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É PRECISO ACABAR COM O AMERICA

por Geraldaves de Almeida


É preciso acabar com o America! O time para o qual torci não mais existe. Trata-se de um arremedo, uma cópia mal feita, um restolho. A camisa, outrora rubra, se misturou ao anêmico sangue dos botinudos que ora a envergam. Alex, Edu, Bráulio e Luisinho ficaram definitivamente na memória dos tolos saudosistas.

É preciso acabar com o America. Urge que o façam logo. Meu time agoniza lentamente em meio a um limbo em forma de espiral. O cenário perfeito para o portador de labirintite.

O agora ex-America necessita de uma morte digna, pois seus dirigentes o tem infestado a cada ano com refugos e velharias. No início da temporada o elenco contava com 6 goleiros, vejam só, 6 goleiros! O principal, contundido, não atuou em nenhum prélio destes certames de segundo escalão que o ex-America insiste em participar sem obter qualquer êxito.

É preciso que algum corajoso aperte logo este botão. O antigo America necessita ser eutanasiado, pois merece uma morte indolor em respeito às suas glórias, restritas a um passado cada vez mais longínquo.

Os jovens de hoje não conhecem o America. Nunca ouviram falar. É o Mineiro? O de Natal? O clube estranhamente desapareceu do noticiário. Seu nome não aparece sequer nas páginas policiais, sinal claro de que o doente terminal necessita urgentemente do direito à inexistência oficial.

A agremiação possuía a sede mais moderna e charmosa da América Latina. Mas o espaço veio ao chão. Dizem que no lugar erguerão um shopping center e no playground ficará acomodado o ex-America. Que triste fim! Será que ao menos a diretoria aprenderá a emitir boletos?

A culpa de toda essa decadência seria da CBF e do famigerado Clube dos Treze, alegam alguns insistentes torcedores. Mas isso não é verdade. A culpa é desse modelo de futebol moderno que promulga a elitização e a existência dos clubes de massa em detrimento da pluralidade saudável e necessária. ‘Money, my friend!’

Não há mais espaço para meu ex-time. Em lugar de vê-lo sujo, mal ajambrado e descolorido, prefiro torcer por um fóssil.

Por favor, desliguem os aparelhos e deixem o meu America morrer em paz!

OS PONTAS, OS MEIAS, O ESPETÁCULO

por Paulo-Roberto Andel


Meu amigo Catalano, também escritor, tem uma tese a respeito do futebol “moderno”: se uma boa equipe tiver dois grandes jogadores abrindo ataques pelas pontas, mais um finalizador de respeito, triturará os adversários no mundo inteiro. Sigo o relator.

Até os anos 1980, todos os times usavam pontas. Depois disso, a prioridade do futebol-força fez com que a posição fosse extinta, pois todos têm que marcar e recompor. Some-se a isso a besteirada de neologismos ocos (agudo, intensidade etc), mais retrancas para tentar garantir os empregos dos treinadores por algum tempo e pronto: chegamos ao cenário atual onde colocamos três times entre os quatro melhores da Libertadores, mas não brilhamos. A Seleção Brasileira é líder disparada nas eliminatórias, mas não encanta em nada.

É certo que os temas e focos mudam. Sem sombra de dúvida, o futebol de hoje exige um condicionamento físico intenso, muito maior do que antes. E os pontas precisam voltar para garantir a dinâmica de jogo. Ok, tudo bem, mas por que a evolução física deveria significar o fim do nosso talento?

Não faz sentido algum.

O Brasil dominou o cenário do futebol quando desenvolveu uma característica própria que nenhum outro país tinha em quantidade: talento individual, drible, passe, lançamentos, soluções surpreendentes. Até hoje somos respeitados por causa disso, e quando jogadores como Neymar encantam multidões em certas ocasiões, é porque exibem resquícios daquele talento.

E onde entram os velhos pontas nessa história? Com os dribles. Tivemos pontas. fantásticos que entortavam marcadores e apavoravam as defesas, cruzando de forma mortífera já de dentro da área. Hoje em dia o sujeito dá um balão do meio de campo e não entende como a defesa rival desarma tudo.

Não entendam estas linhas como um manifesto saudosista, porque este não é o objetivo delas. O que reclamo é: por que temos que abrir mão da nossa qualidade técnica, o bem mais precioso que temos para voltarmos ao topo do mundo? Ele pode ser reabilitado, desde que aplicado às escolas de formação de jogadores, até que voltemos a mostrar talento em campo. Não é difícil, mas exige vontade política. Quem disse que não podemos aliar condição física e excelência técnica?

Sem o drible, o futebol brasileiro perdeu sua essência. Muito disso veio quando passamos a massacrar os pontas, a eliminar a troca do camisa 10 pelo cão de guarda marcador, a fazer do volante um brucutu. E a quem interessava esse discurso? Aos adversários, claro.

Colocando gente que sabe de bola nas divisões de base, talvez possamos reverter essa pasmaceira em alguns anos. Gente que possa fazer o papel de grandes nomes que tivemos, tais como Cilinho, Carlinhos, Faria e Neca, verdadeiros ourives da bola. Caso contrário, continuaremos a ver jogos cada vez mais chochos, chamados de “grandes espetáculos”.

VELHOS BOLEIROS E BOLEIROS VELHOS

por Maurílio Paixão


Chegam aos poucos por volta das 18h. Trabalho, rotina doméstica e problemas de saúde vão desparecendo a caminho do clube e somem ao se deparar com o campinho não mais de terra batida e sim de grama sintética. 

Profissionais liberais, empregados, empresários, aposentados, desempregados e demais “coroas” acima de 45 anos se juntam para a prática da melhor das terapias… O rachão semanal.

Vestir o calção, enfaixar os pés, passar aquela pomadinha milagrosa que tira as dores do tempo, usar a camisa sagrada de seu clube. Chutar e gritar gol como se fosse o ídolo que tanto sonhou ser.

Quando a bola rola, a idade diminui e a experiência aumenta; conhece o atalho do campo, corta caminho e antecipa a marcação, tem o drible irresistível e o toque requintado.

Porém, quando o lançamento é longo e o campo curto; o velho boleiro, de joelheira gasta, da artrose perene, da barriga objetiva, reclama do último toque do beque, da bola que não saiu e do juiz que pra variar não apitou a falta sofrida.

A felicidade é tamanha que por um momento é um menino, gritando, rindo, reclamando. Por um instante, ouve a mãe chamar para o almoço, para o banho da tarde, pra tarefa escolar e é feliz porque o dia seguinte vai ter bola de novo, campinho, companheiros… Saudade boa, saudade sadia.

Convoco os velhos boleiros que penduraram as chuteiras que retornem aos gramados e voltem a ser por 20 minutos boleiros velhos, pois, muito do que os incomoda, será pouco diante do que esperarão da vida após o apito final.

 

O CRAQUE DO BRASIL DO ANO 2000

por Luis Filipe Chateaubriand


Ao final de 1999, Romário completava cinco anos vestindo a camisa do Flamengo (fora uma pequena passagem pelo Valência, da Espanha).

Como prêmio pelos bons serviços prestados – gols a rodo –, foi dispensado da Gávea.

Mexeram com os brios do Baixinho…

Que escolheu logo o Vasco da Gama, arquirrival do Flamengo, para jogar, voltando às origens, pois iniciou a carreira no cruz maltino.

O homem estava com fome de gols, portanto, em 2000.

E foi gol de tudo quanto é jeito que se possa imaginar!

O ano de 2000 marcou o ano em que o Baixola marcou mais gols em toda sua carreira.

Em especial, marcou três dos quatro gols da final da Copa Mercosul – uma virada espetacular do Vasco da Gama para cima do Palmeiras, uma vitória épica por 4 x 3, um jogo inesquecível.

A pergunta que não quer calar…

Como não ser o craque do ano 2000?

Luis Filipe Chateaubriand é Museu da Pelada

EDMUNDO, O MAIOR DO MUNDO EM 1997

por Elso Venâncio


Edmundo foi um dos maiores atacantes que acompanhei de perto no futebol. Ídolo do Vasco e do Palmeiras, era hábil, rápido e jogava com o coração na ponta das chuteiras. Sempre o primeiro a entrar em campo para treinar e um dos últimos a sair. Nas concentrações, só deixava o quarto para fazer as refeições.

Foi o ‘garotinho’ Osmar Santos, locutor esportivo palmeirense, quem lhe deu o apelido mais famoso. Na Rádio Globo paulista, chamava-o de ‘Animal’, sinônimo de craque do jogo. Raí e Cafu, entre outros, não gostavam da alcunha, mas Edmundo, incentivado pela torcida, encarnou bem o personagem. Em 1993, contra o Vitória, no Palestra Itália, a torcida, empolgada com sua atuação e os dois gols marcados na vitória por 2 a 0, iniciou o coro uníssono na arquibancada, grito esse que contagiou o estádio:

– Au, Au, Au, Edmundo é Animal!!!

Em 1997, Edmundo foi o melhor jogador do mundo. Porém, como a Fifa só tem olhos para a Europa, não enxergou o óbvio. O Vasco, tricampeão brasileiro naquele ano, era comandado por seu camisa 10. Autor de 42 gols em 51 jogos, Edmundo estraçalhava adversários. Recorde histórico em partidas da Série A no Brasil, fez os seis gols da vitória por 6 a 0 sobre o União São João, de Araras, em São Januário. Na sequência, humilhou o Flamengo: marcou três na goleada de 4 a 1, com direito a Maracanã lotado. Nessa partida, presenciei uma das maiores atuações individuais no estádio. Edmundo, de quebra, superou o atacante Reinaldo, autor de 28 gols pelo Atlético Mineiro no Brasileirão de 1977. Com seu último gol sobre o Rubro-Negro, chegava a 29. Era, disparado, o craque do Campeonato.

Um dos maiores absurdos da história do futebol foi ver Edmundo na reserva durante a Copa de 1998, na França. Com ele e Ronaldo Fenômeno no ataque, o Brasil teria enormes possibilidades de título. Certamente, a dupla arrasaria os oponentes, um a um.

Em 1994, Bebeto e Romário eram os principais atacantes do mundo. Quatro anos depois, Edmundo e Ronaldo respondiam como os maiores do planeta, mas apenas o camisa 9 foi titular. Zagalo preferiu Bebeto em fim de carreira. O acaso, sarcástico, ainda entraria em campo para impedir Edmundo de jogar a grande final.

No dia da decisão do Mundial, no que saiu a escalação, um susto interplanetário: Edmundo no lugar de Ronaldo, que sequer estava no estádio. Isso a uma hora do jogo. Ninguém entendeu nada.

Na tribuna do Stade de France, a equipe da Rádio Globo, formada por José Carlos Araújo, Washington Rodrigues, Eraldo Leite e eu, todos estupefatos. Ao nosso lado ficava a cabine da TV Globo, com Galvão Bueno e Pelé em polvorosa. Galvão pegou a escalação na mão, olhou para mim e, gritando, perguntou espantadíssimo:

– O que está havendo? Ronaldo não joga?

Ainda repetiu, como que para tentar acreditar:

– O que está havendo?

Ligo para o celular do Gilmar Rinaldi, que passava pela pista de atletismo a caminho do vestiário.

– Ronaldo não joga, Gilmar?

Ele me responde com uma única palavra:

– Joga.

E desliga o telefone.

Ronaldo chega ao estádio com Lídio Toledo. O time estava no aquecimento. Ricardo Teixeira é chamado para uma reunião de emergência com Zagallo, Zico e o próprio Lídio. A última palavra é do médico, que afirma categoricamente que Ronaldo está bem e pode, sim, jogar.

Ninguém teve peito de barrar Ronaldo, o garoto-propaganda da poderosa Nike. Em campo, porém, o Fenômeno provou estar mesmo abalado após a convulsão que sofrera horas antes, na concentração. Seus companheiros visivelmente sentiram o drama do rapaz. Muita pressão sobre seus ombros de apenas 21 anos.

Nisso, o destino, com seus mistérios, tirou de Edmundo a chance de, quem sabe, ser protagonista de uma final de Copa do Mundo.