. Um chute de longe e Taffarel não completou a defesa.
Na etapa complementar, mais sufoco por parte da Bolívia, um bombardeio atrás do outro, com direito a bola na trave, pois era a oportunidade que eles tinham de tentar a virada. Para completar o desespero, Edmundo aprontava uma das suas, dando um soco no jogador adversário. Percebendo que a coisa ia ficar complicada, Zagallo agiu rápido, fazendo as substituições necessárias, sendo uma delas a entrada do Zé Roberto, dando mais “oxigênio” ao meio de campo. Este deu um passe sensacional para Ronaldo Fenômeno, que bateu cruzado, sem chances ao goleiro Trucco. Gol!! Vibrei demais novamente. Tudo isso num momento difícil da partida.
E para “matar” qualquer chance aos donos da casa, Denílson deu um passe milimétrico para Zé Roberto que bateu com categoria, por cima. 3 x 1. Me exaltei demais no sofá de casa com os familiares, daí disse: acabou, caiu o tabu, é campeão!!!
A entrevista (ou desabafo) de Zagallo foi um tanto quanto marcante. Explicando as dificuldades que a Seleção teve na decisão, dizendo que os atletas jogaram com raça e coração. Cansado das críticas que recebia disse palavras fortes:
– Não preciso provar mais nada. Vocês vão ter que me engolir!
E este homem merece respeito pelo que fez no futebol brasileiro e mundial.
O DRAMA DOS HERÓIS QUE PREFERIRAM MORRER A PERDER
por André Luiz Pereira Nunes
A história do futebol é recheada de dramas, alegrias, comoções e superações. Porém, nenhum feito é comparável ao que foi protagonizado pelos atletas do Dínamo de Kiev, nos anos 40. Seus atletas jogaram uma partida cientes que se ganhassem, seriam assassinados. E ainda assim decidiram vencê-la, em uma rara e verdadeira lição de coragem e esportividade que não encontra similaridade no mundo. Para a compreensão dessa árdua decisão, faz-se necessário retroagir no tempo para entender como um simples encontro representou um momento crucial e derradeiro de todo um elenco esportivo.
Em 19 de setembro de 1941, a cidade de Kiev, atualmente a capital da Ucrânia, foi invadida e ocupada pelo exército nazista. Diante desse inferno, nos meses seguintes, centenas de prisioneiros de guerra não tinham permissão para trabalhar, tampouco para viver em casas, de modo que vagavam pelas ruas na mais completa indigência. Um deles era Nikolai Trusevich, goleiro do Dínamo de Kiev, uma das agremiações mais importantes e prestigiosas da então União Soviética. Josef Kordik, um padeiro alemão, a quem os nazistas não perseguiam exatamente por ser germânico, era torcedor fanático do clube. Pois, em um belo dia, caminhava ele tranquilo pela rua, quando ao olhar para um mendigo, estupefato, se deu conta que se tratava de seu ídolo, o gigante guarda-metas Trusevich.
Ainda que viesse a agir de forma ilegal, o comerciante teutônico resolveu desafiar as regras, enganando os nazistas, ao contratar o goleiro para trabalhar na sua padaria. Para Trusevich era a chance de poder se alimentar e dormir debaixo de um teto seguro. Para o seu empregador era a oportunidade de ajudar a estrela de seu time. Durante as atividades laborativas as conversas entre ambos giravam sempre em torno de futebol até que o padeiro teve uma excelente ideia. Propôs a Trusevich que ao invés de amassar pães, se dedicasse a procurar o restante de seus colegas de elenco. Não só continuaria remunerado, como ainda poderia salvar os outros jogadores.
O goleiro então diuturnamente passaria a percorrer o que restara da cidade devastada e, entre inúmeros mendigos, paulatinamente achou os atletas do clube. Kordik forneceu trabalho a todos, se esmerando ao máximo para que as autoridades não descobrissem a sua artimanha. O arqueiro ainda encontrou alguns atletas rivais do campeonato russo, entre os quais, três jogadores do Lokomotiv, vindo também a resgatá-los. Em pouco tempo, a padaria havia virado um verdadeiro campo de refugiados contendo uma equipe de futebol completa.
Ao se verem sob a proteção do padeiro alemão, os jogadores foram logo estimulados a voltar a jogar. A maioria havia perdido as suas famílias diante do exército de Hitler e o futebol era a última chama acesa que poderia acalentar os seus combalidos corações. Como o Dínamo estava proibido de realizar atividades, resolveu-se dar outro nome para aquela agremiação, a qual passou a se chamar FC Start. Não tardaria para que fossem feitos desafios contra equipes de soldados inimigos e seleções formadas pelo Terceiro Reich.
A 7 de junho de 1942 ocorreu a primeira peleja. Ainda que cansados e famintos por terem trabalhado durante toda a noite, os refugiados venceram por 7 a 2. O adversário seguinte seria um time de uma guarnição húngara, também goleado pelo escore elástico de 6 a 2. Uma equipe romena também veio a sofrer uma derrota acachapante de 11 a 0. A situação ficaria ainda mais séria quando, a 17 de julho, defrontaram um time composto pelo exército alemão, vindo a golear por 6 a 2. Os nazistas então começaram a ficar bastante aborrecidos e impacientes devido à crescente fama de um grupo de empregados de uma padaria e se mobilizaram na tentativa de encontrar um time que pudesse derrotá-los, afinal o orgulho alemão estava mortalmente ferido. Trouxeram da Hungria o forte MSG, mas o FC Start triunfaria por 5 a 1 e ainda ganharia uma revanche por 3 a 2. Em 6 de agosto, cientes de sua superioridade, os alemães resolveram preparar uma equipe contendo membros da Luftware, o Flakelf, um grande time, utilizado como instrumento de propaganda de Hitler. Tratava-se de uma tentativa de buscar o melhor rival possível para que cessasse a incômoda e crescente popularidade do FC Start, o qual já gozava de uma enorme fama entre o sofrido povo refém dos nazistas. De nada adiantou, pois apesar da violência e da falta de esportividade dos desafiantes, o Start saiu vencedor por 5 a 1.
Após essa escandalosa e vergonhosa derrota, finalmente os alemães vieram a descobrir a manobra do padeiro. Chegou então de Berlim a sentença de que todos fossem executados, incluindo o dono da padaria, mas as autoridades locais não se deram por satisfeitas. De maneira alguma desejavam que o time russo ficasse perpetuado como uma lenda, pois se fossem todos assassinados, o fracasso alemão estaria perpetuado, pois a superioridade da raça ariana era um dos pilares do nazismo. Por essa razão, antes que fossem fuzilados deveriam ser derrotados em uma derradeira disputa.
Diante de um clima de extrema pressão e ameaças, foi anunciada uma revanche para 9 de agosto, no estádio Zenit. Antes da partida, um oficial da SS adentrou ao vestiário e disse em russo:
– Serei o juiz do jogo, então respeitem as regras e saúdem a platéia com o braço levantado! – exigindo que fizessem a saudação nazista.
No gramado, os atletas do Start, de camisa vermelha e calção branco, levantaram o braço, mas no momento da saudação, levaram a mão ao peito e proclamaram uma expressão soviética que valorizava a cultura física. Os alemães, de camisa branca e calção negro, marcaram o primeiro gol, mas o Start chegou ao intervalo do segundo tempo ganhando por 2 a 1. No intervalo receberiam novas visitas ao vestiário, desta vez com armas e advertências mais claras e concretas:
– Se vocês ganharem, não sai ninguém vivo! – ameaçou um outro oficial da SS. Os aterrorizados atletas até aventaram a hipótese de não voltarem para o segundo tempo, mas pensaram em suas famílias, na gente sofrida que se encontrava nas arquibancadas e gritava desesperadamente por eles e decidiram, enfim, jogar.
Pois, venceram com todos os méritos. No fim, quando já batiam os adversários por 5 a 3, o atacante Klimenko ficou cara a cara com o goleiro alemão, deu-lhe um drible, deixando-o estatelado no chão e, ao ficar em frente a trave, quando todos esperavam o gol, simplesmente deu meia volta e chutou a bola para o centro do campo em um gesto de desprezo e superioridade total. O estádio veio abaixo.
Após a partida, nada de anormal aconteceria. Os nazistas deixaram que saíssem normalmente de campo. O Start ainda atuaria dias depois, goleando o Rukh por 8 a 0. Mas o destino de todos já estava selado. Ao término da partida, a Gestapo visitou a padaria.
O primeiro a morrer com requintes de crueldade, em frente a todos, foi Kordik, o padeiro. Os demais foram enviados para os campos de concentração de Siretz. Nesse local foram mortos brutalmente Kuzmenko, Klimenko e o goleiro Trusevich, este vestido com a camisa do FC Start. Goncharenko e Sviridovsky, que não estavam na padaria naquele dia, foram os únicos sobreviventes e se mantiveram escondidos até a libertação de Kiev, em novembro de 1943. O restante da equipe pereceu em meio a torturas até a morte.
Ainda hoje nas escadarias do clube é mantido um monumento de saudação e recordação aos heróis do FC Start, os indomáveis e corajosos prisioneiros de guerra, os quais ninguém pôde derrotar durante uma dezena de históricas partidas, entre 1941 e 1942.
Na Ucrânia, os jogadores do FC Start são tido como heróis da pátria e seu exemplo de coragem é ensinado nos colégios. No estádio Zenit uma placa brada: “Aos jogadores que morreram com a cabeça levantada ante o invasor nazista”.
O cineasta John Huston se inspiraria nesse drama real para rodar o filme “Fuga para a vitória” (Escape to victory), de 1982, que chamaria muita atenção à época do lançamento, pois participaram grandes astros como Michael Caine, Sylvester Stallone e Max Von Sydow, além de algumas estrelas do futebol como Bobby Moore, Osvaldo Ardiles, Kazimierz Deyna e Pelé. No filme John Huston fez o que o destino não foi capaz: salvar os heróis.
O SUBSTITUTO IDEAL PARA JORGE JESUS
::::::: por Paulo Cezar Caju ::::::::
Ouvi em alguma tevê que Jorge Jesus foi sondado pelo Benfica e que estaria balançado. Vamos supor que seja verdade, quem seria o seu substituto? Pela filosofia do Flamengo dificilmente será um brasileiro. Se me pedissem uma opinião não pensaria duas vezes em sugerir o italiano Gian Piero Gasperini, do Atalanta, que não carrega títulos no currículo, mas sabe armar um time e detectar os pontos fortes de cada jogador. Jorge Jesus fez isso muito bem no Flamengo, encontrou a posição ideal para seus atletas e o rendimento veio naturalmente. O condicionamento físico é outro ponto forte do rubro-negro.
Acompanho Gian Piero Gasperini desde sua chegada ao Atalanta, em 2016. Quem me conhece sabe que assisto até segunda divisão do campeonato indiano e leio tudo sobre futebol. Sempre fui um fominha por informação. O Atalanta evolui ano a ano, vai muito bem no campeonato italiano e pode surpreender na Liga dos Campeões. Gosto de ver o Atalanta jogar. Jorge Jesus também não tinha uma carreira espetacular na Europa quando chegou ao Flamengo. Muitos duvidaram de sua capacidade e, hoje, ele é uma unanimidade no clube. Mais do que isso, o torcedor se identificou com ele e até seus sósias são contratados para eventos. Sabemos que isso é muito difícil de ser conquistado no Brasil. Quantas vezes já ouvimos gritos de torcida reverenciando treinadores?
Gian Piero Gasperini está há quatro anos no Atalanta e o tempo de casa também faz a diferença. Esse tempo é justamente o mais difícil de ser conquistado porque se os resultados não aparecem a diretoria dificilmente compra o barulho do treinador. Fernando Diniz, outro técnico que admiro, sempre reclama dessa falta de tempo implementar sua filosofia de trabalho. E quem vê seus times percebe nitidamente sua mão ali. O Flamengo já havia pensado em trocar um Jorge pelo outro, caso Jesus não ficasse. Seria o argentino Sampaoli, outro que também gosto bastante porque é adepto do futebol ofensivo. Nesse último Fla x Flu, apesar de o tricolor ter saído para o jogo, nota-se que Gabigol, Pedro e Michael se movimentam o tempo todo. Não é fácil marcar um ataque que se desloca sem parar. O Fluminense sabe se defender bem porque essa é a escola de seu treinador, mas precisa de um jogador que desarme e saiba sair jogando com qualidade e um bom definidor. Não entendi, Fred vai operar o olho? Bom, deixa para lá.
Ainda não dá para avaliar o técnico Ramon, do Vasco, mas gosto porque era um bom jogador, que estava cuidando da base. O Botafogo, que já tinha o japonês Honda agora trouxe o marfinense Kalou. Dois jogadores de Copa do Mundo, o que é ótimo para o marketing do clube. Eu disse para o marketing! Mesmo com essa confusão toda, briga de emissora com clubes e federação, torço pela retomada do campeonato carioca, que já foi considerado o melhor do Brasil e hoje é tratado com total desprezo e desrespeito. Lamento muito que os chavões dos analistas de computadores voltaram com tudo: jogador agudo, consistência de jogo, linha de cinco e por aí vai…
FOI UM LADRILHEIRO QUE PASSOU EM MINHA VIDA
por Luis Filipe Chateaubriand
Em 1981, Flamengo e Vasco da Gama decidiam o Campeonato Carioca daquele ano.
De um lado, o melhor time do mundo, que se consagraria campeão do planeta dias depois. Do outro, um bom time, raçudo, valente, com uma torcida apaixonada.
O rubro-negro tinha feito uma campanha muito melhor ao longo do certame. Com isso, o cruz maltino precisava ganhar o primeiro jogo, se não ganhasse o rival seria campeão, em ganhando o primeiro jogo precisava ganhar o segundo jogo, em não ganhando o rival seria campeão, e em ganhando o primeiro e o segundo jogo ainda precisava ganhar o terceiro jogo.
Como se vê, a vantagem do Urubu era gigantesca, o Bacalhau, inferior tecnicamente, dependia de um quase milagre para ser campeão.
Veio o primeiro jogo. Impactados pelo falecimento do ex comandante, o brilhante técnico Cláudio Coutinho, os flamenguistas foram presa fácil para o Gigante da Colina: 2 x 0 para o Vasco da Gama, dois gols de Roberto Dinamite.
Veio o segundo jogo. Em meio a um dilúvio digno de Arca de Noé, e um campo completamente encharcado, o 0 x 0 prevalecia no placar, já aos 43 minutos do segundo tempo. A torcida vermelha e preta gritava “é campeão”, quando uma bola sobra na área, estaciona em uma poça de água, para Roberto Dinamite – sempre Roberto Dinamite – chutar rasteiro para o fundo do gol: 1 x 0 Vasco da Gama, novamente com Bob Dinamite sendo o redentor.
Veio o terceiro jogo. Melhores em campo, os jogadores do “mais querido” logo abrem 2 x 0 na metade do primeiro tempo, gols de Adílio e Nunes.
O título parece decidido.
Entretanto, aos 39 minutos do segundo tempo, o limitado centroavante reserva Ticão diminui.
O jogo está 2 x 1.
O menos dotado tecnicamente time vascaíno, então, se incendeia e vai em busca de um empate que poderia forçar a prorrogação.
Domina o jogo, não contra um adversário qualquer, mas sim contra o melhor time do mundo!
Mas eis que, como diria o Poetinha Vinícius de Moraes, “de repente, não mais que de repente”, um ladrilheiro desgraçado (desculpem, acho que sabem que este escriba é vascaíno…) invade o campo, para esfriar o time da Cruz de Malta.
Irritadíssimos, alguns jogadores vascaínos caçam o ladrilheiro em campo. O zagueiro Ivan tenta lhe acertar um pontapé. O lateral esquerdo Gilberto Coroa lhe dá um murro no rosto.
(Close para os dias atuais: Gilberto Coroa é amigo de uma amiga, rubro negra por sinal; diz que a invasão do ladrilheiro foi uma tremenda falta de ética e que o murro que deu no cara foi merecido).
Mas o ladrilheiro conseguiu seu objetivo: esfriou a turma da faixa diagonal e, assim, o Flamengo manteve o resultado e se sagrou campeão.
Com isso, o ladrilheiro, que ainda recebeu a camisa que Zico usou no jogo de presente, entrou para o folclore do futebol carioca, ou melhor, do futebol brasileiro.
E este signatário, então um menino de 11 anos, queria fazer com o ladrilheiro o que Gilberto Coroa fez, mesmo depois do título decidido…
Arroubos infantis, dos quais damos risadas saudosos, de um tempo romântico do futebol brasileiro!
Luis Filipe Chateaubriand é Museu da Pelada!
O MITO NÃO MORRE
por Valdir Appel
Em 1960, o Vasco veio a Brusque exibir a Taça Jules Rimet conquistada na Suécia, para meus conterrâneos, na sede social do Clube Esportivo Paysandu. Eu tinha 14 anos.
No empurra-empurra, consegui ficar frente a frente com Barbosa, a lenda viva. Tímido, só consegui pedir um autógrafo na minha caderneta de estudante, caderneta que virou atração na escola. Pudera, não era só o autógrafo do grande goleiro Barbosa; consegui que todos os jogadores vascaínos, liderados pelo campeão do mundo Bellini, eternizassem aquele momento.
Um ano mais tarde, Barbosa estaria de volta a Brusque para uma homenagem. Na verdade, um presente do Paysandu, iniciativa do presidente Polaco aos associados do clube que tinha uma maioria absoluta de torcedores vascaínos.
Atendendo aos pedidos, o goleiro não se fez de rogado e treinou com os profissionais do nosso alviverde. Fiquei atrás do gol, buscando os arremates sem rumo porque os tiros que atingiam o arco paravam nas seguras mãos de Barbosa. Ele não usava luvas, o que lhe rendeu muitas fraturas e dedos tortos. Aliás, durante muito tempo, vivemos a ilusão de que o Paysandu iria contratá-lo em definitivo.
Eu ouvia as transmissões dos jogos do Campeonato Carioca, e particularmente os do Vasco. Conhecia apenas pelo nome os oponentes que desafiavam a perícia, a colocação e agilidade do elástico goleiro. Com sua imagem nítida na minha retina, guardada daquele treino, eu podia ver suas defesas se materializarem na voz dos locutores da Rádio Nacional do Rio de Janeiro.
As revistas esportivas (raras por aqui) volta e meia traziam fotos do arqueiro em ação. Uma delas me deixou extasiado: o corpo na horizontal, paralelo ao travessão, o toque na bola com a ponta dos dedos, de mãos trocadas.
Pude vê-lo mais uma vez em ação, no Maracanã. Estava na arquibancada, logo atrás do gol, a esquerda da tribuna de honra. O jogo, uma preliminar de veteranos. No corpo atlético de Barbosa, apenas os cabelos grisalhos evidenciavam o passar dos anos.
No final do primeiro tempo, um chute diagonal riscou o espaço entre a grande e a pequena área, o corpo negro trajando uniforme cinza, ergueu-se com a leveza de quem nunca envelheceu: voou como um pássaro, e buscou a bola-menina que sempre lhe foi obediente. Desceu ao solo para receber os aplausos maravilhados dos espectadores, no maior estádio do mundo.
O eu menino estava lá, com um sorriso maroto e emocionado.