MINHA GUERRA PELO TEU NOME
por Cláudio Lovato Filho
Ele passou o diabo para reabilitar a imagem do velho.
Foi ameaçado nas redes sociais, confrontado na rua, colecionou inimigos: os filhos, os amigos, os filhos dos amigos e os parentes daqueles que transformaram seu pai em um pária e escarraram em sua memória.
Tudo por causa de um lance protagonizado pelo velho, zagueiro seguro e de boa técnica: uma rosca, uma espirrada de taco, o gol contra. E a taça – pela primeira vez na história do clube situada a uma distância possível, um sonho realizável – escorrendo entre os dedos.
Então algum ressentido, alguém com voz levada em conta naquela cidade hipócrita, levantou a suspeita: e se é gaveteiro? E se estava comprado? E rapidamente outros medíocres amargurados, outros “donos da cidade”, compraram a ideia e aquilo em pouco tempo se tornou consenso: é gaveteiro; estava comprado. Vendido.
Os companheiros silenciaram. Nenhum dirigente saiu em defesa dele. A imprensa local – tacanha e provinciana que só ela – gostou da repercussão daqueles títulos canhestros, tendenciosos, falaciosos, e comprou o boato para vender como fato.
Mas por fim ele, o filho obstinado, o herdeiro do pária, com a ajuda de um jornalista obcecado pela história do futebol conseguiu seu trunfo e troféu: uma reportagem especial no site de esportes mais lido do país.
A foto do velho abrindo a matéria: ele sendo cuspido e levando um soco na cabeça de um torcedor que conseguira romper o (falso) cordão dos seguranças do clube.
A segunda foto: o velho, alguns anos após ter encerrado precocemente a carreira, sentado num tronco podre na frente do sítio modesto, com uma caneca branca esmaltada na mão direita e um cigarro entre os dedos da mão esquerda. No rosto barbado, barba grisalha desgrenhada, a falta absoluta de expressão; uma neutralidade fisionômica que sugeria morte. O pai a algumas semanas da morte. Dava para ver num canto da foto, se sobressaindo da velha árvore de tantas fotos de família, o galho grosso no qual ele passara a corda em que pendurou e sufocou toda a melancolia que lhe corroía os ossos e a alma e lhe drenou por completo a vontade de prosseguir.
Sim, ele comeu o pão que o diabo amassou para limpar o nome do velho e recontar aquela história que um grupo de filhos-da-puta inventou para condenar ao patíbulo da execração pública um homem de comportamento humilde e pacífico vindo da parte mais pobre e esquecida e mal falada daquela cidade.
Agora ele só pensava numa coisa: transladar os restos mortais do velho – da cova com uma cruz de pau feita lá nos fundos do sítio ruinoso para o cemitério principal daquela cidade que o escorraçou como se fosse uma secreção, um dejeto contaminado, uma doença contagiosa.
Ele daria ao pai um sepultamento digno. Esfregaria a morte – o assassinato – do pai na cara de todos. E, de tempos em tempos, visitaria o túmulo para lustrar as letras douradas do epitáfio que ele próprio, o único filho do homem transformado em criatura abjeta de caráter purulento, escreveu:
“Aqui estou para que vocês jamais se esqueçam de sentir vergonha pelo que são”.
Mas ele sabe que é provável que ninguém leia aquelas palavras. E os que porventura as lerem certamente não acharão que elas são endereçadas a eles, comprovando-se assim típicos habitantes daquela cidade cheia de máculas e sem alma.
UM GRITO CONTIDO DE GOL
por Zé Roberto Padilha
Em 1971, aos 19 anos, fiz minha estreia nos profissionais durante a Taça Guanabara. E quando Lula voltou da seleção, retornei para o banco de reservas. Não era um lugar de fácil acesso.
As gerações duravam décadas, dava para o torcedor decorar o time titular e a Panini lançar seu álbum de figurinhas. Felix, Oliveira, Galhardo, Assis e Marco Antonio; Denilson e Didi; Wilton, Flavio, Samarone e Lula. Quem não se lembra? E qual juniores tinha acesso ali?
Aí veio a decisão com o Botafogo. E quando Lula aproveitou que não havia o VAR e o choque do Marco Antonio com Ubirajara entrou para a história carregando toda a polêmica, eu dei um grito no banco e vibrei muito com o gol que nos concedeu o titulo.
Aí os bancários, cobras criadas, me deram um pito:
– Psiu, menos juvenil!
– Mas eu sou tricolor! – respondi!
– Lugar de torcedor é nas arquibancadas. Aqui é para dar uma leve secada. Nada grave, fratura nem pensar. Mas uma distensão leve, um estiramento em quem joga no nosso lugar ajuda a sair daqui.
Antes que respondesse, completaram:
– Ou você quer ficar aqui com a bunda quadrada, desconhecido da torcida e da mídia?
A partir desse dia não deixei de ser tricolor. Apenas passei a olhar minha paixão com um outro olhar, não mais pela emoção, mas pela luta dos meus companheiros pela sobrevivência.
Daqueles amigos que vieram do nada, mudaram a vida dos seus, que vestiam sua camisa e não tinham uma outra opção a não ser vencer em nossa concorrida e cobiçada profissão.
E essa, em uma tarde de domingo, nos impediu de gritar, como tricolor, um gol suado que nos deu o título.
Talvez tenha sido o único episódio em que abriria mão da minha luta e voltaria feliz pro meio do pó-de-arroz, que subia livre, leve e solto pelas arquibancadas campeã carioca de 1971.
O CRAQUE DO BRASIL EM 1978
por Luis Filipe Chateaubriand
Em 1978, o maior jogador do futebol brasileiro foi Zenon, do Guarani de Campinas. O craque bugrino teve uma temporada espetacular, sendo o principal artífice do título de campeão brasileiro conquistado pelo clube do interior paulista – é bem verdade que muito bem assessorado por grandes jogadores como Careca, Renato Pé Murcho e Zé Carlos.
Jogador extremamente técnico, Zenon pensava o jogo como poucos, antevendo as jogadas que poderia executar perante o posicionamento dos jogadores adversários. Batia faltas com perfeição. Era um passador de bola e lançador extremamente qualificado.
Todas essas virtudes estavam bastante exacerbadas naquele Campeonato Brasileiro de 1978.
Um dos momentos altos do brilho de Zenon foi na vitória do Guarani de 3 x 0 sobre o Internacional, em pleno Beira Rio. Em dado momento, Zenon está com a bola, na intermediária, próximo ao meio de campo. Vendo Careca marcado, resolve fazer o lançamento… para ele próprio. Joga a bola na frente, corre quando os marcadores adversários não esperavam, chega na frente deles e, de frente para o goleiro, toca para o gol. Brilhante!
Os dois gols que fez na semi final contra o Vasco da Gama, no Maracanã – uma vitória bugrina de 2 x 1 – também são dignos de registro. Um deles, um “tirambaço” de fora da área. O outro, uma falta batida com enorme categoria. Só restou ao goleiro Mazaropi fazer golpe de vista, torcendo para que a bola saísse e, para azar dele, não saiu.
No primeiro jogo da final, contra o Palmeiras, junto com o experiente Zé Carlos e o novato Careca, tratou de enervar o adversário, que precisava vencer o jogo em casa. Conseguiu e, na expulsão do goleiro Leão, converteu o pênalti que garantiu a vitória de 1 x 0 como visitante.
No segundo jogo da final, suspenso, não jogou. Mas já tinha cumprido o seu papel, o de ser o condutor de um time que encantou o Brasil e, merecidamente, promoveu uma inesquecível festa no interior.
Luis Filipe Chateaubriand é Museu da Pelada!
JOGUINHO FEIO
:::::::: por Paulo Cézar Caju ::::::::
“Que joguinho feio” talvez tenha sido a frase que mais ouvi durante a transmissão da final da Libertadores da América. Não do locutor da tevê, claro, mas de pessoas me ligando de cinco em cinco minutos. Sei que pode soar como bairrismo criticar uma decisão entre times paulistas, no Maracanã, mas sou obrigado a concordar: que joguinho feio! Na verdade, feio é pouco, a partida foi medonha! É o retrato do futebol na América Latina, nível baixíssimo. É inadmissível que Santos e Palmeiras sejam os melhores times do Brasil. Cuca até fez milagre com um Santos endividado, mergulhado em uma crise financeira gravíssima, mas o Palmeiras gastou uma fortuna para montar um elenco milionário que venceu, mas não convenceu.
O torcedor não está nem aí e tem mais é que comemorar, mas o português Abel Ferreira adotou uma postura covarde, típica dos retranqueiros brasileiros. O Palmeiras é um time sem novidades, que não nos surpreende, como são praticamente todos os times que disputam o Brasileirão. A crise técnica é preocupante e agora virou moda dizer que “fulano mordeu o adversário” ao citar uma marcação mais firme. A última grande novidade do futebol brasileiro continua sendo a passagem avassaladora de Jorge Jesus, que apostou todas as suas fichas em um futebol ofensivo e animou a galera. Nenhum treinador brasileiro, da nova geração, despontou e continuamos colocando em prática ideias ultrapassadas, praticando esse “joguinho feio”.
Estava no Maracanã acompanhado de alguns campeões do mundo e a falta de educação dos torcedores também foi outro ponto negativo: em pé nas cadeiras, cantando durante o hino nacional e sem máscaras. Cuca, após expulsão patética, juntou-se a eles e dali assistiu o lateral Pará falhar no gol do Palmeiras. O futebol da beirinha, posicional e que ataca a bola agoniza. “Que joguinho feio”, o torcedor está certíssimo. Ainda bem que não teve prorrogação, pois do contrário eu teria que ser deselegante e sair de fininho. Me despedi de Jairzinho e Brito e me deu uma saudade que vocês não fazem ideia…
LANÇAMENTO FESTIVO DA CAMISA RETRÔ DO MANUFATURA EM VILA ISABEL
por André Luiz Pereira Nunes
Na última quinta-feira (28) ocorreu na loja Botão FC, no Shopping Boulevard Rio, antigo Iguatemi, em Vila Isabel, o lançamento da camisa retrô do Manufatura Nacional de Porcelana Futebol Clube. A Otaner Roupas, igualmente responsável por comercializar a indumentária do America, está de parabéns pela ótima iniciativa de reviver essas antigas paixões.
Durante a apresentação, estive com Pedro Henrique Gomes (PH), da Deriva dos Livros Errantes, estrelando uma live, na qual discorremos sobre o rico histórico do mencionado grêmio industriário alvinegro, uma das maiores glórias do futebol amador da capital, que tantos títulos conquistou ao longo da sua pródiga e longa trajetória nos certames promovidos pela Federação Atlética Suburbana, Federação Metropolitana de Futebol e Departamento Autônomo. Também lançamos, no mencionado encontro, uma fanzine sobre a agremiação, de nossa autoria, intitulada “Os Manufaturenses da Cardim”, que pode ser adquirida junta ou separadamente da camisa.
A transmissão, ocorrida pelo Instagram, contou com a qualificada audiência de Edu Coimbra, irmão de Zico, e maior ídolo do America. Ele ficou extremamente feliz de relembrar episódios da sua juventude, quando também frequentou o antigo estádio Klabim, em Pilares, que posteriormente deu lugar ao Norte Shopping. A atração contou com um convidado especial: o ex-atleta manufaturense Clay Viana, hoje responsável pela divulgação da história do clube na internet e promotor dos encontros dos ex-jogadores. Ele ressaltou o glorioso passado do time, citando inúmeros craques revelados, entre os quais, o atacante Rogério, ídolo do Botafogo e da Seleção Brasileira de 1970.
É importante frisar que constam na camisa a menção acerca do bicampeonato suburbano, em 1940/41, e os 80 anos que decorrem dessa importante conquista. A equipe, fundada em 1932, inicialmente disputava apenas amistosos, excursões, desafios e torneios sem menor importância, até que decidiu, em 1939, se filiar aos quadros da Federação Atlética Suburbana, a qual reunia as maiores expressões futebolísticas do quadro amador da cidade como Mackenzie, Modesto, Mavílis, Engenho de Dentro, Del Castilho, Oposição, Magno e Ríver. Não demoraria para que o Manufatura logo conquistasse o seu espaço ao se sagrar campeão do Torneio Início derrotando justamente o Mackenzie na decisão.
A Otaner, ao realizar esse importante empreendimento, contou com a nossa consultoria, para que tudo saísse perfeito e dentro do planejado. Vale frisar que a empresa já havia feito o lançamento da camisa retrô do Andaraí Atlético Clube, também facilmente encontrada através das suas redes sociais ou na loja Botão FC, localizada no Shopping Boulevard Rio, o antigo Iguatemi.
A julgar pela excelentes repercussão e acolhida por parte do público aficionado, que vem prestigiando a reedição de camisas de times extintos, logo teremos novidades. Por ora, Confiança Atlético Clube, de Vila Isabel, e Byron Football Club, de Niterói, estão cotados para serem a bola da vez.