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Ziraldo

SE CUIDA, SEU ZILALDO!

por Sergio Pugliese

Desde bem pequenos, meus filhos Raphael e Frederico, gêmeos de 8 anos, tagarelas com seus amigos imaginários. O do Rapha é o Rait e o do Fred, Macã. Passada uma temporada, o Rapha arranjou um parceiro para o Rait, o Merdon. Mas esse teve vida curta. Morreu tragicamente ao despencar da cabine de um helicóptero, quando fotografava a Cidade Maravilhosa num voo panorâmico. Estatelou-se sobre um motoqueiro sem capacete.

No lugar do Merdon entrou o Boston, que há tempos anda sumido. Pelo que entendi, viajou com o Macã para uma temporada no infinito e além, do Buzz Lightyear. Isso é bom demais! Até quando duram os amigos imaginárions, pensei outro dia. Os meus existem até hoje e volta e meia ligam para me salvar dos faladores compulsivos e das reuniões intermináveis.

Outro dia no carro, levando a dupla no colégio, conheci uma nova brincadeira, a de perguntas sem nexo…

– Quem você queria ser por um dia, Hulk ou Peter Pan?


– Quem jogaria no seu time, Menino Maluquinho ou Cebolinha?

Achei profunda a segunda questão e passei o dia pensando em levar adiante esse desafio. No trabalho, me reuni com João Veiga e Igor Cavaco, da equipe “A Pelada Como Ela É”, e viajamos nessa onda imaginária. Como seria uma partida entre os personagens dos incríveis, fantásticos e extraordinários Maurício de Sousa e Ziraldo? Os dois cães farejadores partiram em busca dos ídolos de tantas gerações e pediram que escalassem seus times para o confronto. De cara, Ziraldo recuou e humildemente reconheceu a superioridade adversária.

– Melhor nem entrarmos em campo. O Maurício tem o Pelézinho, enquanto o meu principal jogador tem uma perna só, o Saci.

Realmente, o criador da Mônica estava bastante seguro e ainda revelou adiantadas negociações para contratar uma nova estrela: Neymarzinho.

– Neymarzinho? Ele não vai ter coragem de fazer isso? – espantou-se.

Quando soube da preocupação do amigo, Maurício prometeu deixar Pelézinho, Ronaldinho e Neymarzinho no banco, como armas secretas, só entrando numa eventual emergência. E não guardou segredo sobre a escalação.

– O Cascão não ficará na banheira por motivos óbvios e poderá driblar facilmente os adversários porque todos fugirão do seu cheirinho. Mas temos que ter alguém bom no ataque, talvez o Chico Bento que gosta de dar chapéu… de palha… e pode mandar a bola no ninho da Coruja (personagem de Ziraldo). O Cebolinha tem planos infalíveis, mas como nunca dão certo terei que desconfiar da sua eficiência como “técnico”. A Mônica é nossa arma secreta para os arremessos manuais com o Sansão. A Magali será a goleira e basta dizer que a bola é uma melancia para ela segurar todas. Ainda temos o Piteco, que vive treinado chute em bola de pedra e pode soltar aquela pedrada. No meio campo vou deixar o Louco fazer jogadas muito loucas e a Marina desenhar as melhores criações de ataque. Na defesa, quero o Horácio porque nunca fará pênalti colocando as mãos na bola. Meu time de respeito seria mais ou menos esse.

Ziraldo analisava a formação adversário e ao desenhar o Menino Maluquinho comemorando um gol em Cebolinha, “bingo!”, lembrou-se que poderia surpreender Maurício & Cia. de duas formas: usando o Maluquinho de centroavante, pois ninguém defenderia sua panelada, quer dizer cabeçada, e escalando a seu lado, além do parceiro Bocão, os mesmos guerreiros que enfrentaram e venceram o escrete da Pruslávia, pouco antes da Copa do Mundo de 1958: Saci, a onça Galilelu, o coelho Geraldinho, a tartaruga Moacir, o macaco Alan, o índio Tininim e o tatu Pedro Vieira, figuras clássicas da lenda brasileira.

A coruja Professor Nogueira apitou esse racha e Tuiuiú e a Boneca de Piche lideraram a torcida. Mas Ziraldo reconheceu a vantagem de terem jogada em casa, na Mata do Fundão, e sugeriu campo neutro para o confronto.

– O Maurício (criado em Mogi das Cruzes) vai querer São Paulo, mas não aceitarei – adiantou o mineiro de Caratinga.


E o aguardado dia chegou! Os craques pisaram no gramado e os fogos explodiram! Na contagem, o árbitro sentiu falta de dois jogadores, um de cada lado, mas o mistério foi rapidamente desfeito: Pedro Vieira, o Tatu, ponta-direita de Ziraldo, estava enterrado porque tinha a missão de surpreender o marcador com ataques subterrãneos e Anjinho, escalado de surpresa, planava porque forçaria as jogadas aéreas.

Os ingressos esgotaram e a criançada se espremia no Estádio Peladão. Os vendedores de cachorro-quente, sorvete e pipoca não davam conta. Rapha e Fred levaram Youle, Dedé, Pedro, Marinho, Flavinho, Fadel, Melendez, Buffara, Junqueira, Borges, Gavin, Maci, Lucas, Lipe e Priolli, inseparáveis amigos do colégio, e Rait, Macã e Boston, vocês já sabem…

A histeria dos locutores contagiava. O árbitro conferiu o cronômetro. Ziraldo e Maurício cumprimentaram-se, e Cebolinha provocou:

– Se cuida, seu Zilaldo!!!

Aí meu celular tocou… Rapha e Fred me olharam com reprovação. Era meu amigo imaginário, mas dessa vez ele ligou fora de hora, então convidei-o para juntar-se a nós. Em seguida, enrosquei Rapha e Fred num abraço, e o jogo começou!

Texto publicado original na coluna “A Pelada Como Ela É”, do Jornal O Globo, no dia 9 de junho de 2012.