VICENTE ARENARI, O LATERAL DE AÇO
por Walter Duarte
Em 1959 o Bahia EC sagrou-se o primeiro Campeão da Taça Brasil, com equivalência ao Campeonato Brasileiro, em cima do Santos FC de Pelé e Cia. Algo fantástico para o “Tricolor de Aço” e motivo de grande orgulho para a torcida, diante das circunstâncias dos jogos dessa decisão e da inversão do prognóstico inicial a favor do time Santista, base da seleção.
Foram três jogos memoráveis, tendo o Bahia vencido dois deles. Na decisão no Maracanã (3×1), um tal Vicentinho, impetuoso lateral-esquerdo, marca um lindo gol de falta. Natural de Natividade RJ (23/03/1935), no Noroeste Fluminense, filho do Italiano Vicente Arenari e Edith Braga, mudou-se com os pais para Campos RJ, junto com mais oito irmãos (Capistrano, Lenita, Ada, Edith, Cleber, José Clauder, Clóvis e Raul Arenari).
Ainda na infância demonstrava suas qualidades nos gramados Campistas, celeiro de craques, iniciando no Americano FC, e logo seguindo para Flamengo em 1954. Fazia parte dos juvenis no ano do Campeonato Carioca de 1955, convivendo no grupo que tinha Dida, Evaristo, Dequinha e Zagalo. A marcante conquista pelo Bahia na sequência de carreira fez Vicente Arenari entrar para galeria dos grandes heróis do clube, a exemplo dos seus companheiros de campanha: Nadinho, Nenzinho, Leone, Ari, Flávio, Léo, Henrique, Mario, Alencar, Beto, Bombeiro, Marito, Careca e Biriba.
Com a credencial de vencedor e imponente defensor na boa terra, chamou atenção do Palmeiras, que arquitetava sua primeira academia, com a contratação do ainda jovem craque do Bangu, Ademir da Guia. Com esse esquadrão, sagrou- se campeão paulista em 1963, vencendo o Noroeste no Pacaembu por 3×0, com uma rodada de antecedência, compondo equipe com os lendários: Julinho Botelho, Djalma Santos e Vavá, campeões mundiais de 1958.
Pelo Palestra jogou por três anos, até 1965, identificando-se muito com o clube e suas tradições. Como profissional, encerrou sua carreira pelo Nacional SP, no ano de 1967, diante de grave contusão no joelho, mantendo residência na capital paulista. Confira alguns dos títulos do Vicente:
– Flamengo: Torneiro Internacional do Rio de Janeiro (torneio Gilberto Cardoso);
– Bahia: Taça Brasil de 1959, Copa norte-nordeste de 1959 e 1961.
– Campeão Baiano: 1956, 1958, 1959, 1960, 1961 e 1962;
– Palmeiras: Paulista de 1963, Torneio Rio-São Paulo de 1965, além de diversos torneios, inclusive no exterior.
Por conta da sua notável liderança e experiência junto a grandes esquadrões, seguiu seu rumo futebolístico como treinador. Trabalhou em clubes como: Nacional SP, Botafogo SP, Mogi Mirim SP, Ferroviária SP, Saad SP, Juventude RS, Santo André SP, Caxias do Sul RS, Americano RJ, Goytacaz RJ, Itaperuna RJ, entre outros. No Palmeiras, treinou a base nas décadas de 70 e 80, sendo promovido a treinador dos profissionais em 1985, uma fase complicada do Clube Alviverde.
O trabalho de base sempre foi umas das preocupações do Vicente Arenari. Sem dúvidas que a fabulosa oportunidade de ser contemporâneo de jogadores diferenciados marcou muito sua filosofia de técnico. Época de uma atmosfera lúdica e inspiradora, porém com embates duríssimos, como nos jogos ” ardidos” da Libertadores da América.
Formou gerações de jogadores com a pretensão de não somente revelar, mas também forjar uma postura do indivíduo, perante os desafios da vida. Sua grandeza, como jogador e cidadão, sedimentaram o orgulho e respeito pelos clubes e profissionais com quem trabalhou. No dia 14/07/2013, tivemos a triste notícia do seu falecimento, aos 78 anos, com sepultamento em sua terra natal. Seguimos assim, com a nossa missão de reverenciar aqueles que nos deixaram ensinamentos e representatividade. O futebol agradece! Máximo respeito ao eterno “Lateral de Aço”, Vicente Arenari.
** Meus agradecimentos a família Arenari pelas informações e a honra do texto, em especial ao parceiro das resenhas Júlio Arenari (sobrinho) e os filhos Vinícius e Vicente Neto.
O PENTATEUCO DE BOB DINAMITE
por Luis Filipe Chateaubriand
Roberto Dinamite, ídolo para mais de metro, marcou gols lindíssimos ao longo da carreira.
Sem mais delongas, vamos aos cinco maiores gols do Bob:
5 – Contra o Flamengo, pelo Campeonato Carioca de 1986, domina a bola alta estando de costas na entrada da grande área, dá o toque adiantando a bola alta enquanto gira o corpo para a frente, ajeita o corpo e desfere a “bomba” no ângulo direito do goleiro Zé Carlos. O Vasco da Gama perdeu por 3 x 2.
4 – Contra o Flamengo, pelo Campeonato Carioca de 1977, recebe na intermediária, passa por dois marcadores com extrema categoria e, na entrada da área, desfere a “bomba” no ângulo direito do goleiro Cantareli. O Vasco da Gama venceu por 3 x 0.
3 – Contra o Santos de Pelé, no Campeonato Brasileiro de 1973, acertou um sem pulo da entrada da área, indefensável. O jogo terminou empatado em 1 x 1.
2 – Contra a Portuguesa de Desportos, no Campeonato Brasileiro de 1984, chega na pequena área pelo lado esquerdo, é bloqueado por um zagueiro, vai como a bola para trás, encontra mais espaço, passa pelo zagueiro, saia na frente do goleiro, que tampa o ângulo todo, mas consegue colocar por cima do goleiro, gol antológico. O Vasco da Gama venceu por 4 x 3.
1 – Precisa falar?? Vamos lá… Zanata cruza a bola para a área de pé trocado, o Bob domina no peito, dá um lençol desmoralizante no zagueiro Osmar Guarnelli e emenda para o gol de direita – um gol para todo mundo ir embora e comprar o ingresso novamente.
E sabe do que mais? Todos esses gols foram marcados no Maracanã – o palco apropriado para essas obras de arte.
Ah, Bob, que falta você faz!
Luis Filipe Chateaubriand é Museu da Pelada!
JUSTIÇA SE FAZ COM PÉS ALEMÃES
por Marcos Vinicius Cabral
Uma simples derrota fez Moacir Barbosa Nascimento entrar para a história do futebol brasileiro. Aquela derrota por 2 a 1 para o Uruguai na final da Copa do Mundo de 1950 foi o maior peso carregado pelo goleiro que encarou olhares de reprovação e perguntas sobre aquela tragédia conhecida como ‘Maracanazo’.
Barbosa, goleiro do Vasco, morreu duas vezes. A primeira, aos 29 anos, naquela tarde de 16 de julho, quando se preparou para defender o chute de Ghiggia, atacante uruguaio, que havia arrancado pelo campo até chegar à grande área. Não deu. A bola passou entre as mãos do goleiro e a trave, calando o estádio. E a última, onze dias depois de completar 79, quando uma parada cardiorrespiratória fechou-lhe os olhos para a eternidade.
Sessenta e quatro anos depois da derrota para a Celeste Olímpica na final da Copa do Mundo de 1950, o 7 a 1 sofrido pela Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 2014 conseguiu fazer justiça com Barbosa. A esquadra de Flavio Costa será para sempre lembrada como o time que, ao menos, foi vice-campeã em casa sem ter sido envergonhada.
Mas se o indulto foi concedido a um dos maiores goleiros do Vasco da Gama, a bola, amada e maltratada em jogos da Copa do Mundo de 1950 até a Copa do Mundo de 2014, passou a ser o centro das atenções em dezesseis mundiais que separaram as duas derrotas (e coincidentemente em solo brasileiro) mais sentidas de todas as 21 edições do torneio mais popular do mundo: o Brasil 1 x 2 Uruguai e o Brasil 1 x 7 Alemanha.
No entanto, tardou, mas a justiça foi feita nos gols de Muller, aos dez, Klose, aos 22, Kroos, aos 23 e aos 25, e Khedira, aos 28 minutos do primeiro tempo; Schurrle, aos 23 e aos 33 minutos do segundo tempo, no Estádio Governador Magalhães Pinto, o Mineirão, que sepultou de vez a culpa que Barbosa carregou nos ombros no Estádio Mário Filho, o Maracanã, por muitos anos.
Mas os sete gols foram demais para a geração de Neymar e Cia que continua marcada para sempre na memória do torcedor do Brasil. Nesta quinta-feira, 8 de julho de 2021, mês sete, em que se completa 7 anos que o Brasil perdeu por 7 a 1 para o time treinado por Joachim Löw, que com a eliminação na Eurocopa para a seleção da Inglaterra na terça-feira, 30 de junho, se despediu do comando da Seleção Alemã após 15 anos.
Atualmente vestindo a camisa 7 do Atlético Mineiro, Hulk falou para uma rádio gaúcha sobre o jogo que mudou a vida dele e de muitos outros jogadores: “A seleção tinha o objetivo de ser campeão e um passo antes de chegar na final a gente perde daquela forma. Perder de 7 a 1, ninguém imaginava aquilo. Por alguns instantes, achava que estava até sonhando, que não estava acontecendo aquele jogo”, definiu o camisa 7 do Brasil naquele 7 a 1.
Mas afinal: de quem foi a culpa pela arrasadora, incontestável e irretorquível goleada história?
Vejamos.
O Brasil se preparou como poucos para realizar a ‘Copa’ das Copas do Mundo e segundo balanço do governo federal, produzir o megaevento aqui gerou gastos, segundo o Tribunal de Contas da União (TCU), de R$ 25,6 bilhões, nove vezes mais que o previsto quando o país foi anunciado como sede do Mundial, em Zurique, na Suiça, naquele longínquo 2007.
Dono de cinco títulos mundiais, dois vice-campeonatos e único país a participar de todas as edições, o Brasil já vivia sua crise territorial e doméstica quando dezoito cidades se candidataram para receberem as partidas e construir (ou reformar) estádios para a Copa, e no entanto, apenas doze foram escolhidas: Belo Horizonte (Estádio do Mineirão), Brasília (Estádio Mané Garrincha), Cuiabá (Arena Pantanal), Curitiba (Arena da Baixada), Fortaleza (Estádio Castelão), Manaus (Arena Amazônia), Natal (Estádio das Dunas), Porto Alegre (Estádio Beira-Rio), Recife (Arena Pernambuco), Rio de Janeiro (Estádio do Maracanã), Salvador (Arena Fonte Nova) e São Paulo (Arena Corinthians).
Todavia, se os bastidores causam espanto e chamam a atenção como um quadro surreal pintado pelas mãos de quem desperdiçou tanto dinheiro público, o time iniciava a Copa com um 3 a 1 contra a Croácia, um empate sem gols com o México e uma goleada pouco convincente sobre os Camarões por 4 a 1.
Nas oitavas de final, a equipe comandada por Luiz Felipe Scolari sofreu muito, mas conseguiu avançar às quartas do Mundial nos pênaltis, depois de um empate por 1 a 1 no tempo normal.
A fragilidade daquele time ficou à mostra quando a cena do zagueiro e capitão Thiago Silva chorando emocionado e desabado no gramado correu o mundo.
O Brasil ganhava musculatura na competição enquanto o que realmente se escondia era um time com data vencida.
Contra a Colômbia, um outro choro, dessa vez não à toa. Neymar, nosso camisa 10 e esperança de conquistar o hexacampeonato, sofreu uma fratura na terceira vértebra lombar após levar uma joelhada do colombiano Zúñiga, nas costas, pouco antes do final do segundo tempo, e ainda no Hospital São Carlos, na Zona Norte de Fortaleza, dava adeus à Copa do Mundo.
A vitória do Brasil, por 2 a 1, e a classificação para a semifinal, foram mais importantes que o relatório da psicóloga Regina Brandão, com pós-doutorado em psicologia do esporte, sobre o baile tático dado por treinadores menos experientes que Felipão, mas mais estudiosos, como o argentino Jorge Sampaoli, do Chile, e Miguel Herrera, do México.
Sem os dois chorões – Neymar lesionado e Thiago Silva suspenso – o Brasil enfrentaria a Alemanha, numa terça-feira, às 17h, no Mineirão, em Belo Horizonte, sem imaginar que os 7 a 1 que o time comandado por Joachim Löw imporia aos comandados de Felipão, superaria o Uruguai 6 x 0 Brasil, em Viña del Mar, Chile, pelo Campeonato Sul-Americano de 1920; o Brasi 1 × 5 Argentina, em São Januário, pela Copa Roca, em 1939; o Argentina 6 × 1 Brasil, no Gasómetro de Boedo, em Buenos Aires, pela Copa Roca, em 1940; o Brasil 2 × 6 São Paulo, no Pacaembu, amistoso em 1962; e o Bélgica 5 × 1 Brasil, em Heysel, Bruxelas, amistoso em 1963.
Goleadas à parte, a santíssima trindade formada por Luiz Felipe Scolari, Flávio Murtosa e Carlos Alberto Parreira – que teve o despautério em dizer que o Brasil estava com a mão na taça na apresentação em Teresópolis – frustrou 202,8 milhões de torcedores espalhados pelos 5.570 municípios do país, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), naquele ano de 2014.
Mas de tanta coisa errada naquele torneio, selecionamos sete pecados capitais para o histórico fracasso na Copa do Mundo de 2014:
AVAREZA
A comissão técnica não quis abrir mão de Daniel Alves e Marcelo, laterais valiosos no cenário internacional. Pecou também pela falta de sensibilidade para perceber e corrigir os buracos deixados pelos avanços deles, expostos antes da Copa pelo fraco Panamá e a Sérvia. Os problemas se repetiram na estreia contra a Croácia, no entanto, o problema foi empurrado para debaixo do tapete até o vexame diante da Alemanha.
GULA
Faminto por vitórias, conquistas e marcas, Felipão havia perdido a fome em fazer história, se superar e poder se tornar bicampeão do mundo à frente da seleção. Com a conquista da Copa das Confederações em cima da Espanha, Felipão “morreu” abraçado ao esquema 4-2-3-1 das cinco vitórias no evento teste às vésperas da Copa do Mundo de 2014. A maior falha foi jamais ter testado o time sem Neymar. O camisa 10 começou todas as partidas da segunda ‘Era Scolari’. Quando precisou se reinventar, não tinha tempo e muito menos recursos humanos para isso.
INVEJA
Completamente inseguro, Felipão criou um clima de inveja nos profissionais de imprensa que cobriam o dia a dia da seleção quando pediu ao assessor de imprensa pessoal para pegar pelo braço na Granja Comary Juca Kfouri e Paulo Vinicius Coelho, ambos da ESPN Brasil, Fernando Fernandes, da TV Bandeirantes, Osvaldo Pascoal, da Fox Sports, Luiz Antonio Prósperi, do O Estado de São Paulo, e Carlos Eduardo Mansur, do jornal O Globo, e levá-los para uma conversa reservada, a fim de pedir conselhos. Ali, ficou escancarado que Felipão havia deixado o elenco escapar das suas mãos. O desembarque às pressas de Regina Brandão em Teresópolis, para recolocar o grupo no divã, constituiu algo que estava errado.
IRA
Os opostos se atraem é um ditado tão certo, mas tão certo, que deu errado com o relacionamento de Felipão com Carlos Alberto Parreira. Calmo, sereno e tranquilo, o técnico do tetra foi, durante todo o tempo, uma espécie de calmante para Felipão. O atual treinador assumiu em algumas entrevistas que, às vezes, queria voltar a ser o Felipão de antes, dar um tratamento de choque no elenco e se irar contra a imprensa, mas recuava ao ouvir os conselhos do coordenador. O Felipão que todos conhecem não esteve na Copa do Mundo no Brasil.
LUXÚRIA
A Seleção Brasileira teve muitas horas vagas na concentração que poderiam ter sido usadas em treinamentos. Prova disso foi a invenção de moda de Daniel Alves e Neymar, que aproveitaram a falta do que fazer para tingir os cabelos, demonstrando vaidade excessiva com a aparência. O cuidado estético representou a maior novidade “tática” da seleção no empate por 0 a 0 com o México, no Castelão, em Fortaleza, pela segunda rodada da fase de grupos.
PREGUIÇA
Felipão dormiu em cima do relatório entregue por Regina Brandão com o perfil dos 23 convocados, ou houve erro de avaliação da profissional de confiança dele. Ambos devem ter percebido que o capitão deveria ser outro, mas insistiram em manter a braçadeira com o zagueiro Thiago Silva. O diagnóstico foi exposto em público nos pênaltis contra o Chile e no choro compulsivo do camisa 3.
SOBERBA
A dupla Scolari e Parreira chegou à Granja Comary de salto alto e com o otimismo lá nas nuvens do céu de Teresópolis, onde cantou vitória antes do tempo. O experiente Carlos Alberto Parreira, preparador físico em 1970 e técnico em 1994, chegou a afirmar
durante a preparação e antes da estreia contra a Croácia: “O Brasil está com a mão na taça”. Depois da partida contra o Chile pelas oitavas de final, os dois reviram os conceitos e Felipão afirmou que, se o seu time fosse derrotado, não seria o fim do mundo. Depois de sete anos, está sendo.
Nesta quinta-feira (08), completa sete anos daquela partida em que sempre que é lembrada, os alemães sorriem e os brasileiros choram, e cabe a Luiz Felipe Scolari, que acabou de ser anunciado como novo treinador do Grêmio, cumprir o que disse um dia em uma palestra para alunos da Universidade de Brasília, na L2 Sul: “Se eu não ganhar a Copa do Mundo, vou pedir asilo aqui ao lado, na Embaixada do Kuwait”.
Dito e NÃO feito.
Porém, o que consola é saber que de tudo que ocorreu naquela nefasta tarde no Mineirão, uma em especial serviu para fazer justiça a Barbosa, vilão por 50 anos: o vexame dos 7 a 1.
PC E A ARTE DA PALAVRA
por Rubens Lemos
O melhor texto do jornalismo esportivo nacional é de Paulo Cézar Lima, o PC Caju, tricampeão do mundo. Sua pena segue o estilo polêmico, debochado e verdadeiro dos tempos em que perfilava zagueiros para driblá-los. PC, quando menino ainda, veio a Natal em 1970, ano em que nasci, depois da Copa do Mundo do México. Amistoso contra o ABC no velho Estádio Juvenal Lamartine.
PC Caju aplicou tanta finta no pobre lateral-direito Preta que a torcida queria agredi-lo no estacionamento da Avenida Hermes da Fonseca, que ficava interditada aos domingos para o povão chegar no teatrinho de arena da bola potiguar.
PC abusou que perdeu um pênalti, defendido pelo falecido baixinho Erivan, um dos principais goleiros da história do ABC. PC fez Preta cair de testa no chão ao tentar acertar-lhe um pontapé. PC riu e as arquibancadas ficaram furiosas.
Mas, hoje, maduro, depois de conseguir dar canetas e toques de curva no destino que apagou suas luzes para ele, durante longo período, contado em belo livro: Dei a Volta na Vida, PC brinda os viciados no bem escrever com palavras bem colocadas, certeiras iguais aos seus lançamentos de três-dedos para Jairzinho, no auge do Botafogo glorioso e não o lixo atual, da mesma lata onde está jogado o Vasco.
PC Caju tecla verdades em seu computador e a última delas é clara: a atual seleção brasileira não tem sintonia com a torcida. É o que eu procurava expressar e não conseguia.
O time de Tite é desconectado do povão. Do povão não, esse, coitado, está banido do esporte luxuoso de arenas reluzentes e pernas de pau decadentes. PC é da turma que fazia o país parar por conta de jogo do Brasil.
Viveu a Era Pelé, com Gerson, Rivelino, o citado Jairzinho, Tostão, Clodoaldo, Marinho Chagas, Dirceu Lopes, Nei Conceição, Ademir da Guia, Silva Batuta e Zanata e brilhou também na fase em que Zico assumia o cetro da bola das mãos (ou da canhota?) de Rivelino.
A ausência de PC foi fundamental para que a seleção brasileira ostentasse o título de “Campeã Moral” de 1978, invicta e em terceiro lugar, com um quarto-zagueiro de lateral-esquerdo (Edinho), um brutamontes (Chicão) em lugar de um nobre (Falcão) e ninguém da estirpe malandra de PC para temperar a partida nos momentos quentes, ele que havia sido fundamental nas Eliminatórias.
Todo redator, repórter, colunista, cronista, colaborador, metido a entender de futebol deveria usar PC como leitura obrigatória. O parágrafo dele é curto e esclarecedor, instigante, provocador.
O texto de PC é o próprio. Sincero e até antipático, problema do interlocutor ou do leitor. Como era transtorno para laterais, fossem da qualidade de Carlos Alberto Torres e Nelinho, fossem limitados como o humilde Preta do baile mais para o tripudiar do que para o empolgar aqui em Natal.
Experimente ler seus artigos e depois ligue a TV no SBT para assistir ao time de Tite. A Lucas Paquetá sendo guindado à referência de uma seleção que assombrava como um tigre e agora não mete medo em combinado de Trinidad e Tobago. Um time em que Neymar vai se esgotando, perdendo o gás, o tesão que nunca teve, a condição física de carregar outros dez marmanjos nas costas.
Jornalista – assim me ensinaram – é para transmitir tudo em linguagem simples. Os experts (os de TV por assinatura mais ainda), conjugam o Titês das linhas altas e baixas, da transição, do jogador de beirada (simplesmente o velho ponta-direita), da contenção e da assistência famigerada em lugar do velho, bom e natural passe. Esses caras não amarram os dedos de PC Caju. Se era uma maravilha vê-lo jogar, é uma delícia saborear suas palavras.
COPA AMÉRICA E EUROCOPA: O ABISMO ENTRE DUAS REALIDADES
por André Luiz Pereira Nunes
A partir do momento em que a Conmebol decidiu unir o seu calendário ao da Uefa para que os torneios entre suas seleções fossem disputados ao mesmo tempo, as comparações obviamente passaram a ser inevitáveis. É certo que ninguém imaginaria que isso aconteceria justamente durante uma pandemia de dimensão mundial, mas ainda assim, fica muito claro que existe um abismo entre o futebol praticado na Europa e na América do Sul.
Enquanto a Eurocopa é tratada por torcedores, dirigentes e atletas como uma Mini Copa do Mundo, o torneio sul americano é visto apenas como um evento protocolar e obrigatório, sobretudo para os jogadores que preferiam estar de férias. O fato também da pandemia ainda estar em níveis alarmantes no continente e, em especial no Brasil, enterra qualquer crença de que o evento tenha alguma grande importância. Para os treinadores é apenas uma oportunidade para preparar seus elencos para o restante das Eliminatórias para a Copa do Mundo.
Em se tratando da Copa América, não há muitas surpresas. Mesmo sem empolgar, o Brasil passou sem maiores dificuldades por seus adversários. Já Uruguai e Paraguai decepcionaram ao capitularem, respectivamente, diante de Colômbia e Peru. Os argentinos, por seu turno, parecem vivenciar uma entressafra de atletas. Dependem tanto dos lampejos de Messi, como o Brasil precisa de Neymar.
No Velho Mundo as coisas transcorrem de forma bem diferente. A Itália provavelmente não apresentava um futebol tão envolvente há muito tempo. O seu tradicional e irritante defensivismo deu lugar a um padrão bem mais agressivo. A Inglaterra também voltou a figurar no rol das grandes seleções mundiais, relembrando a ótima fase de 1990. A Dinamarca volta a figurar como grande surpresa após participações pífias nos últimos eventos.
Porém, é importante ressaltar que alguns selecionados decepcionaram inteiramente. A Bélgica, primeira colocada no Ranking da Fifa, ficou pelo caminho mais uma vez. Seu padrão desempenhado por essa talentosa geração, nem de longe recorda o praticado pelo excelente plantel, capitaneado por Enzo Scifo, que disputou com grande êxito a Copa de 1986, no México.
Por sua vez, a Holanda, mais uma vez decepcionou torcedores e analistas ao ser despachada pela apenas regular República Tcheca. Portugal, apesar do talento indiscutível de Cristiano Ronaldo, precisa de muito mais para suplantar seus adversários e atingir o topo.
Todavia, quem ainda merece algum reconhecimento é a Suíça por ter conseguido eliminar de forma surpreendente, ainda que nos pênaltis, os franceses. Afinal, trata-se da seleção, não só vencedora da última Euro, como também da Copa do Mundo. Apesar desse surpreendente revés, permanece a sensação de que poderia ter chegado mais longe e, mesmo assim, ainda é forte postulante ao título mundial. A Espanha, embora distante de seu apogeu, também não deve ser desprezada.
Portanto, não há como comparar a qualidade dessas equipes com a desempenhada por Colômbia, Equador, Peru, Brasil, Uruguai, Paraguai ou Argentina.
Não é necessário ser nenhuma pitonisa, oráculo, ou mesmo muito entendido para prever que o vencedor do Mundial do Qatar, em 2022, pertencerá ao continente que hoje pratica o melhor futebol.