OS ESTRANGEIROS ASSUMIRAM A PONTA
por Zé Roberto Padilha
Falta de aviso não foi. Há quanto tempo a imprensa esportiva não fala seguidamente sobre as obsoletas estruturas táticas montadas pelos treinadores brasileiros?
O futebol boleiro, de Joel Santana, o bom de grupo e do churrasco, de Waldir Espinosa, o amigo da rapaziada, como Jair Pereira, foram perdendo posições no G4, e se aproximando do ZR4, na medida em que o futebol moderno foi ocupando o espaço do futebol arte.
Por termos há alguns anos a genialidade que resolvia por si mesma, caso do quarteto Ronaldo, Rivaldo, Romário e Ronaldinho, que dominavam os troféus de melhores da FIFA, nossos treinadores relaxavam no quesito aplicação tática na marcação.
Se tomávamos 3, eles faziam 4. E tinha churrasco na segunda e chinelinho na terça.
Quando Neymar, Coutinho, Arthur foram embora e o Diego, Hernanes e o Nenê voltaram para jogar no Master do Luciano do Vale, e acabaram titulares das principais equipes do país devido a escassez de talentos, o Robinho quase veio nessa barca, não havia mais quem resolvesse uma partida com a bola nos pés.
E sem sua posse e guarda, o espaço cada vez menor a ser ocupado precisava de treinamento tático organizado. Nada mais de improviso e muito de estudo e trabalho dentro de campo. E isso esses treinadores aí de cima sabem fazer muito bem.
E por isso as três Mercedes, do Inter, do Flamengo e do Atletico-MG ocupam, hoje, as primeiras posições do Grid de Largada, enquanto as nossas Ferraris, dirigidas pelos que ainda insistem em viver de romantismo e exaltar seu passado, vão ficando para trás na classificação geral.
SAUDAÇÕES AO GUERREIRO
por Claudio Lovato Filho
Ele foi um dos heróis que conduziram o Grêmio numa travessia fundamental.
Com ele, enfrentamos a seca de títulos em boa parte dos anos 70, mas também com ele viramos o jogo.
Formou com Victor Hugo e Tadeu Ricci um meio-campo que todo o gremista recita como parte de um poema épico.
Fez o gol mais rápido da história dos Grenais, aos 14 segundos de jogo, em 14 de agosto de 1977. Uma festa inesquecível no Olímpico. Um sinal claro de que as coisas estavam mudando.
Deu o passe para um dos gols mais importantes da história do Grêmio, o gol que decretou o título estadual que abriu caminho para a conquista do país, do continente e do mundo, o gol de André Catimba na final do Gauchão daquele abençoado ano da graça de 1977. Passe de esquerda, que não era a perna de preferência. Passe milimétrico, passe perfeito, passe de quem sabe – porque ele não era apenas raça e coragem; tinha muita bola no pé também.
Defendeu o Grêmio, como jogador, entre 1971 e 1980. Depois virou conselheiro e dirigente, mas tudo isso – jogador, conselheiro, dirigente –, tudo isso sempre esteve subordinado ao torcedor apaixonado que ele sempre foi desde menino. Ele lutou, chorou e sorriu por causa da camisa azul-preta-e-branca. E a honrou de forma exemplar.
Assim foi desde os tempos do bairro Jardim Floresta, na Zona Norte de Porto Alegre, onde foi criado. Filho de imigrantes russos, passou a infância trabalhando na loja de próteses dentárias fundada pelo pai – e jogando bola, claro.
Júlio Titow, o Iúra, o camisa 8 que foi o mesmo guerreiro nos tempos de vento contra e nos tempos de maré a favor, está completando 68 anos hoje.
Salve Iúra! Parabéns, Passarinho! A Nação Tricolor te parabeniza, te abraça e te agradece por tudo, que não foi pouco.
Tu és, dentre os nossos ídolos, um dos que, de maneira mais precisa, personificam a nossa história, a nossa identidade.
SUDERJ INFORMA
por Paulo-Roberto Andel
Às vezes algumas pessoas perguntam porque tantas outras gostam muito de futebol.
Para mim, não é simples explicar porque praticamente já nasci dentro disso. Então faz parte da minha vida.
Tem muita, mas muita coisa dentro e no entorno de uma partida de futebol. Muito além do esporte.
Milhões de pessoas no mundo e bilhões no planeta têm no futebol às vezes a sua única distração, o seu único alívio. O jogo que nunca termina. Você perde hoje, recobra as esperanças para o próximo jogo, o próximo jogo.
Único esporte em que o mais humilde pode derrubar o mais poderoso.
Jogar bola, botão, ver jogos, games, futebol de preguinho, totó.
Quando era criança, frequentei um lugar chamado Maracanã. Estive por lá durante 35 anos consecutivos e vivi tardes e noites da pesada. Certamente essa vivência impactou toda a minha vida para sempre. Eu olhava as pessoas rindo ou chorando, as bandeiras, a bola chutada para o alto que se perdia em meio aos refletores, os garotos feito eu, alguns bem ricos, outros bem pobres, todos juntos vendo o jogo.
Sem o Maracanã eu teria sido outra pessoa, infinitamente pior. Deitei no chão da geral e fiz do desenho da marquise do Maracanã o meu disco voador. Vi partidas no degrau mais alto da arquibancada e me sentia feliz com aquele mar de gente. Ganhei, perdi, aprendi.
Durante oito anos, ser aluno da UERJ me fez passar pelo Maracanã mais de duas mil vezes, afora os dias de jogos. Até hoje, mesmo com tudo mudado, chegando na Praça da Bandeira eu tenho a mesma sensação de quando meu pai me puxava pela mão, há mais de quarenta anos. Anos depois, eu é que puxei a mão do meu irmão.
Nunca vi o jogo como algo entre inimigos. Pelo contrário: futebol não existe sem o outro. No futebol o adversário é tudo. Já vi muitas partidas com amigos que torcem para outros times. Noutras, não teve jeito: cada um luta pelo seu.
Quantas vezes não fui triste para o Maracanã e passei duas horas de alívio? Muitas, nem sei dizer, talvez a maioria delas.
Apesar do futebol brasileiro estar mal dar pernas, ainda gosto muito do jogo. Mesmo com o meu Maracanã assassinado pela ganância corrupta, ainda vou ao novo em busca de vestígios. Às vezes encontro com amigos, noutras fico sozinho do mesmo jeito que fiz muitas vezes quando era garoto.
O tempo passou muito rápido. Se pudesse escolher no que eu gostaria de voltar no tempo, seria em três vértices: ter minha família de volta, voltar a jogar campeonatos de botão e voltar ao Maracanã, o velho Maracanã de jogos abarrotados e outros muito esvaziados. Às vezes ficar uma ou duas horas em silêncio antes do jogo começar.
Podia voltar ainda mais no tempo e escutar Jorge Curi com João Saldanha no velho Telefunken de luzes verdes. Eram tempos de Edinho e Pintinho, Moisés e Renê, Junior e Uri Geller. Mendonça e Ademir Lobo, Luisinho e Silvinho. Jorge Demolidor. O treinador Velha. Zé Duarte no Rio por algum tempo. Oto Glória. Othon Valentim. Jorge Vieira.
Aquelas luzes piscando num placar de lâmpadas que não deve nada a nenhuma tela de computador da última geração, e que os garotos arregalavam os olhos ao ver o desenho do escudo do time do coração, mais a escalação das equipes.
Hoje, alguns dos meus craques e heróis do gramado estão mortos, outros ainda estão por aí. Os grandes locutores e repórteres. Os cronistas. As rádios. Os líderes de arquibancada. Os árbitros. Mas é como se todos estivessem vivos demais. Penso diariamente em muitos deles, é como se continuassem aqui.
É como se eu ainda tivesse dez anos de idade e ficasse louco para saltar do ônibus e ver meu pai comprar nossos ingressos no guichê, porque aquilo era a certeza de que logo estaríamos num espetáculo de luzes e gentes para todo lado. O que me move agora é isso: eu ainda tenho dez anos de idade, mesmo que o corpo e a lógica desmintam. E quero ter dez anos para sempre, até quando o fim vier.
Miranda desarmando Mendonça, Assis e Washington pulando e trocando palmas.
Cuidado com Luizinho das Arábias. Atenção aos cruzamentos de Perivaldo, do Rodrigues Neto, do Capitão Carlos Alberto Torres também. Tobias agarra demais.
Dener é um perigo, senhores!
No placar do Maracanã, uma narração inesquecível: “Suderj informa!”, obra de arte de Victorio Gutemberg.
@pauloandel
SALVE FERNANDO DINIZ
:::::::: por Paulo Cézar Caju ::::::::
Vamos falar sinceramente? Então, vamos. Existem os torcedores que debatem o futebol de forma consciente, justa, sem clubismo, e os que gostam de zoar, provocar os rivais, criar polêmicas, incendiar as resenhas. Falo desses que, por exemplo, chamam Zico de pé frio e esculhambam os jogadores, alguns cracaços, que nunca venceram uma Copa. Só posso considerar isso uma piada, afinal Zico foi um dos maiores de todos os tempos. Essa introdução é para falar sobre o trabalho de Fernando Diniz.
Há alguns anos venho destacando isso, mas a imprensa o menospreza e até, em alguns casos, falta com o respeito, o ironiza, alega que seus times não tem consistência e todas essas baboseiras vindas desses comentaristas que nunca chutaram uma bola. Mas, nesse domingo, após a vitória maiúscula do São Paulo por 4×1 no Flamengo, os comentaristas, um em especial, disse que, agora sim, o São Paulo estava credenciando a ser um dos candidatos ao título. Isso é uma grande palhaçada. Isso não é um elogio ao São Paulo, mas ao Flamengo. O rubro-negro já sofreu algumas goleadas exatamente pela forma ofensiva com que joga. Levará outras. O São Paulo também já foi goleado e mesmo assim nunca deixei de elogiar o trabalho do Diniz, assim como exaltava o de Jorge Jesus.
O trabalho que Diniz faz com os jogadores é básico, mas importantíssimo para suas carreiras. Diniz treina exaustivamente os fundamentos, o que, claramente, não vem ocorrendo com o Galo, de Sampaoli, que também gosto. Se o Volpi pegou dois pênaltis é sinal de treinamento. Diniz vive na corda bamba porque arrisca, ousa, totalmente ao contrário de Odair Hellmann, técnico do Fluminense, que vem conseguindo avançar usando a velha e ultrapassada estratégia da escola gaúcha. Me perdoem os tricolores, mas o Fluminense joga feio.
O time do São Paulo não é milionário e alguns garotos já se destacam. Ainda cometem erros primários, mas por conta dessa ousadia vimos surgir Brenner. Por isso, desaconselho que os comentaristas repitam que só agora, após vencer o Flamengo, Diniz surge como candidato ao título. Outro dia, um locutor, que agora também é comentarista _ mas quem não é comentarista? _ afirmou que Pedro já é melhor do que Lewandowski. Como levar a sério essa turma que prefere, a todo custo, ficar bem com os rubro-negros, mesmo que de forma constrangedora, do que debater futebol de forma consciente. Nesta semana, meus ouvidos doeram quando um narrador disse que o jogador “ligou o piloto automático”. Por um segundo achei que estava assistindo Fórmula 1! Pior que até os jogadores estão se contaminando com esse vocabulário e, durante uma entrevista, um deles disparou que “o time joga no X1 e está sem identidade”. Melhor parar por aqui!
DERRUBADA DE ESTÁDIOS REPRESENTA TRISTE LEGADO OLÍMPICO DO RIO
por André Luiz Pereira Nunes
O futebol do Rio de Janeiro é uma das grandes vítimas da especulação imobiliária que impera em um dos metros quadrados mais caros do mundo. A Cidade Maravilhosa cede cada vez mais lugar a grandes empreendimentos, de modo que terrenos baldios, campos e até estádios, nos últimos anos, tenham dado lugar a arranha-céus, shoppings e rodovias.
Um dos mais tristes símbolos do chamado legado olímpico é o antigo estádio Eustáquio Marques. Único em Jacarepaguá e muito utilizado por times para treinamentos e jogos, como Flamengo e Vasco, foi derrubado por determinação do insensível ex-prefeito Eduardo Paes, em 2015, para a passagem da Transolimpíca, corredor expresso que liga Deodoro ao Recreio dos Bandeirantes. Com capacidade aproximada de 5.000 pessoas, foi inclusive cenário da novela Avenida Brasil. Muitos clubes, alguns já extintos, que transitaram pelas divisões profissionais do estado, como Barcelona, Boavista, Barra da Tijuca, Estácio, Internacional, Marinho, Rio-São Paulo, Universal e Villa Rio mandaram partidas nessa praça de esportes.
A recente reapresentação do folhetim global, na sessão Vale a Pena Ver de Novo, fez o país reviver os craques do Divino Futebol Clube, como Jorginho (Cauã Reymond), Adauto (Juliano Cazarré) e Leandro (Thiago Martins), o qual até migra da Terceira Divisão para atuar no Flamengo durante a trama. Isso sem contar o ídolo Jorge Tufão (Murilo Benício). Oito anos depois, o estádio não existe mais, nem na ficção, muito menos na realidade.
O último sacrificado pela sanha destruidora dos políticos é o tradicional Everest, de Inhaúma, fundado a 28 de abril de 1953. A sua sede social, a qual englobava o estádio Ademar Bebiano (foto), foi demolida por ordem do péssimo e incompetente prefeito Marcelo Crivella, que simplesmente deu de ombros aos vários apelos contrários proferidos por inúmeras personalidades ligadas ao desporto como, por exemplo, Zico, cuja história está ligada a esse clube. Foi justamente contra o time inhaumense que o Galinho de Quintino marcou o seu primeiro gol quando ainda atuava pela Escolinha do Flamengo. Os associados garantem que em momento algum houve diálogo da prefeitura com os representantes auri-anis. Segundo eles, não haveria necessidade de derrubar um patrimônio com 67 anos de tradição, visto que existem outras áreas vazias na região disponíveis para a construção de moradias populares, no caso o projeto Minha Casa, Minha Vida. Infelizmente a demolição foi a solução encontrada pelo município para a realocação das famílias da chamada Favela do Parque Everest, que sofrem costumeiramente com enchentes desde as fortes chuvas de fevereiro de 2018.
A Prefeitura do Rio, através da Secretaria Municipal de Infraestrutura, Habitação e Conservação, iniciou as obras para uma nova sede para a agremiação despejada. O espaço fica localizado ao lado da Linha Amarela, em Higienópolis. Porém, os dirigentes argumentam que a extensão é muito menor a ponto do campo só poder ser utilizado para jogos de futebol soçaite. E estamos nos referindo a um clube profissional e filiado à Federação, ainda que atualmente licenciado, que sediava partidas do Campeonato Estadual.
A extinção dos espaços destinados às práticas esportivas impacta diretamente no número e, principalmente, na qualidade dos atletas formados. Ao dispormos de menos possibilidades para que os garotos possam mostrar o seu valor, restringimos cada vez mais oportunidades para que surjam novos valores. Infelizmente esse é um dos legados que os Jogos Olímpicos deixaram em nossa cidade e que nos são de triste memória.