OS ENCANTOS DO DOUTOR RÚBIS…
por Péris Ribeiro
O primeiro grande ídolo que tive na vida, não foi Didi, o genial inventor da Folha-Seca. Nem mesmo Zizinho, o inigualável Mestre Ziza. Ou ainda Mané Garrincha, alegria maior dos estádios de todo o mundo.
Na verdade, quem povoou os sonhos da minha infância e me ensinou o caminho das emoções de cada domingo no futebol, foi um fenômeno rubro-negro que atendia pelo nome de Rubens. Rubens Josué da Costa. Um meia-armador baixinho e troncudo, repleto de habilidades, e que, na idolatria da torcida do Flamengo, era o maior de todos os craques da época. Mas que, para ela, era simplesmente Doutor Rúbis.
Conheci-o primeiro pelas ondas do rádio, através das empolgantes transmissões do professor Oduvaldo Cozzi, o mais famoso dos narradores esportivos da época. Até que, já inteiramente arrebatado, parti para vê-lo em ação em pleno Maracanã – onde a minha fantasia, se consumou numa colorida e festiva realidade.
Maior expressão do frenético time do Flamengo, que caminhava a passos largos para a conquista do primeiro tricampeonato da Era do Maracanã, dava gosto – e como! – vê-lo jogar. Particularmente, por unir a cada passo, em cada lance em que o víamos em ação, trejeitos típicos de um passista de escola de samba aos invejados dotes de um grande artista da bola.
Aliás, a tarde – noite em que o Flamengo comemorou o bicampeonato carioca de 1954, em pleno mês de fevereiro e às vésperas do Carnaval de 1955, jamais sairá da minha memória. Ainda mais, que eu estava ali – menino ainda, nos meus 11 anos de idade -, vivenciando tudo aquilo. Tão perplexo quanto deslumbrado. Ainda mais, que havia chovido o domingo inteiro – aquela chuvinha fina e resistente, dos longos dias de verão. Mas o Rio de Janeiro, mesmo assim, era uma festa só.
Nas arquibancadas, a charanga de Jayme de Carvalho, àquela altura, fazia o estádio inteiro tremer. Era um show à parte. E entre sambas e marchinhas carnavalescas, e o empolgante hino do clube, jamais parava de tocar. “ Flamengo, Flamengo / Tua glória é lutar/ Flamengo, Flamengo/ Campeão de terra e mar…” E se empolgava ainda mais, quando mergulhava no embalo de um samba-batuque de Risadinha, que ganharia o carnaval daquele ano, e ao qual adaptara uma paródia irresistível: “ Venho do lado de lá/ Venho do lado de lá/ O Doutor Rúbis mandou/ Todo mundo gingar/ O Doutor Rúbis mandou/ Todo mundo gingar…”
E que lá embaixo, no campo, o Bangu sofria a humilhação de uma goleada de 5 a 1. E toda aquela aula de futebol era comandada por Rubens, que não se cansava de colocar Índio, Evaristo, Benitez e Paulinho Almeida na cara do gol. Ou de descadeirar Zózimo, Gavillan e quem mais se atrevesse a marcá-lo, com sucessivos dribles desmoralizantes.
Ah!, o seu drible! Podia ser pequeno, estreito, mas quase sempre era largo, vistoso. E ele executava-o com elevada tessitura plástica, partindo para cima do adversário e bailando diante dele. Para, logo em seguida, ultrapassá-lo com a maior das facilidades, como se estivesse prendendo a bola à chuteira numa espécie de barbante ou elástico – o que fazia com que a citada bola parecesse ir e vir, intermitentemente, ao seu pé direito. Para desespero de quem dele, Rubens, se acercasse naquele momento.
Gostando de invadir a área inimiga, trocando passes com Índio, Benitez, Paulinho ou Evaristo, Rubens era dos que sabiam chutar com rara precisão a gol. E se conhecia como poucos, os atalhos para os lançamentos sob medida de mais de 40 metros, era de conceber verdadeiros recitais no meio-de-campo, ao lado de sua alma gêmea, Dequinha.
Até que certa vez, após mais um daqueles momentos geniais ao lado do velho Deca, limitou-se a comentar:
– Para ser franco, nem sei bem o que dizer. Nem sei como explicar. Parece uma coisa mágica, sabe? É como se estivéssemos juntos há muito tempo. Como se a gente jogasse por música…
Consagrado o Maior Jogador do Rio nas temporadas de 1953 e 54, além de ser tido e havido como o grande herói daquele bicampeonato rubro-negro, já no início de 1955, Rubens era, na verdade, tudo aquilo e muito mais. Na minha concepção, ele era ritmo, simetria e sofisticação em campo. Tudo isso ao mesmo tempo. Só que também era picardia, malemolência, leveza, malandragem…
Como se vê, só podia virar mesmo Doutor Rúbis !
Por sina. E pura vocação.
A FALTA QUE FAZ O TORCEDOR
por Zé Roberto Padilha
Outro dia, conversando com o Dé, o Aranha, essa figura maravilhosa que só o futebol foi capaz de revelar, relembramos uma partida que marcou muito as nossas vidas. Foi um Flamengo 3 X 1 Vasco, terceira rodada da Taça GB, no dia 04/04/76.
O jogo valia apenas os três pontos, não decidia nada, mas os moradores da Cidade Maravilhosa combinaram, depois da praia, ir ao Maracanã. Foi tudo uma enorme coincidência.
Nos vestiários, pelo barulho, já sentíamos que tinha algo diferente acontecendo lá dentro do estádio. E quando entramos, tomamos um susto. Tinham policiais retirando torcedores das marquises. Nunca vimos tanta gente.
Foram 174.465 pagantes, o quinto maior publico da história do Maracanã. Não jogamos, lembramos, levitamos. Foi inesquecível. Não dá para subestimar o calor ao vivo que potencializa o atleta a ir além dos seus limites.
Hoje, porém, no inicio do Campeonato Carioca, O Globo anuncia que teremos o estadual mais rentável financeiramente dos últimos anos. Para isto, todos os esforços foram feitos para ele, torcedor, ficar em casa. Ser apenas um telespectador.
Serão jogos transmitidos por TV Aberta (Record TV), pay-per-view, plataforma oficial (Carioca TV), canais dos clubes, além da “transmissão bet” e quatro canais de streaming.
Cada vez mais retiram dos estádios o calor do torcedor. O poder, a empatia, a cumplicidade até de uma vaia que chegam até os artistas principais. Seus desempenhos pouco importam. O que vale é o lucro.
Sabe, Dé, se eles soubessem o quanto essa emoção nos faz jogar melhor…mas aí não seriam cartolas. Seriam dirigentes. E como eles fazem falta na organização do futebol brasileiro.
A ordem, a partir de hoje, é esquecer o ingresso. Comprar pipocas, latas de Brahma, reunir os amigos. E pagar caro para ver de longe a falta que todos eles nos fazem por perto.
Carlos Gainete
CARLOS GAINETE
entrevista e texto: Eduardo Lamas
Minhas primeiras tentativas de entrevistar o ex-goleiro e ex-técnico Carlos Gainete foram no início de 2020, quando entrei em contato com o filho dele, de mesmo nome, pelo Facebook. Na época, ele morava no Rio de Janeiro e o pai, fui informado, estava residindo em Porto Alegre. Mas como Gainete nasceu em Florianópolis, pensei cá comigo: uma hora ele vai aparecer na área e não vou perder a chance.
Quando eu e o cinegrafista Fernando Gustav retornamos aos trabalhos para o Museu da Pelada, em outubro de 2021, após longo e tenebroso inverno pandêmico sem vacinação, retomei os contatos com Carlos Gainete filho, que, para sorte minha, tinha vindo para Florianópolis. Numa prévia da pesquisa que sempre faço para preparar a pauta das entrevistas, descobri que estava se aproximando o 81º aniversário do ex-goleiro de Inter, Vasco, Athletico-PR, em 15 de novembro. E aí fui informado pelo filho que o pai viria de Porto Alegre para cá. Mas engana-se que, por isso, foi fácil.
Gainete não se mostrou nada entusiasmado com a ideia de dar uma entrevista, informou-me seu filho. Sem ser chato, algo que detesto ser, mas com alguma insistência, Carlos Gainete cedeu depois de tentar suportar uma saudável e carinhosa pressão caseira do filho e da esposa, aos quais agradeço imensamente. Sorte nossa e de toda massa torcedora do Museu da Pelada. Afinal, boas histórias não faltam, tanto dos tempos de goleiro, quando foi campeão catarinense logo na sua primeira temporada pelo Paula Ramos Esporte Clube, em 1959; campeão da primeira Taça GB, pelo Vasco, em 65, e quatro vezes seguidas campeão gaúcho pelo Inter, e de treinador, com maior destaque para o timaço que formou no Guarani, com Ricardo Rocha, Marco Antonio Boiadeiro, Evair, João Paulo e outros (entre eles Tite, o atual técnico da seleção brasileira), que acabou sendo vice-campeão brasileiro, perdendo nos pênaltis para o São Paulo de Careca, Pita e cia, em 86, numa partida final antológica e cheia de polêmicas, com muita tristeza para os bugrinos e, em especial para Gainete, que confessa jamais ter conseguido rever aquele jogo.
No fim do nosso papo, já em off, ousei perguntar a ele quem tinha sido melhor, o goleiro ou o treinador. Ele respondeu: “O homem”. Aplaudimos espontaneamente, eu, Fernando Gustav e o orgulhoso filho do nosso entrevistado.
SELEÇÕES AFRICANAS EMPOLGAM
:::::::: por Paulo Cezar Caju :::::::::
Sigo acompanhando a Copa da África e tenho gostado muito das equipes. Enquanto assistia um canal internacional que transmitia um jogo da competição, fiquei muito feliz com a aparição do tenista africano Yannich Noah, meu amigo de longa data e um apaixonado por futebol. Para quem não lembra, ele foi campeão de Roland Garros em 1983 e eu tive o privilégio de estar lá em Paris para acompanhar. Assim como eu, ele também tem acompanhado a Copa da África desde o início e trocamos altos papos. A competição já está no mata-mata e é muito bacana ver a evolução dessas seleções, que devem dar trabalho na Copa do Mundo.
Inclusive, se eu estivesse no meio do futebol, com certeza traria jovens africanos para os clubes do Brasil. Eles têm um estilo de jogo que lembra o nosso e ninguém aguenta mais as “apostas” em jogadores acima dos 35 anos que não têm mais espaço na Europa, né? Sobre a Copinha, espero muito que a final entre Santos x Palmeiras me surpreenda. Vi as semifinais e não me encantei por nenhum dos dois clubes.
Aliás, o que mais me chamou a atenção foi a desorganização, com direito a invasão de torcedor e faca no gramado. Aonde isso vai parar? As punições precisam ser severas, é o mínimo! Mas isso é consequência dessa quantidade infinita de times que participam da competição, com um jogo atrás do outro e não há logística que aguente.
Vi uma mobilização na internet para que o Palmeiras leve o menino Endrick para o Mundial. Embora o técnico Abel Ferreira já tenha descartado com o argumento de que o garoto de 15 anos precisa amadurecer, acho que ele tem qualidade e poderia somar! Faz parte do processo de amadurecimento jogar ao lado de jogadores consagrados e esse torneio com certeza traria muita experiência pra ele! Encerro a coluna chateado com o descaso com o Campeonato Carioca? O torneio está para começar e é uma pena ver que ninguém mais dá valor à competição que já foi considerada a mais charmosa do mundo!
O meu Botafogo estreia amanhã e eu nem sabia, o Maracanã está fechado para obras e o regulamento está cada vez mais confuso! Por que não acabar de vez com essa competição? Seria mais digno! E ainda não teria que ouvir que o time está pressionando o adversário com marcação alta e jogadores cascudos mordendo a segunda bola! Na minha época só existia uma bola em campo!
Adilson Heleno
ADILSON HELENO
entrevista e texto: Eduardo Lamas
A primeira vez que vi Adilson Heleno na minha vida foi no dia 29 de agosto de 1982. Eu e boa parte dos mais de 122 mil torcedores que resolveram chegar mais cedo ao Maracanã para assistir a mais um Fla-Flu, fomos privilegiados na preliminar do clássico com um gol que provavelmente nenhum profissional conseguiu fazer em mais de 70 anos de existência do mítico estádio do Rio de Janeiro. Adilson, ainda sem o sobrenome, vestia a camisa 10 rubro-negra e arriscou um chute do meio do campo ao perceber adiantado o goleiro, que ele acha que era Ricardo Cruz, e marcou um gol antológico. Nunca mais me esqueci daquele lance, mesmo com o show do meu time no clássico principal, com o placar de 3 a 0, gols de Vitor, Andrade e Marinho, construído num primoroso primeiro tempo que fez um torcedor tricolor invadir o campo e pedir para os craques rubro-negros pararem com o baile.
Mas o papo aqui é com o canhota que nasceu na Baixada Fluminense e surgiu como grande promessa na Gávea, num momento em que Gilmar Popoca, outro canhota habilidoso e ótimo cobrador de faltas de uma geração anterior de craques feitos em casa, já despontava no time principal. Para complicar mais, logo depois, Zico retornaria da Itália. Adilson não pôde ficar no seu time do coração, mas foi brilhar no Fortaleza, tornando-se campeão cearense de 85; Avaí, onde se tornou um dos grandes ídolos da história do clube catarinense; Criciúma, quando superou o ídolo maior do Flamengo, ao vencer a Bola de Prata do Brasileiro de 88; Grêmio, onde se sagrou campeão da primeira Copa do Brasil, em 89; entre muitos outros.
Adilson era um entrevistado que buscava desde o início da nossa jornada aqui em Floripa, em outubro de 2019. Com a pandemia, a partir de março de 2020, eu e o cinegrafista Fernando Gustav só retornamos em outubro de 2021 e, finalmente, pudemos nos encontrar com o ex-camisa 10 num dia de reunião de amigos na escolinha do Barcelona que fica bem próximo do estádio Orlando Scarpelli, do Figueirense, onde ele cuida do bar local e joga suas peladas. Lá, após o papo que você vai curtir, entre tantos peladeiros muito bons de papo, estavam os ex-atacantes Aldrovani, um cigano do futebol que atuou por diversos clubes do Brasil, além de ter jogado na França e no Japão, e Jorge Luís, ex-Bangu. E a resenha, que começou após a entrevista, por volta das 17h, não queria acabar.