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THE ENGLISH GAME, A SÉRIE PARA QUEM GOSTA DE FUTEBOL

por André Luiz Pereira Nunes


Uma boa dica para quem está sofrendo com a abstinência de futebol em tempos de pandemia é The English Game, uma produção original do Netflix. Idealizada por Julian Fellowes, mesmo autor de Downton Abbey, a trama promove uma eficiente mescla entre luta de classes e os primórdios do popular esporte bretão. 

Dividida em seis episódios de cerca de 50 minutos, a série aborda o embrionário crescimento do futebol em meio ao conflito entre clubes da elite e agremiações operárias. O enredo tem início em 1879 e se centra na rivalidade de Fergus (Kevin Guthrie), um pobre operário nascido em Glasgow, e Arthur Kinnaird (Edward Holcroft), abastado lorde do sul da Inglaterra. 

Para quem é apaixonado por futebol, é interessante constatar como eram os jogos naqueles tempos. Os uniformes não tinham numeração, a bola de capotão era pesada e a ausência de regras, redes e organização tornavam as partidas muito similares às peladas de rua atuais. Nesse ínterim, recheado de dramas pessoais, surgem os dois primeiros atletas profissionais, cujos talentos estarão a serviço de quem se dispuser a pagar por eles, fato que gerará intenso conflito em meio a abastados que jogavam por prazer e humildes que atuavam por paixão. Para disputar as quartas de final da Football Association Challenge Cup, James Walsh, proprietário do Darwen FC, agremiação composta por operários, resolve contratar profissionalmente dois reforços, medida que irá contra as regras da Copa e enfurecerá os Old Etonians, time adversário composto por integrantes da alta sociedade.

Apesar da narrativa girar em torno do futebol, The English Game reúne características de drama histórico com algumas pinceladas de ficção, permeado pela conjuntura histórica de uma Inglaterra duramente dividida entre classes no final do século dezenove.

A POESIA NO RISO DE ISABELA E O FUTEBOL EM TEMPOS DE COVID

por Marcelo Mendez


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Alguma coisa acontece no peito do velho torcedor.

Não tão velho assim, dirão alguns mais gentis, de trecho rodado dirão os abusados e de pneu gasto de tanta estrada, falarão só que sabem de mim. Fato é que algo tem mudado na minha vida quando o assunto é futebol.

Dia desses vi uma amiga, uma menina, Isabela Soares, jornalista recém-formada, lutadora, apaixonada tanto pelo ofício, quanto pelo nosso Palmeiras (meu e dela…) lamentando a falta de futebol, sentindo saudades do Palmeiras, das arquibancadas da Arena dela, do Parque Antártica meu e isso me fez ver algo que me preocupou bastante.

Eu não senti falta alguma do futebol, nem do Palmeiras.

Me lembrei que ao ver o Palmeiras perder uma vaga para decisão da Libertadores para o Boca Juniors eu não senti absolutamente nada e voltei para casa, com a mesma fleuma e preocupações dos comuns que ao término dos 90 minutos imediatamente passam a ter como prioridade o dia seguinte, e a necessidade de passar no sacolão para comprar a acelga, ou alface do dia, ou o pagamento da conta de gás. A derrota já não me causava a catarse de uma perda retumbante.

Eu sei que isso se deve também ao fato de o futebol não ter mais essa retumbância toda, mas me assusta a calma britânica que os anos e a idade me trazem. Acontece que o futebol sempre funcionou para eu perder esse juízo toda no concreto das arquibancadas que vivi. Eu já amei desesperadamente por futebol, assim como já odiei com a fúria de um milhão de adolescentes virgens em busca do primeiro beijo. Mas hoje, além de uma indiferença contumaz, o que mais sinto é uma calma irritante.

Me falta o choro, a raiva, a briga de boteco, as discussões intermináveis regadas à cerveja e moela na farinha do Bar do Ivo no Parque Novo Oratório. Me tiraram tudo isso.

Agora, o futebol é uma guerra de liminares, costurada por cartolas teimosos e insensíveis que querem a todo custo ver seus times ricos em campo. Que se dane as mortes no hospital de campanha ao lado, o que importa é a rede balançar no Maracanã. Esses caras tão pouco se lascando se o torcedor que sofre e que mantém a magia do futebol viva, não tem condição de fazer os testes que os jogadores fazem para detectar o Covid.

Dirão que os dramas do SUS não é problema deles, cartolas, e eu concordo; Não é mesmo. Mas será que é difícil entender que o problema que se tem para resolver é tão grande que tem sufocado até as coisas da paixão que sempre nortearam o futebol? Não dá para sacar que esse comportamento antipático afastará em breve todos os apaixonados torcedores de suas equipes?

Que tristeza.

Enquanto torcedor, sei que preciso olhar para o sorriso de Isabela e encontrar a paixão que um dia foi tão latente pelo clube. Ali naquela imensidão de encanto, sei que encontrarei o verso da poesia perdida que um dia foi tão presente em mim. E os cartolas?

Encontrarão aonde, o bom senso que nunca tiveram? Pois é. Enquanto isso, segue o Covid na vida nossa.

Ao invés dos gols, aguardemos as próximas liminares.

Heróis do Tri

OS HERÓIS DO TRI

Se tem uma seleção que entrou para a história, essa é o Brasil de 1970! Com uma “coleção” de camisas 10 no elenco, Zagallo teve que se virar para encaixar tantos craques juntos e o resultado não poderia ser melhor: 17 dos 19 gols foram marcados por integrantes do histórico quinteto (Pelé, Gerson, Tostão, Rivellino e Jairzinho) e o desfecho foi uma sonora goleada na decisão contra a Itália.

Não por acaso, é considerada por muitos a maior de todos os tempos e, como hoje é aniversário de 50 anos da conquista do tricampeonato mundial, a equipe do Museu da Pelada reuniu as principais resenhas com os campeões para celebrar a data em grande estilo! Com detalhes minuciosos daquela conquista, as feras fizeram a galera viajar no tempo relembrando lances, bastidores e muito mais!

Se tratando de uma seleção com tantos ídolos, nem precisa dizer que, para a equipe do Museu, foi muito prazeroso rever as entrevistas para produzir essa coletânea! Com a certeza de que tudo ficará bem, estamos ansiosos para reunir esses craques novamente e colocar o papo em dia!

Heróis do Tri: Félix, Ado e Leão; Carlos Alberto, Zé Maria, Marco Antônio e Everaldo; Brito, Baldocchi, Fontana e Joel Camargo; Piazza, Clodoaldo, Gérson, Rivellino, PC Caju; Jairzinho, Tostão, Pelé, Roberto, Edu, Dario, (Rogério). Técnico: Zagallo

Relembre a campanha:

Brasil 4 x 1 Tchecoslováquia (03/06/1970)

Brasil 1 x 0 Inglaterra (07/06/1970)

Brasil 3 x 2 Romenia (10/06/1970)

Brasil 4 x 2 Peru (14/06/1970)

Brasil 3 x 1 Uruguai (17/06/1970)

Brasil 4 x 1 Itália (21/06/1970)

 

OS 50 ANOS DO TRI E A ACENTUAÇÃO DAS DIFERENÇAS ECONÔMICAS

por André Luiz Pereira Nunes

Neste domingo, o país comemora 50 anos da conquista do tricampeonato mundial da Copa do Mundo ocorrida no México. De acordo com especialistas, a Seleção Brasileira de 1970 foi a maior de todos os tempos. Na decisão, o Brasil goleou a Itália por 4 a 1 com direito a uma campanha avassaladora e irretocável: seis vitórias e 19 gols marcados. Pelé, Tostão, Rivellino, Carlos Alberto Torres, Gerson e o furacão Jairzinho encantaram o mundo.


Contudo, comparando aquela época com a atual, percebemos que há um crescente abismo econômico. Atualmente, o esporte vivencia uma nova dimensão social, se assemelhando a uma indústria produtora de novos mitos. Naquele tempo, os jogadores faziam propagandas de comida, bebida e itens mais banais. Hoje são propagandistas de grandes marcas internacionais. Ao explorar o potencial econômico do futebol, os empresários têm por objetivo transformar sentimentos em consumo e logicamente visam o lucro.

Analisando, portanto, o elenco tricampeão da Copa do México, percebemos que alguns daqueles atletas encerraram a carreira em modestas equipes, algo que seria impensável ou até bizarro no futebol contemporâneo. O goleiro Ado, por exemplo, reserva imediato de Félix, possuía 23 anos e obteve sucesso atuando pelo Corinthians. Curiosamente, veio a encerrar sua carreira no Bragantino, em 1982. Já o zagueiro Brito, na época com 30 anos, atuava pelo Flamengo e, apesar de memoráveis passagens por grandes clubes do futebol brasileiro como Vasco, Internacional, Cruzeiro e Corinthians, seu último time foi o modesto Ríver, do Piauí, em 1979.

O caso talvez mais emblemático tenha sido o do zagueiro Joel. Após uma brilhante carreira, pontuada por grandes partidas pelo Santos, resolveu aos 29 anos parar de jogar para mergulhar na bebida. Sua última participação ocorrera pelo extinto Saad, de São Caetano do Sul. Veio a torrar todas as economias duramente conquistadas com o futebol até se dar conta que, aos 35, não havia lhe sobrado absolutamente nada. Tomou então uma decisão radical: vendeu todas as medalhas que guardava em casa, incluindo a de campeão da Copa do Mundo. Inteiramente falido e com uma filha para criar, se viu obrigado a trabalhar como estivador no Porto de Santos. Invariavelmente quando era reconhecido, negava a sua origem, pois não admitia que interpretassem sua triste realidade como fracasso. Morreu de insuficiência renal aos 69 anos, em 23 de maio de 2014, pobre, enfermo e esquecido pelos clubes que um dia se renderam a sua indiscutível classe


O lateral-esquerdo Marco Antônio, também com grandes momentos por Fluminense, Vasco e Botafogo veio a terminar a carreira no modesto Fast, do Amazonas, em 1984. Atualmente leva uma vida de dificuldades e luta contra um inimigo invisível e poderoso, o alcoolismo. Zé Maria, o consagrado lateral-direito do Corinthians, pendurou as chuteiras, em 1984, na Internacional de Limeira. O volante Clodoaldo, titular por mais de uma década no Santos, vestiu a camisa do Nacional em 1981, para defender o clube no Campeonato Brasileiro. Também atuou pelo Fast, no emblemático jogo contra o New York Cosmos. Já o último clube de Jairzinho foi o desconhecido Nove de Octubre, do Equador, que hoje atua na segunda divisão do futebol do país. Outros atacantes que não atuaram no Mundial, mas integraram o plantel foram Edu, do Santos, e Dario, do Atlético Mineiro, os quais encerraram suas carreiras respectivamente no Dom Bosco (MT) e e Comercial de Registro (SP).

Comparando aqueles tempos com os de hoje nos parece impensável imaginar Neymar terminar seus dias no São Cristóvão ou Gabriel Jesus assinalar seus últimos gols com a camisa da Ferroviária, de Araraquara. O futebol passa por um processo crescente de elitização e a tendência é que somente os clubes de massa possam realmente prevalecer em um futuro cada vez mais dominado pelo crescente poderio econômico.

COM O DESTINO NAS MÃOS

por Alberto Lazzaroni


Rio de Janeiro, anos 50. A então capital da República era uma cidade bem diferente da que conhecemos hoje. Eram os anos subsequentes ao fim da Segunda Guerra Mundial e vivia-se a esperança de novos tempos. Tempos de paz e prosperidade.

Desde a sua fundação, a cidade sempre teve como característica marcante o fato de ser aberta ao mundo, de receber pessoas das mais variadas origens. E foi ali, no então aprazível bairro do Rio Comprido, que se estabeleceu um filho de imigrantes sírios. Seu nome? João Elias. Ou simplesmente Elias. Ou ainda Cachimbo, por conta do amigo inseparável.

Elias era uma figura ímpar. Sujeito alto, forte e decidido, não gostava de ficar esperando as coisas acontecerem. Ele ia literalmente à luta para realizar os seus objetivos. Era chofer de táxi. Ou melhor, era “O” chofer tamanha a seriedade com que encarava o seu ofício, o que inspirava todos à sua volta. Aqui vale lembrar um detalhe inusitado: à época os taxistas tinham que usar um uniforme, que era camisa branca e calça e gravata pretas. A camisa dele vivia furada por conta das brasas do cachimbo.


Apaixonado por futebol e com tamanha liderança, não tardou a buscar novos voos. O América FC, tradicional clube tijucano, abriu suas portas para ele e, com a mesma maestria com a qual guiava seu táxi, conduziu o time de veteranos a grandes conquistas. Mas Elias queria mais. Não deixava de pensar na família. Criou então um time de futebol de salão (hoje futsal) do qual faziam parte os três filhos. Os dois mais velhos eram realmente bons de bola mas o caçula não jogava nada. O que fazer? Deixar de fora? Nem pensar. Não titubeou: vai virar goleiro.

E aí o destino se encarregou do restante. Os dois mais velhos não deram sequência na carreira de jogador de futebol. Já o caçula é ninguém menos que o grande Nielsen Elias. As mãos que seguravam o volante inspiraram as mãos que seguravam a bola. Dois homens fortes. Dois homens de bem.

O destino estava literalmente em suas mãos.

Bate-pronto: essa coluna é uma declaração de amor de um filho para o seu pai. Serve para nos mostrar o quanto podemos ser inspiradores fazendo o simples, o básico, qual seja fazer sempre com amor. Obrigado Nielsen Elias por me dar essa oportunidade.