por Victor Kingma
Em seus tempos de jogador de várzea, Jacaré foi um craque, emérito cabeceador e com excelente visão de jogo. Aposentado, vivia a relembrar suas glórias e, após umas cervejinhas, invariavelmente acabava exagerando “um pouco” na lembrança de seus feitos.
Liminha era seu amigo e companheiro de trabalho. Mas tinha uma característica peculiar: detestava mentiras. Nada o aborrecia mais do que ouvir alguém mentindo.
E Jacaré naquele dia estava impossível. Contava que certa vez seu time foi jogar contra o maior adversário, de uma cidade vizinha, e ele, com o joelho machucado, não pôde ser escalado.
Ao final do primeiro tempo, seus companheiros já perdiam por 3 x 0. Após o intervalo, a coisa piorava a cada instante: aos 30 minutos o placar apontava 5 x 0 para a equipe da casa. Foi quando o técnico o chamou:
– Meu ídolo, eu sei que você não está em condições de jogar, mas preciso que entre para evitar um vexame maior.
E o nosso herói começou a contar para os amigos, mais uma de suas proezas:
– Aos 35 minutos, escorei um córner de cabeça e fiz 5 x 1. Aos 37, entortei o zagueiro e de virada diminuí para 5 x 2. Aos 40, arrematei de voleio: 5 x 3…
– Ia narrando o antigo craque, embalado pelas “louras geladas”.
Em um canto, impassível e aparentemente dormindo, Liminha apenas ouvia.
– Aos 43, de bicicleta, fiz 5 x 4…
E Liminha parecia mesmo cochilar.
– Aos 45, quando o juiz já se preparava para terminar a partida, peguei a bola na intermediária, passei por três zagueiros, invadi a área, fintei o goleiro…
Mas antes que o nosso craque concluísse o lance, Liminha interrompe a narrativa, levantando aos berros:
– JACARÉ! Se você empatar este jogo eu lhe enfio a mão na cara!