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HISTÓRIAS DE PC CAJU

6 / dezembro / 2022

por Péris Ribeiro

Nos tempos de Flamengo, Paulo Cézar chegou a ser apontado pelo próprio Pelé como o seu sucessor na Seleção Brasileira

Para todos os efeitos, foi um diálogo, no mínimo, inusitado.

– Você é de que rádio?

– Mauá

– Não tem entrevista.

– Por quê?

– Ora, porque ela não dá Ibope!

Em pleno ar, foi assim que, certo dia, o intempestivo Paulo Cézar Caju resolveu despachar um jovem repórter da simpática rádio Mauá do Rio. Aquela mesma do folclórico narrador de 10 Copas do Mundo, Orlando Baptista – que gostava de se autointitular, com o garbo de sempre, “ o mais laureado “.

Arrogância pura? Máscara sem tamanho? Ou um temperamento em que os anjos e demônios do seu espírito viviam a travar, sem trégua, uma briga de foice em pleno escuro?

De certo mesmo, o que havia era que, desde um controvertido episódio das bermudas coloridas, em que PC saiu correndo pela sede do Botafogo, com o presidente alvinegro Althemar Dutra de Castilho no seu encalço, tudo em sua vida parecia projetar sempre ares os mais diferentes. Às vezes, era como se fosse dia de chuva fina, com o sol radiante se abrindo logo depois. Outro tanto, era noite de céu estrelado, transfigurando-se, inesperadamente, em tempo de tenebrosa tempestade.

É que, além do episódio com o jovem repórter da rádio Mauá, não dava para esconder alguns novos atritos com turbulentos grupos que faziam parte da própria imprensa. Também havia comentários, sobre determinadas rixas com companheiros dos times em que atuara. E, a bem da verdade, nunca deixara de existir uma espécie de luta de luvas brancas, de Paulo Cézar com os quase sempre inescrupulosos dirigentes do pesado ambiente do futebol. Sem contar, é claro, o folclórico episódio com o presidente Dutra de Castilho – que odiava, de fato, as incontáveis bermudas psicodélicas do indigitado Caju.

A bem da verdade, porém, justiça se lhe faça: com a bola nos pés – particularmente o direito –, era daquele tipo raro do craque total. Absoluto. Sem igual para a sua época – e olha que era uma época repleta de craques!

Dotado de uma habilidade fantástica, tinha um estilo elegante mas, ao mesmo tempo, esfuziante. E um fôlego que o fazia tanto ir à linha de fundo, pela ponta-esquerda, como o trazia de volta para compor o meio-de-campo com Gérson, Carlos Roberto ou Afonsinho – ou ainda Nei Conceição – num Botafogo de sonhos, bicampeão carioca e da Taça Guanabara nos anos de 1967/68.

Com apenas 19 anos, a realidade é que já cultivava um senhor cartaz internacional. E que iria se multiplicar ainda mais, depois das soberbas atuações contra a Inglaterra – Brasil 1 a 0, gol de Jairzinho – e a Romênia – Brasil 3 a 2 -, pela Copa do México, em 1970. O que o fez reivindicar o direito, já do alto da condição de campeão do mundo, de deixar de vez a ponta-esquerda – que sempre odiou – para ir mostrar as suas inúmeras habilidades no meio-de-campo.

Quem resolveu atender-lhe o desejo foi o Flamengo. E Paulo César, então, procurou retribuir da melhor maneira que conhecia. Jogando ao lado do gringo Doval, fez do rubro-negro da Gávea supercampeão carioca – justo no ano do Sesquicentenário da Independência do Brasil (1972). E, ainda como uma espécie de amostra maior de sua gratidão, eis que o genial PC ainda levaria aquele mesmo Flamengo – que vivia a superlotar os estádios – a um inédito título de bicampeão da Taça Guanabara (1972/73).

Porém, já corroído pelo espírito cigano, achou que era hora de rodar clubes mundo afora. Mas um novo brilho só veio a acontecer de verdade no Fluminense, ao lado de Rivelino – bicampeão carioca – e no Grêmio Portalegrense – campeão mundial interclubes, tendo como parceiros Mário Sérgio e Renato Gaúcho. Se bem que também valha a pena, levar em conta um bicampeonato gaúcho, conquistado com o Grêmio (1979/80) e o título de campeão da Copa da França ( 1974/75 ), com o Olympique de Marselha.

Amante das boates de luxo e da companhia de louras tão esfuziantes quanto o seu futebol, o certo é que Paulo Cézar acabou gastando mais do que ganhou – se bem que não tenha ganhado pouco.

Mesmo assim, continuou a cultivar alguns velhos hábitos, como o de beber o seu chope no Leblon e frequentar a praia de Ipanema. Ainda mais que, as academias de ginástica que possuía com o irmão adotivo, Fred e o dinheiro bem aplicado em alguns negócios, eram o suficiente, àquela altura, para lhe conferir uma aposentadoria até certo ponto tranquila. E ainda havia um prazer todo especial, que era o de frequentar o elitizado futebol – society no campinho de Chico Buarque de Hollanda, duas vezes por semana – onde ele era, por sinal, uma das grandes atrações.

No entanto, como que levado por um indomável vendaval, eis que Paulo Cézar se viu arrastado, de uma hora para outra, para bem longe do barco dos seus prazeres. Tudo por conta de um vício – jamais programado – com drogas pesadas e bebidas as mais variadas. Um pesadelo que parecia, naquele inferno em que se autodestruía, que jamais iria embora de sua vida. Até que, de maneira quase inacreditável – e cerca de dez anos depois -, todo o horror e toda a aura de maldição, desapareceram como que por encanto. Em um passe de magia.

Para alguns personagens especiais, que acompanharam de perto todo o seu drama, a reviravolta só aconteceu por questões meramente espirituais – algo assim, como se fosse uma espécie de milagre real. Já para outros, no entanto, houve o poder da fé, sim. Muita fé! Mas o jogo só virou, graças a um grupo de amigos incansáveis, que se dedicaram heroicamente à completa recuperação de Paulo Cézar. Gente como o produtor cinematográfico Luiz Carlos Barreto, sua filha Paula e o genro, o ex-jogador Cláudio Adão, o advogado Nélio Machado, o ex-presidente do Fluminense, Francisco Horta, o cantor Agnaldo Timóteo, e o ex-técnico Zagallo.

Também foram importantes, os campeões do mundo Carlos Alberto Torres, Gérson, Rivellino, Tostão, Brito, Marco Antônio, Edu, Piazza e Clodoaldo. E, fundamentalmente, um grupo de amigos que começaram com ele, nos juvenis, e depois, já entre os profissionais, foram campeões jogando tantas vezes juntos, no encantador Botafogo da segunda metade da década de 1960. Craques do quilate de Jairzinho, Roberto, Afonsinho, Carlos Roberto, Rogério, Ney Conceição, Zé Carlos e Moreira.

Renascido, com a autoestima lá em cima, e sentindo-se o mesmo Paulo Cézar confiante dos velhos bons tempos, eis que, logo depois, voltou a gerir de novo a própria vida. E mais: tomou as rédeas dos próprios negócios, que continuaram a lhe proporcionar um bom rendimento financeiro.

Perfeitamente integrado ao universo das redes sociais, pode ser apontado, hoje, como um dos cinco melhores analistas de futebol da praça. Porém, é seguramente o mais incisivo em suas críticas – o que pode ser conferido mensalmente na última página da revista “Placar“. Ou semanalmente no Blog do “ Museu da Pelada”.

Porém, o seu grande momento – e que marcou definitivamente a sua recuperação para a vida -, ocorreu em 2006. É que, naquela temporada, o cidadão Paulo Cézar Lima recebeu das mãos do presidente da França, François Hollande , a maior condecoração do país: a Comenda Nacional da Legião de Honra, criada em 1802, pelo Imperador Napoleão Bonaparte.

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