Escolha uma Página

A COPA DA INTOLERÂNCIA

por Idel Halfen

O processo de escolha das sedes para a Copa do Mundo costuma levar em consideração uma infinidade de variáveis, de forma que sejam equacionados os aspectos financeiros e esportivos, todos dentro de um contexto que contribua para o desenvolvimento mundial. Essa é a tese.

Desbravar novos países, ainda que estejam fora do círculo tradicional, ajuda, entre outras coisas, a popularizar o esporte na região, além de mostrá-la ao mundo. Evidentemente, é fundamental que tal decisão não interfira de forma contundente nas demais estruturas que circundem a economia, o esporte e os direitos humanos.

E no Qatar?

Não há como negar a pujança financeira do país, ainda que exista forte desigualdade social. Também não podemos desprezar que, mesmo sem ser uma potência esportiva no futebol, o país realizou grandes investimentos com o intuito de melhorar.

No que tange às condições climáticas, outro grande desafio, optou-se por marcar o evento para um período diferente do usual nesse tipo de competição, objetivando proporcionar temperaturas menos hostis e assim preservar o nível técnico e a saúde dos jogadores.

Trata-se de uma concessão aparentemente salutar quando se foca o espetáculo, mas que também traz reflexos na economia de forma geral, visto que o evento passa a competir com a Black Friday e com o Natal, datas onde as marcas que já concorrem entre si tanto pelo consumo como pela atenção.

A alegação de que o evento ajuda nas vendas faz algum sentido em relação a alguns produtos, embora o consumo destes provavelmente viesse a ocorrer independentemente da Copa.

Outra situação de concessão por parte da organização aconteceu em relação a Budweiser que, mesmo sendo patrocinadora da FIFA, não pode comercializar sua cerveja com álcool por restrições do país.

Claro que um patrocínio dessa magnitude proporciona muitos outros benefícios à marca. A associação ao esporte, a exposição e as ativações são mais do que suficientes para trazer retorno ao investimento, na verdade, a comercialização é o que menos importa nesse caso, porém, sua proibição pode denotar que a FIFA não dá o devido valor aos patrocinadores.

Mas será que em nome da soberania da nação e diante de tanta intolerância, os direitos dos cidadãos devem ser ignorados? Será que deveria ter tal evento no Qatar?
Perguntas difíceis e que sem acesso às negociações ocorridas deixa qualquer resposta com forte grau de “achismo”.

Entretanto, por mais que seja indiscutível o direito de as nações sediarem eventos, há também que se considerar que sendo um evento global, a busca pelo equilíbrio entre as concessões deve reger as negociações, o que não parece ter havido.

A propósito, os próprios critérios de escolha foram bem nebulosos.

DINAMITE E ZICO

por Rubens Lemos

Quando a gente chora, rompe a represa da alma, lágrimas varrendo mazelas frequentes de tristeza e decepções. É um ato de liberdade indomável. Chorar é renovar a vida e a foto de Roberto Dinamite e Zico me deixou, como banho em cachoeira, entregue ao pranto. A ponto de secundarizar, hoje, a Copa do Mundo.

Roberto Dinamite e Zico, Zico e Roberto Dinamite, porque nos dois não existe ordem direta, foram (com o genial Geovani), os ídolos de minha infância.

O menino que mora em mim reapareceu, como nas tardes de domingo a ouvir no velho rádio de pilha as pelejas de Vasco contra Flamengo, Roberto Dinamite e Zico , que nunca foram combatentes de guerra. Lideravam suas bandeiras com talento, amor, exemplo de convivência de irmandade.

Roberto Dinamite, que conheci no Hotel Ducal em 1982 quando a seleção brasileira jogou em Natal pela primeira vez, está com câncer. Lutando. O homem elegante, alto e forte está magrinho ao desbravar a doença diabólica com o ímpeto dos tempos de invasões de defesa e golaços de voleio, que Richarlison imitou contra a Sérvia.

Era Roberto Dinamite, em seu sorriso triste de Quixote resistente, a compensação pelos meus sofrimentos de viver como cigano involuntário, mudando de cidade em cidade pelas limitações impostas ao meu pai, vascaíno e vítima da decisão complicada de sempre priorizar o idealismo, família vindo como consequência.

Os gols de Roberto Dinamite me aliviavam. Nos clássicos contra o Flamengo, a imagem dele e Zico trocando flâmulas, se abraçando, comemorando vitórias com suas torcidas, sem provocar o povo adversário, desnudavam o caráter excepcional dos dois. Passei a amá-los. Roberto Dinamite e Zico formam a dupla dos meus dias, sonhos e do coração.

Juntos, na seleção brasileira, jogaram 26 partidas em tabelinha afinada. Dos 26 jogos, nenhuma derrota a se lamentar, porque Roberto Dinamite e Zico, Zico e Roberto Dinamite, formavam uma dupla estupenda, que a cegueira dos técnicos Cláudio Coutinho, que barrou Zico em 1978 e Telê Santana, que humilhou Roberto Dinamite em 1982, impediu o mundo de aplaudir.

Nunca mais existirão Zicos e Robertos, Robertos e Zico no mercenarismo dominante do futebol. Eles são amigos, jamais rivais. Adversários pelas contingências da bola, não para ocupar microfones, um acusando o outro.

Zico, de surpresa, transformou seu programa no Youtube em festa de aniversário de Roberto Dinamite, há cerca de cinco anos. Em forma, trocaram gozações e dividiram a comoção e extravasaram o bem que um sente pelo outro.

Minhas rezas impediram que eles se juntassem no Flamengo. Em 1980, Roberto Dinamite no Barcelona, o rubro-negro chegou a fechar a sua contratação com direito a gol narrado de Zico deixando Roberto Dinamite na cara do goleiro para mata-lo.

O falecido Eurico Miranda nos salvou e Roberto Dinamite voltou ao Vasco, fazendo os cinco gols dos 5×2 no Corinthians em Maracanã com mais de 100 mil pessoas.

O gesto de Zico é a saudade que tenho de vê-lo partir em dribles encantados, cortando à direita e à esquerda em convicção sem radicalismos ideológicos.

A política de Roberto Dinamite e de Zico era a felicidade do povo. A minha, eles garantiram e a gratidão é do tamanho do velho Maracanã, o Maracanã das gerais.

A grandeza de Roberto Dinamite e Zico é a consagração da amizade como templo do bem. Zico sabe que Roberto Dinamite vencerá a sua decisão mais difícil. Com os dois, deixo minhas lágrimas de reverência e idolatria. Que Deus os abençoe. Ilumine e amém.

descaso com a vitória

por Zé Mário Barros

Observando os jogos dessa Copa, descobri que os jogadores atuais não têm nenhum compromisso com a vitória. Nenhum compromisso em mudar o jogo. Nenhum compromisso em fazer gol.

É um toque para um lado, um toque para o outro lado. Quando apertados, tocam para os zagueiros, que, se também apertados, jogam para o goleiro que, se pressionados, dão um balão. Caso ninguém vá acossar o goleiro, aí ele domina a bola e toca para um zagueiro, recebe de volta e toca para o outro zagueiro e o Analista de Desempenho chega ao orgasmo quando apresenta os números do jogo do time dele:

Posse de bola: 75%
Passes: 600 contra 200 do adversário.
Chutes a gol: 4
Chutes a gol do adversário: 9
Resultado: 0X0.

Gostaria de saber em que setor do campo o time deu 600 toques na bola. Tocar a bola no espaço vazio até o Ganso está jogando e seria titular em qualquer dessas seleções. De repente até eu conseguiria jogar. Me apertando, jogo para o goleiro e digo que é segurança de posse de bola.
A Espanha enrolou a Alemanha e se enrolou também. Tocam sem tesão para fazer o gol.

Sou saudosista mesmo. Sou do tempo em que quando o jogo estava ruim, a gente, no Flamengo de 1972, jogava no PC Caju e ele resolvia. No Fla de 74, era jogar no Zico. No Santos, jogava para o Pelé. No Fluminense de 75, jogávamos no Rivelino. No Botafogo, Garrincha. Na Argentina, Maradona gritava pedindo a bola que ele resolvia.

É, estou idoso mesmo. O futebol mudou. O futebol brochou junto com a minha idade. Messi, Neymar e Cristiano Ronaldo, brocharam também e nem têm a minha idade.

Que sejam felizes os torcedores de hoje com o futebol atual.

Feliz daquele que é saudosista de uma geração de Pelé, Garrincha, Didi, Nilton Santos, Amarildo, Félix, Platini, Cruiff, Paulo Cesar Caju, Ademir da Guia, Dirceu Lopes, Rivelino, Zico, Leandro, Júnior Capacete, Roberto Dinamite, Zanatta, Dé, Enéas, Leão, Liminha, Marco Antônio, Beckenbauer, Doval, Reyes.

Vou parar por aqui porque tenho mais 500 na cabeça.

Façam bom proveito desse Futebol Moderno.

A COPA DA ZEBRA

:::::::: por Paulo Cézar Caju :::::::::

Demorou, mas finalmente entrei no clima da Copa do Mundo! Convenhamos que o torneio cai de nível a cada edição, mas me divirto até vendo a seleção do Catar! Não perco nadinha do maior torneio do planeta!

Nesse início, adorei que a zebra andou passeando por aí e é bom as seleções consideradas grandes abrirem o olho para não serem surpreendidas nas próximas fases. O Japão, por exemplo, ganhou da poderosa Alemanha e perdeu para a modesta Costa Rica, que tomou de sete da Espanha. Como explicar?

Por falar na Espanha, não é de hoje que tenho elogiado a equipe treinada por Luis Henrique. Com um toque de bola de pé em pé, tem conseguido envolver os adversários e surge como uma das grandes favoritas para levantar a taça mais cobiçada do mundo. Mesmo desfalcada, a França se apresenta como uma das grandes favoritas ao título!

A Argentina tomou uma virada histórica da Arábia Saudita, se recuperou contra o México na genialidade de Messi, mas não acredito que chegue longe na competição. O Marrocos conseguiu segurar o empate diante da Croácia e venceu a Bélgica por 2 a 0. A mesma Bélgica que eliminou o Brasil na última edição!

Por falar em Brasil, não gostei nada dos dos primeiros jogos. Tudo bem que estamos classificados, mas é um time sem alma, que teve muita dificuldade com duas seleções do baixo escalão da Europa. Se mantiver esse nível, dificilmente chegará à decisão!

Fato é que a Copa do Mundo tem se tornado cada vez mais desinteressante e, em 2026, quando Canadá, Estados Unidos e México vão sediar, a expectativa é que os dirigentes da FIFA enriqueçam ainda mais!

Pérolas da semana:

“Quebrou a primeira linha de marcação e entrou por dentro na diagonal para encaixar suas ideias pragmáticas com consistência e intensidade, tendo leitura de jogo e imposição física”.

“Roubou a primeira bola e aproveitou o embate pegado para atacar a segunda bola, desenrolar uma montanha russa e na disputa por espaço subir a parede na vertical do setor encaixado”.

JOGAR UMA COPA DO MUNDO

por Serginho 5Bocas

O jogo é bruto! Assim Teixeira Heizer definiu com muita propriedade a maior competição esportiva do mundo. Lá é terra de brabos, não há espaço para choro nem vela, é lugar onde David surra Golias toda hora, é sorriso e choro ao mesmo tempo, só que de lados contrários.

Ser o mais técnico ou ter o melhor elenco, não significa ser campeão da Copa do Mundo. É um bom começo, mas não garante sucesso no fim, a história do futebol e principalmente das Copas, nos ensinou ao longo do tempo, que lá é terreno dos fortes.

Jogadores limitados crescem de tamanho, grandes craques se apagam e equipes pequenas dão trote e pregam grandes surpresas nas grandes e assim enriquecem o folclore desta competição emocionante e apaixonante.

Jogar uma Copa do Mundo é um sonho. Tem muita gente boa que nunca jogou e queriam ter jogado: Di Stefano, George Best, Dirceu Lopes, George Weah, Ryan Giggs, Halland entre outros, estão aí para comprovar a tese, que pena!

Jogar uma Copa do Mundo é sonho de menino e é difícil para qualquer jogador de futebol do planeta, pois implica em se manter em alto nível por um período que pode chegar a 4 anos e ser superior aos seus concorrentes.

Jogar mais de uma então? A cada Copa que o jogador participa, significa que esteve voando por mais 4 anos. Assim, jogadores que jogaram muitas Copas são exceções de qualidade.

O primeiro jogador que ouvi falar, que havia jogado muitas Copas, foi Antonio Carbajal, goleiro do México, que jogou da Copa de 1950 até a de 1966, um fenômeno com cinco participações

Por aqui, Castilho, Djalma Santos, Nilton Santos e Pelé, jogaram quatro vezes e foram os primeiros a se manter em nível alto por tanto tempo. Pelé foi um jogador de exceção, pois apesar de se machucar, conseguiu jogar partidas e fazer gols em todas elas. Jogou a sua última aos 29 anos, em seu apogeu e poderia facilmente, se quisesse, ter jogado mais uma em 1974, com 33 anos, mas preferiu sair por cima, como um rei.

O Alemão Lothar Mathaus repetiu o feito e jogou cinco edições, como Carbajal e no período de 1982 até 1998, esteve sempre lá. Esse alemão foi se adaptando e mudando de posição no campo, para ir se qualificando entre os grandes, até porque ser convocado na Alemanha, que sempre foi um bicho papão no futebol mundial, não é para qualquer um, ele não era.

Passadas muitas Copas, observamos que hoje, tem sido mais comum, jogadores atuarem em mais Copas do Mundo do que no passado. A preparação física tem sido fundamental para esse processo de evolução e participação, mas a qualidade técnica também é requisito obrigatório para ser elegível. A questão não é só física, é preciso ser grande, gigante tecnicamente.

Cristiano Ronaldo e Messi são os grandes exemplos emblemáticos desta longevidade, estão jogando a quinta edição em 2022, sem que ninguém em sã consciência, questione suas participações, se quiserem, jogam mais uma, situação impensável alguns anos atrás. Viva a ciência esportiva e suas inovações, tornando nossos ídolos imortais.

Não imagino onde a ciência vai parar, mas como é bom ver esses gênios tendo as suas carreiras prolongadas, possibilitando a gente desfrutar de grandes lances deles por longo prazo.

Fico aqui com meus botões, imaginando se Pelé tivesse a oportunidade de esticar sua carreira? Talvez tivéssemos a oportunidade e o prazer de vê-lo jogar a Copa de 1978, aos 37 anos, a sua sexta, junto aos jovens Zico, Reinaldo, Cerezo, Roberto, Gil, Oscar, Edinho, entre outros, que vinham pedindo passagem e debutando na competição, que coisa linda ia ser!

Forte abraço!