Escolha uma Página

PAPÉIS INVERTIDOS

:::::::: por Paulo Cézar Caju ::::::::

Ontem foi celebrado o Dia dos Pais e foi bacana demais ver os estádios ao redor do Brasil lotados de família! Em tempos de ônibus apedrejados e brigas de torcidas organizadas, foi um sopro de esperança e até me lembrou os áureos tempos de Maracanã e Geral.

Como meu filho mora na Suécia, aproveitei a data para sentar no sofá e assistir todos os jogos possíveis. Comecei pela manhã vendo o futebol europeu e só fui parar à noite depois da goleada do Internacional contra o Fluminense. Fico abismado ao ver como os papéis se inverteram de uma forma tão rápida. Há pouco tempo atrás, os europeus tentavam de tudo para imitar os brasileiros e, convenhamos, não chegavam aos nossos pés. A ginga, o toque de bola e a irreverência estavam no nosso sangue, nas peladas, e ninguém conseguia nos parar!

Vendo os jogos de ontem, ficou ainda mais nítida a disparidade. Enquanto lá a bola roda de pé em pé, os fundamentos são bem executados e os jogadores sabem suas funções dentro de campo, por aqui regredimos e vemos um bando desordenado em campo.

Muito se falou que o 10×1 (7 da Alemanha e 3 da Holanda) seria um choque de realidade para virarmos a chave, mas não vi nenhuma evolução até então! Pelo contrário…

Faltam menos de 100 dias para a Copa do Mundo, já vejo amigos comprando a camisa nova que está uma fortuna e não consigo nem escalar os 11 da nossa seleção! A minha única esperança é que a zebra dê as caras e nos ajude nesses 7 joguinhos…

Pérolas da Semana:

Resolvi simplificar para os leitores e traduzir algumas delas:

Ligação direta é o mesmo que dar um chutão para frente. Uma linha de quatro é composta por lateral-direito, beque central, quarto-zagueiro e lateral-esquerdo. Centro-médio na frente da zaga fazendo a cobertura. Outra linha de 5 é o mesmo que ponta-direita, meia-direita ou meia armador, centroavante, meia-esquerda e ponta-esquerda. No linguajar dos ditos-cujos seria 5+1.

“O jogador centralizado ou verticalizado fura ou quebra as linhas por dentro com dinâmica compactuada e semente espetada. Assim, dá tapa na bola viva encaixotada ao invés de toque para assistência pelas beiradas”.

E aí, geraldinos da antiga? Entenderam a baboseira?

HOJE TEM PELADA

por Claudio Lovato Filho

Hoje ele vai dar um tempo para os perrengues (presentes e futuros, reais e imaginários).

Hoje ele vai deixar que eles fiquem a cargo do seu São Sebastião-querido-de-todas-as-horas e (claro) dos deuses do futebol.

Hoje tem pelada.

A pelada amada de todas as segundas-feiras. Amém.

Hoje ele vai tomar umas geladas – apesar de ser segunda-feira.

(Tomar, não – porque, como disse o Jamelão, “eu não tomo nada, eu bebo!”)

Hoje ele vai confraternizar com seus camaradas e rir às pampas com eles.

Seus irmãos, gente que conhece sua história e gente cujas histórias ele também conhece muito bem.

É assim na pelada.

Hoje ele vai lembrar do avô (todo dia ele lembra do avô, mas no dia da pelada lembra ainda mais). O avô que levava o neto ao estádio e que sempre ia ver o neto jogar na praia, o avô de quem o neto sente tanta saudade e que se foi deste mundo há muito tempo, o avô que era fã do Jamelão, o avô que foi como um pai.

Hoje é dia de vestir o jaleco!

Hoje tem pelada e pode ser que chova, mas isso não é problema, nunca será – pelo menos enquanto a bola rolar, enquanto o passe chegar.

E se não rolar e se não chegar, paciência – aí é pé embaixo da bola, para levantar a redonda e conduzi-la com malícia e sabedoria e avançar na água empoçada.

Hoje não tem choro nem vela, hoje não tem chorumela.

Hoje ele vai ignorar a coluna encrencada, não vai dar bola pra ela.

(Amanhã o Torsilax resolve.)

Vai tentar o voleio naquela jogada de escanteio, mas (Qual é? Tô fora!) vai fugir do cabeceio.

E quando cansar vai ficar só lá atrás, espanando ou tocando pro lado; subir só na boa (de Uber ou de canoa).

É, hoje tem pelada.

Hoje ele põe de lado todos os imbróglios, aporrinhações, entreveros, broncas, pepinos e abacaxis.

Hoje ele vai deixar os grilos do passado bem quietinhos onde eles têm de ficar – no passado.

Porque hoje tem pelada.

E ele já está indo.

Foi.

Já está lá.

“Rola logo essa p*, Felipinho!”

Sim, hoje tem pelada.

E depois virá a semana, com tudo o que ela reserva de bom e de nem tão bom (porque a vida é assim).

Mas então a semana terá começado do jeito certo.

Do jeito que precisava ser.

Amém.

o craque do brasil em 2019

por Luis Filipe Chateaubriand

No ano de 2019, o Flamengo “deu as cartas” no futebol brasileiro, vencendo a Copa Libertadores da América e o Campeonato Brasileiro.

Liderando um grupo de grandes jogadores, à frente da turma, o recém-chegado Bruno Henrique.

O mancebo teve excelentes atuações.

Extremamente veloz, ganhava na corrida frequentemente de seus adversários.

Técnico, acertava passes e cruzamentos com perfeição.

Irrequieto, ainda fazia seus gols.

O homem parecia estar possuído…

Por essas e outras, Bruno Henrique foi o craque do Brasil em 2019.

“futebol virou um jogo de xadrez”

Lançado por Zagallo, no início dos anos 1970, o ex-ponta rubro-negro Vicentinho recorda, nesta entrevista, o convívio com Zico e a alegria do Maracanã raiz; e diz que teria vaga no Flamengo atual

por Jonas Coelho

Jogador do Flamengo entre 1971 e 1974, Vicente de Paula Santos de Figueiredo Júnior, mais conhecido como Vicentinho, foi um dos antecessores do icônico time da década de 80. Chegou a deixar Zico no banco. Ponta direita veloz e habilidoso, atuou em 67 jogos pela equipe rubro-negra, mas também colecionou passagens por Fluminense de Feira (BA), Ceará, Moto Clube, Campo Grande, Olaria, Volta Redonda, Ponte Preta, Itabuna, Serrano e Tiradentes.

Apesar de pouco conhecido pela atual geração de torcedores do Fla, Vicentinho é reverenciado por lendas da Gávea, como Adílio. Ele enalteceu a trajetória do ex-atacante em depoimento no Instagram: “A história do nosso time vitorioso começou com Vicentinho, Doval, Rogério, Silva Batuta, essa turma toda”.

Os bons tempos do ex-ponta, hoje analista de desempenho, passeiam nesta entrevista. Vicentinho relembra o início da carreira, quando o Vasco o deu bandeja à Gávea, e a convivência com Zicos e demais bambas daquela época dourada. Confessa que tem saudade do Maracanã raiz, da energia emanada da geral, e do maior espaço à habilidade. Por outro lado, reconhece os avanços táticos e compara o futebol de hoje a um jogo de xadrez.

Como foi atuar ao lado de Zico? Era possível observar a singularidade dele desde jovem?

O Zico sempre foi um garoto que despontava pela habilidade, pelo talento. Quando a gente ia assistir a alguns jogos da base, via que ele já era diferenciado. Mas era muito magrinho no começo, e teve altos e baixos na transição para o profissional. O Zagallo estava tentando encaixá-lo no time. Às vezes, ele entrava no meu lugar, na ponta direita. Eu até brinco que ele sentou no banco para mim. Aí ele fala que só tinha 17 anos. Quando estou com o ele e o Adílio, a gente sempre brinca que, por mais que só tivesse 17 anos, já era o Zico. Brincadeiras à parte, não tem comparação. O Zico jogava muito. E sempre foi leal a todos, educado. Gostava muito dele. Hoje temos uma relação mais distante, nos encontramos apenas em alguns eventos. Ele é uma pessoa fantástica.

Como iniciou a sua trajetória no Flamengo?

No meu começo, acabei emprestado ao Campo Grande para a disputa do Campeonato Carioca. Logo depois o Zagallo assumiu o Flamengo. Eu estava indo bem no Campo Grande, dava trabalho para laterais da seleção, como Marinho, do Botafogo, e Marco Antônio, do Fluminense. Aí comecei a virar destaque na competição. Quando joguei contra o Flamengo, eu fui eleito um dos melhores jogadores. O Zagallo, então, perguntou sobre mim, me elogiou bastante, e pediu que eu voltasse para a Gávea. Eles já tinham um ponta direita chamado Rogério, mas só de fazer parte do plantel já estava ótimo para mim. Ainda estava com 19 anos. Jogava alguns jogos. O Rogério, outros. E assim fomos campeões cariocas em 1972 com o Zagallo. Depois fomos bicampeões da Taça Guanabara, em 1973. Voltamos a conquistar o Carioca em 1974.

Você sempre torceu para o Flamengo ou desenvolveu carinho pelo clube a partir da relação profissional?

Comecei a carreira na base do futsal do Vasco. Joguei no infantil de campo do Vasco, depois pulei para o juvenil e, com 17 para 18 anos, joguei pela seleção carioca. Mas, na volta da seleção, o Vasco tinha feito uma mudança política no clube e me dispensaram. A partir daí, eu não quis mais ver a camisa do Vasco na minha frente. Mas não desisti do meu sonho, até porque eu sabia que tinha qualidade. Pela rivalidade do Vasco com o Flamengo, eu passei a me ver jogando pelo time rubro-negro, com o Maracanã cheio. Então, liguei para o massagista da seleção carioca, que trabalhava no Flamengo, e ele me apresentou à diretoria do clube. Na época, não havia juniores. Ou eu ficava no profissional ou um abraço. Quando cheguei lá, já sabiam mais ou menos a minha história e me colocaram para treinar com a equipe profissional. Joguei muito. Dei uma correria para os caras. Então, quiseram me manter e fizeram um contrato de gaveta. Ali começou a crescer a chama da paixão pelo Flamengo, porque os caras me atenderam bem para caramba.

Você teria vaga no atual time do Flamengo? Se sim, no lugar de qual jogador?

Acho que faria parte desse plantel, sim. Mas hoje o futebol é diferente. Agora estamos voltando com os homens de lado de campo, que não são mais chamados de ponta. O time do Flamengo vem sendo tão mexido, que não sei na vaga de quem eu entraria. Acho que teria chance de brigar por uma vaga ali no lado direito, com Everton Ribeiro e Marinho.

Na sua opinião, o Flamengo presta um reconhecimento ideal aos ex-jogadores do clube?

O Flamengo tem um departamento de patrimônio muito bom em relação a isso. Eu já participei de algumas homenagens no Maracanã. No mês do meu aniversário, sempre me convocam, a cada ano, para receber homenagens no Maracanã e na Gávea. Mas só isso mesmo.

Com a valorização do mercado do futebol e o advento da internet, você acredita que teria um reconhecimento maior hoje, principalmente das gerações mais novas de rubro-negros?

Sim. Se na época em que eu jogava nós tivéssemos todo esse aparato, seríamos mais reconhecidos, inclusive pelas gerações mais novas de torcedores.

Como era atuar no antigo Maracanã? Você considera positiva a modernização do estádio ou sente falta de algum aspecto, digamos, mais raiz?

É o sonho de todos os jogadores jogar no Maracanã. Mas, para a gente que jogou no antigo, muitas vezes com 150 mil pessoas, era diferente. Muitas pessoas acham saudosismo. Mas era diferente. Hoje o futebol se tornou um negócio, né? Isso acabou elitizando um pouco o futebol, os estádios. Na minha época, era mais popular. A energia da geral no Maracanã era incrível. O novo Maracanã ficou muito bonito, mas eu tenho saudade do modelo antigo. Hoje em dia, também está até perigoso, com tantas brigas de torcida, diferente da minha época, em que as famílias frequentavam o estádio.

Quais as principais diferenças entre o futebol jogado na sua época de profissional e o atual?

Na minha época, o jogador tinha muito espaço em campo. Você mostrava a sua arte com mais tranquilidade, vamos dizer assim. Hoje os espaços diminuíram bastante e as regras também mudaram. Com as regras de impedimento, os times jogam com a linha de defesa alta. A individualidade se perdeu um pouco. E o coletivo sempre prevalece, sobretudo na marcação. A parte tática evoluiu demais. Sou apaixonado pela parte tática. Trabalho com isso hoje, mais especificamente com análise de desempenho. Acho que ainda temos muito a evoluir no futebol brasileiro, mas estamos no caminho. A vinda dos europeus para cá, nesse sentido, foi ótima. Já devia ter acontecido antes. Costumo dizer que o futebol atual é um jogo de xadrez. Para ir a campo, o time deve estar muito bem preparado

O CACHIMBO DA PAZ

por Zé Roberto Padilha

A poucos meses da Copa do Mundo, chegou a hora de acender um cachimbo da paz entre a torcida brasileira e o nosso maior jogador. Ela, a torcida, para de pegar no pé dele e ele retribui se cuidando para nos levar ao título.

Neymar está com 30 anos, e quem tem acompanhado os jogos do Paris St Germain, como eu, pode afirmar que ele está no auge. O tempo fez com que trocasse suas arrancadas em velocidade, onde decidia tudo sozinho, por um repertório coletivo em que acrescenta assistências preciosas.

Ganhou corpo e equilíbrio, e não cai mais toda hora. Tem feito, ao lado do Messi, partidas tão brilhantes que, tamanha a disparidade com o que estão jogando seus coadjuvantes, nos levam a acreditar que a final no Catar será entre Brasil X Argentina.

Os dois estão voando.

Da nossa parte, torcedores brasileiros, vamos lembrar que ele é o último produto da nossa fábrica de foras-de-série que encantou o mundo. Que a diferença entre ele, Vinicius Jr, Lucas Paquetá e Gabriel Jesus é similar ao mesmo abismo que separou Ronaldinho Gaúcho, Ronaldo e Rivaldo dos seus companheiros da última Copa do Mundo que ganhamos.

Enfim, nunca um país dependeu tanto do talento de um jogador para, ao lado de um grupo talentoso e previsível, recuperar a hegemonia do futebol mundial.

Ao completar 30 anos, Neymar atinge a idade da lucidez. Foi a que Rivelino se apresentou ao Fluminense. Próxima da que Zico, com 28, ganhou o mundial de clubes, e com 29 anos, fez parte do Dream Team treinado por Telê Santana em 1982.

Se os indígenas, de tribos rivais, conseguiam celebrar acordos de paz fumando o tal cachimbo, por que não podemos fazer o mesmo com essa espécie em extinção?