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JUSTIÇA SE FAZ COM PÉS ALEMÃES

8 / julho / 2021

por Marcos Vinicius Cabral


Uma simples derrota fez Moacir Barbosa Nascimento entrar para a história do futebol brasileiro. Aquela derrota por 2 a 1 para o Uruguai na final da Copa do Mundo de 1950 foi o maior peso carregado pelo goleiro que encarou olhares de reprovação e perguntas sobre aquela tragédia conhecida como ‘Maracanazo’.

Barbosa, goleiro do Vasco, morreu duas vezes. A primeira, aos 29 anos, naquela tarde de 16 de julho, quando se preparou para defender o chute de Ghiggia, atacante uruguaio, que havia arrancado pelo campo até chegar à grande área. Não deu. A bola passou entre as mãos do goleiro e a trave, calando o estádio. E a última, onze dias depois de completar 79, quando uma parada cardiorrespiratória fechou-lhe os olhos para a eternidade.

Sessenta e quatro anos depois da derrota para a Celeste Olímpica na final da Copa do Mundo de 1950, o 7 a 1 sofrido pela Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 2014 conseguiu fazer justiça com Barbosa. A esquadra de Flavio Costa será para sempre lembrada como o time que, ao menos, foi vice-campeã em casa sem ter sido envergonhada.

Mas se o indulto foi concedido a um dos maiores goleiros do Vasco da Gama, a bola, amada e maltratada em jogos da Copa do Mundo de 1950 até a Copa do Mundo de 2014, passou a ser o centro das atenções em dezesseis mundiais que separaram as duas derrotas (e coincidentemente em solo brasileiro) mais sentidas de todas as 21 edições do torneio mais popular do mundo: o Brasil 1 x 2 Uruguai e o Brasil 1 x 7 Alemanha.

No entanto, tardou, mas a justiça foi feita nos gols de Muller, aos dez, Klose, aos 22, Kroos, aos 23 e aos 25, e Khedira, aos 28 minutos do primeiro tempo; Schurrle, aos 23 e aos 33 minutos do segundo tempo, no Estádio Governador Magalhães Pinto, o Mineirão, que sepultou de vez a culpa que Barbosa carregou nos ombros no Estádio Mário Filho, o Maracanã, por muitos anos.

Mas os sete gols foram demais para a geração de Neymar e Cia que continua marcada para sempre na memória do torcedor do Brasil. Nesta quinta-feira, 8 de julho de 2021, mês sete, em que se completa 7 anos que o Brasil perdeu por 7 a 1 para o time treinado por Joachim Löw, que com a eliminação na Eurocopa para a seleção da Inglaterra na terça-feira, 30 de junho, se despediu do comando da Seleção Alemã após 15 anos.

Atualmente vestindo a camisa 7 do Atlético Mineiro, Hulk falou para uma rádio gaúcha sobre o jogo que mudou a vida dele e de muitos outros jogadores: “A seleção tinha o objetivo de ser campeão e um passo antes de chegar na final a gente perde daquela forma. Perder de 7 a 1, ninguém imaginava aquilo. Por alguns instantes, achava que estava até sonhando, que não estava acontecendo aquele jogo”, definiu o camisa 7 do Brasil naquele 7 a 1.

Mas afinal: de quem foi a culpa pela arrasadora, incontestável e irretorquível goleada história?

Vejamos.

O Brasil se preparou como poucos para realizar a ‘Copa’ das Copas do Mundo e segundo balanço do governo federal, produzir o megaevento aqui gerou gastos, segundo o Tribunal de Contas da União (TCU), de R$ 25,6 bilhões, nove vezes mais que o previsto quando o país foi anunciado como sede do Mundial, em Zurique, na Suiça, naquele longínquo 2007.


Dono de cinco títulos mundiais, dois vice-campeonatos e único país a participar de todas as edições, o Brasil já vivia sua crise territorial e doméstica quando dezoito cidades se candidataram para receberem as partidas e construir (ou reformar) estádios para a Copa, e no entanto, apenas doze foram escolhidas: Belo Horizonte (Estádio do Mineirão), Brasília (Estádio Mané Garrincha), Cuiabá (Arena Pantanal), Curitiba (Arena da Baixada), Fortaleza (Estádio Castelão), Manaus (Arena Amazônia), Natal (Estádio das Dunas), Porto Alegre (Estádio Beira-Rio), Recife (Arena Pernambuco), Rio de Janeiro (Estádio do Maracanã), Salvador (Arena Fonte Nova) e São Paulo (Arena Corinthians).

Todavia, se os bastidores causam espanto e chamam a atenção como um quadro surreal pintado pelas mãos de quem desperdiçou tanto dinheiro público, o time iniciava a Copa com um 3 a 1 contra a Croácia, um empate sem gols com o México e uma goleada pouco convincente sobre os Camarões por 4 a 1.

Nas oitavas de final, a equipe comandada por Luiz Felipe Scolari sofreu muito, mas conseguiu avançar às quartas do Mundial nos pênaltis, depois de um empate por 1 a 1 no tempo normal.

A fragilidade daquele time ficou à mostra quando a cena do zagueiro e capitão Thiago Silva chorando emocionado e desabado no gramado correu o mundo.

O Brasil ganhava musculatura na competição enquanto o que realmente se escondia era um time com data vencida.

Contra a Colômbia, um outro choro, dessa vez não à toa. Neymar, nosso camisa 10 e esperança de conquistar o hexacampeonato, sofreu uma fratura na terceira vértebra lombar após levar uma joelhada do colombiano Zúñiga, nas costas, pouco antes do final do segundo tempo, e ainda no Hospital São Carlos, na Zona Norte de Fortaleza, dava adeus à Copa do Mundo.

A vitória do Brasil, por 2 a 1, e a classificação para a semifinal, foram mais importantes que o relatório da psicóloga Regina Brandão, com pós-doutorado em psicologia do esporte, sobre o baile tático dado por treinadores menos experientes que Felipão, mas mais estudiosos, como o argentino Jorge Sampaoli, do Chile, e Miguel Herrera, do México.

Sem os dois chorões – Neymar lesionado e Thiago Silva suspenso – o Brasil enfrentaria a Alemanha, numa terça-feira, às 17h, no Mineirão, em Belo Horizonte, sem imaginar que os 7 a 1 que o time comandado por Joachim Löw imporia aos comandados de Felipão, superaria o Uruguai 6 x 0 Brasil, em Viña del Mar, Chile, pelo Campeonato Sul-Americano de 1920; o Brasi 1 × 5 Argentina, em São Januário, pela Copa Roca, em 1939; o Argentina 6 × 1 Brasil, no Gasómetro de Boedo, em Buenos Aires, pela Copa Roca, em 1940; o Brasil 2 × 6 São Paulo, no Pacaembu, amistoso em 1962; e o Bélgica 5 × 1 Brasil, em Heysel, Bruxelas, amistoso em 1963.

Goleadas à parte, a santíssima trindade formada por Luiz Felipe Scolari, Flávio Murtosa e Carlos Alberto Parreira – que teve o despautério em dizer que o Brasil estava com a mão na taça na apresentação em Teresópolis – frustrou 202,8 milhões de torcedores espalhados pelos 5.570 municípios do país, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), naquele ano de 2014.

Mas de tanta coisa errada naquele torneio, selecionamos sete pecados capitais para o histórico fracasso na Copa do Mundo de 2014:

AVAREZA

A comissão técnica não quis abrir mão de Daniel Alves e Marcelo, laterais valiosos no cenário internacional. Pecou também pela falta de sensibilidade para perceber e corrigir os buracos deixados pelos avanços deles, expostos antes da Copa pelo fraco Panamá e a Sérvia. Os problemas se repetiram na estreia contra a Croácia, no entanto, o problema foi empurrado para debaixo do tapete até o vexame diante da Alemanha.

GULA


Faminto por vitórias, conquistas e marcas, Felipão havia perdido a fome em fazer história, se superar e poder se tornar bicampeão do mundo à frente da seleção. Com a conquista da Copa das Confederações em cima da Espanha, Felipão “morreu” abraçado ao esquema 4-2-3-1 das cinco vitórias no evento teste às vésperas da Copa do Mundo de 2014. A maior falha foi jamais ter testado o time sem Neymar. O camisa 10 começou todas as partidas da segunda ‘Era Scolari’. Quando precisou se reinventar, não tinha tempo e muito menos recursos humanos para isso.

INVEJA

Completamente inseguro, Felipão criou um clima de inveja nos profissionais de imprensa que cobriam o dia a dia da seleção quando pediu ao assessor de imprensa pessoal para pegar pelo braço na Granja Comary Juca Kfouri e Paulo Vinicius Coelho, ambos da ESPN Brasil, Fernando Fernandes, da TV Bandeirantes, Osvaldo Pascoal, da Fox Sports, Luiz Antonio Prósperi, do O Estado de São Paulo, e Carlos Eduardo Mansur, do jornal O Globo, e levá-los para uma conversa reservada, a fim de pedir conselhos. Ali, ficou escancarado que Felipão havia deixado o elenco escapar das suas mãos. O desembarque às pressas de Regina Brandão em Teresópolis, para recolocar o grupo no divã, constituiu algo que estava errado.

IRA

Os opostos se atraem é um ditado tão certo, mas tão certo, que deu errado com o relacionamento de Felipão com Carlos Alberto Parreira. Calmo, sereno e tranquilo, o técnico do tetra foi, durante todo o tempo, uma espécie de calmante para Felipão. O atual treinador assumiu em algumas entrevistas que, às vezes, queria voltar a ser o Felipão de antes, dar um tratamento de choque no elenco e se irar contra a imprensa, mas recuava ao ouvir os conselhos do coordenador. O Felipão que todos conhecem não esteve na Copa do Mundo no Brasil.

LUXÚRIA

A Seleção Brasileira teve muitas horas vagas na concentração que poderiam ter sido usadas em treinamentos. Prova disso foi a invenção de moda de Daniel Alves e Neymar, que aproveitaram a falta do que fazer para tingir os cabelos, demonstrando vaidade excessiva com a aparência. O cuidado estético representou a maior novidade “tática” da seleção no empate por 0 a 0 com o México, no Castelão, em Fortaleza, pela segunda rodada da fase de grupos.

PREGUIÇA

Felipão dormiu em cima do relatório entregue por Regina Brandão com o perfil dos 23 convocados, ou houve erro de avaliação da profissional de confiança dele. Ambos devem ter percebido que o capitão deveria ser outro, mas insistiram em manter a braçadeira com o zagueiro Thiago Silva. O diagnóstico foi exposto em público nos pênaltis contra o Chile e no choro compulsivo do camisa 3.


SOBERBA

A dupla Scolari e Parreira chegou à Granja Comary de salto alto e com o otimismo lá nas nuvens do céu de Teresópolis, onde cantou vitória antes do tempo. O experiente Carlos Alberto Parreira, preparador físico em 1970 e técnico em 1994, chegou a afirmar

durante a preparação e antes da estreia contra a Croácia: “O Brasil está com a mão na taça”. Depois da partida contra o Chile pelas oitavas de final, os dois reviram os conceitos e Felipão afirmou que, se o seu time fosse derrotado, não seria o fim do mundo. Depois de sete anos, está sendo.

Nesta quinta-feira (08), completa sete anos daquela partida em que sempre que é lembrada, os alemães sorriem e os brasileiros choram, e cabe a Luiz Felipe Scolari, que acabou de ser anunciado como novo treinador do Grêmio, cumprir o que disse um dia em uma palestra para alunos da Universidade de Brasília, na L2 Sul: “Se eu não ganhar a Copa do Mundo, vou pedir asilo aqui ao lado, na Embaixada do Kuwait”.

Dito e NÃO feito.

Porém, o que consola é saber que de tudo que ocorreu naquela nefasta tarde no Mineirão, uma em especial serviu para fazer justiça a Barbosa, vilão por 50 anos: o vexame dos 7 a 1.

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