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ANGÚSTIAS DE 76

por Zé Roberto Padilha

As rádios só tocavam Belchior em 76: ” Estava mais angustiado que o goleiro na hora do gol…”.

E era natural que ao colocar a bola na marca da cal para bater o terceiro pênalti da decisão da Taça Guanabara, entre Flamengo X Vasco, diante de 124 mil pagantes, entre eles toda a minha família que chegara de Kombi, de Três Rios, tenha lembrado da música.

E uma imensa vontade de corrigir aquela letra. Pois ninguém fica mais angustiado que o batedor na hora do pênalti. Se o Mazarópi pega, vira herói. Se eu perco, viro o vilão daquela decisão.

Quando ajeitei a bola e levantei a cabeça, cadê o gol? Cabeças da geral se juntaram as cabeças das cadeiras que encaixaram na dos arquibaldos. Só dava para distinguir os filetes brancos das traves.

E o goleiro vascaíno ainda estava de preto, quase um vulto a proteger aquela tela de Djanira que escondia o alvo fininho das redes.

Para complicar ainda mais os refletores eram precários, lâmpadas de Led eram luzes de tempos distantes. Perante tamanha falta de visão só nos restou a súplica, um último desejo ao destino que me jogara até ali: que não errasse a bola. Tão pequena, branca com a marca Drible e inocente à minha frente.

Depois de haver perdido um pênalti em uma preliminar de juvenis, Lula, ponta esquerda titular do Flu e da seleção, me chamou após um treinamento nas Larajeiras e revelou o seu segredo.

Bater forte com o peito do pé e de curva à direita do goleiro, tendo como referência a trave para a bola realizar uma trajetória contraria ao salto do goleiro.

E quando fui bater na bola, Mazarópi, que nos conhecia das divisões de base, se atirou para aquele canto. E uma tia kardecista, que nunca faltou na minha família, percebeu a manobra e em cima da hora virou meu tornozelo para o outro lado.

A bola caprichosamente encontrou as redes do outro canto. Assustado, confuso e aliviado, voltava para o meio campo quando ouvi de passagem o comentário de um Apolinho da Globo: “Quem sabe, sabe!”

Não, ninguém sabe o que passa na cabeça de um cobrador de pênaltis. Em decisões, então, esquece. São tantas alegrias e tristezas que serão definidas por uma cobrança que ela deveria ser mesmo batida pelo presidente do clube. Se machucado, pelo presidente do Conselho Deliberativo.

Se convertemos, com um gol daquele tamanho, nada mais fizemos do que a nossa obrigação. Perdendo, pergunte ao Marquinhos o que ele sentiu quando acertou a trave da Croácia e nos eliminou da Copa do Mundo do Catar.

Certamente, foram angústias vividas em 2022 que nem o Belchior, essa sim uma perda bem maior, estava entre nós para descrever o que passou na cabeça daquele rapaz latino americano, sem parentes importantes e vindo do interior.

Só quem bateu e perdeu sabe do que estou falando.

A propósito, perdemos a decisão e alcancei a proeza, no Flamengo, de ser vice do Vasco. Minhas tias kardecistas não foram escaladas para todas as penalidades.

O FLAMENGO DE TODOS OS TEMPOS

por Luis Filipe Chateaubriand

Se fosse possível escalar um Flamengo de todos os tempos, que time seria este?

No gol, Fillol, o argentino que fazia defesas espetaculares, o homem que tinha boa colocação na meta.

Na lateral direita, Leandro, técnica apuradíssima, futebol de primeira grandeza.

Na zaga central, Aldair, um beque de estilo refinado.

Na quarta zaga, Domingos da Guia, classe e elegância.

Na lateral esquerda, Junior, aliança de capacidade técnica com capacidade física.

Na primeira volância, Carpegiani, toque de bola refinado.

Na segunda volância, Zizinho, um fantástico jogador de bola.

Na meia direita, Zico, o craque do escrete.

Na meia esquerda, Leônidas da Silva, o Diamante Negro.

No ataque primeiro, Evaristo de Macedo, insinuante.

No ataque segundo, Romário, “máquina” de fazer gols.

Fillol; Leandro, Aldair, Domingos da Guia e Junior; Carpegiani, Zizinho, Zico, e Leônidas da Silva; Evaristo de Macedo e Romário.

Eis o Flamengo de todos os tempos!

ONDE ESTÃO OS MAESTROS?

por Elso Venâncio, o “Repórter Elso”

O artista da bola, o driblador, está em extinção no futebol. O último foi Ronaldinho Gaúcho. E os meias? Sim, estes viraram cabeças de área…

Os craques são raros ou foram escravizados por esquemas que freiam os talentos em campo. Onde está o camisa 10, número eternizado pelo Pelé? Zico vestiu a 10 por causa do ‘Rei do Futebol’. Gerson e Rivellino trocaram a 8 pelo mítico número. Roberto Dinamite era 9 e com o tempo passou a honrar a 10.

E quanto aos gols de falta? A culpa é da bola, hoje mais pesada? Não, é falta de treino, de dedicação.

E os maestros? A bola passava pelo Jair da Rosa Pinto, pelo Zizinho, pelo Didi, depois por Gerson, por Rivellino, por Dirceu Lopes, Ademir da Guia, Junior… Na Copa do Catar o croata Modric me fez lembrar essa turma que controlava e pensava as partidas como poucos fazem hoje em dia.

Há mais de duas décadas o Brasil não vence uma Copa do Mundo. E sem intercâmbio com os europeus seguiremos na mesma. Os clubes não fazem mais amistosos no exterior. Há uma submissão geral com a FIFA, mas quem tem peso mesmo é a UEFA.

O Flamengo está em início de temporada, ao contrário do Real Madrid. Aliás, os espanhóis opinaram até sobre onde será a sede do Mundial de Clubes.

Não vi, mas sei o que representavam Dorval, Mengálvio, Coutinho, Pelé e Pepe para o futebol brasileiro e internacional. E o ataque do Botafogo? Garrincha, Didi, Quarentinha, Amarildo e Zagallo… Que times!

Santos e Botafogo decidiram um Campeonato Brasileiro quando a competição ainda se chamava ‘Copa Brasil’. No Pacaembu, Santos 4 a 3. No Maracanã, Botafogo 3 a 1. No ‘tira-teima’, com o Santos concordando em jogar no Maracanã, dois gols de Pelé e vitória de goleada: 5 a 0. Ou seja, 16 gols em três partidas. Os técnicos não conviviam com o fantasma de perder o emprego e jogavam o tempo todo no ataque. O futebol brasileiro dava espetáculo e era admirado e temido por todo o planeta.

Na decisão do Mundial de Clubes, em 1962, o Santos enfrentou o Benfica, do craque Eusébio, time bicampeão europeu e que vinha de uma maiúscula vitória por 5 a 3 contra o sempre forte Real Madrid. No Maracanã, Santos 3 a 2. No Estádio da Luz, em Lisboa, nova vitória: 5 a 2, com direito a três de Pelé.

Um ano depois o ‘Peixe’ se tornou o primeiro clube brasileiro bicampeão do mundo ao derrotar o Milan na finalíssima. No Maracanã, 1 a 0 – mesmo sem o ‘Rei’, que estava contundido.

Bom, o tempo se passou e hoje nem discutimos esses fatos. Afinal, faz muito tempo que deixamos de jogar o melhor futebol do mundo.

DESCASO COM A GAROTADA

::::::: por Paulo Cézar Caju :::::::

Início de ano é uma excelente oportunidade para assistir à garotada no torneio mais tradicional do futebol de base: a Copa São Paulo de Futebol Júnior. É inegável que trata-se de uma excelente vitrine para os garotos, visto que os jogos têm transmissão para o Brasil inteiro. Perdi as contas de quantos jovens arrebentaram na competição e logo foram alçados para o time profissional, se destacando no mesmo ano.

Dito isso, é inadmissível o estado do gramado da grande maioria dos jogos. É um crime o que estão fazendo com essa garotada, colocando a integridade física deles em risco, com campos esburacados, lama, poças, areia, grama alta, capim e por aí vai. Quantas vezes já bati na tecla que é preciso investir na nossa base? Não tem mistério, é de lá que vão sair nossos futuros craques! E claro que esse investimento vale não só para os clubes, mas também para a federação. A não ser que seja do interesse deles ficar mais 20 anos sem levantar uma taça da Copa do Mundo! Kkkkk!

Temos que aplaudir esses meninos de pé por conseguirem praticar esse esporte em meio a esses pastos que são obrigados a jogar. O pior é que todo ano essa reclamação vem à tona e os dirigentes não fazem esforço algum para propor melhorias. O interesse deles está somente em colocar as joias em campo para vender o quanto antes para um clube europeu por cifras milionárias. O que eles não sabem é que, com gramados melhores, novos craques poderiam despertar o interesse das potências mundiais. A matemática é simples!

Agora, se os campos estão nesse estado, tenho até medo de imaginar como devem ser as acomodações. Vale destacar que Flamengo, Corinthians, Vasco, Fluminense, Grêmio e São Paulo já deram adeus ao torneio e estou na torcida para que uma das zebras levante o caneco.

No mais, os Estaduais começaram e é impressionante como pouco se fala da competição. Que saudade dos tempos em que o Carioca era o torneio mais charmoso, que Francisco Horta agitava trocas de jogadores para tornar ainda mais competitivo, que a Geral bombava e por aí vai! Éramos felizes demais e sabíamos!

Essa história de poupar os jogadores eu nunca vou entender, e considero uma grande falta de consideração com a torcida. O Vasco, por exemplo, empatou em 0 a 0, assim como o Palmeiras. O Botafogo perdeu para o Audax e o Corinthians para o Bragantino. Certo está o Fernando Diniz, que entrou com força máxima no sábado e tem dado a devida importância ao Carioca!

Pérolas da semana:

“A ligação direta por dentro tem dado consistência e intensidade para o time amassar o adversário e ter uma leitura de jogo que faça o falso 9 espetar a linha de 5 e chapar na orelha da bola”

“Com uma linha baixa em transgressão, o time aciona o atacante agudo no último terço do campo, que tira o zagueiro para dançar e esconde o movimento do chute. Dessa forma, consegue dar dinâmica de jogo, quebrando a intensidade do adversário e tornando o time reativo”.

Esses analistas de computadores seguem enchendo a nossa paciência! Até quando?

ROBERTO DINAMITE

por Paulo-Roberto Andel

Dois de fevereiro de 1989. Vencíamos por 1 a 0, com um gol estranho de Donizete. Jogo duro, decisão de vaga para as semifinais da Copa União. De repente, a bola veio para o meio e Roberto deu um toque de primeira, por cobertura, um passe espetacular para Bismarck, que acertou um chutaço no canto esquerdo, de primeira. Um golaço. Eles empataram. E então eu me dei conta de que estava presente a um dos maiores jogos da história do Maracanã. No fim, o Flu na venceu numa noite fantástica, com prorrogação e golaço do saudoso Washington.

Outro jogaço, Fluminense 3 a 2 Vasco, 1981, Flu vencedor e Vasco classificado. As duas torcidas aplaudindo o fim do jogo, algo que só vi de novo no Fla x Flu do gol de barriga e, desde então, nunca mais.

Esse foi só um pedacinho do que era Roberto Dinamite, certamente o mais difícil jogador adversário que vi o Fluminense enfrentar. Fazia gol de todos os jeitos, chutando, cabeceando, batendo faltas. Quando dava o corte para a direita antes do chute, babau.

Um dos maiores artilheiros de todos os tempos, Roberto sempre representou um escudo do Vasco que anda. Nós todos, garotos cariocas do começo dos anos 1980 que não éramos vascaínos, o queríamos nos nossos times. E não era só dentro de campo.

Era muito difícil não vê-lo sorrindo. Mantinha sempre o mesmo tom de voz, calmo, tranquilo.

Num tempo em que as pessoas só podiam ver futebol indo ao estádio, eu era um garoto apaixonado por futebol e dei sorte: vi vários gols de Roberto contra outras equipes que não fossem o Fluminense. Vi os cinco contra o Corinthians, os dois contra o Flamengo na primeira partida da final de 1981.

Sua história é tão grande que não cabe num texto e sequer num livro ou filme. Precisa de vários.

Há muitos anos, num aniversário de meu amigo Leo, chegou ninguém menos do que Ademir Menezes, seu tio-avô se não me engano. Lembro que ele parecia gigantesco quando apertei sua mão. Ademir, o maior ídolo vascaíno até a chegada de Roberto, fez história no Fluzão de 1946. Roberto, não. Tudo bem: não se pode ganhar todas.

Neste momento penso no Augusto, no Cassiano, no Luiz, no saudoso Xuru e em tanta gente da minha juventude que, num minuto, quarenta anos se amontoam em tardes maravilhosas no Maracanã, jogos incríveis, gols espetaculares e aquela velha paixão pelo futebol, algo muito difícil de explicar mas muito fácil de entender se você conhece ou conheceu o futebol carioca dos anos 1970 e 1980.

Ao mais temível dos adversários, um abraço para sempre, onde quer que esteja além dos nossos corações.

@pauloandel