ANDERSON SILVA, O BRUCE LEE BRASILEIRO
por Elso Venâncio
Ídolo mundial das artes marciais, Anderson Silva, o “Spider”, é o Bruce Lee brasileiro. No UFC, conquistou 17 vitórias seguidas, além de 10 defesas, em sequência, do título. O campeão deixou a Organização, foi para o boxe e sacudiu o mundo das lutas ao vencer Julio Cesar Chavez Jr.
O curioso é que, no boxe, Anderson recebe por luta mais do que ganhou em metade da sua espetacular carreira. Contra Julio Cesar, por exemplo, embolsou 500 mil dólares, fora um extra de US$ 100 mil pelo fato de o adversário não ter batido o peso. Isso sem falar no milionário pay-per-view, que é um mistério de valores não revelados.
Em seguida, Anderson novamente engordou as finanças ao nocautear Tito Ortiz. No UFC, vale dizer, ele só passou a ganhar fortunas após o surgimento do Conor McGregor, que enriqueceu em poucas lutas.
A partir de julho de 2013, na derrota para Chris Weidman, e tendo o falastrão irlandês como exemplo, o “Spider” passou a pedir uma grana preta. Era atendido, mas criou atritos com Dana White, que nunca deu boa vida ao brasileiro.
Em 2010 o UFC desembarcou em Abu Dhabi, território de ouro para grandes eventos. A ideia era encher os cofres e tornar o MMA popular nos Emirados Árabes. Anderson Silva foi escalado, mas já não vivia um bom momento com o patrão. Venceu Demian Maia numa luta bizarra em que provocava o adversário o tempo todo chamando-o de playboy. Não sei se queria irritar o oponente ou o chefe. Quem sabe os dois. Só não foi demitido por ser o carro-chefe da Organização.
Um ano antes, Anderson chegou a lutar a contragosto com Thales Leites, seu companheiro de treinamento na Nova União. Venceu, após os cinco rounds, e ainda recebeu uma punição! Teve que enfrentar o poderoso Forrest Griffin, ex-campeão da categoria acima. Acabou crescendo ainda mais: em pouco mais de três minutos, obteve o maior nocaute da história do esporte.
Com isso, veio outro desafio que mais soava castigo: ter que derrotar Vitor Belfort, missão dificílima, apesar dos apelos para não enfrentar atletas brasileiros. Um chute preciso e fulminante colocou de forma rápida o ‘Fenômeno’ para dormir…
Em guerra velada com a Organização e cansado das pressões, o supercampeão deixou Los Angeles, onde treina e mora, no fim de junho de 2013 para ir a Las Vegas enfrentar Chris Weidman. Não tinha a habitual motivação. Era muito sacrifício e pouco reconhecimento por parte dos chefes. Pelo menos, em sua conta bancária, alguns milhões de dólares entraram para dar aquela animada.
Nas minhas idas a Vegas, fiquei amigo de Guto Ormenezi, um paulista, sócio de uma agência de turismo, que está há anos radicado na cidade. Ele trabalha para o UFC acompanhando os lutadores brasileiros. Guto me falou da falta de concentração do Anderson. Na véspera da luta, chegou a ir à churrascaria Fogo de Chão e, após o almoço, numa sala reservada, ficou horas de papo com Ronaldo Fenômeno, Djalminha e outros dois brasileiros. Às seis da tarde, Guto deixou o ídolo no hotel; três horas depois, recebeu um telefonema dele. Anderson estava sem sono e queria ir, como foi, ao cinema sozinho.
Sábado, 7 de julho, dia do combate! MGM Grand Garden Arena. Mike Tyson sentado na primeira fila. No mesmo ringue, em 1997, ele mordeu a orelha direita de Evander Holyfield e a cuspiu em seguida. A entourage do UFC, fãs, turistas, todo mundo concentrado no gigantesco hotel. Acordo cedo para caminhar e vejo muita gente ainda nos cassinos. De repente, surge diante de mim um cara com roupão de lutador. Ele caminhava ao lado do seu treinador; ia para a academia sem sequer ser reconhecido. Era Chris Weidman.
Que naquela noite, na arena lotada e incrédula, chocaria o planeta ao nocautear a maior lenda do UFC.
RETRANCA SEM FIM
:::::::: por Paulo Cézar Caju :::::::
Pela declaração de dois técnicos, antes de a bola rolar, entende-se perfeitamente porque anda difícil assistirmos bons jogos. Marcão, pressionado pela torcida, disse que estava valendo vencer o Athletico Paranaense até por meio gol de diferença. E foi o que acabou acontecendo. Ganhou por 1×0, gol contra, de nuca, em uma partida horrorosa. Garantiu o emprego e nos presenteou com um espetáculo de quinta categoria. Do outro lado era a estreia do Valentim….prefiro nem comentar.
Antes de Flamengo x Cuiabá começar, o técnico Jorginho, tetracampeão do mundo, ultra ofensivo na época de jogador de Vasco, Flamengo e seleção brasileira, e a quem eu admiro como pessoa, foi objetivo ao repórter: o Flamengo sabe atacar e eu sei defender. Não seria preciso dizer mais nada, mas vou falar. Essa história de os técnicos entrarem em campo com uma estratégia assumidamente defensiva é um outro dano ao futebol.
Alguns entram para garantir o emprego, outros para permanecerem na Primeira ou Segunda divisões e assim caminha o futebol. Outro dia ouvi dizer que a virada de 3×2 da França sobre a Bélgica foi boa. Mas só foi bom porque o técnico Didier Deschamps, retranqueiro famoso, entrou com uma postura covarde, levou dois gols, recorreu aos jogadores ofensivos, que driblam, resolvem, e saiu vitorioso. Tite fez isso contra o Uruguai e o torcedor falou que há tempos não via a seleção atuar bem. Treinadores com esse perfil odeiam renovar, escalar um ensaboado, mas quando o bicho pega é obrigado a engoli-los.
O torcedor está carente e a bola da vez é o jovem Raphinha, que deitou e rolou em uma seleção uruguaia totalmente ultrapassada. Me perdoem, mas vencer o Uruguai atual é como chutar cachorro morto. Mas é óbvio que a seleção precisa mais de jogadores, como Raphinha, Antony e qualquer outro que dê uma arejada nessa mesmice que virou o futebol. Jogadores assim não podem ficar engaiolados e só saírem da gaiola quando o dono percebe que a casa está prestes a cair.
Gostaria de entender porque os analistas de computadores fazem questão de complicar! No último fim de casa ouvi que o time era fora da curva e que jogava por uma bola após entregá-la para o adversário! Não deu nem tempo de absorver essa baboseira e já emendaram que o jogador de beirinha quebra o jogo e atormenta o adversário entrando pela diagonal…
DIVIDIR POR DOIS
por Rubens Lemos
É sumária a sentença segundo a qual o atacante Raphinha é montanhas acima da cordilheira técnica do futebol brasileiro. Pelo jogo contra o Uruguai na semana passada (4×1), Raphinha selou seu carimbo de virtuoso e de homem que pode ser o protagonismo em caso de ausência de Neymar e parceiro dele, de igual para quase igual, com pequena vantagem para o camisa 10.
Em 2006, na Copa do Mundo das futilidades e rebolados, o Brasil dispunha de monstros: Ronaldinho Gaúcho, Ronaldo Fenômeno, Adriano, Roberto Carlos, Kaká e Robinho de ótimo opcional.
Faltou Rivaldo, mais maduro, aos 34 anos e craque, para dar o mínimo de equilíbrio emocional a um time que virou circo, transformando treinos em piruetas coletivas e bagunça como a de fãs beijando jogadores.
O Brasil tinha um timaço do meio – onde também estava Juninho Pernambucano, que fracassou por apatia geral ao time, mas a cada dia, a cada exibicionismo coletivo, achava que venceria o Mundial quando quisesse. Aí chegou Zidane e botou todos no bolso, com direito à chapelaria coletiva num amplo lençol, maior que a lona do fiasco final.
Zidane, abrindo aqui uma prosa, parecia aquele cara que, no colégio, nos perseguia, batendo na gente só por sadismo, no que o tempo depois convencionou chamar de bullying.
Pois é, o Brasil sofria bullying de Zidane. O cara que nos sacolejava menino e, dez anos depois, em reencontro no bar, dava um cascudo, de leve, apenas para não perder a supremacia da força, no caso dele, com técnica de pianista.
Quando o Brasil entrou em campo em 2010 com Felipe Melo no meio, as probabilidades de um título foram anuladas. Amedrontava feito lutador de MMA, um brigador de rua, um porra-louca dando carrinhos criminosos e sem afetividade no trato com a bola. Além dele, Gilberto Silva, meramente protocolar, sem nenhum algo a mais, critério de um selecionável.
Kaká e Robinho eram os últimos. Kaká, brihante com a bola, era engomadinho demais. Nunca sujou cueca e meião em partida que fosse, essa é a minha suspeita, que fique bem evidente.
Kaká não dispunha da raiva de arrancada dos grandes meias. Postava-se na intermediária abusando de toquinhos e dando chutes despretensiosos, desperdiçando o talento do baú do seu par de chuteiras.
Revelado em 2002 no show dos meninos do Santos, Robinho logo se achou Pelé. Todo garoto revelado na Vila Belmiro deveria assistir 180 vezes um filme de gols, dribles, malandragem e pancadas do Rei, que sabia bater e quebrar sem ser notado. Robinho é o semi-quase, o pseudo, enrolado em casos criminais que sepultaram em definitivo a sua carreira.
Raphinha é um canhoto, primeiro ponto positivo. O canhoto é um subversivo em campo. Sua ginga é feiticeira, Sua finta, mais deslumbrante que a do destro, pode ser alongada ou curta igual a um prego.
O pé esquerdo abençoado é fascinante. Rivelino me ensinou ainda nos anos 1970, domando a gorducha com leveza e fúria em combinação irretocável.
Para Neymar, se Neymar resolver ser menos egoísta, a chegada de Raphinha lhe será decisiva para a última Copa do Mundo dele, no próximo ano. Neymar e Raphinha e a dupla que jamais houve desde a estreia de Neymar contra os Estados Unidos em 2011. Os holofotes sempre foram para ele, por truque de merchandising e por escassez de brilho próximo.
Ora, Neymar é supercraque, nunca foi negado aqui, mas nas duas Copas do Mundo, a de 2014, a da Vergonha contra a Alemanha (ele não jogou nem teria evitado o massacre de 7×1) e na de 2018 na Rússia, acompanhou-se de Fred, Hulk, Jô, Philipe Coutinho e suas oscilações e pernas de pau de grife: Paulinho, Willian e o obtuso-mor Renato Augusto.
Agora, Neymar pode preparar seu encerramento de carreira com boas chances de ser campeão mundial por contar com parceiro de extrema qualidade e destemor.
Os dois podem tabelar, criar um para o outro, inverter posições confundindo defesas, formar dueto afinado, tipo Tom Jobim e João Gilberto na Bossa Nova. Não eram exatamente amigos, mas a plateia (a quem interessava a criatividade), delirava nas maravilhas divinas dos gênios.
MISSÃO QUASE IMPOSSÍVEL
por Eliezer Cunha
Democraticamente venho utilizar deste espaço proposto pelo “Museu da Pelada”. Espaço este normalmente utilizado para enaltecer grandes jogadores de nossa história, porém agora tento com sucesso ou não, de alguma forma corrigir injustiças.
Me oriento para esta abordagem, utilizando de fatos pragmáticos e de uma abordagem sistêmica. São injustiças impostas pela história do futebol, como já ocorrido com tantos jogadores profissionais dentro das 4 linhas ou circundado por 3 troncos de madeira, o Gol. Mas hoje o momento é de se fazer justiça a um jogador que talvez tenha a função mais em risco dentro destes espaços, entre o céu e o inferno. Falo de Cantareli, arqueiro rubro negro que defendeu o famoso manto com unhas, dentes e mãos no meados dos anos 70. Recebeu de Renato o trono difícil de ser um goleiro de um dos times mais amado do Brasil. Catareli recebeu a incumbência num momento difícil da história rubro negra, time desfeito pós Campeonato Carioca 72 e 74, já sem os grandes astros e, num momento de reestruturação. O Flamengo ainda não era a potência de 1978 e dos anos a seguir, lutava pelo Campeonato Carioca com times extraordinários como: Fluminense chamada de máquina, Vasco com um elenco maravilhoso e uma zaga consistente, os anos finais do maestral Botafogo, sem falar no América que também na época lutava por títulos.
Foram anos difíceis aqueles meados da década de 70, mas se manteve titular e fez o que lhe cabia, até entregar a camisa número 01 a Raul, recém-chegado do Cruzeiro. Não pode participar daquele time que conquistou brasileiros, sul-americano e mundial, não desfrutou das glórias de uns dos melhores times formados pelo Flamengo. Apenas trabalhou em silêncio e paciência, porém, o destino não o contemplou com a foto histórica daquele fabuloso time ao lado de Zico e companhia.
Neste momento, peço mais um pouco de reflexão aos críticos que fazem de Cantareli um inexpressível e apenas simples arqueiro de futebol de um possível grande time de futebol, mas sim, um jogador que trabalhou com afinco e determinação para impedir que o Flamengo não deixasse de ser um time respeitado, que apesar dos contratempos ainda lutava pelos títulos nacionais.
RUBENS GALAXE, UM CORINGA MULTICAMPEÃO
por Paulo-Roberto Andel
Hoje em dia é quase impossível ter num clube um jogador que atravesse uma década vitoriosa num elenco, mas na década de 1970 isso era perfeitamente possível. É o caso de Rubens Galaxe, sexto jogador que mais vestiu a camisa do Fluminense na história, com 462 apresentações.
Em meio a craques consagrados, Rubens atravessou diversas formações. No começo dos anos 1970, quando ele chegou, o Flu vinha de uma trajetória vitoriosa, ganhando o Campeonato Carioca de 1969 e o Brasileiro de 1970. E assim seguiu, ganhando os estaduais de 1971 e 1973, até desaguar na monumental Máquina Tricolor, campeã em 1975 e 1976, além de chegar a duas semifinais de brasileiros. Jogadores chegavam e saíam, mas Rubens estava lá. Era o “coringa”, o jogador que se adaptava às diversas funções e posições sem qualquer reclamação – hoje em dia seria uma referência mundial. E ninguém foi tão fundo quando o assunto tratou de posições diferentes em campo: só não jogou de goleiro e centroavante, sempre honrando a camisa tricolor. Não era um craque, mas possuía todos os fundamentos qualificados no futebol e trazia um consigo que foi sua marca: a eficiência.
Com a diáspora da Máquina, vieram tempos ruidosos e o Fluminense ficou três anos sem títulos importantes – hoje, com nove, tem gente que aplaude e comemora, mas naquela época dava até confusão. Pela primeira vez vivendo uma crise no Flu, Rubens aguentou firme e, aos 28 anos, foi o “veterano” do grandioso time campeão carioca de 1980, praticamente todo formado na base tricolor. Dois anos depois, deixou o clube. Uma pena: ele merecia fazer parte do time tricampeão de 1983 a 1985.
Sempre discreto, Rubens marcou poucos gols, mas dois deles foram espetaculares: um chute violentíssimo numa goleada sobre o São Cristóvão por 8 a 1 em 1979 e outro, belíssimo, numa vitória sobre o Flamengo por 3 a 0 no mesmo ano. Este jogo por si dá um livro, tantos foram seus acontecimentos: o Maracanã abarrotado com mais de 100 mil torcedores, o goleiro Paulo Goulart defendendo um pênalti de ninguém menos do que Zico, um monumental gol marcado pelo jovem Cristovão (que depois seria treinador de diversos clubes) num drible sobre Manguito e, por fim, a frustrada estreia da torcida Flagay no Maracanã, provocado por homofobia de setores da arquibancada rubro-negra. O gol de Rubens abriu o marcador num chute forte, no ângulo esquerdo do goleiro Cantarele, e a comemoração virou uma foto maravilhosa publicada na Revista Placar.
Numa entrevista mais recente, Rubens Galaxe declarou: “Nunca fui vaiado pela torcida do Fluminense”. Nem teria como: nos tempos em que o Campeonato Carioca era o mais importante do país, Rubens foi nada menos do que pentacampeão em uma década. Quando o Fluminense teve o time mais emblemático de sua história, ele teve lugar cativo como titular. E depois de uma grande crise, ele colaborou muito para o que Flu voltasse a ser campeão. Sua trajetória e história merecem ser contadas e relembradas: elas falam de um jogador honesto, sério, que nunca teve os holofotes para si, mas que está em muitos posters de um dos gigantes do futebol brasileiro. Um pentacampeão que não escolheu posição para defender sua camisa.
Ele foi muitos num só.