PRIMEIRO CAPÍTULO DA DECISÃO
por Fabricio Santos
Analisando o jogo de ontem e verificando as evidências dos últimos dias referentes ao jogo de quarta-feira (08) é possível ter algumas reflexões após essa segunda partida entre Fluminense x Flamengo.
A primeira é que o time do Flamengo, mesmo tendo feito um bom primeiro tempo, está longe de ser esse Flamengo empolgante e vibrante de se assistir. O time até fez um jogo melhor em relação ao jogo de quarta-feira, porém longe de ter o volume e intensidade em relação à temporada passada. Isso é bem intrigante visto que o Mister, como os Flamenguistas se referem a Jorge Jesus, está bem menos vibrante à beira do gramado. Será um indício de saída?
Essa é uma pergunta que não temos ainda uma resposta, porém o time rubro-negro não apresenta o mesmo futebol que até mesmo no pós-pandemia estava vistoso.
Por outro lado, vimos um Fluminense mais ofensivo no jogo de hoje, dominando um segundo tempo quase por completo e não merecendo sair com a derrota, porém futebol não é merecimento e a equipe do Flamengo soube se aproveitar da qualidade técnica superior e num contra ataque conseguiu sair com o resultado final da partida.
Ao sair do jogo de quarta-feira, Jorge Jesus deu parabéns à equipe do Fluminense, mas ao mesmo tempo deixou claro que a equipe tricolor entrou para perder de pouco e acabou saindo com a vitória. Agora a pergunta que não quer calar é qual será o discurso do Mister em relação à partida de ontem?
A equipe rubro-negra entra como favorita na próxima quarta-feira para comemorar mais um título, porém o que cabe ressaltar é a sua postura dentro de campo. Será que veremos um Flamengo mais intenso ou teremos um Fluminense com essa vontade se sobressaindo?
Quarta-feira teremos a resposta, mas fica aqui apenas um registro o jogo está aberto e se a equipe tricolor mantiver a mesma pegada que a apresentada no jogo de hoje teremos um belo espetáculo diminuindo dessa forma o favoritismo rubro-negro para a partida.
CEM, NOTA 100
“Nenhuma tecnologia vai conseguir resgatar a emoção do Canal 100”. A frase disparada por Eduzinho Coimbra em uma resenha com a equipe do Museu representa a opinião da grande maioria dos apaixonados por futebol que viveram os anos gloriosos do cinejornal brasileiro!
Idealizado por Carlinhos Niemeyer, o Canal 100 era exibido semanalmente por todo o Brasil e levava multidões aos cinemas só para ver cada movimento dos nossos craques através das imagens em alta qualidade.
O fim dessa história foi em 2000, mas até hoje ninguém consegue esquecer aquelas filmagens. A prova disso é que, quando reproduzimos algum jogo do passado pelas lentes do Canal 100, a alegria toma conta da rapaziada e não são poucos os comentários pedindo a volta do cinejornal.
Por isso, a equipe do Museu foi até a casa do parceiro Alexandre Niemeyer, filho de Carlinhos Niemeyer e com participação em várias filmagens, para matar um pouco da saudade e fazer uma verdadeira viagem no tempo ao revirar o precioso acervo guardado com carinho.
– Temos muita coisa inédita no acervo, que são as sobras de filmagens dos longas que o Canal 100 produzia, principalmente da Copa de 70 e de 82! – revelou Alexandre!
Dê o play no vídeo acima e confira como foi o papo!
DUDU E OS FANTASMAS
por Rubens Lemos
Dudu morria de medo de fantasma. Ainda não morri e morro de medo de alma penada. Na infância, em Arraial do Cabo (RJ), Dudu passava em disparada pelo cemitério da praia até chegar tremendo na casa dos pais. Dudu era volante do Vasco e não temia o assombro chamado Zico nas tardes de Maracanã. Dudu marcava Zico com técnica e lealdade. Ganhou e perdeu, sem apelar para pancadas.
Aos 19 anos, Dudu tornou-se titular no Vasco, vice-campeão brasileiro de 1979, perdendo a decisão (as duas partidas), para um Internacional imbatível, com Batista, Falcão, Jair e Mário Sérgio, quarteto em solo, armando o jogo. Aquele Inter invicto e invencível, desmoralizou quem lhe apareceu.
O Vasco, de estandarte Roberto Dinamite, trocava o experiente Zé Mário pelo garoto com biótipo de jogador de basquete e condução de bola de destruidor que sabia jogar. Seu passe era correto, medido, usava o corpanzil para chegar de trás e disparar canhões preparados por Dinamite.
Fazendo negócios a granel, o Vasco armou festa para receber um dos mais sofisticados camisas 5 da história do Maracanã: Carlos Alberto Pintinho, seleção brasileira e formado nas bases do Fluminense.
Pintinho era uma indecência maravilhosa. Conduzia a bola de cabeça erguida, passava sem errar um milímetro, driblava e parecia flutuar na grama do ex-maior do mundo.
Pintinho ficou um ano em São Januário. Dudu, discreto e preciso nos toques, o pôs na reserva e, em seguida, forçou a venda de Pintinho para o Sevilha da Espanha. Dudu fazia dupla com Serginho, emérito marcador, que o liberava para tocar a bola no andar de navio em águas calmas.
Pesado, na contradição com a agilidade, Dudu conseguiu o primeiro título de sua vida em 1980. Capitão da seleção brasileira de Novos em Toulon (França). O time revelaria várias celebridades: Marola (Santos); Edson Boaro (Ponte Preta), Luiz Cláudio (Botafogo) , Mozer (Flamengo) e João Luís (Vasco); Dudu (Vasco), Mário e Cristóvão (Fluminense); Robertinho (Fluminense), Baltazar (Grêmio) e João Paulo (Santos). Técnico: Nelsinho Rosa.
Exceto o zagueiro Luiz Cláudio, do Botafogo, todos vestiram a camisa canarinho principal. Dois foram a Copas do Mundo: Edson em 1986 e Mozer em 1990. Dudu chamou a atenção de Telê Santana, que viu a final contra a França (Brasil 2×1) e foi seduzido pelo futebol progressivo do gigante. Dudu voltou à França no ano seguinte na célebre excursão do Brasil que venceu Inglaterra pela primeira vez em Wembley (1×0), a França (3×1) e a Alemanha Ocidental (2×1).
O titular era Toninho Cerezo e Dudu disputava a reserva com o falecido Rocha, do Botafogo (RJ) e Vítor, do Flamengo (RJ) se revezando em novas convocações para a reserva. Dudu adorava cerveja. Adorava demais e Telê Santana, um conservador mineiro, riscou o nome dele do seu caderno.
No Vasco, engordava, atrasava nos treinos, exibia no rosto fechado o semblante do declínio. O que não o impediu de brilhar em 1982 no supercampeonato do Vasco sobre o América e o Flamengo, vencidos, ambos, por 1×0. Um dos melhores em campo nas duas partidas, permaneceu titular até 1983.
Gordo, chegou a ser emprestado ao Cruzeiro (MG) e devolvido após a pesagem. A balança tilintou. Humilhante. Dudu deixou o futebol alegre e passou a rastejar em campo. Magoado com o Vasco, seguiu para Portugal, jogando no Belenenses, mediano time.
Desceu a ladeira do sucesso e virou nômade desconhecido. Seu último clube foi a Portuguesa da Ilha do Governador, pequeno entre os cariocas, nos idos de 1992. Dudu emagrecia de forma devastadora até descobrir um câncer, que o matou terça-feira em sua terra. Seu aspecto magérrimo causava piedade.
Aos 60 anos, Dudu foi embora após prestar um serviço impagável ao futebol-arte. Passou seu cetro a um dos melhores jogadores da criatividade exuberante: Geovani, seu substituto gênio e o primeiro a homenageá-lo na despedida. Um gesto nobre de um príncipe a um homem amargurado e vencido pelos fantasmas de si próprio.
O FLA-FLU DO NOVO NORMAL
por Marcos Vinicius Cabral
Maracanã vazio, sem torcida, tendo o Coronavírus como marcador implacável de todos nós e um campeonato maculado pela bagunça.
Não bastassem tantas efemérides, o Fluminense mostrou sua grandeza na partida de hoje (ontem) que teve um valor simbólico, quase inestimável, é bem verdade, para suas tradições tricolores.
Não acho que o time de Odair Hellmann tenha feito uma partida memorável ou que vai ser campeão daqui a dois jogos.
Nem o tricolor mais otimista acredita nesse título, porém, cabe ao Flamengo, mostrar que é muito melhor como time de futebol que o adversário.
Em dois jogos, a qualidade tende a prevalecer e mostrar para os deuses desse esporte, que seu investimento, assim como a briga comprada com o Grupo Globo, valeram a pena.
O ‘Fla-Flu’ de ontem, quarta-feira (8), mostrou o quanto o Fluminense é gigante.
A vitória por 3 a 2 na decisão por pênaltis, após 1 a 1 em tempo normal, mostrou que esse esporte é uma caixinha de surpresas.
Mas foi legal ver os jogadores do Fluminense dando volta olímpica, vibrando e olhando para as arquibancadas e saudando a torcida imaginária.
É como se dissessem: “Acreditem, o futebol é maior que qualquer MP 984 canetada por Bolsonaro, Grupo Globo, FERJ, FlaTv, R$10 e isolamento social”.
Seria esse o “novo normal” do futebol?
Com exceção do narrador Anderson Cardoso, que comandou o jogo pela FluTV, e não citou os nomes dos jogadores do Flamengo, a noite teria sido perfeita.
No entanto, restou um pouco de dignidade por parte rubro-negra, já que o narrador Emerson Santos, da FlaTV, não devolveu na mesma moeda sua narração e pôs em prática a imparcialidade nossa do bom jornalismo.
Menos mal.
O Flamengo continua anos luz à frente do Fluminense em favoritismo.
Não é só questão de ser melhor time, pois treinou por muito mais tempo, tem elenco mais qualificado e um treinador que dispensa adjetivos.
Mas o favoritismo de hoje (ontem), era um óbvio ululante e levou os bobões da objetividade, como eu, a analisar um jogo que nasceu 40 minutos antes do nada pela ‘lógica’.
E convenhamos: nenhum ‘Fla-Flu’ tem lógica.
O Fla-Flu de hoje (ontem) merecia crônica do autor de ‘Toda Nudez Será Castigada’, chamado seu Nelson, seu Nelson Rodrigues.
Bom dia, boa tarde, e boa noite tricolores, ninguém mereceu mais esse título do que vocês.
MEU PAI, A AGULHA E A BOLA
por Simone Magalhães
Oswaldo José de Souza, filho da Rua Oliveira Fausto, pertinho da sede de General Severiano, era botafoguense doente. Daqueles que dava instruções aos jogadores pela televisão, assistia às partidas com radinho de pilha grudado no ouvido e às mesas redondas na extinta TVE, hoje TV Brasil. Sofria a cada partida. Quando o Botafogo perdia, nervoso, ele jurava: “Troco meu nome se continuar torcendo pra esse time!”. Que nada! Nunca abandonou o “Botinha”, como chamava seu time, carinhosamente.
Vavá, para quase todos, e Vavado para a família, nasceu em 27 de julho de 1929. Perdeu a mãe aos 4 anos, mal fez o curso primário. Seu pai não o queria pelas ruas do bairro gazeteando e tratou de arranjar trabalho para o menino. Aos 9 anos, foi entregador de pães. Não deu certo. Largava a cesta num canto da Oliveira Fausto para participar das peladas com os meninos na rua. Aos 13, seu pai o obrigou a ser aprendiz de alfaiate. O garoto nem tinha interesse pela profissão, mas não desacatava o pai que amava.
Como o sonho de ser craque de bola foi frustrado, aos 20 anos ele remava pelo Botafogo. Em barcos com ou sem “patrão”. Se dava bem – ganhou a medalha de bronze na prova clássica Riachuelo, da Federação Metropolitana de Remo -, mas não era aquilo o que ele queria. Entrou para o time de futebol amadores do clube do coração. Durou pouco. Tinha que trabalhar muito para ter sua própria alfaiataria. Em 1962, arranjou um sócio para, aí, sim, comprar um conjunto de salas, na Rua da Passagem. Nascia a Oswaldo & Barros Alfaiataria. E os atletas do Botafogo começaram a querer se vestir na estica…
Minhas lembranças mais antigas são de 1969. Tinha jogador que ia buscar os ternos lá em casa – muitas vezes, à noite. Meu pai costurava para o escrete que foi a base da Copa de 70. Jairzinho, PC Caju, Clodoaldo, Gérson… Eu achava estranha a cabeleira pintada de louro do Marinho Chagas e a barba do Afonsinho – um gentleman. Lembro-me de acordar uma noite e ver um rapaz que me arrebatou – imagina isso, aos 6 anos de idade! – moreno, alto, cabelos cacheados… Quando ele saiu lá de casa, pegou um Dodge Dart vinho, e nunca mais o vi. “Quem era, pai?”, perguntei. “O Wendel, goleiro do Botafogo”.
Foi um ano tenso. Véspera da ida à Copa do México. Além dos ternos que os jogadores e outros clientes do meu pai pediram, ele ainda fez uniformes da Seleção para Jairzinho e Gérson. Rivellino, aos 45 do segundo tempo, não tinha alfaiate. Por indicação do Canhotinha, ligou para o meu pai. Não dava, estava em cima da hora. Riva demonstrou que não ficou nem um pouco feliz e bateu o telefone.
Mesmo com vida atribulada, Vavá foi campeão, nas peladas do Aterro, como treinador do Doca, um time de amigos de Botafogo. Lembro do Alfredinho, nosso vizinho, que quase se profissionalizou, mas não seguiu a carreira; do Ivan Gonçalves, pai do ex-jogador Robertinho; do canhoto João Carlos; do Carlinhos, da General Polidoro; dos irmãos Ney e Nédio – duas figuras simpaticíssimas. E do seu Manuel, uma espécie de assistente, caso alguém se machucasse. Estão todos e mais alguns que não reconheço na única foto que meu pai mandou colorizar e enquadrar. Com muito orgulho.
Além do Aterro, papai supervisionava ou era técnico (eu nunca soube bem a diferença…) de futebol de areia. Foi bicampeão invicto dirigindo o São Conrado Praia Club (1968/69), com direito à faixa e placa de agradecimento. Ainda em 1968, foi vice-campeão no Torneio de Pelada Jorge Miranda. No IV Campeonato de Pelada Jornal dos Sports, em 1970, e no VIII, em 1975, vice duas vezes. Na Praia de Botafogo, amigo, das antigas, do Ivo da Rocha Gomes, fundador do São Clemente Futebol Clube, ele participava dando seus palpites. Numa conversa com Lurnel (filho de LURdinha Bittencourt com NELson Gonçalves), Vavá soube da necessidade de um reforço nas estratégias de jogo na praia da Urca. Lá foi ele. Lembro-me do time Guaíba e do falecido ator João Carlos Pedroso, que, nas areias, tinha o apelido de “Dedinho”. E também de outros times, como Radar, Milionários, Dínamo.
Nos anos 1980, meu pai foi chamado pelo Maestro Júnior para reger temporariamente o Juventus, em Copacabana. Ele conhecia Júnior das areias; e Zico, do Aterro, ainda na luta para se desenvolver fisicamente. Vavá era muito introspectivo, mas quando o assunto era futebol falava pelos cotovelos. Acho que uma das últimas informações futebolísticas que tive foi sobre um grande amigo, Garrincha. Ele o encontrou bêbado, sentado no chão, no Tabuleiro da Baiana. Mané insistiu no pedido de um trocado pra “mais uma, só mais uma”. Papai não deu. Chamou um táxi, deixou o dinheiro na mão do motorista e o encaminhou para a casa. Logo depois, num encontro com Nilton Santos, papai profetizou emocionado: “Assim, ele vai morrer logo”. Não deu outra.
Vavá se aposentou, a lombar dele suplicava por isso. E passou a ir muito eventualmente à praia para ver um jogo. Com a morte da minha mãe, por erro médico, em 2003, ele ficou apático. Confuso, foi constatado que tinha Alzheimer. Contou várias vezes as histórias do passado, como a do calote que PC Caju deu nele, encomendando um terno de tecido caríssimo, que nunca foi buscar. Não tive tempo de registrar tudo. Adoraria dedicar um livro a ele, que foi reencontrar seu grande amor, exatamente dez anos depois, em 17 de fevereiro de 2013.