TÁLÁAAAAAAAA!
por Paulo-Roberto Andel

Durante anos, uma das vozes marcantes do futebol brasileiro foi ouvida à meia noite de domingo, quando começava na querida e saudosa TVE a reprise do jogo de domingo no Maracanã.
Uma voz clássica, retumbante, de falas pausadas a cada novo jogador que tocasse na bola. Uma explosão quando havia um lance de perigo para os goleiros. E se o perigo virasse gol sofrido, um segundo de silêncio e uma bomba atômica: TÁLÁAAAAAAAAA! Em seguida, o nome do jogador e, em alguns casos onde o gol havia acontecido numa rebatida na área, cravava: “Numa sinuca maluca!”.
José Cunha, um tremendo locutor esportivo, veio de Minas para o Rio e por aqui ficou. Passou por várias rádios, sentou praça na TV e, fora do futebol, participou do fenômeno popular “O povo na TV”, programa ao vivo na TVS, depois SBT, ao lado de futuros ícones da mídia como Sérgio Mallandro, Wagner Montes, Cristina Rocha, Roberto Jefferson (ele mesmo!), Anna Davies e Wilton Franco.
Cunha foi chefe, mestre e líder de gerações de jornalistas de suas equipes. Muitos profissionais o definiram como uma figura de extrema doçura, generosidade e carisma. Num meio onde vaidades costumam pipocar, ele foi uma unanimidade profissional.
Os garotos de 1979, 1980 e 1981 que escutavam José Cunha nunca mais vão se esquecer dele. A poderosa voz do narrador contou incontáveis partidas recheadas de craques por todo o gramado do inesquecível Maracanã. Com seu TÁLÁAAAAAAA, ele imortalizou grandes lances de Mendonça, Zico, Roberto Dinamite, Edinho, Cláudio Adão e tantas outras feras do futebol daquele tempo de arquibancadas populares, geraldinos ensandecidos e a festa permanente que o Rio desfraldava no maior estádio do mundo.
Sua despedida leva muitos torcedores de agora a se reencontrarem com a juventude, talvez nos melhores momentos de suas vidas. Sua voz é o registro de outro sobre um futebol fascinante, popular e extremamente humano.
Viva José Cunha!
UMA HORA OS MÚSCULOS ARREBENTAM
por Zé Roberto Padilha

Arrascaeta tem sido uma das maiores vitimas das trocas da Comissão Técnica no Flamengo. Mal chegamos ao mês nove e já foram três. Não pelos seus treinadores. Jogando em que lado do campo seja escalado, por portugueses Pereiras ou Souzas, argentinos Sampaolis, tem talento de sobra para resistir à mediocridade.
O problema são dos que cuidam da sua parte fisica. Quando o ano terminou, o camisa 14 levou para as férias um cronograma de repouso e atividades físicas leves para não voltar totalmente fora de forma.
Quando retornou não encontrou mais a planilha dos preparadores físicos do Dorival Jr., encontrou outra, do Vitor Pereira. E vocês sabem, não há no futebol um governo de transição, como na política, que membros de uma gestão fornecem dados àquelas que o sucedem.
Como caem da noite para o dia, Arrascaeta foi submetido aos novos comandantes físicos sem uma planilha com os rumos de sua preparação. Se era para aumentar a carga, diminuir, força ou aprimorar a velocidade. Ou seria a hora da manutenção?
Para piorar, são substituídos. E no meio da temporada seus músculos, púbis e articulações são entregues aos comandados por Sampaoli, que querem mostrar serviços em meio a Libertadores, Copa do Brasil e Campeonato Brasileiro.
Está na hora de respeitar a estrutura física dos nossos jogadores. Suas limitações. Não são máquinas, são seres humanos que precisam que tais limites sejam respeitados. Mesmo quando se trocam os treinadores, é preciso que os músculos cuidados pelos ministros de Bolsonaro sentem para conversar com os ministros de Lula.
Antes da posse. Antes das finais da Copa do Brasil. E se a política nossa, de um escândalo por dia, foi capaz de dar um bom exemplo, por que nosso futebol não conseguiria?
A VERGONHA DO CARIOCA DE 90
por Luis Filipe Chateaubriand

Em 1990, Botafogo x Vasco da Gama era o jogo decisivo do Campeonato Carioca, mas, também, o jogo da polêmica.
Na interpretação do Botafogo, quem vencesse o jogo seria o campeão do certame; havendo empate, prorrogação e, caso necessário, pênaltis.
O lógico.
Mas, na interpretação do Vasco da Gama – leia-se, na interpretação do seu delirante vice-presidente de futebol Eurico Miranda –, o Vasco da Gama garantia o título vencendo ou empatando e, se o Botafogo vencesse, ainda haveria prorrogação e, caso esta terminasse empatada, pênaltis.
O quiproquó estava formado!
Veio o jogo.
O Botafogo venceu por 1 x 0, com gol de Carlos Alberto Dias, já no final da partida.
Como o Botafogo interpretava que a vitória lhe daria o título, os jogadores botafoguenses comemoraram à beira do campo, com direito à taça e tudo!
Como o Vasco da Gama interpretava que a vitória do Botafogo ensejava uma prorrogação, os jogadores vascaínos ficaram dentro do campo, esperando que a prorrogação fosse jogada.
Como o regulamento previa que, passados 30 minutos sem que um dos clubes comparecesse para jogo, o adversário era proclamado vencedor por W.O., decorridos os 30 minutos após o fim do jogo, os vascaínos se proclamaram campeões e, para comemorar o título, pegaram com a torcida, na geral, uma caravela em miniatura, com a qual desfilaram tal fosse uma taça.
Ridículo!
Patético!
Surreal!
O imbróglio todo só foi resolvido nos tribunais e, ali, o razoável prevaleceu.
O Botafogo foi decretado campeão!
Aos vascaínos, como este escriba, só restou o sentimento de imensa vergonha que o vice-presidente de futebol do clube nos fez passar.
“UMA COISA JOGADA COM MÚSICA” – CAPÍTULO 24
por Eduardo Lamas Ne

Em meio à festa após a execução do trecho inicial da ópera “Carmen” por causa do olé de Garrincha no argentino Vairo, adivinha quem aparece? Ele mesmo, Mané Garrincha.
Garrincha: – Ô, seu João, que lembrança boa. Muito obrigado.
João Sem Medo vai abraçar o Mané, levando Ceguinho Torcedor consigo. Sobrenatural de Almeida e Idiota da Objetividade também cumprimentam o grande ídolo. Zé Ary faz reverências ao Anjo Torto e todos o seguem na homenagem.
Garrincha (emocionado): – Obrigado, gente.
Garçom: – Vamos ouvir a continuação da história, que é maravilhosa.
João Sem Medo: – O Estádio Universitário quase veio abaixo com aquele espetáculo tão integrado entre o futebol e a música. O Vairo não foi até o fim do jogo, claro. O técnico do River, meu amigo Minella, o substituiu. O Vairo saiu de campo bem perto do nosso banco e estava sorrindo: “No hay nada que hacer. Imposible”. E ainda gozou com o reserva que ia entrar: “Buena suerte, muchacho. Pero antes, te aconsejo que escribas algo a tu mamá”.
Músico: – Hoje, ele falaria pro substituto mandar um zap pra mãe!
Todos riem muito.
Garçom: – Bom, minha gente. Depois do gênio das Pernas Tortas, vamos trazer aqui no palco do Além da Imaginação um mestre do choro: Jacob do Bandolim!
Jacob do Bandolim vai com seu instrumento ao palco, cumprimenta antes os 4 amigos, Zé Ary, os músicos, a plateia, que o aplaude efusivamente, e acena pra Mané Garrincha.
Jacob do Bandolim: – Agradeço muito. Bom, não posso tocar outra música agora que não seja “A ginga do Mané”.
Garrincha: – Assim vocês vão me arrebentar de emoção.
Aplausos gerais para Jacob e Mané.
Ao fim da execução com maestria, novamente todos aplaudem muito, tanto Jacob, quanto Garrincha, que foi ao palco. Os dois se abraçam, e a ovação é total da plateia.
Ceguinho Torcedor: – Olé! A música e essa história são excelentes, João. Excelentes!
Garçom: – O México então criou o olé dentro de campo e a “ola”, fora, seu João?
João Sem Medo: – É verdade.
Idiota da Objetividade: – A “ola” surgiu para o mundo na Copa do Mundo de 1986 e é feita por torcedores de muitos países até hoje nos estádios em competições dos mais variados esportes. “Ola”, em espanhol, significa onda.
Ceguinho Torcedor: – É mesmo uma verdadeira onda que gira em torno do estádio… Eu não vejo, mas sinto toda a vibração.
Com a sugestão no ar, um grupo perto do palco começou a “ola”, que ficou rodando pelo Bar Além da Imaginação, com a participação de todos, até do Ceguinho Torcedor, por um bom tempo.
Garçom: – Gente, vamos aproveitar a presença de Garrincha aqui pra mais uma homenagem musical. Ele merece muito, não é?
Todos concordam e aplaudem.
Garçom: – Então vamos chamar ao palco o grande José Messias pra cantar “Garrincha cha”, de Rutinaldo Silva.
Todos aplaudem José Messias
José Messias: – Muito obrigado. É um grande prazer estar aqui em meio a tantas feras do futebol pra cantar essa homenagem ao grande Mané Garrincha. Vamos lá!
Todos dançam e aplaudem, inclusive Garrincha.
SAUDADES DE UM FANÁTICO TORCEDOR
por Zé Roberto Padilha

Se por um lado o futebol me proporcionou uma desafiadora e encantadora profissão, por outro, ao viver a realidade de ser dirigido por cartolas, despreparados e amadores, oriundos do quadro social, não da Fundação Getúlio Vargas, vi escorregar aos poucos, pelos dedos que conduziam minha bandeira, a emoção passional, única e irrefletida de ser um fanático torcedor.
Ao deixar as arquibancadas e ocupar os vestiários, são as gestões que o dirigem, não mais os jogadores, que irão conduzir os rumos de sua idolatria.
Para cada Escurinho, Gilson Nunes, Lula que me encantavam em campo, surgiram nos gabinetes presidentes Arnaldos Santiagos que me desencantaram. Francisco Hortas que me trocaram quando mais reunia méritos e alcançava a titularidade para defendê-lo.
Acreditem, nada é mais sem graça depois de discutir, em bares e botequins, que se tornar um torcedor racional. Deixar de ficar nervoso com um corner contra sua meta e não saber de cabeça um só grito uníssono de guerra.
Deixar de pedir pênalti com a bola que você mesmo viu que bateu no peito do zagueiro adversário. E contestar depois as próprias imagens do VAR.
Pedir a saída do treinador, que perdeu o cargo porque seu atacante perdeu o gol. Pior, ir ao aeroporto receber nos braços o mesmo Cuca que na competição passada deixou o clube debaixo de seus protestos e vaias.
Nada é mais cruel que assistir o jogo ao lado de quem preservou valores que você deixou escapar. E preservou sua paixão. Mesmo sendo sua paixão. “Foi na bola. O Felipe Melo entrou na bola!”, ela protestou. E mesmo com o adversário saindo de maca, você precisa concordar.
Caso não queira dormir na sala. Ou na maca.