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MESTRE ZIZA, O ÍDOLO DE PELÉ

por Elso Venâncio


Nascido em São Gonçalo, Thomaz Soares da Silva, o Zizinho, craque do Flamengo, do São Paulo, do Bangu e da seleção brasileira, caso estivesse vivo teria completado 100 anos de idade no último dia 14 de setembro.

Segundo João Máximo, nosso grande nome do Jornalismo Esportivo, Zizinho, vice-campeão do mundo em 1950, influenciou não apenas Pelé, mas toda uma geração.

No fim da década de 50, já campeão do mundo e principal jogador do país, Pelé veio com o Santos jogar no Maracanã e bateu de frente com Zizinho. Ato contínuo, aproximou-se de seu ídolo e disse, emocionado:

– Mestre, aprendi tudo com você…

Resposta do Zizinho:

– Aprendeu de mais, hein, garoto!

O técnico do Flamengo Flávio Costa lançou Zizinho, então com 19 anos de idade, com a missão de substituir ninguém menos do que Leônidas da Silva, outro ícone nacional. Zizinho lideraria o Rubro-Negro na conquista de seu primeiro tricampeonato carioca: 1942, 1943 e 1944!

Nessa época, o Brasil tinha três ídolos nacionais: o Presidente Getúlio Vargas; Orlando Silva, o “Cantor das Multidões”; e Leônidas da Silva, o “Diamante Negro”, nome até hoje de chocolate.

Eis que surgia, então, um novo mito: Zizinho.

Na Copa de 50, se houvesse eleição da FIFA, ele certamente seria apontado como o melhor jogador do planeta. Foi o grande nome do Mundial.

“O futebol de Zizinho me faz lembrar Da Vinci pintando uma obra rara” escreveu o jornalista italiano Giordano Fatori, da Gazzetta dello Sport.

No começo dos anos 2000, reuni no “Enquanto A Bola Não Rola”, programa de debates que eu apresentava aos domingos na Rádio Globo, os maiores armadores do nosso futebol: Didi, Gerson, Rivellino e Paulo Cézar Caju. Liguei para Niterói para avisar que um carro estava à disposição para buscar Zizinho, presença que todos ansiávamos, mas ele não pôde comparecer por já estar sem forças. Percebi que ele queria realmente participar, rever os antigos companheiros e conhecer os novos ídolos, mas não deu.

Seria a última grande lição do Mestre Ziza! Mestre não só de Pelé, mas de todo o futebol.

FUTEBOL SONOLENTO

:::::::: por Paulo Cézar Caju :::::::


Não sei vocês, mas prefiro mil vezes quando o Botafogo descobre um talento na base e coloca para jogar do que quando traz um veterano, prestes a se aposentar! Mas é bom o torcedor brasileiro ir se acostumando a ver o seu time recheado de másters porque como as jovens revelações saem cedo para o exterior a solução será essa. Realmente não consigo me encantar, por exemplo, com o Corinthians trazendo Renato Augusto, Giuliano, Willian e, agora, Paulinho….parece até a seleção do Luciano do Valle!!! E é bom o engomadinho técnico Silvinho colocar as barbas de molho, afinal do jeito que o Coringão gosta de reviver antigos amores já já vai reconvocar o professor Mano Menezes, recém-demitido, na Arábia Saudita.

Mas sobre essa história de times mesclados, claro que já atuei em alguns repletos de forasteiros, mas, no fundo, prefiro os com maioria de jogadores formados na base, como o Botafogo, da década de 60, e o Flamengo arrasador dos anos 80. O Fluminense também teve uma época maravilhosa quando tinha Edinho, Pintinho, Rubens Galaxie, Gilson Gênio, Edvaldo, Kleber, Erivelton e uma série de outros jogadores que subiram juntos e permaneceram durante um período no time de cima.

O Vasco teve Dinamite, Romário e Edmundo. A torcida teve o privilégio de curti-los durante um bom tempo até serem vendidos. Hoje, quando os jovens não são vendidos para a Europa são emprestados para pegar experiência. Ué, mas não podem pegar rodagem jogando pelo próprio clube. O São Paulo vendeu Brenner sei lá para onde e emprestou Helinho para o Bragantino. O Bragantino também pegou Praxedes, do Inter. E você assiste o Inter jogando e não vê ninguém melhor que o Praxedes, vai entender.

Mas, PC, e o gol do Vasco batizado de “isso a Globo não mostra”? Não falta mais nada!!! O desinteresse pelos jogos é tanto que até a turma que transmite tem dado suas cochiladas. Ontem, após o fim de Grêmio 1 x 0 Fla, por engano colocaram na tela a classificação da Segunda Divisão e vi meu Botafogo super bem colocado, mas era só mais uma pegadinha e assim como os vascaínos fui dormir frustrado com a nossa triste realidade.

Já ia me esquecendo das pérolas da rodada! Neste fim de semana, ouvi que a bola estava viva, o jogo estava sendo desenhado e que o jogador encaixotado tabelava com o ponta agudo. Se já não fosse o bastante, teve analista de computador falando que a briga era pela segunda bola! Se com uma bola já está ruim, imagina com duas?! Não quero nem ver!

O FIM DA PICADA

por Victor Kingma 


O juiz apita! Falta na entrada da área.O avante solta a bomba. A bola sobe e estoura no galho da árvore atrás do gol!

Os moradores da casa ao lado se agitam e invadem o gramado. Começa a confusão: 

O gandula, pernas avermelhadas, grita de dor. O goleiro abandona a meta e corre. 

Os demais jogadores, assim como o trio de arbitragem, com as orelhas em fogo, também saem em disparada. 

A turba de torcedores se esvoaça. À beira do gramado, o cão vira-latas rola na grama.

No estábulo ao lado do campo o touro, anca em brasa, arrebenta a cerca e foge. 

O tropeiro que assistia ao jogo, pica a mula e desaparece. O narrador solta o grito, não de gol, mas de dor.

Pânico geral!

Minutos de terror!


Após a invasão, pouco a pouco os invasores vão voltando pra casa. 

Mas ainda há perigo. Ninguém quer sair do abrigo.

– O que fazer?

Damião, o corajoso massagista, acende a tocha…

Pouco depois a casa de marimbondos fumega no chão.

Alivio geral.  

É O FIM DA PICADA!

Mas será que ainda vai ter jogo?

O FALECIDO BIRA BURRO E DADÁ MARAVILHA: NOS TEMPOS DO FUTEBOL IRREVERENTE

Por Pedro Tomaz de Oliveira Neto


Essa semana fez um ano que o futebol brasileiro perdeu um de seus grandes personagens. Em 14 de setembro de 2020, morria Ubiratã Silva do Espírito Santo, o Bira Burro.

Antes de mais nada, vale ressaltar que de burro este macapaense não tinha nada. O apelido surgiu quando Bira decidiu se transferir para o Internacional de Porto Alegre. A opção foi classificada por muitos como burrice, já que o clube da Beira-Rio passava por uma forte crise e havia um suposto interesse pelo seu passe por parte do Flamengo de Zico, Adílio e Carpegiani, que começava a despontar para uma era de glórias.

O fato é que a “burrice” de Bira lhe rendeu o título de campeão brasileiro em 1979 e a admiração eterna do torcedor colorado pelo seu futebol. No Inter, não chegou a fazer muitos gols, mas foi peça fundamental no esquema do técnico Ênio Andrade, com boas assistências e fazendo o pivô para a chegada em condições de concluir de Falcão, Jair e Cia.

Além de goleador, Bira também era um marqueteiro. Espirituoso, sempre dava asa àquela rivalidade sadia entre jogadores e torcidas. E quando do lado do maior adversário tinha um especialista em marketing de si como Dadá Maravilha, o futebol se tornava mais interessante, delicioso, alegre e festivo.


Antes de Bira se mudar para o Sul, ambos se confrontaram num dos mais disputados clássicos do Brasil, Remo e Paysandu, o RE-PA. Dadá passou a semana provocando e prometendo o gol Sossega Leão, numa referência ao mascote do Remo. Sem deixar barato, Bira, que ainda não era “burro”, garantia fazer outro gol como resposta a cada gol do consagrado e fanfarrão artilheiro, além de lhe aprontar uma boa surpresa.

No domingo, o Mangueirão lotado foi palco de um jogaço de bola, com os dois artilheiros sendo o centro das atenções. Ao abrir o placar, ainda no primeiro tempo, Bira protagonizou uma das comemorações mais originais e inusitadas do futebol brasileiro. Ensandecido com o seu gol, escapou dos abraços dos companheiros e saiu na disparada até o meio de campo ao encontro de Dadá para festejar pendurado em seu colo. Era a anunciada surpresa do artilheiro azulino. No segundo tempo, Dario empatou para o Paysandu, sossegando o Leão tal como prometido e devolvendo a comemoração ao se jogar nos braços de Bira, sob aplausos das torcidas rivais, já confraternizadas num armistício que durou até o apito final do clássico.

Diante de tanta irreverência e naturalidade, desta saudável disputa nascia uma grande amizade, que seguiu firme e forte até a partida de Bira para o andar de cima.

PASTA DE PAPELÃO

por Claudio Lovato Filho


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– O que ele tem?

– Não sei. Faz dois dias que está lá no quarto, agarrado naquela pasta de papelão. Não quer sair pra nada. Perguntei se ele estava sentindo alguma coisa, se queria ir ao médico, mas ele disse que não, você conhece o seu irmão.

– À noite eu passo aí.

– Obrigada, querido!

Desligaram.

Ele ficou pensando no irmão, seu irmão mais velho, trancado no quarto.

À noite, depois de cumprimentar a cunhada, ele avançou pelo corredor do apartamento, e, lá no fim, deu duas batidas na porta do quarto do casal.

– Chico, posso entrar?

Ele não ouviu resposta.

Deu mais uma batida e foi entrando devagar.

– Oi, garoto! – disse o irmão mais velho enquanto se erguia e sentava na beirada da cama.

O irmão mais novo viu a velha pasta de papelão verde com elástico preto nas extremidades em cima da cama.

– Está tudo bem? – ele perguntou ao irmão mais velho.

O irmão mais velho ficou olhando para ele sem dizer nada.

O irmão mais novo sabia o que havia na pasta. Algumas vezes haviam passeado juntos pelo seu conteúdo. Eram reportagens sobre a carreira do irmão mais velho, ex-meio-campo com passagens vitoriosas por alguns dos maiores clubes do país. Havia também fotos presenteadas por um grande fotógrafo esportivo de quem ele se tornara amigo. As lembranças da carreira do irmão mais velho estavam espalhadas pela casa – em algumas caixas, em um armário, no computador –, mas aquela velha pasta de papelão continha a nata das memórias, uma seleta do que aconteceu de mais importante, registros de alto poder simbólico que abarcavam toda sua trajetória, desde os tempos em que, ainda adolescente, fora promovido a profissional no clube que jamais deixou de ser seu clube do coração até a despedida do futebol em outro grande clube pelo qual, já veterano, conquistara um campeonato nacional.

O irmão mais novo se sentou ao lado do mais velho na beirada da cama. 

– Aconteceu alguma coisa?

Passou-se algum tempo até que o irmão mais velho respondesse.

– Nada. Não aconteceu nada. Esse é o problema. Nunca acontece nada. Nunca mais aconteceu nada. 

– Não diz isso, Chico! Quanta coisa boa tem na sua vida!

O mais velho não disse nada por algum tempo. E então:

– Agora dei para começar a ficar nervoso quando o telefone toca, quando chamam no interfone, até quando chega uma mensagem… Caraca! 

Ficaram mais um tempo quietos no quarto iluminado apenas pela claridade que vinha da rua.

– Quer sair pra conversar? Vamos dar uma passada lá no bar do Bento? 

– Não, não estou pra isso, vou ficar na minha! – disse o mais velho com um meio sorriso. 

– Estou na boa, pode ir tranquilo.

– Então vamos ver o jogo juntos amanhã. Vai lá pra casa!

– Pode ser. Amanhã a gente combina.

O irmão mais novo se levantou apoiando uma das mãos no ombro do outro.

– Tá bom. Estou indo. Fica bem. Valeu? 

Quando estava abrindo a porta, ouviu a voz do irmão mais velho às costas. 

– Toma. Leva isto com você. 

Ele se virou e olhou para a pasta nas mãos do irmão mais velho.

– Por quê?

– Leva com você e faz o que quiser com o que tem aí.

– Isso é seu, é importante pra você.

– Pega!

Ele pegou a pasta e foi embora.

No carro, antes de dar a partida, colocou a pasta no colo e a abriu. Mais uma vez, conforme folheava as páginas de jornais e revistas, as impressões de matérias de sites e blogs em papel A4 e as fotos, ele pensou, orgulhoso, no sucesso que o irmão conseguira fazer.

Encontrou uma reportagem feita quando o irmão já era veterano, mas ainda jogava em alto nível, e que incluía uma foto de arquivo, já bastante antiga à época, em que apareciam, lado a lado, o irmão mais velho, no começo da carreira, e ele, o mais novo, então uma criança, ambos com o uniforme completo do clube. A matéria, de duas páginas, que agora lhe chamava a atenção de um jeito diferente, incluía uma entrevista em formato de perguntas e respostas. O último questionamento se referia ao período pós-carreira.

“Você já pensou no que gostaria de fazer depois que parar de jogar?”

E a resposta dele:

“Sinceramente, não penso nisso. Vou deixar para pensar quando chegar a hora. Mas ainda vai demorar! (risos)”

Ele fechou a pasta pensando no irmão mais velho, em tudo o que o irmão fez, tentando imaginar o que estava por vir.

“Um dia de cada vez”, ele pensou. “Um passo depois do outro”.

Então ligou o rádio no volume mais alto que podia tolerar e arrancou.

Enquanto isso, lá em cima, no apartamento, o irmão mais velho virava-se de lado na cama e pegava no sono, em paz (a paz possível), como há tempos não conseguia.