VIDA DE TREINADOR
por Zé Roberto Padilha
A última partida que dirigi como treinador foi contra o Flamengo, na Gávea, em 1995. Comandava o Entrerriense FC e disputávamos o octogonal decisivo da 1º divisão carioca. Lutamos muito para ficar entre as oito melhores equipes do estado em um dos mais disputados estaduais. O nível era muito alto: Centenário do Flamengo, o Botafogo acabou campeão brasileiro e o Fluminense, de Renato Gaúcho, foi campeão carioca.
Nunca apanhamos tanto na vida.
Mesmo com o lombo doído de um dever cumprido, entramos no ônibus que nos levaria à Gávea. Foi quando um diretor do clube entrou também e sentou-se com o filho nas primeiras poltronas com a camisa do Flamengo. Deixa eu repetir: o time do Entrerriense foi jogar no Rio contra o Flamengo e um diretor embarcou no ônibus da delegação com a camisa rubro-negra.
Para tudo. Ou ele desce com o filho, troca de camisa, ou vai no seu carro. O fato é que não deixamos o ônibus partir. Confusão geral até a chegada do presidente. Que tinha que tomar uma posição e ficou em cima do muro. E o impasse durou trinta minutos, quase não chegamos a tempo. Finalmente, o diretor e seu filho desceram sob protestos. E sabia que ali estaria decretado meu destino.
Porque quando cheguei ao clube ele tinha três médicos. Dois neurologistas e um clínico geral. Torcedores e beneméritos sempre acompanharam o time. No amador tudo bem, mas no profissional? De cada atendimento em campo, 99,9% são casos para um ortopedista. E exigi que o Entrerriense contratasse um. E foram os três para o outro lado das arquibancadas torcerem contra mim.
Agora já eram quatro. Quase a diretoria toda.
O jogo? Acabou Flamengo 6×0, Romário fez três, Sávio fez dois e o outro não anotei a placa.
Dia seguinte fui demitido. E fiquei pensando: não teria sido melhor melhor não ter deixado o ônibus partir? Tomar de WO?
SERGINHO CHULAPA
por Paulo R. Carvalho
Com toda essa onda de reprises de jogos históricos por conta do confinamento que estamos passando, voltou à tona um tema que de tempos em tempos sempre retorna ao radar: a campanha da seleção brasileira na Copa de 1982 e, sobretudo, a escalação do Serginho na equipe titular.
Deixem-me voltar um pouco no tempo para poder apresentar quem realmente foi Serginho para aqueles que só viram as reprises desses cinco jogos da Copa e formaram um julgamento influenciados pela desclassificação do Brasil.
Serginho foi um centroavante espetacular. Em meados da década de 70 já esbanjava vigor físico, velocidade, técnica (SIM) e faro de gol. Por conta disso é até hoje o maior artilheiro da história do São Paulo Futebol Clube com 242 gols em 399 partidas disputadas, uma excelente média de 0,61 gol por jogo.
Em 1977, ano em que o SPFC foi campeão brasileiro, Serginho disputava gol a gol com Reinaldo do Atlético-MG o papel de artilheiro e protagonista do campeonato. Dava gosto de vê-lo jogar, fazia toda a diferença em uma equipe apenas mediana, mas que se superou e chegou ao seu primeiro título nacional.
Como o mundo não é perfeito, o que tinha de genial, Serginho também tinha de intempestivo. Uma agressão chutando um bandeirinha que anulou equivocadamente um gol legal do artilheiro resultou em uma suspensão por 14 meses, posteriormente abreviada para 11, mas que lhe tirou da lista dos convocados para a Copa de 1978 na Argentina.
Ah….se arrependimento matasse!!! Essa Copa de 1978 tinha “a cara do Serginho”. Disputada em campos pesados, esburacados e com muitas disputas físicas, tudo o que nossa seleção precisava era de um camisa 9 com as características do Serginho. Como não foi possível convocá-lo, Cláudio Coutinho optou por Reinaldo (escolha óbvia) e Nunes, artilheiro que vinha com bastante destaque atuando pelo Santa Cruz, de Recife. Com o grupo de 22 jogadores já definido, uma contusão em um treino forçou o corte de Nunes e a convocação do Roberto Dinamite às vésperas da estreia do Brasil na Copa. Curioso, né? Roberto, atacante do Vasco da Gama, foi a 4ª opção do “carioca” Cláudio Coutinho para o ataque.
Passada a Copa do Mundo e já de volta aos gramados, Serginho fez parte de uma das maiores equipes do SPFC da história, tendo sido bicampeão paulista em 80/81 e vice brasileiro no mesmo ano de 81. Nessa época, Telê Santana já estava à frente da seleção brasileira e buscava formar a equipe que mais tarde encantaria o planeta na Espanha.
No período que compreendeu Mundialito no Uruguai, eliminatórias sul-americanas e diversos amistosos pelo Brasil e Europa, todos os grandes centroavantes brasileiros tiveram oportunidades. Foram testados na posição Reinaldo, Serginho, Nunes, Roberto, Careca, Baltazar, César e até o Dr. Sócrates improvisado. Todos eles jogaram e puderam ser avaliados pelo saudoso Telê.
Entre jogos iniciados como titular e entradas no decorrer das partidas até o início da participação do Brasil na Copa de 1982, os que mais jogaram na posição de centroavante foram:
1. Serginho – 15 jogos
2. Reinaldo – 11 jogos
3. Sócrates – 7 jogos
4. Roberto – 5 jogos
5. Careca e Baltazar – 4 jogos
6. Nunes e César – 2 jogos
Os escolhidos por Telê Santana foram Serginho (escolha mais do que óbvia dada a quantidade de partidas disputadas pela seleção e excelente desempenho nos anos de 80/81/82 pelo SPFC) e o surpreendente Careca que estreou pela seleção apenas em março/82 em uma partida contra a Alemanha Ocidental no Maracanã diante de 150.289 torcedores, entre eles, eu. Reinaldo acabou ficando de fora. Uns dizem que por contusão, outros por conta de seu comportamento fora de campo que desagradava o treinador. Com o corte do Careca por contusão, também às vésperas da Copa, novamente Roberto Dinamite acabou convocado ao apagar das luzes.
Serginho foi, portanto, merecedor de sua convocação. Conquistou sua posição na bola, dentro de campo e ao longo de vários jogos distribuídos entre os 26 meses que antecederam a Copa com Telê como treinador.
O resto da história todos conhecem. Serginho fez 5 jogos como titular na Copa do Mundo, marcou 2 gols e teve participação em alguns outros gols com passes e deslocamentos. Avaliar sua participação é um tema bem subjetivo. Eu entendo que ele fez uma Copa, no mínimo, “honesta”. Discreto contra a URSS, péssimo contra a Escócia, bem contra Nova Zelândia e Argentina e mal no derradeiro jogo contra a Itália onde o time todo não se encontrou. Falando nesse jogo, muitos atribuem nossa eliminação às escalações de Valdir Peres e Serginho, porém lembro que não foram eles que “deram” 3 gols para a Itália. No primeiro gol, Júnior muito mal colocado não acompanhou Paolo Rossi e ele marcou de cabeça. No segundo, Cerezo deu um “maravilhoso passe” para Paolo Rossi marcar e no terceiro, novamente Júnior se “esqueceu” de acompanhar a movimentação da defesa canarinho de modo a deixar Paolo Rossi em impedimento. Não estou aqui buscando culpados. Só quero mostrar que não foi pela presença do Serginho na equipe que perdemos a Copa. Perdemos porque em mata-mata de Copa não podemos errar e, infelizmente, tivemos erros individuais grosseiros que cobraram seu preço. Mesmo assim ainda tivemos chance de empatar no final, porém os deuses do futebol e Zoff não deixaram.
Se tivéssemos passado pela Itália com um empate de 3×3, apesar das falhas individuais, tudo isso teria sido relevado. Nós brasileiros comemoraríamos o título considerando que tivemos apenas um “imprevisto” contra a Itália que em nada comprometeu nossa conquista. Mais ou menos como o frango do Valdir Peres no primeiro jogo e aquele gol que Serginho não fez contra a Itália tendo Zico logo ao seu lado para finalizar…
Paulo R. Carvalho
Quem sou eu?
Paulista nascido em 1968 mas que mora no RJ desde 1980. Serginho foi meu primeiro e único ídolo no futebol. Por causa dele sempre joguei de centroavante e tenho o 9 como meu número predileto. Perdi a conta de quantas brigas tive em meus tempos de colégio aqui no RJ defendendo o Serginho das gozações feitas por meus colegas cariocas que insistiam em chamá-lo de “pereba” e defendiam os locais Nunes e Roberto Dinamite. Infelizmente não tive o prazer de conhecê-lo pessoalmente (ainda).
FALCÃO E O JOGO DO ANO EM 1979
por Luis Filipe Chateaubriand
Era a semi final do Campeonato Brasileiro de 1979, Palmeiras x Internacional no Morumbi.
O Palmeiras jogou com: Gilmar; Rosemiro, Beto Fuscão, Pollozi e Pedrinho; Pires, Mococca e Jorge Mendonça; Jorginho, Carlos Alberto Seixas e Baroninho.
O Internacional foi de: Benitez; João Carlos, Mauro Pastor, Mauro Galvão e Cláudio Mineiro; Batista, Falcão e Jair; Valdomiro, Bira (Adílson) e Mário Sérgio.
Jogo extremamente equilibrado, as chances iam se sucedendo lado a lado.
Tínhamos o duelo entre o estrategista Ênio Andrade e o estilista Telê Santana, colocando frente a frente os dois melhores times do país de então.
Por volta de 35 minutos do primeiro tempo, depois de uma bola rebatida pela defesa colorada, Baroninho chuta de longe, rasteiro e por baixo de Benitez, para abrir o placar.
Palmeiras 1 x 0.
No final do primeiro tempo, Mário Sérgio cruza da esquerda, para linda e espetacular bicicleta de Falcão, que passa rente ao travessão.
O segundo tempo se inicia como a mesma tônica do primeiro, chances de lado a lado.
Já por volta dos cinco minutos da segunda etapa, o príncipe Jair chuta de longe para, em falha do goleiro Gilmar, empatar o jogo.
Tem-se 1 x 1 no placar.
A igualdade não dura muito, pois por volta de dez minutos do segundo tempo, Jorge Mendonça recebe a bola na entrada da área de costas, mata no peito girando o corpo e conclui para o barbante – um golaço!
Palmeiras 2 x 1.
O Internacional segue, obstinadamente, em busca do empate. E, por volta de 20 minutos da etapa final, um cruzamento da direita encontra a cabeça de Falcão, que sobe mais que o bem mais alto Beto Fuscão, e dali vai para as redes.
Nova igualdade, 2 x 2.
Cerca de cinco minutos depois, por volta de 25 minutos da etapa final, Falcão aproveita uma rebatida de Beto Fuscão para emendar um sem pulo sensacional, em gol antológico!
Internacional 3 x 2.
Continuam se sucedendo as oportunidades lado a lado, em jogo memorável, mas o placar não se altera mais.
Ênio Andrade vence o duelo, vitória gaúcha em plena São Paulo.
Em um jogo de tantos craques, sobressaiu aquele que fez gol improvável de cabeça, gol incrível de sem pulo, quase gol de bicicleta que seria inesquecível e comandou o time em campo: Paulo Roberto Falcão, o futuro Rei de Roma, a classe em forma de jogador de futebol!
Luis Filipe Chateaubriand é Museu da Pelada.
RESPEITO À HISTÓRIA
:::::::: por Paulo Cezar Caju ::::::::
Recebi uma mensagem do santista J. Maurílio Paixão sugerindo que os jogadores de nossa época não fiquem comparando qual dos dois times, Botafogo e Santos, teria sido o melhor. Um tinha Pelé, o outro Garrincha e proporcionaram ao público espetáculos grandiosos em que pouco importava o resultado. Sabe, ele tem toda razão, afinal todos os jogadores se respeitavam. Mas volta e meia caímos nessas pegadinhas da imprensa, tipo “PC Caju x Edu”? Na época, o bairrismo era pesado e influenciava até nas convocações da seleção. Também tinha o Cruzeiro, Palmeiras e outros gigantes, cada qual com o seu 10 de qualidade e seu centroavante que cabeceava de os olhos abertos. O mundo nos respeitava e a maior prova de nosso poder de fogo foram as conquistas internacionais.
Hoje, os times brasileiros não são convidados mais para nada, no máximo torneios de quinta categoria nos Estados Unidos. Agora, o centro de memória do Botafogo, em nome de Luís Felipe Carneiro de Miranda, reivindica à FIFA como títulos mundiais. Talvez seja uma batalha inglória, mas nós jogadores podemos garantir sua relevância, tanto que o Torneio de Caracas era chamado de Pequena Taça do Mundo. A qualidade dos adversários era infinitamente superior aos de hoje. Fui campeão mundial de clubes pelo Grêmio em cima do Hamburgo e, claro, me orgulho disso, mas na segunda edição do Torneio de Caracas vencemos a seleção da argentina na final. Na primeira, a decisão foi contra o Barcelona e ganhamos por 3×2, gols de Aírton Beleza, Gerson e um meu. Também vencemos o Peñarol, o Spartak, o próprio Santos, de Pelé, e o Benfica, de Eusébio e Coluna.
O nível era altíssimo e não é nenhum absurdo essa reivindicação. O Botafogo até confeccionou os troféus porque o torneio não premiava. Vários clubes têm suas reivindicações, justas ou não. Que coloquem a boca no trombone! Os clubes da época venciam seleções e o mundo os reverenciava, talvez fosse importante a FIFA rever seus critérios, não pelo Botafogo, mas pela história do futebol como um todo. Se hoje grandes torcidas existem, muito deve-se a esses jogadores. Pouco me importa se o Botafogo vai subir mais alguns degraus no ranking, afinal com essa revisão outros clubes seriam contemplados.
O santista J. Maurílio Paixão sabe bem que seu clube era um papa-títulos internacional. Bangu, Corinthians e Cruzeiro também venceram edições do Torneio de Caracas, tinham timaços! Relendo a mensagem de J. Maurílio Paixão me emociono porque vejo um torcedor brigando por suas cores, exigindo respeito, tudo com extrema educação e cordialidade. Está na história e história é para ser respeitada. O Santos sempre foi um celeiro de ídolos, assim como o Botafogo. Se a FIFA não aceitar a reinvindicação de nosso clube, continuaremos tendo a plena certeza de nosso papel, de nossa luta, de nossa glória.
A APOSTA
por Valdir Appel
O campeonato paranaense de 1978 poderia ser decidido nos pênaltis e Manga apostou com Evangelino da Costa Neves, presidente do Coritiba, seu clube, 100 dólares para cada pênalti que ele defendesse contra o arqui-rival Atlético Paranaense. E, realmente, a decisão foi para as cobranças de penalidades.
Enquanto os técnicos decidiam quem iria bater os pênaltis, Manga sentou-se ao lado da baliza e pediu ao massagista aplicação de gelo num dos joelhos, que aparentemente estava machucado. Após enfaixá-lo, foi para o gol. Talvez, seduzidos pelo joelho envolto num pano, os jogadores do Furacão insistiram em cobrar daquele lado e erraram três cobranças. Duas, Manga defendeu; e uma foi para fora.
No dia seguinte, o presidente entregou 200 dólares ao goleiro, que reclamou:
– Son trecentos, pressidente!
– Como trezentos, se você defendeu dois?!
– Pressidente, mira acá! Manguita non defendió porque la pelota se fue para fuera. Son trecentas platitas!