JOÃO AVELINO, O POPULAR 71
por Valdir Appel
Baixinho, bochechudo, de bigodinho aparado, chapéu de palha para proteger a calvície do sol, e dono de um humor sarcástico e afiado, o treinador João Avelino parecia uma figura chapliniana comandando suas equipes.
Montou o primeiro time do Ceub de Brasília para a disputa do campeonato brasileiro de 1973.
Cabia ao jogador identificar um elogio por trás das palavras duras e das críticas que ele fazia constantemente.
Era dado a comparar de forma pejorativa um atleta seu a outro mais famoso:
– Pelé perde pra você! Se você continuar chutando assim, vai matar o goleiro… de raiva!
– Vaii cabecear assim na casa da mãe Joana!
Suas provocações davam resultado, mexiam com os brios dos jogadores que se superavam.
Quando o estádio Mané Garrincha estava prestes a ser inaugurado e alguns treinos foram permitidos para reconhecimento do gramado, um repórter pouco experiente foi entrevistar João Avelino:
– Seu João, o que o senhor está achando do gramado?
João se abaixou, colheu e mastigou um cadinho de grama, e respondeu:
– Verdinho, macio e azedinho, meu filho!
O mesmo incauto repórter:
– Seu João, como é que o senhor está vendo o jogo?
– Com os olhos, meu filho, com os olhos!
João Avelino Gomes, mais conhecido apenas como João Avelino ou como 71, foi um treinador de futebol brasileiro, que se destacou principalmente por suas passagens em dois clubes da cidade paulista de São José do Rio Preto: o América-SP e o Rio Preto. Wikipédia
Nascimento: 10 de novembro de 1929, Andradas, Minas Gerais
Falecimento: 24 de novembro de 2006
SAUDADES ETERNAS
por Luis Henrique Marques
Era uma segunda-feira, dia 23 de maio de 1983, às 7h da manhã, foi a última vez que pude vê-lo vivo.
Tínhamos passado um belo domingo, eu, minha mãe e ele. Teve almoço, frango assado com arroz e salada, suco da fruta feito pela minha mãe e de tarde o primeiro jogo da final do Campeonato Brasileiro daquele ano, era Santos e Flamengo. Almoçamos, descansamos e assistimos o jogo, que teve uma derrota do Flamengo por 2 x 1. Eu disse:
– Pai, semana que vem é no Maracanã, não é? – e ele respondeu que era e que estaríamos lá para ver.
Veio o dia seguinte, me arrumei para ir à escola, papai botou o terno com as suas abotoaduras que guardo até hoje, pegou a pastinha marrom dele, sapato brilhando, entrou no carro e foi dar o seu expediente no escritório Tozzini.
Fui para a escola, me senti estranho a manhã toda, acabou a aula e eu voltei para casa. Quando eu cheguei em casa, a primeira coisa que minha mãe disse, foi que alguém esteve na casa, mas ela não sabia quem era, não havia ninguém. Naquele tempo não tínhamos telefone em casa, pois custava o preço de uma casa.
Almoçamos, eu e minha mãe, pois depois eu descansaria para fazer os deveres de casa. Por volta das 14h, sem mais e nem menos, apareceu o meu primo Francisco, ele estava estranho, uma expressão esquisita, mas eu só tinha 8 anos, como poderia perceber o que era? Depois, apareceu minha prima Geni com o seu marido Joasi, muito amigos nossos e, nos disseram que tínhamos que ir até o Centro de Niterói, pois meu pai havia passado mal.
Chegamos lá e todos olharam para nós e falaram com muito cuidado que meu pai, com apenas 39 anos de idade, havia falecido naquele dia, naquela manhã, às 8h, logo depois de se despedir de nós. Ele infartou dentro das Barcas Rio – Niterói, bem no meio da travessia, inclusive tendo a barca que voltar a Niterói.
Quando recebi a notícia, senti o maior buraco do mundo se abrindo aos meus pés, um buraco que até hoje eu não sei a dimensão dele.
A vida seguiu, mas nunca consegui suprir a sua ausência, a do meu pai, aquele no qual eu sempre tive como ídolo.
Na semana seguinte, o seu e o nosso Flamengo, reverteu o resultado, e fomos Tri- campeões Brasileiros, mas não teve graça pra mim.
Pai, eu continuo sendo aquele seu garotinho, aquele que adorava pedalar de bicicleta com o senhor na Quinta da Boa Vista, que adorava ir ao Maracanã em plena quarta-feira de noite, aquele que não entendia como uma nota de 100,00 cruzeiros, poderia virar várias no troco da feira, eu ainda tenho muito daquela inocência.
Eu te amo, pai.
Saudades eternas de você.
EU, LAZARONI, A POCHETE E OS PASTORES ALEMÃES | PARTE 2
por Nielsen Elias (@nielsen_elias)
2º CAPITULO
Ainda em Bruxelas, como haveria um espaço entre os jogos da eliminatórias.
Lazaroni resolveu ir até Portugal para acompanhar o jogo entre o clube do Porto x Benfica. Afinal de contas, pelo menos quatro jogadores estavam na sua lista para a Copa do Mundo, que eram, Ricardo Gomes, Mozer e Valdo pelo Benfica e Branco pelo Porto.
Já no aeroporto de Lisboa, fomos recebidos pelo empresário Manoel Barbosa, que na ocasião tinha um certo prestígio na Europa, em especial em Portugal.
Manoel Barbosa era um Benfiquista ferrenho e naquele momento tinha colocado os três jogadores nos encarnados, como chamam os torcedores do Benfica.
A rivalidade era bem acentuada entre as torcidas.
E essa partida aconteceu no antigo Estádio das Antas, pertencente ao Porto.
Fomos de carro, de Lisboa a cidade do Porto.
Levamos quase três horas para chegar.
O movimento era muito grande de torcedores, não só no entorno, como dentro do estádio.
Carro estacionado e o convite nas mãos.
Lazaroni, eu, Manoel Barbosa e seu segurança subimos a rampa que tinha uma placa que indicava: camarotes.
Pelo caminho, percebemos que alguns torcedores do Porto demonstravam um certo descontentamento com a presença do Manoel Barbosa, mas como ele era torcedor do Benfica, consideramos situação normal, que acontece na maioria dos países.
Entramos numa pequena fila para passarmos pela roleta.
O primeiro foi o Lazaroni que não teve qualquer problema para entrar, até porque naquela altura já sabiam da sua presença na cidade para assistir ao clássico, tudo bem natural.
O segundo fui eu, que da mesma forma que o Laza, entrei normalmente.
E logo após de mim, vinha o Barbosa.
Eu e Lazaroni paramos para esperar por ele.
Mas, quando o Manoel Barbosa chegou bem perto da roleta, de repente, surge uma mão e bate no peito dele com uma certa violência , e diz:
– Você aqui não entra!!!!
Levamos um grande susto com aquela reação inesperada. Não entendíamos o que estava acontecendo… Por outro lado o Barbosa também não fez por menos. Com o ingresso na mão, bradava enraivecido que iria entrar de qualquer maneira e que além de tudo estava acompanhando o mister da seleção brasileira e aquilo era um desrespeito! Uma grande confusão se formou de imediato.
E rapidamente fomos conduzidos ao nosso camarote, mesmo argumentando que gostaríamos de esperar o Manoel Barbosa, afinal era o nosso cicerone.
Com a argumentação que tudo logo seria resolvido e que não nos preocupássemos, nos conduziram até o camarote.
Jogo pra começar e nada do Manoel…
O estádio estava lotado!!
Acaba o primeiro tempo, mas ele não aparece… essa altura achávamos que estava em algum lugar reservado para os torcedores do Benfica.
Finalmente, o jogo termina em 0x0, e nada dele aparecer…
Fomos convidados para descer ao balneário (é assim que os portugueses chamam os vestiários).
Já no balneário, encontramos com todos os jogadores, em especial os brasileiros e ficamos conversando por um bom tempo.
Os jogadores do Benfica vão para o ônibus para retornar a Lisboa.
E continuamos o papo com o Branco, que nos leva para o estacionamento, onde sua esposa o espera com seu carro.
No trajeto até o carro, verificamos que o estacionamento está praticamente vazio e o carro do Manoel Barbosa não está por lá.
Contamos o ocorrido ao Branco, que nos diz que os dirigentes do Porto odeiam ele por suas declarações contra o Porto.
Falamos mais sobre o jogo, que achamos um pouco violento, com o que o Branco concorda e tira da bolsa a caneleira que se usa em Portugal, como uma forma de confirmar o nosso sentimento em relação à partida.
Me surpreendo com a caneleira, pois não é nada convencional. É um tipo bem diferente. A começar que é feita sob medida em loja de ortopedia.
O material é bem leve e ela se encaixa na perna, se prendendo na panturrilha. Seu tamanho também é bem diferente, ela vai da base do joelho até quase o calcanhar, dessa forma protege por inteiro a tíbia. Sensacional!!!
A nossa preocupação aumenta não só com o Manoel Barbosa e também como retornaríamos para Lisboa?
Menos mal, porque estamos com o Branco e ele poderia nos socorrer.
Papo vai e papo vem, surge um mensageiro com um recado.
Ele pergunta:
– O senhor é seu Sebastião!?
Laza, com a cabeça faz um sinal positivo.
Após a confirmação, ele diz:
– Seu Barbosa está esperando o senhor no restaurante tal…
Ficamos mais aliviados e o Branco se oferece para nos deixar lá. E emenda:
– Só posso levar, infelizmente não poderei ficar… vocês sabem como é, né!?
Era restaurante grande e com estilo bem antigo, decorado por barcos e redes de pescar.
Sua especialidade era frutos do mar!
Entramos, e logo avistamos o Barbosa sentado à mesa e atrás, em pé, seu fiel escudeiro.
Ao nos aproximar, vimos um Manoel bem destroçado…
Sentamos à mesa e já havia uma garrafa de vinho aberta.
A aparência dele era a pior possível, parecia que tinha saído de uma garrafa. Cabelo em desalinho, seu paletó todo amassado.
No pé só um sapato.
Seu rosto estava marcado com algumas manchas vermelhas, mas o que mais chamou a minha atenção foram seus óculos Cartier. A lente esquerda estava pra baixo, enquanto a direita estava pra cima… Os óculos estavam completamente tortos!!!
A gente meio perplexo com toda aquela situação não sabia o que dizer…
Então, ele quebra o silêncio e fala:
– Olha o que aqueles bárbaros fizeram comigo… me bateram à beça!!
Eu e Laza balançamos a cabeça, quase ao mesmo tempo!
E ele continuou falando de forma resignada:
– Sabe de uma coisa mister!? Poderia ter sido uma tragédia….
A sorte que meu segurança é muito calmo e não reagiu…
– Ainda bem, mister!!!! Ainda bem…
E finalizou…
No próximo capítulo, estaremos no leste europeu, países com o regime comunista.
Lembrando que o muro de Berlim está preste a cair…
Até!
UM JOGO, UM GOL, UMA VITÓRIA
por Wesley Machado
Maracanã, 5 de agosto de 1979. O Flamengo tinha Zico, Júnior, Adílio, Tita, Júlio César, Cláudio Adão, entre outros grandes jogadores que marcariam época no Rubro-Negro. Era o começo da fase mais áurea do clube da Gávea, que enfrentaria o Americano de Campos dos Goytacazes pelo Campeonato Carioca.
– Antes do jogo a gente sabia que enfrentar o Flamengo no Maracanã com aquele timaço que jogava por música ia ser muito difícil. Entramos em campo com o time mais ou menos fechado. O técnico nosso era o Murilo, um ex-jogador do Flamengo que tinha a experiência de ter passado por lá e orientou a gente. O Flamengo com aquela maneira de jogar com domínio e toque de bola e a gente ficou envolvido o tempo todo, só que a bola não entrava. Nosso goleiro era o Paulo Sérgio (Botafogo e Seleção Brasileira). Adílson e Rubinho na zaga. A bola batia na defesa, Paulo Sérgio defendia e foi até o final desta forma! – conta o ex-jogador do Americano, Sérgio Pedro.
Ele descreve como fez um gol histórico e inesquecível, o da vitória de 1 a 0 do Americano de Campos sobre o Flamengo de Zico no Maracanã:
– Futebol tem dessas coisas. Eu consegui dar um drible curto em Rondinelli na entrada da área. Aí a bola caiu para a perna esquerda e eu chutei mal. A bola foi pererecando na reta do goleiro e de repente o Té entrou na frente, levou a bola pra a linha de fundo do lado esquerdo e eu continuei acompanhando a jogada. Ele ficou sem ângulo e, pressionado pelo goleiro Cantarelli, ele cruzou a bola pro meio da área, eu entrei com o gol praticamente vazio e, por incrível que pareça, eu toquei na bola com o pé direito, que é difícil até para subir no ônibus! – revela o ex-jogador do Americano.
Da esquerda para a direita – Em pé: Zé Carlos(depois foi para o Flamengo), Oliveira (foi para o Bangu), Totonho (https://www.museudapelada.com/resenha/totonho-impavido-alvi-anil), Ronaldo (Torres, virou preparado físico), Índio e Cesar. Agachados: Amarildo (chegou a jogar no Cruzeiro), Antônio Carlos, Maciel, Zé Roberto (Ex-Flamengo e Fluminense, Colaborador do Museu da Pelada) e Sérgio Pedro (Personagem da Reportagem).
– Aquele gol ficou na memória de muitos. Este gol, que a gente ainda recorda apesar de tanto tempo, foi até assim estranho. O lance do gol foi interessante. E a emoção da vitória foi incrível. A vitória foi um marco. Foi a primeira vitória no Maracanã daquele time pequeno. Que era assim que o pessoal chamava os times do Interior. E realmente a diferença era muito grande. Foi aquela vibração todo mundo no Maracanã. Repórteres que exaltavam esta vitória de impressionar. E depois também no vestiário. E até na cidade de Campos também. Esse gol todo mundo lembra por esse momento. Então a gente encontra hoje vários torcedores que quando me vêem lembram desse gol. Naquela época foi um feito relevante, que não foi esquecido! – lembra Sérgio Pedro, que escolheu encerrar a carreira de jogador de futebol aos 25 anos, com a sensação de dever cumprido, após realizar o sonho de ser aprovado no ano de 1985 em um concurso público.
AUTOBOL, UM ESPORTE BRASILEIRO DISPUTADO POR CARROS
por André Luiz Pereira Nunes
É no mínimo inusitado imaginar uma partida de futebol contendo carros em vez de jogadores. Parece impossível, mas não só existiu essa modalidade, como ainda foi inventada, no início dos anos 70, por um brasileiro, embora tenha persistido por pouco tempo. Foi o doutor Mário Marques Tourinho, fã de futebol e automobilismo, quem a concebeu e a pôs em prática, apoiado pelo produtor de TV, José Maria Adame. Na época, Mário era diretor do departamento médico do America e médico da Associação Carioca de Volantes de Competição.
A ideia ganharia corpo e se tornaria uma verdadeira febre com direito a uma ampla cobertura de jornais e televisão. Após algumas experiências envolvendo amistosos no estádio Luso-Brasileiro, na Ilha do Governador, os organizadores resolveram, em 1973, organizar o primeiro Campeonato Carioca de Autobol no antigo estádio do America, na Rua Campos Sales, na Tijuca. Os disputantes foram America, Flamengo, Vasco e Fluminense. O campeão foi o Tricolor das Laranjeiras, o qual contava em seu elenco com o piloto Ivan Sant’Anna, hoje um famoso escritor, além de Alfredo, Fernando Davi e Paulo Jorge.
Os jogos eram disputados em campos de terra batida ou saibro contendo as mesmas dimensões de um gramado de futebol. A bola, de couro de búfalo com diâmetro de 1 metro e peso de 11 kg, era conduzida por carros, cujo número por times variou ao longo dos anos de três, quatro, cinco ou seis. Os escolhidos eram modelos baratos, como o Dauphine, que tinham câmbio de três marchas, facilitando bastante as manobras, pois a ré e a primeira marcha faziam parte do mesmo canal. Outros automóveis como o Volkswagen Fusca 1300, Volkswagen 1600, antecessor da Brasília, Gordini, Renault RQ e o Kharman-Ghia também foram bastante utilizados. É interessante frisar que os carros com capô redondo, como o Fusca, eram utilizados para “chutar” a bola para o alto, possibilitando que os outros veículos a “cabeceassem” para o gol. Já os de capô quadrado executavam passes rasteiros e cobranças de falta.
Na edição seguinte, em 1974, o Botafogo, que entrara no lugar do America, sagrou-se vencedor. Alguns cotejos também passaram a ser disputados no Colégio Santo Inácio, em Botafogo, no campo dos Funcionários do Horto Florestal e até no gramado das Laranjeiras, o qual aguardava replantio. Porém, a alegria durou pouco. O país, que vivia o auge da ditadura, experimentava outra de suas costumeiras e inúmeras adversidades econômicas que permearam a sua história. O estouro da crise mundial do petróleo, agravada pelo fim do transitório e ilusório Milagre Econômico culminaram em severas restrições à prática de competições automobilísticas no país, inviabilizando totalmente o Autobol, o qual permanece vivo apenas nas lembranças de alguns aficcionados e estudiosos do peculiar esporte cuja origem é totalmente brasileira.