GABIGOL É CAMISA 10!
por Elso Venâncio

Gabriel Barbosa, o Gabigol, tornou-se o grande ídolo do Flamengo. Figura popular, carismática, parece um torcedor no meio dos craques em campo. Isso mesmo, há uma espécie de elo entre os dois. A torcida joga com ele e Gabigol torce com a galera. Lembrando as conquistas, a importância e o peso que tem, superou gigantes – como Romário e Bebeto, citando apenas dois – e caminha para se aproximar dos maiores.
O goleador tem somente 26 anos, joga no clube há apenas quatro temporadas e vem quebrando recordes. Artilheiro dos dois últimos Brasileiros e da recente edição da Libertadores, o homem não para!
Ele se supera em jogos importantes, sendo absolutamente decisivo nas finais. Contra o Corinthians, adversário que na final da Copa do Brasil esteve perto de vencer no tempo normal, houve uma cena histórica no Maracanã. Decisão nos pênaltis, o centroavante caminha lentamente para fazer a cobrança, mira a arquibancada nervosa, ameaça erguer os braços e, então, seus olhos suplicam:
– Calma, galera! Vamos chegar lá!
Gabigol não gosta de ser poupado. Sem essa de entrar na conversa dos técnicos, que alegam o lado científico tentando demonstrar que são professores. O Santos de Pelé serve de exemplo: apresentava-se mundo afora a cada três dias numa época em que o futebol era muito violento e sequer havia cartões.
Na festa pelo título, no Centro do Rio, Gabi provocou os adversários ao vibrar como um torcedor apaixonado:
– Tite, eu já jogo numa seleção…
Outra dele:
– Enquanto uns comemoram por sair da série B, outros vibram com o tri da Libertadores…
Merecidamente, Gabigol herdou a mítica camisa 10 de Zico. Aliás, quando voltou da Europa, aos 21 anos, vestiu no Santos a 10 de Pelé. Arrascaeta ou Everton Ribeiro poderiam vestir essa camisa até porque, anteriormente, ao goleador cabia honrar a 9 – segundo Waldir Amaral, “camisa que tem cheiro de gol”. Naquela época, o craque do time, se jogasse do meio para a frente, usava a 10.
Hoje em dia vestir de 1 a 11 não indica mais quem é titular ou não. Cada jogador tem seu número de preferência, que vai do 1 e passa do 40, 50, um negócio sem pé nem cabeça. Mas Gabigol foi o escolhido para usar a 10 porque é alguém que se posiciona, se comunica, ao contrário da estrela uruguaia e de Everton, que são tímidos.
Antes da homenagem, Gabi avisou:
– Vou pedir autorização ao Zico.
Mesmo tendo limitações (perna direita, dribles e cabeçadas), como não sentir essa energia que ele passa em campo, além das festas que comanda no gramado após as vitórias e títulos, regendo e empolgando a ‘Nação’ no Maracanã?
Um paulista que virou carioca da gema. E rubro-negro de coração!
COPA DESCARACTERIZADA
::::::: por Paulo Cézar Caju ::::::::

A Copa do Mundo começou, mas confesso que ainda não me acostumei com o fato de ser no fim do ano. Na verdade, o que eu nunca vou conseguir me acostumar – e muito menos aceitar – é o preconceito e a violação dos direitos humanos. Como o próprio nome diz, a Copa do Mundo é um evento mundial, que reúne diversas culturas e resulta em uma linda festa. Na atual edição, no entanto, predomina um clima sombrio, com liberdade restrita, sobretudo das mulheres.
Recentemente, foi notícia pelo mundo inteiro a morte de Mahsa Amini, de 22 anos, espancada brutalmente após ser abordada pela polícia moral do Irã por não estar usando seu véu de maneira adequada. Já falei aqui na coluna algumas vezes que não achei uma boa escolha o Catar sediar o Mundial e só agora a ficha e as máscaras estão caindo. Respeito qualquer cultura, mas não dá para aceitar criminalizar a homossexualidade, por exemplo.
Se já não fosse o bastante, li que o Catar gastou mais de US$ 229 bilhões para sediar a Copa do Mundo 2022. Para se ter uma noção dos valores, a Rússia gastou US$ 11,6 bilhões em 2018, o Brasil US$ 15 bilhões em 2014 e a África do Sul US$ 3,6 bilhões quatro anos antes. A impressão é que a FIFA está interessada somente em encher o bolso dos dirigentes e fiquei indignado ao saber que milhares de trabalhadores imigrantes morreram durante as obras para o Mundial por estarem submetidos à condições desumanas. Sabe qual é o pior? Os jogadores, donos do espetáculo, no centro dos holofotes, não se manifestam, não opinam, não fazem nada para mudar essa cultura desprezível da maior entidade do futebol mundial. Lamentável!
Sobre a competição em si, confesso que esperava outra postura do Catar diante do Equador. Parece que foi o primeiro anfitrião na história a perder na estreia da Copa do Mundo. O Brasil estreia na quinta e não pensem que será um jogo fácil contra a Sérvia. Aliás, nem contra a Sérvia, nem contra a Suíça, que jogam um futebol defensivo, agressivo e preparado. Vale destacar que o jogo de estreia é importantíssimo para adquirir confiança, ainda mais que nosso plantel reúne diversos jogadores jovens, que nunca participaram do maior torneio do planeta! Ao contrário do que muitos pensam, estou na torcida pelo Hexa!
Pérolas da semana:
“Medir a altura das linhas para chegar com intensidade no último terço do campo, antes da subida da linha de três ou da descida da linha de 4”.
“Com a perna invertida, o jogador de beirinha faz a diagonal por dentro e ativa o conceito de jogar para dar uma identidade ao time com consistência, chamar a marcação e centralizar o time propositivo”.
MELHOR DO MUNDO
por Rubens Lemos

Aos gritos de “fica, fica, fica!”, Pelé dava a volta olímpica com o gramado do Maracanã cercado de meninos uniformizados em trajes dos maiores clubes nacionais. Pelé, nu da cintura para cima, chorava e simbolizava o fim de uma era: a do país melhor do mundo no futebol. O Brasil foi número 1 enquanto seu camisa 10 reinou por 14 anos no escrete.
A tarde do empate por 2×2 com a Iugoslávia, a 18 de julho de 1971, diante de 138.573 pagantes no estádio, sinalizou para o futuro da seleção como de elite, mas sem soberania. Pelé saiu para a entrada do gorducho Claudiomiro, paradoxo monumental a escrever em letras de vento: o retrato passava a ser o do substituto. O jogo terminou em 2×2.
O ufanismo do regime de exceção impunha o futebol como válvula de escape para a efervescente e dolorosa conjuntura política sem democracia, portanto Pelé desagradou e muito o Regime Militar, tanto que o General Presidente Garrastazu Médici, contrariado com a saída do principal item do cardápio da propaganda popular, faltou, contrariado, ao jogo contra os iugoslavos.
É maldade com os garotos de agora, os que enchem bancas de revistas em busca de figurinhas para álbuns da Copa do Qatar, insistir que o Brasil pratica o futebol mais bonito ou insuperável do planeta. Mentira. Fraude.
Com Pelé, que estreou aos 16 anos na derrota de 2×1 para a Argentina, gol dele, a 7 de julho de 1957 também no Maracanã, o Brasil ganhou três dos cinco mundiais conquistados. Pelé jogou quatro e estava nos três títulos, fulgurante em 1958 e 1970 e contundido no segundo jogo de 1962. Em 1966, Pelé caçado e, em controversa final com os alemães, os ingleses foram únicos a ganhar com o Rei em atividade.
Depois da volta olímpica de Pelé, o torniquete foi apertando. O Brasil ganhou duas Copas. Em 1994 e 2002. A Alemanha, papou três: 1974, 1990 e 2014. A Itália, duas: 1982 e 2006.
A Argentina, também dois canecos: o de 1978, vergonhoso, escandalosamente corrupto no suborno aos peruanos que abriram as pernas aos albicelestes que precisavam de 6×0, conseguiram e fariam 16 se fosse necessário.
Em 1986, a Argentina se redimiu à humanidade e ao esporte apresentando o semideus Maradona em desempenho impecável, driblando e abrindo clareiras com seu pé canhoto, gols dignos da pena de Jorge Luís Borges, o maior escritor portenho.
Emergente, a França conquistou sua primeira taça em casa em 1998, naquela lambança provocada pela convulsão de Ronaldo Fenômeno e pelo apagão psicológico do time de Zagallo, massacrado por Zidane num 3×0 de fechar a conta, sem direito a despedida.
Em 2018, deu França de novo. A Marselhesa tocava, também, pela segunda vez. Comandada pelo enjoado craque Mbappé, impressionante pela técnica veloz ou pela rapidez habilidosa.
A Espanha do lindíssimo tike-taka, o toque de bola envolvente e digno da arte brasileira dos anos dourados de Didi, Gerson, Rivelino, Zizinho, Zico, Falcão e Sócrates, impôs um ciclo lindo em 2010, pondo os adversários no ridículo, em roda de bobo, nos toques rápidos e deslocamentos de atordoar. Pena que fracassou feio quatro anos depois, time envelhecido e pedante.
A importância de Pelé é incontestável. Nada será igual a Ele. O Rei será Ele enquanto vida existir sobre a terra, embora sua natureza seja da amplidão divina. De carne é o Edson. De fascinação, é Pelé.
O Brasil, tendo Pelé, esmagou a França em 1958 por 5×2, a Suécia por igual escore, humilhou a Inglaterra, o Uruguai e a Itália em 1970. Sem ele, quase não vence o Zaire em 1974. Sem Pelé, qualquer concorrente requer os cuidados que ele pulverizava aos dribles e gols de placa.
O Brasil, ao contrário do que possa parecer, não deve desanimar. Tem um bom time. E a chance, maior que a dos últimos três torneios, no mínimo, de tentar, ao menos, se igualar aos alemães na liderança do grupo coeso e coerente dos campeões sem superioridade incontestável.
E A COPA PERDE OUTRO GRANDE ARTILHEIRO
por Zé Roberto Padilha

Quando a gente lembra que o vírus europeu, que infectou o técnico Tite, e o fez abrir mão do Gabigol em prol de um opaco Gabriel Martinelli, apenas por este jogar no Arsenal, eis que outro treinador é infectado: Lionel Scaloni, da Argentina.
Ao perder dois dos seus quatro atacantes, Joaquim Corrêa e González, cortados por contusão, ele chamou Angel Corrêa e Thiago Almada (Atlético de Madrid) para os seus lugares.
Será que o técnico Lionel Scaloni já ouviu falar em Germán Cano?
Se o gol é o grande momento do futebol, como Brasil e Argentina podem privar o mundo da presença dos seus maiores goleadores jogando uma Copa do Mundo?
KATINHA, O PONTINHA QUE DANÇAVA O BOLE BOLE COM A BOLA
por Eduardo Lamas
“Katinha, que dança é essa que o corpo fica todo mole…”. A paródia de “Dança do Bole Bole”, de João Roberto Kelly, gruda na cabeça já no caminho a pé pelas ruas de Itaguaçu até Coqueiros rumo ao Clube do Bola. Não me é lá muito agradável, embora já tenham se passado quatro décadas desde que aquele pontinha veloz e habilidoso entrou no segundo tempo de um Clássico dos Milhões para dar uma vitória retumbante ao Vasco da Gama sobre o meu Flamengo. Ninguém o conhecia até então no Rio de Janeiro. E aqueles 4 a 2 para os cruzmaltinos, em 1979, com brilho também do ídolo Roberto Dinamite, foram marcantes para a carreira do então jovem jogador catarinense.
Hoje, o senhor muito simpático de 64 anos relembra com um sorriso aquele jogo, cantarolando timidamente a versão da torcida vascaína. Porém, sem se esquecer jamais de outras partidas pelo próprio Vasco, Atlético Paranaense (no tempo em que se escrevia assim), Avaí, Ceará, Fortaleza, Joinville. E, com prazer, relembra o início da sua relação amorosa com a bola e conta como surgiu o apelido, ainda nos juniores do hoje Athletico.

Para minha alegria, ele gentilmente ainda autografou a página do meu caderninho de ingressos onde está colada a entrada de uma partida em que o Vasco saiu derrotado: a primeira da final do Campeonato Brasileiro de 1979, contra o Internacional. O que só prova o seu espírito esportivo e o cavalheirismo que anda tanto em falta nos nossos gramados.