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TRADIÇÃO OU PRAGMATISMO?

por Idel Halfen


Tradição ou pragmatismo? Quem prontamente escolher alguma destas opções estará correndo um sério risco de estar errado, visto que a resposta depende da conjuntura em que se estabeleça o questionamento, além do que, o ponto de equilíbrio é sempre condição imprescindível para tudo na vida.

Essa breve introdução tem por intuito discutir alguns modelos de camisas de times de futebol a serem lançadas pela Puma, nas quais não haverá a presença dos escudos, que serão substituídos pelo nome do time em maior proporção.

Os mais tradicionalistas que tiveram acesso às supostas imagens de alguns uniformes já manifestaram insatisfação, achando um absurdo a supressão dos escudos, ainda que estes evoluam ao longo do tempo e que a associação do nome com o time fique mais direta, eliminando aquela costumeira pergunta: “de quem é essa camisa?”

Pragmaticamente falando, as chances de uma maior demanda – guardadas as condições básicas de distribuição, precificação e estética – tendem a ser bem maiores. Contudo, antes que os defensores da iniciativa a justifiquem com o tolo cálculo feito por alguns “especialistas do marketing esportivo” que multiplicam a estimativa de vendas pelo preço de venda ao consumidor, adianto que a conta correta contempla a venda multiplicada pelos royalties que cabe ao clube, o qual é apurado após a subtração dos impostos e das margens. Portanto, ainda que qualquer “dinheiro” seja útil, o ganho intangível com a popularização da marca pode ser o mais significativo no longo prazo.

Os protótipos publicados – não de forma oficial – permitem também considerar que as camisas passem a ser demandadas por consumidores que se importam com o lado fashion, aumentando assim o espectro anteriormente restrito a fãs do time e/ou de algum dos seus ídolos.

Terminando os argumentos em prol do “pragmatismo”, lembramos que as camisas da NBA não trazem os escudos das franquias.
Por mais que todas as alegações anteriores pareçam conduzir o texto para o lado do pragmatismo, não é essa a conclusão almejada, visto ser essencial um trabalho de pesquisas e testes de mercado para avaliar a real aceitação do produto.

O tal equilíbrio preconizado no primeiro parágrafo deve ser sempre buscado, pontuando, no entanto, que a tradição – atributo primordial para a identidade de qualquer organização – nem sempre é inquestionável, e que o pragmatismo imposto pela busca de receitas e valorização, não deve ignorar a cultura e a história daquela organização.

Partindo da premissa de que todos os clubes buscam “internacionalizar” suas marcas, pois dessa forma aumentam o potencial de faturamento através de oportunidades fora de seus domínios territoriais, cabe aqui um questionamento: quais escudos são efetivamente conhecidos externamente?

Pois bem, é provável que a grande maioria não seja reconhecida, o que, talvez, indique que uma solução intermediária que comunique o nome possa ser necessária até que haja uma popularidade maior dos escudos.

RESPEITO É BOM E O BOTAFOGO MERECE

por Zé Roberto Padilha


Acabo de ler, no livre espaço democrático das redes sociais, mais uma gracinha contra o Botafogo. Tipo, “Saiu a relação do Cartola e não havia jogadores do Botafogo. Erro de digitação?”.

Todo mundo deveria estudar História. Se não a grego-romana, a das grandes navegações, pelo menos aquela que diz respeito a nossa maior paixão: a do futebol. Se o fizessem, renderiam homenagens, não fariam gracinhas a essa estrela brilhante e solitária.

Porque se alcançamos o título mundial, em 58, a ala esquerda do Botafogo, com Nilton Santos e Zagallo, teve uma participação decisiva. Nossa enciclopédia marcou o primeiro gol de um lateral em Copas do Mundo. Eles, marcadores, nunca ultrapassaram a linha do meio campo em suas equipes, quanto mais marcar gols em mundiais.

E havia um príncipe negro coroado em General Severiano, reinando na ponta dos pés, tal a classe, tal a arte, que encantou os europeus: Didi.

Já no bi em 62, no Chile, se Garrincha foi decisivo, Amarildo, também atleta alvinegro, teve a mais difícil missão: substituir o Rei Pelé. E o fez com tanta competência que marcou contra a Espanha gols decisivos que nos levaram à final.

E no tricampeonato, no México, onde firmamos nossa hegemonia, o Botafogo nos revelou Gerson, Paulo Cézar Caju e Jairzinho, que marcou gols em todas as partidas do Mundial. Um recorde absoluto.

Sendo assim, antes de ironizar essa gloriosa estrela solitária, lembrem-se que existem dois países verde, amarelo, azul e branco citados pela história.

O primeiro, que foi descoberto pelos portugueses. O segundo, que o mundo só tomou conta da sua existência quando ganhamos a Copa da Suécia.

“Quem seriam esses seres miscigenados que jogam bola como pintamos quadros, escrevemos poemas, erguemos monumentos?”, disse o Rei da Suécia após levar um banho de bola em seus dominios, um 5×2 na decisão, para não deixar qualquer dúvidas sobre quem reinaria nos gramados de todo o mundo dali pra frente.

Pois se Cabral descobriu o Brasil, foi o nosso futebol, carregado de estrelas solitárias, que foi descoberto pelo mundo.

E salve o Botafogo. Que merece nossa admiração e respeito. E vai dar a volta por cima porque foi lá em cima que ele nos elevou.

WILSINHO, O XODÓ DA VOVÓ

por Luis Filipe Chateaubriand


Nos anos 1970, a televisão passava um desenho chamado “O Xodó da Vovó”, dos Estúdios de Hanna-Barbera.

O desenho tinha, basicamente, dois personagens: a vovó Dulcina e o seu cachorro, Precioso, seu xodó.

Basicamente, os enredos de cada desenho se constituíam do xodó livrando a vovó das mais diversas ciladas e, ao fim do imbróglio, dando uma risada característica.

Pois o Vasco da Gama também tinha o seu Xodó da Vovó!

Era Wilsinho, ponteiro formado nas divisões de base do clube.

Veloz, jogava tanto pela ponta-direita como pela ponta-esquerda.


Insinuante, levava as defesas adversárias a “baterem cabeça” com a sua ousadia.

Habilidoso, passava pelos defensores com relativa facilidade, se posicionando tanto para fazer o cruzamento como para chutar em gol, em diagonal.

O glorioso Wilsinho, o Xodó da Vovó, também teve passagens por Flamengo e por Fluminense.

No entanto, a passagem mais marcante foi, mesmo, pelo Vasco da Gama.

Tratava-se, como Xodó da Vovó do desenho, de um atacante precioso.

Luis Filipe Chateaubriand é Museu da Pelada!

MANUAL DE SOBREVIVÊNCIA DO REPÓRTER DE TIMES DE MENOR INVESTIMENTO

por André Luiz Pereira Nunes


– Primeira informação importante. A sua presença no estádio é totalmente dispensável. Você não é médico, delegado, ambulância, policial, árbitro ou jogador.

– Sendo dispensável a sua presença, não se importe se for destratado por torcedor, delegado, torcedor ou qualquer outro. São situação corriqueiras. Saber resolvê-las com diplomacia é a solução.

– Nunca se esqueça de que a sua matéria é mais importante do que você mesmo. Se alguém anunciar uma novidade, sem lembrar que foi você mesmo que a escreveu, não se importe.

– Nas coberturas de futebol ninguém lhe oferecerá nada. Nem um copo d’água, quanto mais lanche ou bolinho da vovó. Lembre-se de que você é dispensável. Quitutes são para convidados de honra. Você, definitivamente, não está nessa categoria. Esqueceu-se de que você é dispensável?

– Se você estiver com fome, beba bastante água. Água você pode conseguir nos bancos de reserva. É muito mais importante você se manter hidratado do que alimentado. Nosso corpo pode aguentar até 2 semanas sem comer, mas sem beber aguenta muito pouco. Vem logo uma insolação. Além do mais, beber água engana a fome durante algum tempo.

– Se algum dirigente disser que você é o melhor repórter que existe, finja que acredita.

– Não acredite que a sua matéria, que você pensa que vai bombar, irá bombar… Nada! As pessoas lerão e, 5 minutos depois, já estarão pensando nos seus próprios problemas.

– Se algum dirigente disser que um dia lhe chamará para trabalhar finja que acredita.

– Não reclame de fazer esse tipo de cobertura. Ninguém mandou ou pediu que você o fizesse. Foi ao jogo porque quis. Melhor ver um futebolzinho do que assistir ao Domingão do Faustão ou Caldeirão do Huck.

– Não crie expectativa de futuro em relação ao trabalho. É o mesmo que se cobrar. O futuro não deverá ser muito diferente do presente, diria um analista realista, se pudesse.

– Se receber um tapinha nas costas, fique feliz. Já é alguma coisa. É um tipo de reconhecimento.

– Se um presidente de um time horroroso disser que o time dele é o melhor, finja que acredita. Todo pai diz que seu filho joga bem. É outra mentirinha que você ouvirá muito e deverá fingir que acredita.

– Não aceite JAMAIS que algum treinador lhe proponha indicá-lo para determinado clube em troca de ajuda futura. Se o cara fizer merda, lembre-se: a culpa será sua. Se ele se sair bem, ninguém lembrará de você. O mesmo vale para jogador. Não indique nem ajude ninguém. Repórter não é empresário.

– Lembre-se de que você, como figura totalmente dispensável, pode ser tanto ovacionado como maltratado. Saber lidar com esses extremos é fundamental para continuar nas coberturas.

– Se algum dirigente se queixar de que você não escreve contra a Federação, ria!!! Nunca aceite sugestões de matéria desse tipo. Você se queima e ele fica bem na fita.

– Aprecie o lúdico. As partidas podem não ser muito boas, mas a distração vale a pena. Há fatos, lugares e pessoas engraçadas.

– Nunca peça camisa para dirigente. Compre! Não deva favor a ninguém. Não se queime por causa de um pedaço de pano. Se fizer muita questão, tente comprá-la junto ao fornecedor que sai bem mais barato do que em loja.

– Não discuta com a autoridade. Negocie. Seja educado. Brigar para quê? Você é o extremo mais fraco da escala. Quem se lembra do repórter a não ser ele mesmo?

– Não fale mal das outras pessoas. Deixe que falem. Ouça muito e fale pouco.

– Não tenha opiniões formadas sobre nada. No futebol as coisas mudam muito rapidamente. É um verdadeiro tabuleiro de xadrez.

– Não se preocupe em dar o furo. O furo procura o melhor repórter assim como a bola procura o craque.

– Seja cordial com os colegas, mesmo os concorrentes. Educação não significa passividade. Cumprimentar não custa nada.

CARIOCÃO?

por Paulo Roberto Melo


Li hoje no jornal, em uma matéria sobre o Campeonato Estadual do Rio de Janeiro de 2021, que a Federação de Futebol do Rio, estava satisfeita com a realização da competição. Confesso que não entendi e não entendo o motivo da satisfação. Nem mesmo o fato do futebol, em tempos de pandemia, ser encarado como uma válvula de escape serve de explicação. Afinal, o campeonato foi pouco televisionado e assim, não teve o alcance necessário para tal.

Cresci, escutando meu pai, um português da Ilha dos Açores e apaixonado pelo Vasco, contar a façanha do Super-supercampeonato carioca de 1958, conquistado pelo clube da Colina. Depois de dois triangulares, envolvendo o próprio Vasco, o Flamengo e o Botafogo, o título veio de forma heroica para São Januário. Como nasci em 1966, minha noção de futebol só aconteceu aos 10 anos, quando comecei a ser levado ao Maracanã e minhas lembranças começaram.


Lembro-me da Máquina Tricolor e seus craques: Rivelino, Paulo César, Félix, Edinho, Gil. Um time tão bom, que foi bicampeão carioca em 75 e 76. No ano seguinte, 1977, Roberto Dinamite converteu a última cobrança de pênalti e deu o título ao Vasco, cuja escalação está na memória de todo vascaíno: Mazaropi, Orlando, Abel, Geraldo e Marco Antônio. Zé Mário, Zanata e Dirceu. Wilsinho, Roberto e Ramon. Não me esqueço da cabeçada magistral do Rondinelli, em 1978, aos 44 minutos do segundo tempo, dando o título daquele ano ao Flamengo. Junto a esse título vieram mais dois, em um mesmo ano, 1979, dando ao clube da Gávea seu terceiro tricampeonato.

As lembranças da década de 80 povoam a minha mente. Em 1981, o Flamengo, campeão da Libertadores e Mundial, contou com um reforço para ser campeão carioca: além de Zico, Andrade, Adílio e Júnior, um ladrilheiro foi colocado em campo para esfriar um aguerrido Vasco, que insistia em ser mais eficiente do que um certo Liverpool. Mas em 1982, com um gol olímpico ou de cabeça, o campeão foi o Vasco. “Laranjeiras, satisfeita sorriu”, quando viu seu tricolor ser tricampeão em 83, 84 e 85, com uma geração que aliava técnica, marcação e um craque paraguaio, chamado Romerito. 


O ano de 1986 ficou marcado como o primeiro em que Romário, com 20 anos, foi artilheiro do Campeonato do Rio, embora o campeão tivesse sido o Flamengo. O Baixinho seria artilheiro da competição, outras seis vezes. Lembro-me da corrida desabalada do Tita, com a camisa do Vasco na cabeça, depois de estufar as redes do Flamengo, dando o título de 87 ao cruzmaltino. Inesquecível, foi o que protagonizou o jogador Cocada, na decisão de 1988, entre Vasco e Flamengo. Ele entrou aos 41 minutos do segundo tempo, fez o gol do bicampeonato do Vasco e foi expulso aos 45, depois de jogar sua camisa no banco rubro-negro. E todos se lembram de ver uma estrela solitária brilhar em 1989, quando o técnico Valdir Espinosa conduziu o Botafogo a um título, depois de 21 anos.

A década de 90 começa com o Maracanã caindo, literalmente, aos pedaços. Na final do Brasileirão de 92, ganho pelo Flamengo, parte do alambrado das arquibancadas caiu, matando três pessoas e determinando o fechamento do estádio por sete meses. Assim, o Campeonato Carioca daquele ano, teve seus jogos mais importantes disputados em São Januário. Esse campeonato, ganho pelo Vasco, é marcado por ser o primeiro título de um endiabrado Edmundo e o último do eterno Roberto Dinamite. Nos dois próximos anos, 93 e 94, só a torcida do Vasco comemorou, cantando no reformado Maracanã: “tri, tri, o Vasco é tri!” Memorável foi o ano de 95! Capitaneado por Romário e com um timecheio de craques, em busca de um título no ano do seu centenário, o Flamengo viu a taça ir para as Laranjeiras, graças à barriga de um certo Renato, o mais carioca dos gaúchos. Vibrei em 1998, com o Vasco sendo campeão carioca no ano do seu centenário. 

Os anos 2000 são de flashs para mim. O chocolate que o Vasco deu no Flamengo, na decisão da Taça Guanabara, ganhando de 5×1, em pleno domingo de Páscoa, apesar do campeão carioca daquele ano ter sido o Flamengo.  A sensacional e (in)defensável cobrança de falta de Petkovic, aos 43 minutos do segundo tempo, sacramentando o quarto tricampeonato do Flamengo em 2001. O passe de letra de Léo Lima, no gol que deu o campeonato de 2003 ao Vasco. O quinto tri do Flamengo, em 2007, 2008 e 2009. Um bicampeonato do Vasco em 2015 e 2016.

Enfim, o que se lembrar do “Cariocão” de 2021? A estranha fórmula, em que o campeão da Taça Rio é o quinto colocado? Uma final de campeonato em uma noite de sábado? Um artilheiro da competição com apenas nove gols marcados? Com certeza, o sexto tricampeonato do Flamengo é a única coisa que ficará para a história e mesmo assim, por apenas uma parte do Rio de Janeiro.

Sabe, não sou e não gosto de ser chamado de saudosista. Mas aqui entre nós, tem sido difícil não ser.