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ELA REZA

9 / maio / 2025

por Claudio Lovato Filho

Ela reza. Pelo menino. Seu menino joga bola, seu menino é jogador. Ela não entende de futebol. Nada. Quase nada. Mas ele está lá, metido naquilo, e é disso que ela entende, entende do seu menino. Ela reza para que ele não se machuque. Para que o técnico não o persiga. Reza para que ele não faça inimigos, e, se os fizer, para que eles se tornem pó, poeira no vento, antes que consigam agredir-lhe o corpo e, principalmente, a alma. Reza para que ele não caia na conversa dos falsos amigos, e, se falsos amigos um dia conseguirem se aproximar dele, que sejam como os morcegos, que fogem ao ver a luz, a  luz do seu menino, que é forte, que vem de cima, que vem do lugar mais alto que pode existir. Ela reza, todos os dias, várias vezes por dia, segurando com suas mãos de jovem-velha o terço que carrega no pescoço. Assim ela reza.  E, por vezes, sempre que o menino consegue um grande feito – um gol, ou mais de um, ou tem uma atuação elogiada na TV, na rádio e na internet –, ela sente que o medo, mesmo que por instantes, abandona-lhe a alma e é substituído pela alegria, pelo orgulho e pela gratidão, sobretudo pela gratidão. Ela reza porque seu amor pelo menino é tão grande que só pode ser manifestado assim, em oração. Ela reza como se a insistência de seus pedidos fosse a garantia de que Deus jamais se esquecerá dele, do seu menino. Ela reza porque ama, e seu amor é uma oração, a oração mais forte que já existiu, a oração fadada a ser aquela que nenhuma outra pode superar, a oração das orações. E ela, mais uma vez, segura firme o terço, enquanto o homem da TV diz que seu menino acabou de dominar a bola no meio de campo e que avança de cabeça erguida para cima de seus marcadores numa velocidade “impressionante”, assim diz o homem da TV, “velocidade impressionante”, e então ela sente o coração e o mundo pararem de repente, e ela apenas olha para a tela, pensando, em menos de uma fração de segundos, que tudo o que ela podia fazer está feito.

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