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ECOS DE 1982

por Paulo-Roberto Andel


Parece que foi ontem, mas vai fazer quarenta anos. Está fazendo.

Dirigida desde 1980 por Telê Santana, a Seleção Brasileira era a equipe nacional mais respeitada do mundo. Jogando no mínimo uma vez por mês, o Brasil sofreu apenas duas derrotas no período – uma para a URSS no comecinho do trabalho e outra para o Uruguai na final do Mundialito.

Em 1981, a Seleção encantou o mundo definitivamente, ao vencer Inglaterra, Alemanha e França em seus respectivos domínios. A respeito da Alemanha, o Brasil já tinha derrotado os então bicampeões mundiais por 4 a 1 naquele mesmo Mundialito e voltaria a vencer no Maracanã, às vésperas do embarque para a Copa da Espanha. E não foram apenas vitórias, mas shows de bola sobre adversários espetaculares do porte de Keegan, Breitner, Rummenigge, Hansi Muller, Tigana, Tresor, Platini e outras feras.

A Seleção não fazia partidas, mas exibições. Dava gosto em ver. Dribles, passes, tabelas, lançamentos. Naquele tempo se popularizou a expressão futrbol-arte, mas no fundo era apenas o futebol em sua essência, como deveria ser para deixar os torcedores felizes. Futebol de talento, de capacidade e ofensividade, de fazer o adversário se preocupar com o jogo dias e dias antes.

Quando saiu a convocação final, não havia maior prova do grande momento do futebol brasileiro. Ficaram fora da lista final cracaços como Adílio e Mário Sérgio, afora outros nomes que sequer foram cogitados numa lista com 22 convocados – não é exagero dizer que o Brasil poderia colocar 44 jogadores se o regulamento permitisse.

É certo que cada um tem seus gostos e preferências, portanto alguns convocados passaram a ser mais contestados com o tempo. Noutros casos, há quem diga que alguns reservas da Seleção estavam em melhor fase do que os titulares. E o desfecho da Capa de 1982 levou a críticas naturais. Mas nunca é demais lembrar: no início da Copa, o Brasil não era favorito ao título apenas para os brasileiros, mas para o mundo inteiro. Fizemos por merecer com quase dois anos de ótimas partidas, algumas contra as mais poderosas seleções de outros países.

Há quarenta anos, eu era um garoto de treze apaixonado pelo Maracanã, louco para ir às Laranjeiras e fazia de tudo para economizar minha minúscula mesada para ir aos jogos. Fui a muitos, muitos, e em todos eles eu tive a certeza e o orgulho de que jogávamos o melhor futebol do mundo. Quando vejo hoje a reação das pessoas aos jogos da Champions League, lembro que era o que sentíamos pelos nossos jogos locais e os da Seleção Brasileira. Se o desfecho da Copa ficaria longe dos meus sonhos, nada vai tirar o brilho daquelas partidas de 1978 a 1982 na minha memória do Maracanã, nem o início da Era Telê, que começou com o maravilhoso Palmeiras de 1979, que jogava tão bonito a ponto de levar seu treinador à Seleção mesmo sem os títulos paulista e brasileiro.

Ultimamente o que não falta é gente querendo mudar o passado, mas é bom que se diga: a Seleção do Seu Telê jogou demais. Demais.

O VICE-TREINADOR

por Zé Roberto Padilha


O Fluminense acaba de inovar ao criar, no futebol, a figura do vice-treinador. Aquele que como José Sarney, Itamar Franco, Michel Temer, Cláudio Castro, mal figuravam na cédula, ninguém votou, não compareceram aos debates e de repente …assumem o poder.

Sem qualquer responsabilidade, pois se perder não foi culpa sua, foi de quem montou seu ministério. Se empatar está no lucro, se vencer é um salvador da pátria.

No futebol é mais fácil do que na política. Para derrubar Tancredo, bastou uma infecção, Collor, uma Elba e o Eriberto, ao Michel Temer, uma pedalada mal contada, Witzel…bem, este aí todos esperavam.

Para derrubar o Abel, mesmo sendo campeão carioca, ter alcançado recordes de invencibilidade, e olha que ainda nem entramos no mês 5, bastou o Fred desperdiçar um pênalti aos 48 minutos do segundo tempo.

Nem o direito à cobrança o Abel teve para tentar salvar o pobre pescoço. Eles erram, eu caio.

Não precisou de passeatas, greves, de um mau perdedor ,como Aécio Neves, ou o Eduardo Cunha atuando nos bastidores com o Merval Pereira dando cobertura na Globonews.

O presidente do Fluminense, que sabe muito de futebol, se trancou na sala com outra dúzia de dirigentes que também não jogaram nada, e decretou o Impeachment.

Agora, nos resta acompanhar as ações da Petrobrás, se o dólar se estabiliza, se cai o preço do gás de cozinha. Com a palavra, o Congresso Nacional.

Sua próxima reunião é domingo, em Curitiba. Se perder…só o Moraes!

DOIS ÍDOLOS, DUAS ESTÁTUAS E QUASE 2 MIL GOLS

por Elso Venâncio


Romário me disse, quando deixou o Barcelona para jogar no Flamengo, que era muito grato a Roberto Dinamite:

– Esse cara me ajudou muito. Quando subi para os profissionais, ganhei confiança para marcar gols graças aos lançamentos dele.

O ex-zagueiro rubro-negro Mozer gosta de lembrar:

– Eu marcava duramente o Roberto, não dava espaços para ele, até que certa vez ele me provocou: ‘Tá metendo a porrada, né? Vai ver agora… Olha bem pra esse garoto” – disse Roberto, apontando para o Baixinho com o dedo indicador.

Na lateral do campo estava Romário, que tinha acabado de assinar a súmula e se aquecia para entrar, aos 20 minutos do segundo tempo.

Romário foi para o campo a mil. Em pouco tempo, recebeu ótimo passe de Roberto e marcou o gol da vitória.

Quando jogou com Romário, o ídolo Roberto já tinha mais de 30 anos. Passou a atuar mais recuado, metendo toda hora na cara do gol o garoto que surgia feito um furacão, saindo como um raio em diagonal da esquerda para o meio.

Acompanhei os dois de perto durante o bicampeonato carioca que o Vasco conquistou entre 1987 e 1988. O time que levou o primeiro dos dois títulos era surreal: Acácio, Paulo Roberto, Donato, Fernando e Mazinho; Dunga, Geovani e Tita; Mauricinho, Roberto e Romário. A equipe que entrou em campo no jogo do bi também deixa saudades: Acácio, Paulo Roberto, Donato, Fernando e Mazinho; Zé do Carmo, Henrique e Geovani; Vivinho (Cocada), Bismarck e Romário.

Nessa final, o treinador Sebastião Lazaroni resolveu colocar Cocada no lugar de Vivinho. O lateral entrou aos 41 minutos do segundo tempo, fez o golaço da vitória por 1 a 0 aos 44 e, logo em seguida, foi expulso, aos 45, por debochar do treinador rubro-negro Carlinhos, que o preteriu na Gávea. O Vasco tinha vencido o Flamengo por 2 a 1 no primeiro jogo e precisava apenas empatar. Acabou ganhando, sendo que o Flamengo era o atual campeão brasileiro. O gol que consagrou Cocada é um dos mais marcantes da história do clube.

Na comemoração do título, numa boate em Copacabana – naquela época, os craques e a imprensa conviviam bem de perto –, o “Tremendão” Erasmo Carlos pegou o microfone e, no meio de jogadores, dirigentes e torcedores, cantou com entusiasmo e repetidas vezes, o hino vascaíno.

Essa viagem no tempo, que não espera ninguém e corre cada vez mais veloz, me leva à cidade capixaba de Nova Venécia. Foi lá, no estádio Zenor Pedrosa Rocha, que testemunhei, do gramado, a estreia de Romário pelos profissionais.

Isso faz quase 37 anos. Era agosto de 1985 e a delegação carioca se hospedou no Hotel Hádria, de apenas dois andares e cuja arquitetura era colonial. Pela Rádio Globo, do Rio de Janeiro, eu, como repórter, e os saudosos Antônio Porto – locutor que criou o bordão “Bola pro mato que o jogo é de Campeonato” – e Alberto Rodrigues nos comentários. A população, imagino, não chegava a 40 mil habitantes, sendo que pelo menos metade era formada por gente simples da zona rural.

Foi o técnico Antônio Lopes quem lançou Romário. Ex-delegado, ele tinha moral e coragem para colocar jovens e mudar a equipe na hora que bem entendesse. Maior exemplo disso é o título estadual de 1982, conquistado em cima do Flamengo campeão do mundo. Lopes fez cinco alterações às vésperas da final e faturou o caneco graças a um gol de Marquinhos, um dos titulares barrados, que só entrou no segundo tempo.

Romário, por sua vez, fez logo dois, em sua estreia. O primeiro, aos 38 do segundo tempo – ou seja, com 18 minutos em campo. Outro, dois minutos mais tarde. O Vasco goleou: 6 a 0 no acanhado estádio de gramado irregular. Surgia ali um gênio da bola, um baixinho gigante que se tornaria o melhor jogador do mundo após o tetra que a seleção buscou em gramados norte-americanos, na Copa de 1994.

Curiosamente, Roberto, contundido, não jogou nem a final de 1988, nem a estreia de Romário. Mas isso é o de menos. O que vale é que Roberto Dinamite enfim terá sua estátua inaugurada, atrás do gol à esquerda da tribuna de honra de São Januário. Do outro lado, no gol da capela, eternizado pelo gol 1.000, marcado sobre o Sport em 2007, no mesmo estádio, já está a de Romário.

Os dois ídolos somam a impressionante marca de quase 2 mil gols marcados em suas carreiras. E agora, para a felicidade de toda a imensa torcida bem feliz, ambos os craques estarão novamente juntos, imortalizados na Colina histórica.

O OCASO DE UM MALANDRO: A HISTÓRIA DO SPORT CLUB DIABO

por André Luiz Pereira Nunes


Equipe campeã do Torneio Início Interclubes da Zona Sul em 1935

O Sport Club Diabo, uma das maiores glórias do chamado “sport menor”, foi fundado em 1° de março de 1927, por iniciativa de Ary da Conceição, ainda sob a denominação de Onze Diabos, pois era composto primordialmente por esse número de elementos, todos no auge da juventude.

Naquele mesmo ano já se tornaria uma sensação na cidade no que tange à conquista de torneios e a organização de festivais esportivos, tão em moda naqueles áureos e longínquos tempos.

O Grêmio Rubro-Negro, por conseguinte, logo angariou uma numerosa legião de fãs que resolveram mudar a sua intitulação para Sport Club Diabo, instalando-o na localidade de Águas Férreas, em Laranjeiras.

Não tardaria para que ganhasse as alcunhas de “campeão carioca do sport menor” e “Terror da Zona Sul”.

Em 1935, sagrou-se vice-campeão do Campeonato Carioca de Clubes Independentes, promovido pelo Jornal dos Sports, tendo ainda vencido, de forma invicta, nos segundos quadros, o Torneio Interclubes da Zona Sul, organizado pela Gazeta de Notícias, além da conquista igualmente invicta, nos primeiros quadros, do Torneio Início desta competição.

Sua sede social promoveu inúmeros bailes à fantasia e carnavalescos, concertos de bandas de jazz, festas juninas, réveillons, além do monumental baile do “Inferno Encantado”.

Porém, como é sabido, alegria de pobre dura pouco. Em 1940, os jornais já prognosticavam o iminente fim dos irreverentes “milionários de Águas Férreas”.

Uma noite quando o malandro chegou em casa, não encontrou, como de hábito, a sua amada Helena. Procurou-a, debalde, por toda parte e, como se não fosse possível descobrir seu paradeiro, pôs-se a cantar o samba que inspirou a sua alma trovadoresca.

– Helena, Helena, vem me consolar…, cantarolava.


Capa da Gazeta de Notícias retratando a conquista do SC Diabo

Mas a ingrata, acompanhada da amiga Aurora, resolveu permanecer onde estava, ignorando completamente os apelos do consorte apaixonado.

E o sambista continuou a chamá-la, cantando risonho:

– O dia já vem raiando. Só tu, Helena, não vens.

Entretanto, logo o malandro receberia uma notícia alvissareira. Sua Helena, cuja ausência lhe povoara o espírito de ciúmes, se encontrava no fórum, ao que consta, tratando de despejar o “Diabo”.

E enquanto não conseguisse pôr na rua o terrível “Demo”, para o que conta com o despacho do juiz da 9° Vara Cível, Helena não voltaria ao morro.

Tudo isso, no entanto, não passou de um simples sonho do infeliz sambista abandonado, visto que na realidade o que houve naquela Vara Cível foi uma petição de Dona Helena Corrêa requerendo o despejo do Sport Club Diabo, com sede à Rua Cosme Velho, 204, tendo mandado citar seu presidente, Sr. Seraphim Torres Filho.

A HONRA MAIOR CONCEDIDA

por Zé Roberto Padilha


O ano de 1975 deveria ser o meu como titular da ponta esquerda do Fluminense. No clube desde 68, passando por todas as divisões de base, com a venda de Lula, para o Internacional, o caminho estava aberto para a titularidade.

Joguei toda a pré temporada e quando estava prestes a começar o estadual, Francisco Horta contratou o melhor ponta esquerda do Brasil: Mário Sergio.

Horta queria um Dream Team e trouxe Rivelino e Paulo César. Que se juntaram a Edinho, Marco Antonio, Gil e Félix. Mario Sergio era um gênio e deu vontade de arrumar as malas. E voltar para Três Rios.

Para minha sorte, além do futebol ser um esporte coletivo, ele tem duas regrinhas básicas, porém fundamentais: com a bola você joga, sem ela você marca.

E com Toninho, Edinho e Marco Antonio se lançando ao ataque para ajudar Gil, PC, Rivelino, Gil, Manfrini e Mario Sergio, apenas Silveira e Zé Mário protegiam o Félix. A equipe fazia três, tomava três.

E o inesperado aconteceu (foto, ao lado do Cleber e do Herivelto) : Mário Sergio foi para o banco de reservas. E justifiquei minha escalação me tornando o torcedor que foi a campo defender o seu time de coração.

Para Mário Sergio, ficar na reserva era um fato inusitado, nunca acontecera durante o seu reinado no Vitoria-BA. E, muito menos, aconteceria na sua vitoriosa carreira que deu sequência no Grêmio, Inter, Botafogo e São Paulo, além da seleção brasileira.

Dizem que voltou.mais competitivo. Todo jogador deveria sentar nesse divã do futebol para rever conceitos e posturas.

Cada jogador carrega, como recordação da sua carreira, entre conquistas e frustrações, uma honra maior. A minha, foi vestir a 11 reservada, pela técnica e habilidade, a um dos mais completos ponta esquerda que o Brasil conheceu.

E ele, dentro da sua generosidade e elegância, não só respeitou minha escalação, como nos concedeu conselhos e orientações.

A genialidade, e Mário Sergio provou isso, tem uma relação muito próxima da nobreza. E, desse jeito, ao nos deixar precocemente, o “vesgo” deixou muitas saudades dentro e fora das quatro linhas.