DO MARACANÃ A BOMBONERA, E VALENTIM FICOU RICO
por André Felipe de Lima
“É sopa fazer gols nos argentinos”. Tanto é verdade que o autor da frase, um centroavante brasileiro, um dos melhores que o Botafogo já teve, tornou-se um dos maiores ídolos do Boca Juniors em todos os tempos. Torcedores portenhos, e seja de qual clube fosse, idolatravam-no em Buenos Aires. Paulo Valentim era uma unanimidade na Argentina. Dizia ter saído de General Severiano porque “venceu pelo cansaço” o embate com os cartolas. A oferta do Boca era tentadora, e no Alvinegro sua vaga de artilheiro já estava começando a ser ocupada por um ponta de lança paraense e muito bom de bola, que acabaria se tornando o maior goleador (até hoje insuperável) da história do clube: Quarentinha. Havia também o Amoroso, outro excelente centroavante, que também sabia fazer gols pra chuchu. Mas Valentim era a vedete, sobretudo após o extraordinário título de 1957, quando marcou uma saraivada de gols na final contra o Fluminense. Perdê-lo seria o ocaso, temia o pessoal em General Severiano.
Foi Paulo Amaral quem bateu o martelo. Virou-se para Valentim e disse que no Botafogo não dava mais e que ele, Valentim, estava psicologicamente perdido para o time. Também, pudera. As luvas de dois milhões meios de cruzeiros eram quantia absurdamente alta para os padrões do futebol da época. Naturalmente que Paulo Valentim já não pensava mais em Botafogo. Mas o Botafogo ainda pensava nele.
Brandão Filho, diretor de futebol, também ouviu o treinador atentamente e foi bater um papo com o Valentim. Derradeiro empenho para que permanecesse no clube. Tentativa em vão. O jogador conversou em seguida com o vice-presidente Sérgio Darci e, depois, com o presidente Paulo Azeredo, de quem conseguiu, após muito chororô do certola, a liberação para jogar pelo Boca. Na última semana de junho de 1960, Valentim e sua esposa Hilda (ela mesma, a famosa Hilda Furacão) embarcaram para a capital da Argentina, com mala, cuia e, claro, gols.
A primeira abordagem do Boca aconteceu em março de 1960. Valentim estava em excursão com o time do Botafogo, viajando pelos gramados da América Central. Hilda enviou uma carta ao marido, na qual escrevera que um emissário do Boca baixara na casa deles querendo convencê-lo de que jogar pelo Boca valeria muito a pena.
O mesmo camarada não se deu por vencido. Permaneceu no Rio de Janeiro até que o Paulo Valentim desembarcasse no Galeão. Foi esperá-lo, de campana, no aeroporto para convidá-lo, pessoalmente. Valentim disse que por menos de dois milhões de luvas e 70 mil cruzeiros mensais não haveria jogo. Mas houve um pouco mais. O salário saltou para 75 mil e Valentim e Hilda teriam confortável casa garantida em Buenos Aires, onde já o esperava o brasileiro Edson dos Santos, um dos melhores zagueiros da história do América e que já vestia a camisa do Boca.
Passou a ouvir inúmeras vezes pelos campos da Argentina a musiquinha que se tornou célebre cada vez que marcava um gol: “Tim, tim, tim, gol de Valentim”. Cada gol que fazia valia, literalmente, uma moeda de ouro, que lhe era presenteada pelo presidente xeneize Alberto J. Armando. “Se soubesse que ganharia tanto dinheiro na Argentina para lá já me teria transferido há mais tempo.”
Valentim foi embora, ser gauche na vida. Ficou riquíssimo em Buenos Aires, perderia toda a fortuna depois, essa é, contudo, uma outra (e triste) história. Mas, certamente, seu coração jamais deixou de ser alvinegro. Coisas do futebol.
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SOBRE PAULINHO, LEIA TAMBÉM A CRÔNICA “O DIA EM QUE PAULINHO PERDEU O MEDO”, PUBLICADA EM MARÇO NO MUSEU DA PELADA:
TÚLIO MARAVILHA, NÓS GOSTAMOS DE VOCÊ
por Luis Filipe Chateaubriand
É raro ver, no futebol, uma identificação perfeita entre um clube e um jogador. Evento mágico, denota que aquele personagem é o cara certo no lugar certo.
É, sem dúvida, este o caso de Túlio e Botafogo!
Casamento perfeito, mágico, indescritível, em que a personalidade do jogador e a do clube se encaixam perfeitamente, como poucas vezes se viu no futebol.
Túlio jogou em diversos clubes, brasileiros e estrangeiros, alguns deles gigantes, como Corínthians e Fluminense. E até na Seleção!
Mas, quando se lembra de Túlio, é do Túlio do Botafogo.
O Túlio do Botafogo campeão brasileiro de 1995, título mais importante do clube nos últimos 50 anos. Time fantástico, de jogadores fantásticos, como seu companheiro de ataque Donizetti, o Pantera, dirigido pelo excelente técnico Paulo Autuori.
Mas com uma estrela solitária na frente – a estrela de Túlio.
Túlio era irreverente. Não uma irreverência prepotente, marrenta, soberba. Mas sim uma irreverência ingênua, brincalhona, divertida. Não era tudo ou nada, mas “Túlio ou nada”. Não estava tudo bem, mas “Túlio bem”. O jogador cearense Silas, recém-chegado ao clube – de pernas tortas, bigode e orelhas de abano – não era o Silas, recebeu de Túlio o mítico apelido de Gavanildo: pernas tortas de Garrincha, bigode de Valdir e orelhas de Iranildo.
Assim era o bem-humorado Túlio.
Mas, para além do bom humor, existia um artilheiro nato: o que se posicionava na área de forma inteligente; o que via a bola chegar e definia o lance com extrema rapidez; o que tinha incrível frieza na hora de concluir em gol; o que, quando o lance exigia, ainda driblava o zagueiro, para o gol se tornar mais escancarado; o compenetrado até enviar a bola às redes… para só depois disso aderir a uma grande brincadeira.
Brincou demais.
E a torcida, extasiada, repetia: “Túlio Maravilha, nós gostamos de você! Túlio Maravilha, faz mais um para a gente ver!”
Luis Filipe Chateaubriand acompanha o futebol há mais de 40 anos e é autor de vários livros sobre o calendário do futebol brasileiro.
CONSCIÊNCIA GERAL
:::::::: por Paulo Cezar Caju ::::::::
Hoje é Dia Nacional da Consciência Negra e os atos de racismo continuam nos atormentando, inclusive nos estádios. Assim como Nelson Mandela, sonho com o dia em que todos se levantarão e compreenderão que fomos feitos para vivermos como irmãos. Esse dia há de chegar! O futebol é uma ferramenta social importante, pois em um mesmo time jogam atletas de vários países. Esse intercâmbio é fundamental.
Hoje, a discussão da vez, de certa forma preconceituosa, é sobre o sucesso de um treinador português no futebol brasileiro. É ridículo demais, afinal os brasileiros invadiram Portugal e, pelo que eu saiba, são muito bem recebidos por lá. No futebol, nem se fala! Há anos treinadores brasileiros vêm dirigindo times portugueses e nunca ouvi falar em roubo de espaço. Os professores daqui nunca viram com bons olhos a chegada de profissionais de outros países, se sentem os donos do pedaço. Ao invés de mergulharem nessa troca de experiências torcem contra.
Hoje deveria ser o Dia Nacional da Consciência Geral. Chega de falar que no futebol atual não há mais espaço para os baixinhos, para os lentos, para os carecas, Kkkkk, desses ainda não pegaram no pé! O futebol nasceu para abrir portas e derrubar muros. Por isso, não gostamos dos retranqueiros porque eles fecham portas, Kkkk!!! E fecham com força!!! O futebol foi feito para fluir. O futebol é uma dança, é plástico, é pura arte. O futebol é multicolor!
Sobre a última rodada, nenhuma novidade e apresentações pavorosas. Não encontro outro adjetivo para Cruzeiro, Inter e Corinthians.
A seleção sub-17 conseguiu um feito, ser campeã mundial sem ter sido classificada nas Eliminatórias, Kkkkk. E todos acham lindo, a imprensa exalta e vamos vivendo no famoso me engana que eu gosto.
A seleção de Tite não vencia há incríveis cinco jogos, desde a final da Copa América! Só conseguiu ganhar da poderosa Coreia e Rodrygo, que vem encantando os europeus, só entrou nos acréscimos. Talvez porque o menino tenha sido elogiado por Zidane no Real Madrid e, como se sabe, nossos professores são contrários as opiniões dos estrangeiros, Kkkkk.
RACISMO COMO CARTA NA MANGA: MAL AMADOS BEM ARMADOS
por Brenno Carnevale
No último dia 10 de novembro testemunhamos mais um episódio odioso de discriminação racial nos estádios de futebol.
Em Minas Gerais, um “torcedor” indignado com a atuação dos agentes de segurança que supostamente fecharam uma saída de emergência disparou a seguinte frase contra um deles: “olha a sua cor”.
Discriminação racial escancarada e afrontosa, mas, infelizmente, não surpreendente.
Na verdade, a fase oral do racismo, isto é, quando as palavras de ódio e discriminação são efetivamente proferidas, revela-se apenas a ponta do iceberg.
Muito antes do grito repugnante, o racismo e a discriminação já se encontram consolidados na estrutura mental e comportamental daquele que se julga mais puro.
Conclui-se, então, lamentavelmente, que os racistas existem em muito maior quantidade do que somos capazes de ouvir.
Em outras palavras: existem muitos racistas que nunca xingaram um negro de macaco (para usar um triste e corriqueiro exemplo de racismo escancarado), mas que nem por isso deixam de ser racistas.
O racismo, muito antes de ganhar a forma de voz e xingamento, se encontra enraizado nas estruturas mentais e nas perspectivas e formas de ver o mundo.
No Brasil, que vive o mito de país miscigenado com a fantasia (quiçá intencional) de povo cordial, o racismo funciona como verdadeira carta na manga.
É o super-trunfo do prestígio social.
Se o garçom, o porteiro, o pedreiro, o faxineiro, o segurança, a diarista, o advogado, o motorista, o policial, o professor, o jornalista, o médico, o engenheiro (e tantos outros) fizerem tudo de acordo com a vontade de seus “senhores”, a relação será amistosa, respeitosa e, quem sabe, até amigável.
Mas o conforto de muitos brancos está em suas estruturas mentais de superioridade.
No primeiro interesse não satisfeito dos arianos “donos do poder” ou no primeiro deslize daqueles que os servem, é sintomático o pensamento e o comportamento que coloca os outros na condição de inferioridade e de seres dignos de desprezo.
É o mantra criminoso: “Tinha que ser negro/preto”, tatuado na mente doente de muitos mal amados, mantra este que ganha a roupagem de uma enorme miscelânea de comportamentos odiosos, desde a forma de olhar até o ruído de cortar qualquer coração que ainda se digne de assim ser chamado, ruído bem simbolizado pela famigerada frase: “olha a sua cor”.
Olhar a cor do outro e percebê-lo como um igual é um ótimo exercício de cidadania.
Olhar a cor do outro para não enxergá-lo ou fazê-lo como argumento de superioridade é um dos crimes mais odiosos que uma sociedade pode testemunhar.
Em um Brasil em que os mal amados estão bem armados, é tempo de tornar o racismo, com todas as suas formas odiosas, uma carta definitivamente fora do baralho.
CARA CRACHÁ
por Eliezer Cunha
Tivemos na última quarta feira a realização de um dos maiores clássicos do futebol brasileiro Flamengo x Vasco. O chamado “clássico dos milhões”, classificação que infelizmente não se consolidou na ocorrência desta partida, já que por parte da torcida do Vasco não houve a adesão esperada dos torcedores. Bom, perderam uma boa oportunidade de assistir o time da Cruz de Malta jogar de igual para igual com o melhor time do campeonato.
Rivalidades à parte dentro do campo durante ou após os jogos são fatos normais e vão se estender enquanto houver disputas entre equipes. O que não dá pra entender são situações inoportunas geradas por personagens que deveriam estar em outro lugar que não fosse dentro do contexto do jogo, me refiro a diretores, gerentes e/ou os amigos do rei. Possuir crachá ou ser indicado já é o suficiente para ficar presente no banco com direito de até entrar no gramado. Em geral, essa prática é utilizada por todos os clubes e ocorrem em praticamente todos os jogos, proporcionalmente, obviamente ao poderio do clube no contexto esportivo nacional.
No caso específico do jogo da última quarta feira, ao final da partida, no calor do resultado, um “gerente” se adentra em campo para tomar satisfação com um jogador do time adversário e chega a agredi-lo. Esta recepção “calorosa” e dispensável veio por parte de um integrante da gestão do Vasco. Ora, o que deveria ser comemorado pelo time por conquistar um belo resultado, foi manchado por uma atitude imatura e inconsequente.
O Club de Regatas Vasco da Gama já carrega por anos o estigma do coronelismo esportivo praticado no passado por grandes e importantes dirigentes como Eurico Miranda e Calçada, mas o que precisamos entender é que os tempos mudaram e os rumos do esporte também. Quando uma atitude desta natureza ocorre traz em si consequências que vão de desentendimentos no gramado do jogo até uma desavença em uma roda de amigos em um bar da esquina.
O espetáculo e o seu resultado deve ser respeitado. A preocupação com as interferências extra campo devem ser medidas e monitoradas e a prática “Cara Crachá” banida dos esportes de uma vez por todas pelo bem e evolução de nossos esportes.