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AGONIA DO CRUZEIRO

por Marco Antonio Rocha


E o Cruzeiro de Tostão, Dirceu Lopes, Piazza, Nelinho, Raul, Sorín, Niginho e Natal trocou as páginas de esporte pelas de polícia. A poucos meses de completar 100 anos, no dia 2 de janeiro, o clube não tem o que festejar. Afundado em dívidas, vê ações trabalhistas se acumulando, jogadores indo embora, salários atrasados e seu nome manchado por aqueles que lhe juravam amor eterno. Traição.

A situação ficou ainda pior quando a Fifa decretou a perda de seis pontos na Série B por uma dívida com o Al-Wahda, dos Emirados Árabes, pelo empréstimo de seis meses do volante Denilson. E mais: o Cruzeiro corre o risco de sofrer em breve a mesma punição pela compra do atacante Willian junto ao Zorya, da Ucrânia. Seriam 12 pontos a menos… O risco de queda para a Terceira Divisão este ano é imenso, já que o clube teria apenas seis meses para quitar o débito. É provável que novos processos do tipo surjam em breve. Tormento.

O cenário se desenha justamente no momento em que o Cruzeiro precisa se reerguer nos gramados, em uma Série B complicada como jamais acontecera: o regulamento pela primeira vez obriga um clube grande a ver sua cota fixa de TV despencar – neste caso, de R$ 22 milhões para minguados R$ 6 milhões. A pandemia, que deixará os estádios desertos e a arrecadação com bilheteria reduzida a zero, aqui é apenas um detalhe. Devastação.

Minha sogra, Zilda, é cruzeirense e aos 70 e poucos anos foi enfática ao resumir seu sentimento: “Ao ver a camisa do Cruzeiro, sinto saudade. Mas é só. Perdi a chama”. É justamente isso o que esses dirigentes abjetos fazem com os torcedores — e não apenas do Cruzeiro, mas de todos: apagar a chama. É ela que motiva uma pessoa a sair de casa no dia do aniversário da mãe para ver um jogo, entupir o armário de camisas oficias caríssimas, economizar cada centavo para pagar o plano de sócios, passar essa paixão para o filho. Esses dirigentes não. São capazes de acumular um déficit de R$ 394 milhões somente em um ano. Mais de R$ 1 milhão em cada dia de 2019! Em outras palavras, para usar a definição da querida mineira, o que essa gente faz é apagar a chama. Desilusão.

Há quatro crimes sendo investigados pelas bandas da Raposa: falsificação de documentos/falsidade ideológica, apropriação indébita, organização criminosa e lavagem de dinheiro. Estima-se que a dívida total do Cruzeiro passe de R$ 1 bilhão. Se o clube fosse uma empresa, já teria fechado as portas, confinando o amor de sua torcida a memórias que se apagariam com o tempo — a bem da verdade, se fosse uma empresa os dirigentes estariam no seu lugar de direito: atrás das grades. Revolta.


Não me surpreenderei se o Cruzeiro — esse mesmo de Tostão, Dirceu Lopes, Piazza, Nelinho, Raul, Sorín, Niginho e Natal; duas Libertadores e tantos outros títulos — sumir do mapa. Seria o primeiro de muitos gigantes que se deitariam para sempre. Clubes brasileiros têm dívidas insolúveis, fazem do drible sobre o fio da navalha uma prática recorrente. Há 20 anos o Vasco sobrevive graças ao esforço de sua torcida, que constrói um CT e distribui cestas básicas a funcionários; o Santos agradece a cada craque fora de série vendido, sem saber se haverá um próximo para pagar contas básicas — e nem isso tem sido o bastante; o Corinthians joga dentro de uma bomba-relógio prestes a explodir. Somam-se a eles Fluminense, Botafogo, Atlético-MG… A lista é longa, e mais chamas podem se apagar. Desesperador.

OS TIMES DO SUBÚRBIO | PARTE 2

:::::::: por Paulo Cezar Caju ::::::::


Óbvio que recebi alguns puxões de orelha por não ter lembrado de alguns craques na crônica que fiz sobre os times do subúrbio. Jorge Lasperg acrescentou na lista Ivo Sodré e Badu, no São Cristóvão, Alves e Clair, no Campo Grande, Mário Breves e Itamar, na Portuguesa, e Jair Pereira e Morais, no Bonsucesso. João Antônio Soares lembrou do Mateus, reserva do Aladim, do Bangu. Olha só, o pessoal lembra até dos reservas! Fernando Cesar Monteiro Mattos lembrou do Zé Mario, a quem chamo de Dustin Hoffman, no Olaria, e Reinaldo Smoleanschi, de Sena, do Madureira.

São incontáveis craques, assim como vi na praia, no soçaite e no futebol de salão. Um deles foi Álvaro Canhoto ou Álvaro Garrincha, que, por sinal, estava revoltado com um ranking publicado listando os 100 melhores jogadores de futebol de salão de todos os tempos. E tinha total razão. Se não constavam Aécio e Serginho, do Vila, Tamba e Vevé, esqueça, essa lista não tem qualquer credibilidade. O próprio Álvaro deveria fazer parte. Do salão, saiu Pintinho, do América, toda a família de Zico, do Juventude, Zé Mário, do Magnatas, eu, meu irmão Fred, Antônio Carlos e o goleiro Borrachinha, do Vasco.

Comecei no Flamengo e vi muitos craques, os bairros tinham clubes com times muito fortes, como O Melo, Imperial, Sampaio Correia, Minerva/Helênico, os Tijucas, os Grajaús. Vi o Carioca, do Jardim Botânico, com Álvaro Canhoto, Elmo, Chiquinho, Serginho e Zezinho, o Flu, de Eurico Loiro, Mário Sérgio, Ricardo Chacal, Branco e Djalma, o Fla, de Moacir Vinhas, Orlando Vinhas, Bebeto, Zanoni e Khalil. Vi Antônio Carlos, do América, que jogou uma barbaridade, e admirei Tamba, que já falei aqui, um dos melhores que vi e que me aplicou uma das mais dolorosas goleadas.

A verdade é que os boleiros estavam espalhados por todas as modalidades. Basta lembrar como ficava o Aterro do Flamengo, apinhado de gente, para presenciar o Embalo do Catete, de Luisinho, e o Ordem e Progresso, de Cacá. Na praia, os times atraíam milhares de torcedores e turistas para assistir os embates entre Tatuís e Lagoa, por exemplo. O Lagoa era um timaço, com Dadica, Salgado, Lula, um cracaço, Pepe, Joninha, Gugu e Marcelo. E o Radar, de Eurico Lira?

Na praia, vi Bavani, Geraldo Mãozinha, Jorge Davidson, o Baba, Armando Monteiro, Patada e Nelsinho, do Botafogo. Tinha o Lá Vai Bola, de Renato, Santoro, Tubarão e Cesar, e o Copaleme, de Vitinho, Paulo Pelicano e Fernando Canalongo, o Guaíba de Leoni, o Grêmio, de Ricardo, General e Ligeireza, e o Dínamo, de João Carlos Barroso, claro que minha memória pode estar me traindo em alguns detalhes. Seu Edu criou o Columbia, time que eu e meu irmão Fred jogamos por muitos anos na companhia de Lauro, Bosco, Juarez, Feijão, Paulada, Fred Foca, Bira, Bada, Nena, Agnaldo, Ivan, Marcelo, Gilo e Roberto. Também lembro que criamos o Gerashow, em homenagem a Geraldo, do Flamengo, que morreu durante uma operação de amígdala. Era um time de soçaite e jogávamos, no Federal, Piraquê, Monte Líbano e Caiçaras, do craque Zé Britto.

Nessa época de quarentena reviramos nossos baús e sentimos saudade desse tempo de praias cheias e o sol abençoando a todos. Agora, me vejo em minha sala, sozinho, álcool e gel do meu lado, assistindo jogos do campeonato alemão, bons jogos, sem torcida. Na mesa, um álbum da Copa de 70 e uma foto do time do Botafogo, com Manga & cia. Na poltrona, um casaco da seleção brasileira. Faço dele um travesseiro, me deito no sofá e choro tentando entender o que fizeram com o nosso planeta. A quarentena está acabando e a minha preocupação é ter que ouvir novamente os jargões dos comentaristas, como “quebrar a bola”, “leitura de jogo” e por aí vai…

O RETORNO

por Claudio Lovato


Os dois times entram em campo e são recebidos por um imenso silêncio – um silêncio de cimento e plástico.

O menino com o pai nas cadeiras perto do campo não tira fotos com seu celular nem o pai olha para ele, sorrindo, compreensivo, sensibilizado, porque nenhum dos dois está ali.  

Os amigos que há mais de trinta anos vão juntos aos jogos, sempre gozando da cara uns dos outros, sempre relembrando aventuras e elogiando os “nossos tempos”, também não estão ali.

As torcidas organizadas não entoam seus cantos nem fazem tremular suas bandeiras nem agitam suas faixas e seus trapos porque igualmente não estão ali.

Em suas casas, os torcedores assistem ao jogo na TV, pelo pay-per-view, no celular, no tablet, no desk top, e alguns se socorrem no rádio e nas transmissões minuto-a-minuto. Não são permitidas aglomerações no entorno do estádio.

O primeiro gol é do time da casa, um gol bonito, diga-se; um voleio da entrada da grande área, mas os jogadores não comemoram. Não como antes. Agora apenas dão sorrisos tímidos, fazem sinal de positivo com o polegar, batem palmas e então voltam para seu lado do campo.

No intervalo, na saída dos jogadores para o vestiário, é possível perceber o semblante de cansaço e tensão de alguns deles. Não conversam entre si, sequer se olham.    

Mais adiante, por longos instantes, por ordem ou por distração do diretor de TV, vão ao ar apenas imagens de cadeiras vazias, setores inteiros vazios, o estádio vazio.

Nas entrevistas do intervalo, feita por meio de um aplicativo de reuniões virtuais, um ex-jogador com duas Copas do Mundo no currículo diz que “os donos do poder estão aproveitando a situação para aprofundar o processo de transformação do esporte mais popular do planeta num espetáculo unicamente televisivo” e que “futebol é povo no estádio, aliás, como antes mesmo da pandemia já não estava se vendo mais” e que “o futebol, assim como todo esporte, é celebração da vida e da saúde e que deveria haver mais preocupação com os jogadores, os integrantes das comissões técnicas e os funcionários dos clubes e suas famílias”. Um ex-técnico que participa do programa pondera que o futebol tinha que voltar mesmo, “porque se demorasse mais os clubes poderiam quebrar, alguns não conseguiriam se reerguer”, e outro ex-jogador argumenta que “o que mais importa agora é que os protocolos sejam seguidos com todo o rigor” e o jornalista que conduz a entrevista encerra a conversa dizendo “bom, é assim que estamos por ora, é assim que será por enquanto, isso vai passar, gente, daqui a pouco vamos ter estádios lotados de novo, vamos botar fé”, e, depois de um break comercial, voltam à tela imagens do estádio.

O segundo tempo é lento e burocrático, fato atribuído à forma física dos jogadores, que ainda precisa melhorar de forma considerável. O jogo termina um a zero e, sem entrevistas de beira de campo, a TV logo passa a exibir os melhores momentos da partida. Em seguida, a transmissão vai para o estúdio, onde os comentaristas tentam explicar aos telespectadores o novo momento que está se vivendo. Fazem um nítido esforço para justificar a decisão de retomar o futebol neste exato instante. Há quem concorde e há quem discorde em medida praticamente igual, conforme mostram os números da participação dos internautas na enquete que acaba de ser feita no ar. Então partem para a análise do jogo, com entradas ao vivo feitas por repórteres usando máscaras e a repetição dos lances do jogo até o início da madrugada.

   

EU, LAZARONI, A POCHETE E OS PASTORES ALEMÃES

por Nielsen Elias

1º CAPITULO


Há 31 anos, exatamente no final dos anos 80, após a classificação do Brasil para a Copa de 90.

O técnico Sebastião Lazaroni da seleção brasileira, e eu, fomos para Europa, em especial ao leste europeu, acompanhar alguns jogos das eliminatórias europeias para a Copa do Mundo na Itália.

No roteiro, estavam os países, Bélgica, Hungria, Tchecoslováquia, Bulgária e Alemanha Oriental. E nesse período, estava começando uma grande mudança politica nos países do leste europeu.

A primeira parada foi em Bruxelas, na Bélgica, após uma conexão em Paris… Malas nas mãos, partimos para o hotel com as reservas previamente feitas. Ao dirigirmos à recepção com as reservas devidas, nossa grande surpresa, quando o gerente com sua frieza europeia nos disse:

– No booking!!! I feel so much… – mesmo assim, o Laza tentou argumentar que ela estaria confirmada. Então, o gerente pediu que esperássemos no hall do hotel, pois iria tentar resolver aquela situação; e sempre afirmando que tinha um grande evento na cidade e todos os hotéis estariam lotados!

Já era noite, e nós sentados nas poltronas, que ficavam no hall, e muito cansados pela viagem, estávamos “loucos” por um banho e afrouxar o nó da gravata…e essa altura, nossas malas já serviam como descansos para as nossas pernas. E, finalmente, após uma longa espera, chega o gerente com uma solução, isso já quase meia noite, e diz:

– Como está muito tarde vocês irão dormir aqui, mas nas primeiras horas da manhã terão que deixar o quarto, pois um hóspede estará entrando amanhã bem cedo. E enquanto isso, vou tentando um lugar para vocês ficarem amanhã…

No dia seguinte, apesar de não termos um sono confortante, fomos despertados pelo telefone com o gerente dizendo que teríamos que deixar o quarto, pois haveria necessidade de ser limpo. Tomamos nosso banho e descemos rapidamente. Na recepção, lá estava o gerente com os nossos passaportes em uma mão e a conta na outra, e dizendo que havia conseguido um hotel não muito bom, mas naquele momento era o máximo que poderia fazer por nós… Bem, outros contra tempos ocorreram. Na hora de fazer o pagamento, por aquela noite mal dormida, Laza sacou duas notas de U$100 e colocou no balcão, para logo em seguida ser recusada pelo gerente:

– Desculpe senhor mas no momento não aceitamos essas notas de 100.

Laza perguntou já perdendo a paciência.

– Por quê!?

O gerente prontamente respondeu:

– Houve um derramamento de notas falsas e por essa razão estamos no momento proibidos de receber…

Era só que nos faltava, pensamos, olhando um para outro, e o gerente querendo ajudar, nos disse que só no banco poderíamos trocar! O Laza perguntou onde tinha um banco mais perto e o gerente explicou:

– No outro lado da rua, mas infelizmente hoje é sábado e todos os bancos estão fechados.

Sem mais o que fazer, Lazaroni com um sorriso irônico, que mais parecia que estava “puto”, tirou seu cartão pessoal e pagou a diária.

Então rumamos para o outro hotel indicado pelo gerente, que além ter um pequeno quarto que mal cabia nós dois e ainda por cima sem banheiro privativo, ficava numa espécie de serra bem longe do centro, putsgrila! Mas mesmo com essas situações nada agradáveis, podemos acompanhar o jogo da seleção Belga no Estádio de Heisel, que depois ficou marcado por grande tragédia entre torcidas e após 1995 passou a ser chamado Rei Balduíno. O jogo foi bem disputado e o tratamento no estádio foi VIP, com direito champanhe, vinhos, cervejas e todos os tipos de comida.

Bruxelas é uma cidade única, com suas ruas subterrâneas e sua linda arquitetura, além de ter um escargot delicioso, que eu fiz o Laza provar, como o prato de entrada do nosso jantar:

– Pô são caramujos, Ni!? – para em seguida cairmos na gargalhada… além de uma cidade muito interessante, possui também mulheres lindas…

Assim foi a nossa passagem pelo primeiro país. No próximo capitulo, eu conto mais… especialmente, a nossa chegada na fronteira com Alemanha Oriental. Foi surreal!!! Me senti na Segunda Guerra mundial, com os enormes soldados alemães e seus ferozes pastores, em frente a nossa cabine do trem…

Até..,

BLOG DO LEDIO

por Ledio Carmona


O respiradouro do Vasco é o coração do vascaíno.

O craque do clube nessa década não calça chuteiras, nem entra em campo. A torcida é a camisa 10.

Vou repetir e escrever pela enésima vez. O craque do Vasco nessa década não calça chuteiras, nem entra em campo. A torcida é a camisa 10.

São os vascaínos que arregaçam as mangas, botam o clube no colo e tentam levá-lo à frente. É o cruzmaltino que derrama amor e altruísmo pela sua bandeira. Foi ele que ajudou a erguer o monumento batizado de São Januário, tijolo a tijolo, centavo por centavo, suor em cima de suor. Paixão avassaladora e sem limite. Diante de tantos problemas, descaso, desmando e politicagem barata, o Vasco-2020 não seria nada sem a sua gente. O respiradouro do Vasco é o coração do vascaíno.

A imprensa, como quase sempre, não deu muita atenção, porém o torcedor vascaíno fez sua parte mais uma vez essa semana. A TV retransmitiu ontem a final da Taça Libertadores de 1998. O Vasco tinha um timaço e levantou a taça em Guayaquil. 22 anos e uma pandemia depois, a TV Globo anuncia a retransmissão e alguém tem a ideia de vender ingressos simbólicos.

Com a grana arrecadada, a ordem é ajudar no pagamento (eternamente) atrasados de salários dos funcionários. Mais de 13 mil ingressos foram comprados. E muitas famílias terão algum dinheiro graças a esse movimento.

Esse mesmo torcedor ajudou (e segue ajudando) na arrecadação de recursos para a construção do CT do clubes. E fez história ao transformar o Vasco no clube com o maior número de sócios-torcedores no Brasil.

Repito: hoje, sem dinheiro, com time fraco e totalmente à deriva, o Vasco estaria muito pior sem o amor do seu torcedor. Cada um desses apaixonados merecia uma placa de agradecimento na Colina Histórica. Mais trabalho, mais ideias e menos politicagem já seriam uma boa retomada. Não custa sonhar. Sai de graça e, se custar alguma coisa, o cruzmaltino banca com sua esperança.

Texto publicado originalmente em: https://globoesporte.globo.com/blogs/blog-do-ledio/post/2020/05/24/o-respiradouro-do-vasco-e-o-coracao-do-vascaino.ghtml