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Naná Vasconcelos

Naná Vasconcelos: ‘Não deixe o futebol perder a dança’

Em homenagem ao grande percussionista pernambucano que morreu hoje, postamos um artigo publicado no site da Veja em junho de 2013

Por Naná Vasconcelos

Sou torcedor “sofredor” do Santa Cruz, o time das multidões, a cobra Coral recifense. Um de seus hinos diz “Eu sou o Santa Cruz de corpo e alma / E serei sempre de coração” – e isso é levado a sério pela torcida, formada por gente de todas as classes sociais, econômicas e políticas. Em sua maioria, porém, são pessoas simples, daí a beleza da paixão sem medo de mostrar sentimentos. O Santinha, como é chamado carinhosamente pelos torcedores, leva cerca de 20 000 pessoas ao estádio, apesar de o time disputar a terceira divisão do campeonato brasileiro.

Não sou fanático, mas adoro o futebol-arte, objetivo, claro. O Brasil exportou esse estilo de jogo, essa maneira de jogar, para a Europa, que aprendeu e usa com muita objetividade, mas sem a dança, que é o ponto forte no nosso futebol, por causa da miscigenação presente na nossa cultura – e aqui futebol é cultura.

“Não deixe o futebol perder a dança”, diz a letra de uma composição minha, pois quando ele perde a dança, ele perde. Aí é triste, é feio, mas poucos dias depois tudo volta ao normal. A esperança, a paixão, o pensamento de que “agora vai” ou “vamos lá”, isso mostra o comportamento de um povo que está sempre pronto para festejar.

A Copa das Confederações chega no momento em que o Brasil vive uma fase de desenvolvimento econômico e cultural bem visível. O Nordeste está a todo o vapor, recebendo importantes investimentos na área industrial. Isso me faz feliz, me alegra e me dá esperança de ver um futuro melhor para nosso povo, que já está em clima de preparação para acolher os ilustres atletas e torcedores vindos de outros países. Não deixem o futebol perder a dança!

O jogador argentino Lionel Messi, que ganhou há alguns meses pela quarta vez consecutiva o prêmio de melhor jogador do mundo, já falou que seu maior sonho ainda é jogar pelo Santa Cruz – é claro que esse é só o sonho de um torcedor. A arte do futebol sempre engrandeceu nosso país.

Eu sou um músico livre, improvisador, solista, mas adoro armar tudo para que outro instrumentista ou cantor possa dar seu recado. Aprendi a ouvir, isso me dá flexibilidade e facilidade de adaptação, em qualquer formação eu encontro meu espaço, gosto de tocar dançando e de dançar tocando. O importante é que a escuta, os reflexos estejam ali vivos, acesos e objetivos, em função do grupo de músicos ou da música que esteja acontecendo no momento, fazendo o melhor para que tudo fique lindo.

Na música, o primeiro instrumento é a voz e o melhor instrumento é o corpo. No futebol, o primeiro instrumento é a bola e o melhor instrumento é o corpo, Creio que, como na música, os reflexos devem estar vivos, prontos para atingir o objetivo final. Das artes, a música é a mais imediata, porque mexe com os sentimentos. No futebol, o sentimento mais almejado é o da alegria do gol, da vitória que sempre engrandece o povo: “Não deixe o futebol perder a dança”.