CHOREMOS POR NEYMAR
por Marcos Fábio Katudjian
Nos últimos dias, surgiu uma polêmica acerca de Neymar. Mais uma.
O narrador chorou ao falar dele. O comentarista rebateu, disse que aquilo era absurdo, ridículo. Se pegaram nas redes sociais. Pilantra pra cá, bebê chorão pra lá.
E, no meio, Neymar.
E a pergunta: quem é Neymar?
Para muitos, um sujeito que não levou a profissão a sério. Mas, para outros que o tiveram perto de si – como Muricy, técnico durão, sem meias palavras –, ele é um dos melhores profissionais com quem já trabalharam.
Difícil saber quem está certo ou errado. O fato é que o “menino Ney” envelheceu. Com 33 anos, está bem próximo da aposentadoria. A questão é saber se ela já não deveria ter acontecido.
Minha opinião? Seu talento é o maior dentre todos os seus contemporâneos. Sim, maior que Lionel e Cristiano. Seu talento é similar ao do maior jogador brasileiro de todos os tempos, Garrincha. (Sim, porque Pelé não se compara com nada.)
Algo que não é só minha opinião, mas um consenso: ele foi muito aquém do que poderia.
Se há algo que justifica o choro do narrador – e o nosso – é isso. Neymar nos desperta algo mais profundo e talvez inconsciente: o fato de ser um símbolo perfeito para o Brasil. O país do futuro, que simplesmente não chegou lá. Nem perto.
Talvez mais doloroso ainda seja perceber que nossos próprios sonhos particulares irrealizados, projetados em Neymar, refletem bem a vida como ela é.
Então é isso. O Brasil tem o craque que merece. E está tudo certo.
Mas, mesmo assim, é triste.
É triste, mas não é o fim. Ainda há futuro. Pequeno, muito menor agora, mas há futuro.
Ainda há vida.
E, se há vida, há esperança – que é a última que morre.
E o choro, quem sabe, talvez seja a emoção necessária para a redenção tardia.
CAMPO DO GRADIM
por Marcos Vinicius Cabral

Na sexta-feira (7), meu coração foi partido em mil pedaços. Continuo aqui, inconsolável, tentando juntar cada pedacinho dele a fim de reconstruir parte a parte do que restou.
O motivo?
Mais cedo passei na BR-101 e olhei uma grande obra no local onde existia o Campo do Gradim, passarela verde por onde pisaram pés habilidosos, verdadeiro point dos boleiros.
Foi neste campo, histórico de São Gonçalo, que uma das mais brilhantes equipes de futebol amador da cidade chamada Jovem Fla conquistou um bicampeão em 2004 e 2005. O primeiro, de forma invicta.
Dentre os dons que Deus me deu, orgulho-me muito de ter jogado futebol. E jogado com os melhores. Se não fui profissional por causa das condições financeiras da família, os joelhos, já combalidos, não me impediram de vestir a camisa 8 do Jovem Fla que todos conheciam pelas cores rubro-negras e talentos dos jogadores.
No entanto, na mais profunda humildade, me orgulho, não tão somente, em ter sido bicampeão, mas em ter conquistado, ao lado de meus companheiros, 39 troféus entre campeonatos e torneios realizados em São Gonçalo.
Resumindo: ganhamos tudo enquanto o Jovem Fla existiu!
O solo gonçalense, rico em produzir talentos das mais diferentes áreas, foi o município escolhido por Deus para que o Jovem Fla existisse. E conseguimos escrever nossos nomes no futebol amador da região.
Por tal motivo, hoje me bateu uma tristeza enorme do tamanho da obra que está sendo realizada naquele local. É menos um campo de futebol e a certeza de que serão talentos não serão observados e, consequentemente, lapidados para chegar a um clube.
Ficam as memórias, as amizades e os troféus que, empoeirados e laureados por teias e mais teias de aranha, estão guardados na casa de Wallace, fundador do Jovem Fla.
Obrigado a cada um de vocês (companheiros do JF) que me ajudaram a construir essa história. Nada apaga. Assim como nada apaga os verdadeiros amigos que a bola me deu.
Nunca foi, não é, e jamais será apenas futebol.
EM VIDA
por Rubens Lemos

Geovani era um esteta do futebol. Dos seus pés saíam versos imaginários para Roberto Dinamite, Romário, Bebeto, Edmundo e todos os artilheiros com os quais dividiu ribalta nas décadas de 1980 e 1990. Geovani pisava macio e elegante. É meu maior ídolo. Somos amigos fraternos há 12 anos e nunca vi qualquer astro do esporte tão simples quanto ele.
Geovani ensinou prazer no ato de criação de meio-campo. Batia de direita com suavidade e com charme, arrematava de esquerda. Um craque com cinco títulos em doze anos de carreira no Vasco. É, historicamente, o melhor armador do clube em todos os tempos, verdade computada em diversas pesquisas em que a eleitora foi a sagrada torcida no seu passionalismo certeiro.
Aos 60 anos, Geovani dribla a cada dia os efeitos de uma polineuropatia, espécie de câncer na coluna que atacou seu corpo humano, mas não lhe tirou a capacidade de lutar no jogo da vida. É uma doença rara e grave, que fragilizou fisicamente o Pequeno Príncipe, designação nobre ao estilo clássico do craque.
Geovani nem queria ser atleta. Nasceu com uma perna quebrada e rejeitou o primeiro convite para testes na Desportiva Ferroviária, seu clube de origem em Vitória(ES). Seu pai, seu Sebastião Conrado, insistiu e colaborou profundamente para a história da bola convencendo o filho a seguir em frente.
Então, Geovani foi jogar no Vasco em 1981, disputa vencida com o Flamengo de Zico, de quem o candidato a herói logo passou a ser chamado de sucessor. Geovani atuava mais recuado, como segundo homem da Academia de Letras do Futebol ali pelos labirintos da meiúca.
Aos 18 anos incompletos, encantando todo o Almirantado do Heroico Português, passou a titular, destronando ídolos como Dudu e Elói, heróis dos saudosos anos oitenta. Geovani fazia do passe uma mensagem romântica e seus lançamentos tinham a precisão de um sniper de guerra. Jamais erravam o alvo.
Um ano depois, o mundo caiu aos seus pés de pluma. O Brasil, com uma geração fantástica, conquistou o campeonato mundial da categoria Sub-20 ao derrotar a Argentina na decisão por 1×0, gol de Geovani, eleito o melhor do mundo na competição e também artilheiro. Estava nascendo o semideus de São Januário.
Mas havia obstáculos domésticos a vencer. Geovani sofreu nas mãos de treinadores que adotavam o futebol-força, de marcação e trombadas, parando no banco e ameaçando ir embora do Vasco, que nunca aceitou vendê-lo.
A grande temporada de Geovani foi a de 1988 quando chegou a craque do ano com o voto decisivo de Zico e a terceiro melhor jogador das Américas, perdendo apenas para Maradona e o uruguaio Ruben Paz. Na vaga de Paz, ele merecia ter ficado.
O capítulo Copa do Mundo foi traumático para o gênio pequenino de andar de comboy. Em 1986, em grande forma, viu a seleção brasileira levar brucutus do naipe de Elzo e Alemão e uma companhia envelhecida remanescente da derrota de 1982.
Pior fez Sebastião Lazaroni em 1990. Quando foi contratado pela CBF, um ano antes, anunciou que seu escrete seria Geovani e “mais dez”. campeão da Copa América em 1989, depois de ter sido o melhor das Olimpíadas de 1988 em Seul, Geovani ficou fora da lista dos 22 convocados para o Mundial da Itália.
Quando estava encerrando sua passagem pelo Vasco, em meados de 1995, Geovani teve tempo de fazer parte do mesmo time de Pedro Paulo de Oliveira, o Pedrinho, ex-jogador de futsal de habilidade desconcertante com a pata canhota. Pedrinho, aos 17 anos, Geovani aos 31, formaram no mesmo time que disputou o Campeonato Brasileiro 30 anos atrás.
Pedrinho foi brilhante, campeão da Libertadores e é um dos ídolos históricos do Vasco. Agora, preside o clube e, na semana passada, homenageou Geovani quando o Vasco enfrentou o Volta Redonda em Cariacica(ES). Geovani, debilitado, resistente e ovacionado. Dois craques. Na bola e na índole. Quer prestar homenagem, que se faça como Pedrinho a Geovani: em vida.
RIVELLINO E A MÁQUINA: 50 ANOS DO SONHO TRICOLOR
por Paulo-Roberto Andel

Há muitos e muitos sábados atrás, completando exatos 50 anos, o Fluminense iniciava construção de seu time mais emblemático: a Máquina Tricolor. E não poderia ser diferente: no sábado de Carnaval de 1975, numa goleada sobre o Corinthians por 4 a 1, diante de mais de 40 mil pagantes e uma legião de penetras.
O Fluminense deitou e rolou em campo. Rivellino esmagou o Corinthians. Zé Mário, outro estreante, fez um partidaço. Mário Sérgio, também em sua primeira atuação pelo Fluminense, cumpriu boa jornada. Aqui falamos de três grandes jogadores, afora os que o clube já possuía como Toninho, Marco Antônio, Cléber, Gil, Zé Roberto, o miolo de zaga com Assis e Silveira, o monumental goleiro Felix e tantos outros que marcariam presença, como Paulo Cezar Caju, Edinho, Rubens Galaxe, Cafuringa e Manfrini. Enfim, uma verdadeira Seleção Brasileira que no ano seguinte teria ainda outras grandes estrelas.
O eterno presidente queria acabar com a alcunha de “timinho” que o Fluminense ganhou em 1951 e que virou página comum, mesmo quando ganhava grandes títulos com jogadores espetaculares. A partir de 1975, não houve como disfarçar: era um timaço-aço-açooooo com narração do ícone rubro-negro Jorge Curi.
Era o início de uma grande era tricolor, com muitos craques em campo, o Maracanã cheio de gente e grandes títulos cariocas e internacionais – por favor, entendam que naquela época o campeonato do Rio era o mais empolgante e famoso do país, mais do que o bagunçado Brasileirão. A Copa do Brasil não existia e ninguém ligava para a Libertadores.
A Máquina chegou a duas semifinais de campeonatos brasileiros, ambas disputadas num único jogo. Em 1975, depois de grande campanha, o Fluminense caiu diante do super time do Inter, um resultado normal. No ano seguinte, o jogo Fluminense x Corinthians já foi tema de livros e filmes. Os idiotas da objetividade tentam colar na Máquina a pecha de fracasso em vão: 50 anos depois, não há tricolor que não conheça as escalações tricolores daqueles dois anos – e 1976 é a temporada com a maior média de público tricolor da história, com mais de 40 mil pagantes por jogo, prova inequívoca do quanto a torcida curtia e aproveitava estar junto do time, vendo verdadeiros espetáculos de futebol.
Nunca mais no futebol brasileiro uma equipe teve tantos craques contratados e campeões mundiais pela Seleção em campo. Já se passou meio século e a força da Máquina continua vivíssima. Há 50 anos, uma Seleção Brasileira entrava em campo vestida com as três cores que colonizaram o futebol brasileiro. Em 2075, Rivellino e sua turma continuarão a ser aplaudidos e homenageados. É que a Máquina é Fluminense demais e, por isso mesmo, como dizia Mestre Nelson Rodrigues, ela tem a vocação da eternidade.
O QUE ERA FEITO TODO DIA, HOJE É PUSKAS
por Zé Roberto Padilha

Logo pela manhã, uma chamada no GE: joia da base do São Paulo faz gol pra concorrer ao Prêmio Puskas. Estava atrasado e levei minha curiosidade para o trabalho. E ela foi aguçada quando um amigo no trabalho foi logo dizendo: “Você viu?”
Seria de bicicleta? Olímpico? Driblou três defensores e deslocou o goleiro? E tome elogios ao Ryan Francisco, o dono do feito, a tal joia da base do São Paulo, que fui ouvindo e colecionando elogios na volta pra casa.
Quando finalmente consegui ver o gol, um sentimento de pena, dó e compaixão nos dominou. Coitados, não assistiram ao Dirceu Lopes jogar. O Romário entrar na grande área e com sutileza, não com espanto, surpresa, dar um toque por baixo diante de um guarda-meta que saía em desespero.
O talento do jogador brasileiro anda tão escasso, que, hoje, um atacante dominar uma bola dentro da área e encobrir o goleiro, algo tão corriqueiro nos pés de Túlio, Assis, Nunes, Roberto Dinamite e torcedores do Flamengo que batem pelada no seu Aterro, já se torna logo um candidato a Prêmio Puskas.
Foi um gol bonito. Mas não de anjo, um verdadeiro gol de placa, quando a galera agradecida assim cantava: Fio Maravilha, que saudades de vocês!