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O ZAGUEIRO BUFÃO E A GINGA DO MENINO VOODOO CHILD

por Marcelo Mendez


(Foto Ilustrativa: Check)

Sábado de futebol, inverno chegando em mim e eu, em doces lembranças que iam da luz que vem de um par de olhos azuis e uns sons de Jimi Hendrix, me vi na beira do campo do São Paulinho do Parque Novo Oratório em Santo André, vendo um daqueles jogos que nada mais vale, além apenas de ser lúdico.

Uma autêntica pelada de várzea, com times que se juntam em um sábado a tarde para nada além de bater uma bolinha, comer uma carne e beber uma cerveja. O jogo, portanto, era aquilo que o ludismo poderia propiciar. As favas com os fatos. Estão lá as caneladas, mas, o coração tem que se sobrepor ante o olho para efeitos poéticos.

Com essa premissa na cabeça, nada esperava. Eis que então a bola encontra o camisa 11 do time de vermelho. Sim, esqueçam essas groselhada de FIFAs, Federações e afins. Essa pelada era entre o time de vermelho e o time de branco e azul. O time de branco e azul tinha lá pelo lado do campo um zagueiro daqueles que só a várzea pode nos dar. Grisalho, meio duro de cintura, pançudo, caneleiro clássico a exibir as travas de sua chuteira ainda preta. Foi babando pra cima do menino camisa 11 de vermelho.

Nesse momento, com a ginga de um milhão de gafieiras, o menino camisa 11 de vermelho lhe aplicou muito mais que um drible. A bola que passou por entre as pernas do zagueiro bufão do time branco era uma privação de sentidos! Uma afirmação de fé! Uma afronta à razão!

Meus caros, aquilo não foi um drible; foi uma esculhambação!

Não contente o menino prosseguiu. Atrasou o passo, esperou o botinudo voltar e então lhe rabiscou em dribles coloridos de todas as formas possíveis e principalmente, inimagináveis. E como gran finale, parou a bola, olhou pra cara do sujeito e colocou a pelota para fora pela linha lateral, apontando pro cara e dizendo:

– Da onde veio esses dribles vai vir mais. Bate o lateral aí que você vai sair daqui zonzo…

Rapaz… O zagueiro do time branco então passou a vociferar pragas em cima do menino camisa 11 de vermelho que nem ligou. Saiu vitorioso da picardia e prometendo mais. Nesse momento, no meu ipod Jimi Hendrix tocava “Voodoo Child” com uma letra que dizia o seguinte:

– Uma Criança Vodoo que te rouba um doce, mas, devolve qualquer dia desses – perfeita definição:

O menino é um escândalo!

Dribla para satisfazer sua sanha hedonista, para lavar a alma do cronista ávido por arte, esculacha zagueiros para o deleite de fãs sazonais de sábado à tarde. Com ele o que mais importa é a brincadeira. É a chance que o moleque tem de ser grande. De subverter a ordem dos “sérios”, de mandar as favas os “Objetivos” e os “Planejamentos dos Pofexô” dos bancos de reserva. Aquele menino camisa 11 de vermelho é a chance do torcedor de “não estar nem aí”, de não ligar para a miséria da “busca pelos três pontos da tabela”, de deixar pra lá todo o resto das obviedades que infestam o dia a dia do nosso futebol. E mais:

Ele é nossa chance de fazer com que o as coisas se revolucionem por um viés muito mais maneiro e mais transado que as caretices que se apresentam por aí. Ele dribla, ele esculacha, ele sorri, ele tira onda, ele faz o zagueiro bufão cheio de ódio comer terra e babar. Ele joga por nós!

Em um dos dribles que aplicou no botinudo, eu sorri e ele viu. No outro, tomou uma pernada e riu de novo. Na seqüência, deu outra caneta e olhou para mim:

– Essa caneta foi para você, barbudo!

Com um sorriso, o agradeci! Era meu doce sendo devolvido…

 

 

VELUDO QUERIA UM FILHO CENTROAVANTE. NÃO DEU TEMPO

por André Felipe de Lima


O bairro da Saúde, na zona portuária do Rio, presencia hoje merecida revitalização. Foi lá, nos tempos em que foi reduto da boemia e da malandragem carioca, em que nasceu no dia 7 de agosto de 1930 o cidadão Caetano Silva, que anos depois ficaria conhecido como Veludo, apelido que recebeu em 1947 do escritor e imortal da Academia Brasileira das Letras Otávio Faria. Foi com o mesmo apelido que se consagrou no futebol brasileiro, especialmente no Fluminense. Foi, sem dúvidas, mesmo sendo a “sombra” do magistral Castilho, um dos melhores goleiros da história do Tricolor. Tanto é verdade que o seu talento, mesmo sendo reserva de Castilho, garantiu-o na seleção brasileira que embarcou para a Suíça, sede da Copa do Mundo de 1954. “Não ganhei nada com o futebol, apenas injúrias”, lamentava-se no final da carreira. A amargura teve começo, meio e fim. Era, portanto, justificada por uma vida muito difícil antes mesmo de o futebol entrar em sua vida.

Veludo perdera o pai ainda bem pequeno e teve, ainda adolescente, de trabalhar na estiva para sustentar a mãe, dona Joana, e os irmãos Jerônimo, Paulo Roberto, Neusa e Júlia. Ora carregava sacos mais pesados que o próprio corpo, ora era o goleiro titular do Harmonia, time de peladeiros da Saúde. Na final do campeonato de peladas do bairro, contra o Atilia, um camarada conhecido como “Espanhol” insistiu para que Veludo fosse com ele às Laranjeiras para um teste. Veludo foi. Newton Cardoso, que era o técnico dos juvenis, gostou dele. Ficou por lá mesmo.

Orgulhava-se apenas do filho Anselmo Perdomo Silva. Jamais da carreira. Tinha verdadeira paixão pelo menino. “Quero ser jogador do Flamengo”, dizia o garoto para o pai. “Seja centroavante, meu filho. A posição de goleiro não é mole”, aconselhava sabiamente Veludo.

A vida sorriu marota para o grande goleiro. E isso é verdade. Viveu o céu e o inferno. Negro, sofreu com o preconceito. Superava isso com a bravura nos gramados. Um genuíno herói. Fora dele, era sempre muito mais difícil lidar com os graves e hipócritas desníveis sociais. Jamais soube lidar com esse injusto e imoral desafio, que representa o racismo.

Igualmente grande escritor como Otávio Faria, Luis Fernando Veríssimo esboçou uma digressão sobre o racismo de que fora vítima Veludo: “Cresci ouvindo dizer que o melhor goleiro do Brasil era Veludo. Reserva do Castilho no Fluminense e tão bom que era reserva do Castilho na seleção. Só não era o titular, diziam, porque era negro […] estereótipos racistas sobre agilidade e elasticidade até favoreciam uma tese inversa, a de que o negro mais confiável do que o branco no gol. Mas quando o Barbosa deixou passar aquela bola de Ghiggia, em 50, o preconceito, até então disfarçado, endureceu e virou superstição.”

Veludo sofreu talvez até mais que Barbosa com racismo tupiniquim. Mergulhou em profunda depressão no começo dos anos de 1960. Decidiu abandonar tudo em 1963, quando jogava no Renascença, de Belo Horizonte. Didi e João Saldanha chegaram a convidá-lo para treinar no Botafogo. Mas era tarde demais. Veludo fora engolido pela atormentada alma.

O amado filho jamais teve tempo de responder ao pai em que posição decidira efetivamente jogar. Veludo, vítima da diabetes, acentuada por conta do alcoolismo, não resistiu. Castilho, de quem foi grande amigo, presidia a Fundação Garantia do Atleta Profissional (Fugap). Ajudou-o com internações e o acompanhou até o fim, em outubro de 1970.

Partira Veludo para o andar de cima. Mas deixou uma história singular. Foi um ídolo, e como todos os grandes, merecidamente amado e injustamente odiado. Um gigante do futebol e uma personagem singular que nem mesmo o mais trágico dos poetas ousaria entortar a prosódia ao decantá-lo em prosa e verso. Veludo tem história.

OS NOVOS LIBERTADORES DA AMÉRICA

por Zé Roberto Padilha


Zé Roberto Padilha

Mal acordei e o WhatsApp disparou: “Caiu!”. Logo abaixo, efeito cascata, centenas de compartilhamentos assinavam abaixo: “Estava insustentável!”. “Burro!”. Se vivêssemos em um país sério, a queda seria do presidente da república. Passou a perna no interino, escalou mal seus ministros e comprou meio time para se manter no cargo. Mas quem caiu foi Zé Ricardo, o técnico do Flamengo. Sua culpa? Trabalhar num país cujos homens torcem mais por sua nação do que a defendem como cidadãos. Michel Temer está firme no cargo – e um cara do bem, honesto e trabalhador perdeu o seu.

Saí para comprar o pão e os garis aceleravam suas vassouras em euforia. Varriam o lixo como retirassem todo e qualquer resquício daquele seu treinador. “Aonde já se viu, Diego e Everton Ribeiro juntos?” Pouco estavam interessados em saber que a escalação do Gedell Vieira ao lado da mala de Rocha Loures ajudou a comprar a reforma trabalhista, cuja terceirização irá ameaçar a estabilidade por eles alcançada no concurso mais concorrido do estado.

“Finalmente, que venha o Wanderley!”. Wanderley Luxemburgo, outro cara do bem, já garantiu o seu futuro. Será que com a reforma da previdência nossos valorosos garis não sabem que vão varrer ruas até os 85 anos para alcançar a sua?

O Brasil voltou recentemente a ocupar a zona do rebaixamento no quadro da Fome da ONU. De que importa? O que vale mesmo é o Flamengo ficar entre os quatro que vão à Libertadores. Para alcançá-la, são capazes de encher um ninho de urubu num domingo de praia e deixar completamente vazios os palcos de luta e resistência como a Avenida Copacabana e a Paulista.


Antes, os libertadores da América tinham sobrenomes como Bolívar, Martin, L’Overture, Guevara, Guimarães e irmão do Henfil. Hoje, a liberdade é buscada de uma forma tão imbecil que enforcamos inocentes a céu aberto – e nos calamos dentro de casa e damos folga às nossas panelas diante dos culpados.

Bom dia, Brasil. Num passe de injustiça, a bandeira de Mello foi erguida nesta segunda-feira após a derrota para o Vitória. Só mesmo em um lugar onde Michel Temer continua e Zé Ricardo perde o seu lugar é que toda vitória significa uma derrota. E assim será enquanto não erguermos outras bandeiras de luta. E levarmos o nosso próprio país a sério.

PRÍNCIPE NO PARQUE

por Fabio Lacerda


A maior contratação da história do futebol é do garoto Neymar. A escolha pelo bilionário Paris Saint-Germain transcende as quatro linhas e as infinitas ações de marketing para o clube, para a Ligue 1, Liga dos Campeões, e demais competições que o time mais brasileiro na França venha concorrer ao título. Já levou a Supercopa da França. 

A ida deste menino iluminado para a Cidade Luz coincide com a jovialidade presidencial de Emmanuel Maccron recém empossado. A França, sobretudo após os atentados terroristas sofridos, e manifestações pelos subúrbios de Paris que sempre deixam a população em alerta (período que Sarkozy era o presidente), busca nos jovens a oportunidade de reciclar. 

Não resta dúvida que ao colocar as cores do Brasil na Torre Eiffel a imagem de Neymar pode promover uma mudança social que o país tanto precisa. Heterogênea, até mais que a população brasileira, a França terá para si, provavelmente, a figura esportiva a ser mais desejada pelas lentes e câmeras cinematográficas do mundo. Porque o mundo precisa de jovens saindo da zona de conforto e buscando oportunidades e novos rumos. 


Neymar é astro. E sua estrela há de continuar brilhando. Essa ida para a França também passa pelo campo das Relações Diplomáticas. Neymar será uma referência, inclusive em prol da paz, para diversos jovens de origem africana, muçulmana e outras tantas. Neymar chega à França com um sorriso leve, malemolência e a tradicional alegria nos pés para encantar um povo que lê ao ano o que o brasileiro não lê em vida – a média de leitura de livros pelos franceses passa de um por mês. Portanto, a missão de encantar e engajar está dada. E ele vai tirar de letra! Tenho a ousadia de dizer que sua imagem será muito mais destacada diante das missões extra-futebol que Raí e Ronaldo Gaúcho quando estiveram no Parc des Princes. 

Não subestimem o futebol francês. Vale lembrar que o Brasil deu-se bem apenas na Copa do Mundo de 1958. Desde as Olimpíadas de Los Angeles que o Brasil sucumbi diante da França. 

Festa do Possesso

festa do possesso

texto: André Mendonça | fotos: Daniel Planel | vídeo e edição: Daniel Planel

Já cansamos de elogiar as resenhas do Caldeirão do Albertão, no Grajaú, mas não poderia ser diferente, os encontros são sempre memoráveis! O último, então, contou com a presença de dois campeões mundiais. A causa era mais do que nobre, festa de aniversário de 78 anos de Amarildo, e o nosso padrinho PC Caju não pensou duas vezes antes de aceitar o convite!


À altura do evento, a recepção foi de gala. Assim que os boleiros chegavam ao Caldeirão naquela manhã ensolarada, se deparavam com uma mesa farta de melancias fresquinhas.

– Essa recepção aqui não existe! O nosso amigo Perrone traz esse aparato todo para a gente se fortalecer antes da pelada, mas em campo senta o sarrafo! – revelou Ney Pereira, lenda do futebol de salão.

O anfitrião Beto Ahmed não escondia a felicidade pela oportunidade de reencontrar o amigo de infância:

– Ninguém aqui pode falar melhor do Amarildo do que eu! Era meu vizinho, acompanhava ele no Botafogo e, mesmo sendo flamenguista, não conseguia torcer contra ele.

Se nos bastidores Perrone comandava a organização, dentro das quatro linhas a missão era da fera Sandrinho, que varreu cuidadosamente o campo para que a bola rolasse de forma impecável! A pelada só chegou ao fim quando o aniversariante Amarildo e PC Caju apareceram, conduzidos por Guilherme Meireles Careca.

O que o Possesso não imaginava é que um bolo personalizado, feito com carinho por Fabiana Falbo, da Dolci Delizie, mulher do craque Guido, fosse adoçar ainda mais a festa.


Amarildo, Guilherme Careca e PC Caju

– Nunca recebi tanto carinho de amigos no meu aniversário quanto hoje! Não há presente melhor do que esse! – agradeceu um Amarildo arrepiado e emocionado.

Em seguida, o amigo PC Caju pediu a palavra e revelou toda a sua admiração por um dos destaques do bicampeonato mundial em 62:

– Eu ficava atrás do gol assistindo ao treino do Botafogo pegando a bola que aqueles caras chutavam. Amarildo é um dos maiores jogadores que nós tivemos no mundo, além de ser uma figura excepcional! Muito obrigado por tudo, Amarildo – finalizou.

Parabéns, Possesso!